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CAPITULO III
Durante a semana seguinte, Emma fez o possí vel para afastar o pensamento de Miguel Salvaje. Mas era mais fá cil querer do que fazer. Era apenas abrir o jornal e lá estava o rosto dele, olhando-a fixamente. Ou entã o sempre dava de cara com propagandas anunciando o pianista mexicano que estava dando recitais com a Orquestra Sinfô nica de Londres, no Festival Hall. Pela primeira vez em sua vida, desejou ter uma amiga í ntima, algué m de sua idade, em quem pudesse confiar suas lá grimas e má goas. Mas a garota que tinha sido sua grande amiga já estava casada há anos e tinha ido para longe. Agora lhe restava apenas Victor, seu noivo e confidente, mas era claro que nã o podia lhe dizer nada. Portanto, guardou seus pensamentos para si mesma e concentrou todas as energias em seu trabalho na agê ncia. Ainda assim, continuava abalada. Uma tarde, o noivo entrou na agê ncia. Depois de conversar rapidamente com Fenella, aproximou-se de sua mesa, olhando-a diretamente nos olhos, e disse: — Miguel Salvaje é um dos seus favoritos, nã o é? Sei que você tem até alguns discos dele. As mã os de Emma tremeram e ela cruzou-as no colo, para que Victor nã o percebesse. Mas nã o pô de esconder o rubor das faces. — O que você disse? — perguntou, sem jeito. — Miguel Salvaje. Você gosta dele, nã o é mesmo? Emma tentou se recompor. — Sim, acho que sim. Mas por que está perguntando isso? Victor balanç ou seus ombros fortes. — Eu ganhei isto. — Enfiou a mã o no bolso e tirou dois ingressos. — Sã o gratuitos. Aquele tipo de brinde que distribuem para todas as firmas. Bem, estes vieram parar nas minhas mã os e achei que seria bom se os aproveitá ssemos. Mas como sã o vá lidos só para esta noite, achei melhor avisá -la. Emma engoliu em seco. A ú ltima coisa que queria era ir a um dos concertos de Miguel Salvaje. Nã o queria vê -lo novamente; sabia que ia sentir aquela coisa horrí vel, irritante, sem propó sito que ele lhe provocava. — Nã o sei, Victor — respondeu, sem coragem de encará -lo. — Estou muito ocupada aqui na agê ncia, nã o sei se vai ser possí vel sair a tempo... Victor nã o se convenceu com o argumento. — Ei, Fenella, é tã o importante assim Emma trabalhar até tarde esta noite? — Claro que nã o. — Fenella parecia surpresa. Victor virou-se para ela. — Você nã o está querendo ir ou coisa assim? — Nã o é isso. — Pensei que você gostasse do Salvaje! Você tem discos dele. — Eu sei que tenho. Emma se viu sem saí da. Que desculpa podia dar? Como ia convencê -lo de que nã o queria ir, sem levantar suspeitas? Victor, algumas vezes, era um homem muito possessivo. — Mas é um concerto sem importâ ncia, Victor. — Mas pode ser um bom concerto. Vá para casa, troque de roupa e eu vou buscar você à s sete em ponto. Assim, aproveitamos e paramos para um drinque em algum barzinho e depois do concerto iremos a um bom restaurante. Está bem assim? Entã o está bem. Agora, preciso ir embora, tenho uma reuniã o dentro de meia hora. Está tudo combinado, nã o é, querida? — Tudo certo. Emma observou-o sair, alto e elegantemente vestido, como sempre. e ao concerto, mas aquilo nã o importava para Victor. Quando decidia uma coisa, estava decidido. Estava pronta quando Victor chegou. Usava um vestido de lã lilá s que nã o realç ava sua pele. Mas era um vestido que Victor lhe trouxera da Itá lia, depois de uma viagem de negó cios, e sabia que ele esperava que o usasse na primeira oportunidade. A capa preta que usava era bem mais bonita, mas, como seu cabelo estava preso no alto da cabeç a, ela parecia sé ria e mais velha. Seria este papel que teria que representar a vida toda? O festival Hall estava quase lotado quando chegaram. Emma