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CAPÍTULO VII
Julie mudou-se para Thorpe Hulme no fim de semana. Sua mobí lia já havia sido entregue, e uma cozinheira chamada sra. Hudson já estava à sua espera na casa. Desde a noite em que Emma vomitou, ela viu Robert poucas vezes. Ele passava a maior parte do dia no escritó rio e suas noites pareciam dedicadas a Pamela e seus amigos. O que era natural, dizia Julie a si mesma, amargamente. Na realidade, era muito agradá vel mudar-se para uma casa só sua, outra vez. A sra. Hudson era uma viú va de meia-idade, com os filhos já todos criados e casados. Tratou Julie mais como uma filha do que como uma patroa. Estava combinado que Robert as levaria para Thorpe Hulme no domingo de manhã, mas na sexta-feira ele recebeu um telegrama do escritó rio em Nova lorque, informando-o de uma reuniã o à qual teria de comparecer. Pamela, que estava no apartamento quando o telegrama chegou, esperando que Robert a levasse ao teatro, imediatamente insinuou que ela poderia levar Julie e Emma para a casa. — Afinal, querido — prosseguiu —, nã o faz diferenç a quem levará Julie, faz? — Nã o, acho que nã o — concordou. — Está bem para você, Julie? Julie nã o estava particularmente entusiasmada em ter Pamela como motorista — Nó s podemos pegar um tá xi — sugeriu. Pamela estendeu-lhe as mã os. — Minha cara, nã o é necessá rio, estou livre. Julie foi forç ada a aceitar sua oferta e, assim, Pamela as levou à e ajudou-as com a bagagem. A sra. Hudson veio da cozinha para saudá -las. Era pequena, como Julie mas mais gorda, com os cabelos cinzentos e uma expressã o sorridente e calorosa. Guardou para Emma um sorriso todo especial e entã o disse: — Eu fiz um pouco de café, sra. Pemberton. Está à sua espera na sala de estar. Será que a pequena poderia vir à cozinha comigo? Fiz uma deliciosa gelé ia de nozes, e se ela quiser provar... Emma arregalou os olhos. — Oh, fantá stico! — exclamou, e Julie disse: — Está bem. Mas hã o exagere, ouviu? — Eu cuidarei para que isso nã o aconteç a — prometeu a sra. Hudson. Assim que as duas se foram, Julie olhou ao redor do vestí bulo prazerosamente. As paredes eram todas brancas e um carpete vermelho escuro cobria o chã o. Depois de oferecer uma xí cara de café a Julie, Pamela disse: — Acho que você se sentirá muito confortá vel aqui, nã o? Julie sorriu-lhe francamente. — Acredito que sim. É uma casa antiga e adorá vel. — É, sim. A princí pio eu queria que Robert a comprasse para nó s, mas ele achou muito pequena. Afinal, Robert tem que receber à s vezes e, no momento, ele se acha confinado naquele apartamento. Assim que casarmos espero que possamos receber mais constantemente. Um solteiro nunca pensa nisso, nã o é? Julie aquiesceu polidamente. Pamela estudou-a por um longo tempo, o que fez com que Julie nã o se sentisse muito confortá vel, e finalmente disse: — Você já esteve comprometida com Robert, nã o esteve? Julie pousou a xí cara sobre o pires, fazendo barulho. — Sim, você acertou. Pamela pareceu pensativa. — Eu sei. Robert me disse. Julie respirava com dificuldade. A idé ia de tornar-se um assunto discutido por Robert e sua noiva nã o lhe parecia aceitá vel. Imaginava por que Pamela estava trazendo isso à baila. — Mas você casou com o irmã o dele — prosseguiu. — Michael. Sim — Julie concordou. — Robert disse que você s acabaram antes dele ir para a Venezuela. Você se importa de dizer por quê? — Os olhos de Pamela examinavam. — E isso importa? — Julie desejava que ela mudasse de assunto — Você tem um cigarro? — perguntou, mexendo nervosamente com as mã os. Pamela pareceu desconfiada, mas abriu a bolsa e tirou um maç o de cigarros. As duas estavam