achou isso ó timo, mas sua alegria durou pouco. As entradas de Victor eram para as poltronas da fileira da frente. Seu coraç ã o batia descompassado. Certamente Miguel ia vê -la. Quando ele entrou no palco, ela se afundou na poltrona, ao mesmo tempo com medo e fascinada. Miguel começ ou a tocar o segundo concerto para piano de Rachmaninoff e ela esqueceu todas as preocupaç õ es. Ele era um gê nio! Aplaudiu de pé, e só quando Miguel se levantou para agradecer Emma percebeu que, desde o começ o, ele sabia que ela estava lá. Seus olhos correram pela fila da frente, até encontrá -la. E nã o viu nenhuma surpresa neles. Durante todo o resto da noite nã o tornou olhá -la. Victor gostou muito do concerto. Ignorando o conflito da noiva, nã o entendeu o motivo de sua palidez quando saí ram do auditó rio. Pensando que estava muito cansada, sugeriu que seria melhor irem para o apartamento dele e comer alguma coisa lá mesmo, em vez de jantar fora. Mas Emma nã o tinha nenhum apetite. Forç ou um sorriso educado. — Nã o acho uma boa idé ia, Victor. Se me levar para casa, talvez a sra. Cook possa fazer alguns sanduí ches para nó s. Victor nã o gostou, mas concordou: — Entã o está bem. Mas vou avisando que comi só um sanduí che antes do concerto e estou faminto. A sra. Cook nã o estava quando chegaram. Engolindo o mau humor, Emma acomodou Victor na sala com uma bebida, e foi para a cozinha. Havia muito para escolher: presunto frio, bacon, ovos, salada e uma torta de carne. Achando que Victor preferia alguma coisa quente, resolveu fazer omelete de queijo. Estava batendo os ovos quando o telefone tocou. Esperou um pouco, mas como Victor nã o atendeu, enxugou as mã os num pano de prato e saiu apressada para o hall. Quem podia ser, à quela hora da noite? — Olá, Emma! Quase deixou o fone cair. — Você, senhor? — murmurou. — Gostou do concerto? — Gostei muito. Você esteve brilhante. — Gradas, señ orita! — Havia um traç o irô nico no tom dele. — Tinha certeza de que seu noivo ia usar os ingressos. —- Você tinha certeza? Quer dizer entã o que foi você quem mandou os ingressos para Victor? — Mas claro. Por quê? Você pensou outra coisa? Emma olhou de relance para a porta da sala. Estava fechada, mas nã o podia ter certeza de que Victor nã o podia ouvi-la do outro lado. O suor começ ou a escorrer por seu rosto e suas mã os ficaram ú midas. — Eu nã o fazia a menor idé ia. — Mas você foi. — Claro. Por que nã o iria? Foi por isso que você ligou? Para saber se eu tinha gostado? Houve silê ncio por um longo momento e ela pensou, com uma terrí vel sensaç ã o de afliç ã o, que ele tinha desligado. Entã o Miguel disse, calmo: — Nã o, liguei porque queria falar com você, Emma. Tenho pensado muito em você. As pernas de Emma tremiam como uma gelatina. — Escute, acho que nã o podemos nos falar agora — disse, com voz trê mula. — Por acaso isto significa que pretende falar comigo uma outra hora? Aposto que o rico sr. Harrison está por aí. — Como você sabe o nome do meu noivo? — Eu andei investigando. — Ele hesitou alguns instantes. — Acha que ele vai embora logo? — Por quê? — Eu lhe disse. Quero ver você! — Agora à noite? — Por que nã o? Amanhã tenho um concerto e també m um encontro de negó cios – disse ele — Meu tempo está todo ocupado. — Acho que vai ser impossí vel — disse, olhando novamente para a porta da sala. — Por que vai ser impossí vel? Só se... — Sua voz esfriou. — Você costuma dormir com esse tal de Harrison? — Claro que nã o! — Emma estava furiosa. — Eu nã o durmo com ningué m! — Nã o? — Seu sotaque ficou carregado de repente. — A que horas ele costuma ir embora? A porta da sala foi aberta e a grande figura de Victor surgiu. — O que está acontecendo por aqui? — perguntou, torcendo o