fumando quando Pamela disse: — Você nã o se incomoda de eu lhe perguntar essas coisas, nã o? Acontece que... bem, é difí cil conversar sobre isso com Robert. Julie soprou a fumaç a displicentemente. — Nã o, está tudo bem — respondeu, levantando-se decidida. — Você acha que teremos um inverno pesado? Eu nem me lembro direito de como é neve. Pamela levantou-se també m, chegando-se perto da outra na janela. — Eu nunca disse nada — disse com suavidade —, mas estou lhe oferecendo agora minhas condolê ncias pela morte de seu marido. Sinto nã o tê -lo conhecido. — Muito obrigada — Julie murmurou, atrapalhada. Pamela concordou e a tocou amigavelmente no ombro. — Agora preciso ir. Mamã e me espera para uns drinques antes do almoç o. Há visitas em casa. — E, hesitante, acrescentou: — Assim que estiver instalada aqui, você deveria ir nos visitar. Estou certa de que mamã e e papai ficariam deliciados em recebê -la. Mas que reviravolta! Julie estava aturdida. Era ó bvio que, para qualquer um que nã o ficasse em seu caminho, Pamela conseguia ser tã o cativante quanto seu pai. Julie percebeu que essa era a oportunidade para mencionar que ela havia almoç ado com Francis no começ o da semana. Mas, por algum motivo, as palavras nã o saí am. Afinal, se Francis nã o havia dito nada, como ela poderia? Pamela dirigiu-se para a porta e acenou para Emma e para a cozinheira enquanto saí a. Julie viu seu carro partir, sentindo uma sé rie de dú vidas. Como a vida, de repente, lhe pareceu terrivelmente complicada! O que haveria de errado com ela para sentir que preferia a hostilidade de Pamela do que sua amizade. Dali a poucos dias, elas já estavam comodamente insta]adas em Thorpe Hulme. Sandra Lawson nã o se juntaria a elas na primeira semana, para que tivessem tempo de se ajustar. Assim, nos primeiros dias, eram apenas Julie, Emma e a sra. Hudson. Os jardins nos fundos da casa eram o encanto da menina. Apesar dos dias serem frios e ú midos, o balanç o exercia uma espé cie de magnetismo e ela passava a maior parte do dia sobre ele, acompanhada ora por sua mã e, ora pela sra. Hudson. Robert estava nos Estados Unidos e ainda faltava uma semana para seu retorno. Naturalmente, Julie nã o ouviu isso diretamente de Robert, mas Lucy telefonava-lhe todos os dias para ter a certeza de que Julie se mantinha atualizada com as notí cias. Nesse tempo, Pamela visitou-a algumas vezes. Na quinta-feira, Francis telefonou-lhe. Atendendo desinteressadamente o telefone, esperando ouvir a voz de sua sogra, lulie teve uma agradá vel surpresa ao reconhecer a voz dele. — Alô, Julie — disse, sorrindo. — Você pensou que eu me esqueceria de você? — Nã o. Eu pensei que você tinha mudado de idé ia — respondeu, com certo embaraç o. Francis riu. — Dificilmente. Bem? Como você está se dando com a vida no campo? — Eu gosto. — Julie sentou-se no braç o de uma poltrona pró xima. — Estamos nos adaptando muito bem. Emma adora a liberdade. Como vai você? — Oh, lutando — respondeu, zombeteiro. — A principal razã o de eu nã o haver ligado é que eu estava fora, na Escó cia. Voltei ontem à noite. — Robert está viajando també m. — Sim, eu sei. Algué m me disse isso em casa. — Estou contente por você ter ligado — disse num impulso. — Está mesmo? Por quê? Julie suspirou... — Oh, eu nã o sei. Estou me sentindo um pouco desanimada. Acho que é a mudanç a! Oh, sabia que a governanta chega no domingo? — A governanta? Você quer dizer Sandra Lawson? — Sim. Você a conhece? — Claro que sim. Ela e Pam freqü entaram a escola juntas. — É claro. — Julie recordou-se de que sua sogra lhe havia dito — Eu esqueci. — Algo errado? Ela a intimida? Julie traç ava um desenho no carpete com a ponta do pé. — Nã o vai conseguir — disse com determinaç ã o. — Soa sinistro — brincou Francis. — Olhe amor, eu nã o telefonei para passar meia hora conversando com você. Quero vê -la. — Quando? Julie hesitou. — Nã o sei. Tem Emma... — Leve Emma també m. Deixe que eu lhe diga: que tal se eu for aí e você me convidar para almoç ar? Julie ergueu as sobrancelhas. — Acho que está bem — respondeu devagar, antecipando mentalmente qual seria a reaç ã o de Robert quando soubesse que Francis havia ido almoç ar. — Nã o me parece muito encorajador — observou Francí s, Como se tivesse ficado sé rio. — Devo ter-me enganado. — Oh, perdã o, Francis. — Julie agora gargalhava. — Mas é claro que você pode vir almoç ar. E, como um tratamento especial, eu lhe farei o meu melhor prato! — Isso parece interessante. E qual é? — Espere e verá — Julie respondeu e, olhando para seu reló gio, prosseguiu: — Já sã o onze horas. Onde você está? — Em casa. — Em sua casa? — Julie estava chocada. — Isso mesmo, estou em meu escritó rio. Ningué m pode nos ouvir. — Você faz isso parecer tã o furtivo. — Realmente? Desculpe-me. Vou entã o sair e falar para Louise e Pamela onde vou e, sem dú vida, elas irã o comigo. — Oh, Francí s! — Você quer que elas me acompanhem? Julie suspirou. — Claro que nã o. — Ela queria ver Francí s, apenas Francí s. Ele era muito bom para ela e Julie estava precisando de algué m com quem conversar. — Bem, entã o? — Entã o venha — respondeu rí spida e desligou. Ela mal teve tempo de trocar-se e pentear o cabelo e o carro dele apontou na entrada da casa. Emma o viu da cozinha. — Nã o é o tio Francis? — perguntou. Julie teve que avisar a sra. Hudson que haveria um convidado para o almoç o e Emma estava obviamente excitada. — Oi, coraç ã o — disse Francis enquanto fazia có cegas sob o queixo de Emma, que se dobrava de tanto rir. Entã o, chegando perto de Julie, falou; — Nã o me olhe assim, Julie, ou vou começ ar a querer deixar de ser o bom menino que você pensa que sou. Julie sorriu... — Venha, entre — disse, nã o muito perturbada com a familiaridade. De alguma forma, Francis era diferente de todos os outros homens que havia conhecido. Emma saiu pulando em direç ã o à sala de estar e ele examinou o ambiente com um ar crí tico. — Sim, eu conheç o aqui — concordou. — Nã o está mal, nã o? Levando-se em conta que foi minha filha que escolheu a decoraç ã o! Julie riu e encaminhou-se para a bandeja de bebida sobre a mesa de canto. — O que posso oferecer a você? Cherry? Uí sque? Ou você prefere café? — Uí sque está ó timo. Posso sentar? — Mas é claro — Julie concordou e Francis afundou-se no sofá com Emma a seu lado. — Onde está tia Pamela? — a garota perguntou com sua habitual falta de tato. — Em casa — Francis respondeu, complacente. — Ela nã o quis vir aqui com você? — Emma estava surpresa. — Simplesmente adoraria, mas eu nã o a chamei. — Francis aceitou o uí sque que Julie lhe oferecia e, rindo ainda mais com a expressã o de desagrado da menina, acrescentou: — Eu achei que, se ela vem ver você um monte de vezes sem me avisar, por que eu a chamaria? Emma pareceu orgulhosa disso. — Você realmente veio ver-me? — E a mamã e — esclareceu Francis, enquanto tomava seu uí sque. — Alé m do mais, seria muito grosseiro de minha parte dizer que vim aqui apenas para vê -la, nã o seria? — E, piscando para ela completou baixinho: — Mas nó s sabemos, nã o sabemos? Emma gargalhou e Julie sentou-se ao lado deles, perguntando: — Por que você nã o teve mais filhos, Francis? — Porque nã o erá para acontecer — ponderou, suave, e Julie rapidamente mudou de assunto. O almoç o foi alegre. Francis era um perito em entreter uma crianç a e Emma achou-o uma grande