nariz. — Está queimando alguma coisa? — Oh, Deus, a omelete! — Emma olhou desesperada para o telefone e Victor fez um gesto impaciente. — Quem é? Emma colocou o receptor no ouvido. — Agora eu nã o posso mais falar, Jennifer. Você... nã o podia ligar amanhã? Sem esperar pela resposta de Miguel, desligou e correu para a cozinha, arrancando a panela esfumaç ada do fogo. Os ovos nã o serviam para mais nada, uma mistura marrom grudada no fundo da frigideira. Victor a olhava divertido. — Quem é Jennifer? — Jennifer? — Emma procurou desesperadamente por uma explicaç ã o. — Você conhece a Jennifer. Nó s é ramos grandes amigas antes dela se casar. — Pensei que aquela fosse a Sheila. — Eu tinha mais do que uma amiga. — Olhou para a frigideira. — Vá lá para a sala e sente-se novamente. Vou tratar de arrumar outra omelete. — Nã o, obrigado. — Victor esticou os braç os, num gesto cansado. — Para falar a verdade, depois de esperar tanto tempo, acabei perdendo o apetite. Emma mordeu os lá bios. — Sinto muito. — Eu també m. Vou apenas terminar de tomar minha bebida e entã o irei embora. Você parece estar muito cansada! Nã o anda dormindo bem? — Mais ou menos. — Acompanhou-o até a sala. — Pelo menos deixe que eu lhe sirva uma outra bebida. — Nã o, obrigado. Já bebi bastante, e alé m do mais tenho que dirigir. Emma ficou em pé, indecisa, torcendo as mã os, enquanto ele esvaziava o copo. — Mas afinal de contas, o que ela queria? Victor voltou ao assunto do telefone e Emma, que pensou que aquilo já tinha sido esquecido, fez um gesto de desagrado. — Oh, ela tentou ligar uma porç ã o de vezes, mais cedo, mas como nã o recebeu resposta, resolveu ligar agora. — Era alguma coisa importante? Emma forç ou um sorriso, sentindo-se culpada pela mentira. — Na verdade, nã o. Está esperando o primeiro filho. Aquilo era uma inspiraç ã o e pareceu satisfazer Victor. — Bem, agora preciso ir embora. Beijou-a na boca. Aquele devia ser um longo beijo, mas Emma, perturbada, afastou-o com delicadeza. Victor tirou um lenç o do bolso e limpou a boca, corando. — Preciso ir. Boa noite, Emma. — Boa noite, Victor. Emma acompanhou-o à porta. Se pelo menos ele mostrasse um pouco mais de emoç ã o! Cé us, logo estariam casados. Que tipo de relacionamento iam ter, se sempre reprimiam qualquer demonstraç ã o do amor que sentiam um pelo outro? Victor nã o voltou a beijá -la. Apertou as mã os dela com carinho, depois desceu os degraus. Emma fechou a porta com violê ncia desejando, pela primeira vez na vida, ter mais experiê ncia com os homens. Estava quase acabando de limpar a cozinha quando a sra. Cook voltou. A governanta entrou na cozinha, surpresa com a frigideira queimada. — O que aconteceu? Pensei que tivesse saí do para jantar. Emma nã o tinha dito que ia assistir ao concerto de Salvaje. — Nó s í amos, mas eu nã o estava com muita fome, resolvemos voltar. Nã o havia mais nada para dizer. Deu boa-noite e subiu para o quarto. Embora estivesse bastante cansada, o sono nã o veio. O que Miguel Salvaje teria pensado de ela ter desligado na cara dele? Esperava que a qualquer momento a sra. Cook viesse avisar que ele estava lá embaixo. O cé u já começ ava a clarear quando finalmente conseguiu dormir e ningué m perturbou o silê ncio da noite. A sra. Cook foi acordá -la à s dez horas, levando uma xí cara de E logo Notou o rosto pá lido de Emma. — Esta com pé ssima aparê ncia! O que aconteceu? Nã o dormiu? Emma pulou da cama e pegou a xí cara de chá. — Nã o muito bem — respondeu, puxando para trá s o cabelo comprido. — Que horas sã o? — Dez horas. Quer que eu lhe traga o café aqui? — Nã o, muito obrigada. A sra. Cook deu de ombros e caminhou em direç ã o à porta. Depois parou. — Ah, ia me esquecendo, telefonaram