companhia. Apó s a sobremesa, uns bolinhos deliciosos de morango que eram a especialidade de Julie, a menina insistiu em levá -lo para fora para que visse seu balanç o. A sra. Hudson, que ainda nã o conhecia Francis, comentou: — É um homem agradá vel, nã o? Muito paciente. Julie suspirou. — Sim. Você sabe que ele é o pai da srta. A sra. Hudson assentiu. — Havia percebido. — E você deve ter percebido que ele nã o deveria estar aqui murmurou Julie, desgostosa. — Por quê? — A sra. Hudson era sempre direta. — Bem. Ele tem a esposa dele, a senhora sabe. A sra. Hudson estava ocupada com a louç a. — Mas nã o há nada entre você s, nã o? — perguntou. Julie encarou-a. — Como pode afirmar isso? A senhora nã o conhece a situaç ã o. A sra. Hudson sacudiu a cabeç a. — Conheç o o suficiente para saber quando um homem e uma mulher estã o dormindo juntos — respondeu com firmeza e, diante do espanto de Julie, prosseguiu: — O sr. Hillingdon ficará para o jantar? Julie estava quase engasgada de espanto. — Eu... acredito que nã o. A sra. Hudson sorriu-lhe. — Nã o fique tã o chocada. Eu nã o deveria ter dito nada, nã o? Julie recompô s-se. — Pelo menos... estou feliz. Eu nã o tinha ningué m com quem conversar. A sra. Hudson olhou-a, radiante. — Bem, nã o se preocupe comigo. Eu sei quando devo manter minha boca fechada. Julie voltou-se, desesperada. — Isso parece terrí vel, sabia? — E entã o, rindo, acrescentou: — Oh, sra. Hudson, a senhora está certa. Ele é realmente um homem agradá vel. Quando Francis e Emma voltaram para a casa, a sra. Hudson estava preparando um chá e Francis estirou-se preguiç osamente em uma das confortá veis cadeiras da sala. — Você me deixou exausto — queixou-se para Emma, que imediatamente ligou a televisã o. — Está quase na hora do " Brinque de Escola" — explicou, toda sorridente. — Você nã o está realmente cansado, está, tio Francis? — Você deve estar brincando! Eu nã o estou acostumado a passar as tardes pulando pelo jardim. — isso lhe fará bem — disse Emma, repetindo praticamente aquilo que de tempos em tempos diziam para ela. Fico feliz por você pensar assim. — Francis voltou-se para julie que acabava de entrar com o carrinho de chá. — Tem uma xicara para mim? — Claro! — Julie sorriu. — Você vai ficar para o jantar? A expressã o alegre desapareceu do rosto de Francis. — Nada me agradaria mais — respondeu honestamente — mas tenho que sair com Louise hoje à noite. Nó s costumamos jogar bridge as quartas-feiras. — Francis voltou-se para Emma e viu que ela estava entretida com seu programa de televisã o. Entã o, tomando a mã o de Julie, exclamou, Impaciente: — Oh, Julie, peç a-me para ficar e eu ficarei! Julí e afastou sua mã o, relutante. — Você quer aç ú car? — perguntou, um pouco ofegante. — Duas colheres, por favor — pediu Francis. — Deixe-me levá -la para jantar uma noite dessa semana, antes que o dragã o chegue. — Ela sabia que ele estava se referindo a Sandra Lawson, e seus lá bios crisparam-se. — Que tal sá bado? É uma ó tima noite. Você nã o gos-taria de ir à cidade? Estou certo de que a sra. Hudson poderia cuidar de Emma. — Estou certa de que poderia. Seria maravilhoso. — Ó timo. — Francis tomou sua xí cara de chá. — Acredite-me, os dias irã o se arrastar até lá. Depois que Francis se foi, apó s terem acertado tudo com a sra. Hudson, Julie começ ou a sentir-se terrivelmente culpada. Assim que pô s Emma para deitar, em vez de dirigir-se para a sala como fazia todas as noites, foi à cozinha. A sra. Hudson estava lavando a louç a do jantar e a olhou com um sorriso. — A senhora quer alguma coisa? — perguntou. — Apenas um papo — respondeu Julie. Suspirando e pegando um pano de prato, começ ou a enxugar