para você. Os nervos de Emma pareceram querer saltar. — Já? — Já. Aquela tal srta. Harding, da agê ncia. Mandou perguntar a você podia ir até lá esta tarde. Parece que está superatarefada, outra vez. — Oh! — Emma entregou-lhe a xí cara e encostou-se no travesseiro — Ah, sim, acho que vou poder. Era só isso? — O que mais esperava? A sra. Cook estava curiosa. Emma balanç ou a cabeç a. — Nada, ora. — Você gostou do concerto de ontem à noite? Emma olhou fixamente para ela. — Como sabe que fui ao concerto, ontem à noite? — A srta. Harding me contou. Quando eu lhe disse que você ainda estava na cama, ela perguntou se tinha chegado muito tarde. — Ah, entendo. — Emma descobriu as pernas e saltou da cama, pegando o penhoar. — Bem, mas isto nã o tem importâ ncia, nã o era nenhum segredo. — Entã o por que nã o me contou? — A sra. Cook cruzou os braç os. — O sr. Harrison sabe que Salvaje a trouxe para casa na noite da neblina e que també m há menos de uma semana veio aqui visitá -la? Emma pô s-se de pé. — Nã o, por que ele devia saber? — É estranho que tenha comprado entradas justamente para aquele concerto, nã o acha? Emma deu um longo suspiro. —- Você é muito curiosa, minha querida sra. Cook! — Eu sei disso e sei també m que, enquanto seu pai estiver fora, sou responsá vel por você. — Tenho vinte e cinco anos, sra. Cook! — Sei disso, mas ainda assim sou responsá vel por você. Se quer saber minha opiniã o, há alguma coisa estranha nisso tudo. — Ningué m lhe perguntou. A governanta suspirou e sua expressã o tornou-se ansiosa. — Você nã o vai começ ar a pensar em tolices justamente agora, vai? — Nã o sei o que está querendo dizer. Faç a um pouco de café para mim, por favor. Nã o estou com fome, mas adoraria tomar um gole de café. — Está bem. Você vai ligar para a srta. Harding? Ela pediu para ligar para ela. — Pode deixar, daqui a pouco eu ligo. Esperou que a sra. Cook se afastasse e depois foi para o banheiro. Sabia que a governanta suspeitava de que havia muito mais do que ela pró pria podia desconfiar, mas agora que já sabia a respeito do concerto, o que mais podia dizer? Nã o havia mais nada para ser revelado. Emma estava no quarto, escovando o cabelo, quando a campainha tocou. A sra. Cook apareceu no topo da escada e chamou-a. Seu coraç ã o disparou. — Srta. Emma, há algué m aqui que quer lhe falar. Emma levantou-se, olhando desesperada para o cabelo solto. Levaria muito tempo para tranç ar todo; entã o, prendeu-o com duas travessas. Desceu apressada e parou assustada quando viu Miguel Salvaje. Sentiu vontade de virar e subir correndo os degraus, mas ele já a tinha ouvido e virou o rosto para olhá -la. — Bom dia, señ orita. Emma respirou fundo e desceu o resto dos degraus. — Bom dia, senhor. Ningué m teria conseguido reconhecer o elegante solista da noite anterior. Agora ele usava uma roupa de brim, um sué ter de gola larga e parecia mais um estudante. — Está surpresa por me ver? Emma balanç ou a cabeç a, devagarinho. — Para ser totalmente sincera, nã o. Mas — olhou em volta para ter certeza de que a sra. Cook nã o estava por perto — pensei que tinha dito que ia ensaiar hoje. — Eu tinha ensaio. Isto é, tenho. Mas acho que estou... Como é que se diz? Estou enforcando. Si? — Si. Emma fez um gesto de impaciê ncia. — Por que veio aqui? — Nã o vai me oferecer um pouco do excelente café que está sendo preparado? Estou sentindo o aroma delicioso dele. — Claro. Atravessou o hall e saiu pela porta da sala com passos rá pidos. — Entre e espere um pouquinho, vou falar com a sra. Cook. A governanta estava ocupada lavando pratos e olhou com reprovaç ã o quando Emma entrou. — Bem? Ele já se foi? — Nã o. Será que podemos tomar um pouco de café? A sra. Cook enxugou as