a louç a que estava no escorredor. — Isso nã o é necessá rio, a senhora sabe! — exclamou a cozinheira. — Pode falar se quiser, mas deixe que eu cuido dessa louç a. — Gostaria de ajudar — disse Julie simplesmente. — Eu... eu nã o queria ficar sozinha. — Emma já está deitada? — Oh, sim. Ela estava esgotada. Foi um dia muito agitado para... ela. — E para o sr. Hillingdon també m, e nã o é de se estranhar — observou a sra. Hudson com uma risadinha. — Ele é muito bom para ela, nã o? — Sim, senhora. Ele deveria ter filhos mais jovens també m. — Bem, ele teve Pamela, anos atrá s. — Sim. — O tom da sra. Hudson era revelador. — Você nã o gosta dela? — Julie estava cometendo o imperdoá vel pecado de bisbilhotar sobre seus convidados com sua empregada mas nã o pô de evitar a pergunta. — Digamos que ela nã o é bem meu tipo — a sra. Hudson respondeu, cautelosa. — Eu sei o que está querendo dizer. Uma espé cie de personalidade do tipo " eu nã o gosto disso, nã o gosto daquilo". — É isso mesmo. — A cozinheira torceu o pano de prato e começ ou a limpar o escorredor. — Mas, sem dú vida, estou errada, O sr. Robert parece que gosta muito dela. — Você conhece Robert? — Claro que sim. Eu trabalhava para a mã e dele, anos atrá s, quando Michael e Robert eram dois pirralhos. — É verdade? — Julie estava fascinada. — Ora. vamos! Fale-me disso. — Sobre Michael, senhora? Julie ficou ruborizada. — Sobre ambos. A sra. Hudson deu de ombros. — Eles eram garotinhos ainda. Apenas um ano de diferenç a entre ambos. — Entendo. — Julie fez uma expressã o vaga — Cé us, que mundo. A sra. Hudson fez que sim com a cabeç a. — Bem, quando o sr. Robert comprou esta casa, e estava procurando uma cozinheira, veio direto a mim. Julie recostou-se numa das banquetas de pernas compridas que havia na cozinha. — Você os tem visto muito nesses ú ltimos anos? — De tempos em tempos eles vinham nos ver, depois que eu casei a senhora sabe. E quando Brian morreu, eles foram muito atenciosos. — A cozinheira deu um sorriso, como se estivesse relembrando de algo. — Eles sempre foram bons meninos. — Sim. Você sabia que eu já fui noiva de Robert? — Sim, sabia, senhora. Cheguei até a receber um convite para o casamento. Julie estava vermelha. A sra. Hudson suspirou. — Nunca imaginei que tudo fosse cancelado, como foi, e que o sr. Robert fosse para a Venezuela. — Foi decisã o dele. — O quê? Ir embora para a Venezuela? — Sim. E cancelar o casamento. Mas eu entendi que ele tinha que ir, senhora. Houve um acidente nã o? Um dos seus empregados foi morto, nã o foi isso? — Sim, no projeto do vale do Guaba. — Isso mesmo. — A sra. Hudson insistiu no assunto. — E o sr. Robert teve que ir para tomar o seu lugar. — Ele nã o precisava ir — afirmou Julie. A sra. Hudson pareceu perturbada. — Oh, eu nã o sei disso nã o, senhora. Afinal, mandar alguma outra pessoa poderia ser arriscado. Ele era o ú nié o que conhecia tudo sobre o serviç o, alé m do homem que foi morto, naturalmente. Julie encolheu os ombros. — Bem, isso aconteceu há muito tempo. A sra. Hudsô n concordou. — Mas a senhora nã o podia amá -lo, pois se casou com o sr. Michael e se foi com ele antes do sr. Robert voltar. Julie dirigiu-se para a porta. — Robert partiu exatamente uma semana antes de nosso casamento — disse, com os lá bios crispados. — Seu marido faria isso? — Essa é uma pergunta difí cil de responder. Você s dois acabaram por causa dessa viagem? — Eu nã o disse isso. A sra. Hudson fez um ar de resignaç ã o. — A senhora sabe como cuidar de sua pró pria vida. Mas, como eu disse, a senhora nã o poderia casar-se com O sr. Michael como fez, a menos que estivesse em dÚ vida sobre o sr. Robert. Julte abriu a porta. — Nã