mã os. — Já vai. — Mas seu tom nã o era encorajador. — Nã o me olhe assim. É algum crime oferecer uma xí cara de café ao homem? — Por que ele está aqui? O que ele quer? Emma ajeitou as xí caras numa bandeja. — Nã o sei — respondeu, um pouco rude. — Talvez queira saber se gostei do concerto. — Ah, é? Suponho que ele visite todos os fã s para perguntar isto! — Está bem, está bem. Acho que veio porque queria me ver. — Por quê? — Nã o sei. — Nã o mesmo? — Nã o. — Emma pegou a bandeja. — Está tudo aí? — A nã o ser que você queira alguns biscoitos. — Nã o, acho que nã o. Obrigada. Levou a bandeja pelo corredor até a sala e encontrou Miguel sentado ao piano, tocando baixinho. Parou quando ela entrou, pegou a bandeja e colocou-a sobre a mesinha do centro em frente da lareira. Emma afundou-se no sofá, tentando controlar as mã os trê mulas, e depois perguntou: — Creme e aç ú car? — Nã o. Café preto, por favor. — Sentou-se ao lado dela. — Humm, isto é muito bom. Bem melhor do que aquele lugar de ensaio. Emma levou a xí cara aos lá bios e tomou um gole de café. Queimou-se e abafou um grito. — Você está muito nervosa, Emma. Por quê? Do que tem medo? De mim? — Claro que nã o. — Emma endireitou os ombros. — O que vai tocar esta noite? — Nã o quero falar sobre meu trabalho. Já olhou para fora? Está fazendo um lindo dia de outono, daqueles que deixam a gente feliz por estar vivo. O sol dourava as á rvores do jardim. Borboletas voavam como se estivessem fazendo festa, apesar do frio. — Eu quero passar o dia fora — ele disse, baixinho. — Quero guiar até a costa e sentir a brisa do mar no meu rosto. Quero me sentir livre novamente! — Estendeu a mã o e tirou as travessas do cabelo dela, que se soltou pelos ombros, quase batendo na cintura. — E quero que você venha comigo! Emma estremeceu. — Isso é impossí vel! — Por quê? Por que é impossí vel? Você vive me dizendo isso! Nã o é impossí vel! Nada é impossí vel! E para acabar com esta histó ria, nã o vou mais aceitar suas desculpas! Emma percebeu que ele estava com raiva. Tentou nã o se deixar intimidar. — Nã o estou arrumando desculpas, senhor. Trabalho como secretá ria numa agê ncia e preciso estar lá daqui a pouco. — Secretá ria de uma agê ncia? E esta é sua palavra final? Emma levantou-se nervosa, cruzando os braç os. — Eu, eu... O que mais posso lhe dizer, senhor? — Meu nome é Miguel. — Levantou o queixo dela, e entã o seus olhos piscaram. — Venha comigo, Emma. Embora os dedos dele estivessem frios, pareciam queimar sua pele. Esquivou-se. — Eu nã o posso. — Ou seja, você nã o se atreve. — Você acha assim tã o impossí vel algué m recusar a sua companhia? Mas Miguel estava se aproximando cada vez mais dela; suas mã os seguraram seus ombros, puxando-a para si. — Fique quieta! — murmurou impacientemente e, inclinando a cabeç a, apertou seus lá bios contra os dela com uma posse devastadora! Emma debateu-se sem forç as contra o peito musculoso. Mas aquela boca e aquelas mã os a dominaram e toda sua resistê ncia desapareceu. Ele a segurava com forç a pela cintura e a apertava tanto que podia sentir todos os mú sculos do corpo dele. Ningué m, nem mesmo Victor, tinha beijado Emma daquele jeito, tanto e com tanta paixã o. Quando finalmente se afastaram, sentiu-se perdida e insatisfeita, como o seu corpo reclamasse por aquilo há muito mais tempo. Era vergonhoso e humilhante o que estava sentindo. Deu alguns passos para trá s, horrorizada com seu comportamento. Miguel acendeu um cigarro, olhando calmamente para ela. — Pare de me olhar como se eu tivesse acabado de seduzi-la, Para uma mulher com vinte e cinco anos completos, você é bastante inexperiente. Emma controlou sua raiva. — Nã o lhe pedi para fazer nada. Ele riu. — Nã o. Mas