o. Bem, acho que nã o devemos insistir nessa conversa. Você pode ir agora, se quiser. Se eu precisar alguma coisa, mais tarde, eu mesma providencio. — Está bem, sra. Pemberton, muito obrigada. Sandra Lawson chegou sem nenhum aviso na manhã do sá bado. A sra. Hudson a recebeu e Julie já a encontrou no vestí bulo. — Espero que a senhora nã o tenha nehhuma objeç ã o — disse, pousando sua bagagem no chã o —, mas minha senhoria queria dispor do apartamento a partir de hoje, por isso pensei que, em vez de gastar dinheiro com um hotel, poderia vir para cá. Afinal, um dia a mais ou a menos nã o fará diferenç a, nã o é? Julie esboç ou um gesto confuso. — Eu... bem... sra. Hudson? A cozinheira sacudiu seus ombros largos. — As camas estã o todas feitas, senhora. Nã o há problemas. Sandra dirigiu um olhar avaliador para a sra. Hudson. — A senhora deve ser a sra. Hudson. A srta. Hiltingdon falou a seu respeito. Julie nã o parava de mexer com os dedos. — Sra. Hudson, poderia mostrar o quarto da srta. Lawson e depois preparar-nos um café? — Pois nã o, sra. Pemberton. A sra. Hudson disse para Sandra segui-la escada acima, mas nã o fez nenhuma menç ã o de ajudá -la com as malas. Julie hesitou, mas finalmente voltou para a sala de estar, enquanto Sandra carregava sua bagagem e seguia a cozinheira com má vontade. Nã o fora um começ o auspicioso. Emma entrou na sala, excitada e suja de tanto brincar no jardim. — Quem estava naquele tá xi, mamã e? — perguntou, com uma expressã o desconfiada. — Era a srta. Lawson, querida. — Mas você disse que ela só viria amanhã. — Eu disse, mas ela chegou antes. Emma fez uma careta. — Por quê? Vou ter que assistir aula hoje? — Nã o seja boba, querida. Nã o acredito que suas aulas começ em nos pró ximos dias. E olhe para esses seus sapatos! Estã o imundos. Vá colocar seus chinelos se quiser ficar dentro de casa. Emma caminhou pensativa para fora da sala e Julie a observou com complacê ncia. Pobre Emma! Quantas coisas mudaram em tã o pouco tempo. Primeiro Rathoon, depois Kuala Lumpur, Londres e finalmente Thorpe Hulme. Num impulso, discou para o apartamento de Robcrt em Londres. Halbird atendeu e Julie disse: — A sra. Pemberton está? — Desculpe, senhora, nã o. Saiu esta manhã. Devo dizer-lhe que deseja falar com ela quando chegar? Julie hesitou. — Nã o, nã o é preciso, Halbird, obrigado. — Muito bem, senhora. Foi agradá vel ouvi-la outra vez. A senhora está bem instalada, agora? — Mais ou menos — Julie respondeu, amarga. — Até logo. Robert ainda nã o havia voltado dos Estados Unidos ou Halbird mencionaria isso. Pegou a lista telefô nica e procurou o nú mero dos Hillingdon. Ousaria telefonar para Francis? E se Pamela atendesse, ou Louise? Qual desculpa daria para estar telefonando? Entã o se lembrou de seu escritó rio. Ele deveria estar lá, ou algué m poderia dizer como entrar em contato direto com ele. A recepcionista da Corporaç ã o Hillingdon foi bastante precisa. — O sr. Hillingdon está no pré dio, senhorita, mas nã o está atendendo ningué m. Está em uma reuniã o. Gostaria de deixar algum recado? — Será possivel voce dizer a ele que foi Julie quem ligou e perguntar-lhe qual a hora mais conveniente para lhe telefonar? A recepcionista hesitou. Obviamente estava insegura quanto à identidade de Julie. — Um momento, senhorita. Julie esperou impacientemente, nesse meio tempo, Emma voltou com as mã os e o rosto limpos. — Para quem você está ligando? — perguntou. — Nã o importa — disse rispidamente. — É vovó? — Nã o. Fique quieta. A voz calma de Francis fez-se ouvir. — Julie? É você? — Francis! — Julie estava tã o aliviada que se afundou no braç o de uma poltrona pró xima. — Falar com você é como falar