també m nã o fez nenhuma objeç ã o, nã o é? Ela virou de costas, cobrindo o rosto com as mã os. — Emma! Nã o faç a uma tempestade disso tudo. Agora troque de roupa. Vamos passar o dia fora. Emma voltou-se nas pontas dos pé s. — Você ainda acha que eu teria coragem de sair com você depois disso? O rosto de Miguel ficou duro. — Eu nã o penso coisa nenhuma. Eu sei que você vai comigo. — Nã o pode me forç ar! — Nã o posso? Balanç ou a cabeç a, confusa. — Por que você quer me levar? — Porque gosto da sua companhia. — Mas deve haver uma outra mulher. Isto é, tenho certeza de que ha outras mulheres, alé m de mim, que você conhece aqui em Londres. — Eu nã o conheç o você ainda, Emma. — Mas eu nã o sou o seu tipo. E alé m disso, tem o Victor. — Quer que eu o convide també m? Entã o! Vá se arrumar. E, por favor, vista alguma coisa menos sé ria do que essa roupa. — Apontou para o vestido dela como se ele o ofendesse. — Você nã o tem nenhuma calç a comprida? Emma titubeou. — Eu tenho algumas calç as velhas de brim. — Ó timo. Nã o demore muito. Tenho certeza de que vamos passar uma tarde maravilhosa. Dizendo isso, foi até o piano e começ ou a tocar uma mú sica de Grieg. Sem saber o que estava fazendo, Emma subiu rapidamente a escada e fechou a porta do quarto. Como podia permitir que ele lhe desse ordens? Afinal de contas, o que sabia a respeito dele? Seus relacionamentos, seu passado, seu modo de vida? Podia até ser casado. E també m, onde Victor ficaria nessa histó ria? E seu trabalho na agê ncia? A sra. Cook a encontrou parada no meio do quarto. — Alguma coisa errada? — Nã o, nada de errado, sra. Cook. Eu vou sair. Com o sr. Salvaje. A velha pareceu horrorizada. — Mas eu pensei que você tivesse telefonado para a srta. Harding e tivesse lhe dito que iria trabalhar. — Eu ligo novamente, avisando que nã o vou poder. A governanta balanç ou a cabeç a, confusa e preocupada. — E o que vai dizer-lhe? Que você vai sair com esse... esse pianista? Emma deu um sorriso amarelo. Ningué m poderia chamar Miguel Salvaje apenas de pianista. Era um sacrilé gio! — Nã o, vou dizer que estou com uma forte dor de cabeç a. — E o sr. Harrison? O que vai acontecer com ele? — Oh, nã o vou ver Victor até a noite. Alé m do mais, devo estar de volta antes de escurecer, espero. Mig... isto é, o senhor Salvaje tem um concerto hoje à noite. A sra. Cook nã o poderia desaprovar mais. — Nã o sei, nã o. Contar mentiras para a srta. Harding, sair com um outro homem pelas costas do sr. Harrison! O que está acontecendo com você? — Nã o está acontecendo nada comigo. Santo Deus, parece até que estou fugindo com esse homem! Nó s apenas vamos à costa. Que mal há nisto? — Você sabe a resposta para isto tã o bem quanto eu. Tenha juí zo, garota! Seu pai nã o está aqui e você sabe que eu sou a responsá vel por você. Portanto, nã o me arrume confusã o, ele confia muito em mim. E o que um homem como esse pode querer com você, senã o encrencas? Alé m do mais, acho que ele está procurando mulheres, bem, por aquelas razõ es ó bvias que você deve saber muito bem. Emma cerrou os punhos. Sabia que a velha tinha razã o, mas naquele exato momento ela nã o queria nem podia ouvir nada daquilo. — Tenho que ir. Preciso trocar de roupa e nã o tenho tempo para ficar discutindo esse assunto agora. Sinto muito que você nã o aprove mas nã o vai ser por isso que deixarei de ir. A sra. Cook fez um gesto como se lavasse as mã os e foi para a cozinha. Talvez ela estivesse sendo tola ao se comportar como uma adolescente com um homem que obviamente era muito experiente em sexo. Mas todo mundo tem o direito de ser tolo uma vez na vida. E este era o seu momento e de ningué m mais.
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