com a famí lia real! Francis divertiu-se. — Bem, eu estava em uma reuniã o — explicou gentilmente. — Algo errado? Julie olhou desolada para Emma e entã o disse: — É difí cil falar agora. Mas, na verdade, a srta. Lawson chegou hoje. — E daí? Ah, você está se referindo a hoje à noite, é claro. — Sim. — Julie suspirou. — Oh, Francis, o que é que eu vou fazer? — Você vai jantar comigo, naturalmente, por quê? — Seu tom de voz era decidido. — Mas, como? Ela vai saber que se trata de você! — E daí? — Francis, por favor! — Escute, Julie, eu já falei antes que nã o me importo que saibam de nosso relacionamento. É você quem está preocupada. — Foi a vez dele dar um suspiro. — Se você está querendo cancelar nosso compromisso por causa dessa mulher, isso é outro assunto. — Oh, Francis! — Julie apertava o telefone. — Olhe, se isso a faz mais feliz, vou sugerir para Pamela que vá até aí hoje à tarde. Quando ela vir Sandra, certamente irá convidá -la para que a acompanhe, ainda mais com Robert estando fora. O que você acha? — Oh, isso é maravilhoso! — Julie começ ou a respirar com mais facilidade quando notou que Sandra Lawson havia entrado na sala enquanto conversava. — Agora eu tenho que desligar. — Entendo. — Francis riu. — Oh, mas que complicaç ã o! Julie concordou com um leve sorriso e desligou. Entã o, voltando-se— para a outra garota, disse: — Está tudo bem? Sandra sentou-se no sofá. — Otimo, obrigada. — Olhou para Emma. precisamos nos conhecer. — Sim. — Emma estava desconfiada. — Você vai morar aqui? — Vou. — Sandra parecia estar em casa. — Será que mais tarde você pode me mostrar onde iremos ter as nossas aulas? Mamã e já reservou um quarto para isso? Julie pigarreou. — Para falar a verdade, a casa ainda nã o está toda mobiliada. Esta sala e a sala de jantar estã o prontas, mas, lá em cima, apenas trê s dos quartos estã o arrumados. Acho que, por enquanto, você terá que se utilizar desta sala ou da de jantar. Julie pareceu aliviada ao ver a sra. Hudson entrando na sala com uma bandeja de café. — Oh, que bom. Coloque aqui, sra. Hudson, por favor. — Pois nã o, senhora. — A sra. Hudson voltou-se para Emma. — Você nã o quer vir me ajudar a fazer alguns pasté is? — Eu posso? — Emma levantou-se de um salto, mas Sandra Lawson impediu-a... — Emma e eu estamos nos conhecendo, sra. Hudson — observou severamente. Julie encarou-as, contrariada. — Acho que Emma terá muito. tempo para conhecê -la, Sandra. Pode ir, querida. Emma saiu aos pulos atrá s da sra. Hudson e Sandra encarou Julie. — Como posso esperar exercer algum controle sobre a crianç a se você anula minhas instruç õ es? — Seu ar continuava severo. — Permitir que Emma ajude a sra. Hudson nã o significa contrariar suas instruç õ es. Você acabou de chegar, Sandra. Nã o pressione Emma demais ainda. Depois disso, a conversa se esvaziou. Obviamente Sandra estava remoendo o que julgava ser uma injustiç a e Julie estava absorta em seus pensamentos sobre a incô moda companhia dessa mulher. Como iria aturar isso? Como Francis havia prometido, Pamela chegou à tarde e pareceu deliciada em encontrar-se com Sandra. Julie deixou-as sozinhas, procurando pela companhia da sra. Hudson na cozinha. Emma estava brincando no jardim e Julie a observou em silê ncio por alguns momentos. De repente a sra. Hudson disse: — E sobre hoje a noite, a senhora ainda vai sair? — Sim. — Julie voltou-se para ela. — Eu falei com Francis pelo telefone e ele sugeriu que Pamela viesse ver Sandra hoje à tarde. Elas sã o velhas amigas e como Robert está fora, possivelmente Pamela convidará Sandra para jantar com ela. A sra. Hudson riu zombeteiramente. — Incrí vel! — Sim, é preferí vel. Eu nã o deveria deixar Emma nas mã os de Sandra logo na primeira noite aqui, alé m de outras coisas, é claro. — Sim, senhora. Mas se nã o gosta dela. por que é obrigada a tê -la aqui? — Foi idé ia de Robert. Eu nã o tive escolha. Ele é o guardiã o legal de Emma. — E nã o poderia haver melhor — comentou a sra. Hudson secamente. — O que você quer dizer com isso? — Nada, senhora. Apenas que ele é uma pessoa adequada para ter a crianç a sob sua responsabilidade. — Dirigiu-se para a porta. Para alí vio de Julie, Pamela realmente sugeriu que Sandra fosse jantar com ela naquela noite, mas ficou desconcertada quando Pamela completou: — Por que você nã o vem també m? Papai vai sair, portanto ficaremos só nó s, mulheres. Poderemos passar uma noite agradá vel, juntas. Julie teve de pensar cuidadosamente antes de responder: — Na verdade, uma velha amiga telefonou-me esta manhã e ficou de me Chamar novamente à noite, por isso vou ficar em casa. Pamela franziu as sobrancelhas. — Uma velha amiga, você disse. — Algué m com quem eu trabalhei — explicou Julie, detestando o que estava fazendo. — Ela deixou a firma há algum tempo. Seu nome é Valerie Smith. — Nã o, nunca ouvi falar dela. — Pamela sacudiu a cabeç a. — Bem, Sandra, vamos? — Sim. — Sandra levantou-se. — Está certa de que nã o se importa, sra. Pemberton? — Claro que nã o. — Julie queria que ela fosse embora o quanto antes, pois se sentia irritada. Foi com alí vio que ouviu o carro de Pamela indo embora. Voltou entã o para a sala de estar, sentindo-se mais leve. Emma subiu em seus joelhos e ela a abraç ou carinhosamente. — Espero que a srta. Lawson nã o fique com a gente. Nã o acha, mamã e? Julie suspirou. — Ela é apenas a governanta, Emma. Nada tem que ser diferente por causa dela. — Eu terei liç õ es. — Você as teria da mesma forma na escola-explicou Julie, tentando parecer razoá vel Emma dormiu antes de Julie começ ar a aprontar-se para o jantar. Ela nã o havia mencionado que ia sair para a menina, antes de tudo para evitar perguntas, mas a sra. Hudson tinha instruç õ es de dizer-lhe onde estava caso ela acordasse e ficasse preocupada. Julie colocou um vestido de lã creme, com mangas compridas e um decote arredondado. A saia comprida acentuava-lhe a curva esbelta das cadeiras e a estreiteza de sua cintura. Francis chegou logo depois das sete e elogiou-a pela aparê ncia. — Você está, como sempre, maravilhosa! — comentou. Foram a um restaurante relativamente conhecido e Julie pareceu perturbada quando vá rias pessoas foram falar com ele e a olharam com indisfarç á vel curiosidade. — Nã o fique tã o preocupada! — censurou-a gentilmente. — Você está me fazendo sentir bem. Afinal, eu já passei da idade em relaç ã o a certas coisas. — Você nã o é velho — Julie protestou, sorridente. — Tenho quarenta e oito anos. E você, quantos? Vinte e cinco, vinte e seis? — Julie concordou. — Mais de vinte anos mais velho que você. Velho o suficiente para ser seu pai. Mais tarde, danç aram. A mú sica era lenta e Julie sentiu-se relaxada em seus braç os. Percebeu que se sentia atraí da por ele e a constataç ã o foi agradá vel. Nã o o amava, mas o relacionamento dos dois era uma coisa especial, uma coisa boa. Ele levou-a para casa por volta da meia-noite, mas ela nã o o convidou para um drinque. Julie entrou. Havia luzes acesas na sala e ela pensou tratar-se da sra. Hudson assistindo a um filme ou algo assim. Empurrou a porta e espiou, procurando nã o assustá -la, caso estivesse dormindo. Teve entã o um sobressalto. O aposento parecia quente e confortá vel e, para reforç ar essa idé ia, Robert estava estirado preguiç osamente sobre o sofá, num sono profundo.
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