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CAPÍTULO VI



 

Morro do Falcã o. Uma pedra escura contra o cé u, dominando uma grande extensã o de charnecas em Pencarne, uma encantadora aldeia de pescadores entre os penhascos.

O chalé parecia fascinante, escondido por uma saliê ncia da pedra, com um jardim espalhado numa plataforma rochosa.   

Os quartos eram mobiliados em estilo rú stico e a cozinha estava aparelhada com um fogã o a gá s, armá rios, um aquecedor de á gua e uma pequena geladeira també m a gá s.

Jim Lovibond era muito prestativo. Ajudou a levar as compras para casa e a estender os lenç ó is sobre as touceiras de alfazema para que secassem ao ar do mar.

— Você é muito moç a para cuidar da filha do doutor — comentou, com um sorriso. — A srta. Patrí cia vai chegar amanhã e ela é muito levada, apesar de parecer delicada. Se há mais alguma coisa que eu possa fazer pela senhorita, diga-me, por favor.

— Obrigada, Jim. O pessoal daqui é tã o amá vel como você?

— Somos todos muito prestativos — ele respondeu, acanhado. — Mas a senhorita nã o parece de fora, com o seu aspecto e o seu nome. Parece que é daqui!

Luana respirou fundo o ar da Cornualha, certa de que ia gostar do lugar. Na casa, ouvia-se o barulho do mar, que à noite devia embalar o sono de todos os habitantes de Pencarne.

Passou algum tempo ocupada arejando a casa, fazendo bolinhos e colocando flores nos cô modos. Quando terminou, a casa estava alegre e acolhedora, com um cheiro muito gostoso de bolinhos recé m-saí dos do forno.

Quando olhou para o reló gio e viu que já eram cinco e meia, lembrou-se de que naquela hora Ann e Buck deveriam estar visitando Tarquin no hospital, falando de seus planos para o futuro. Mas nã o mencionariam o papel que ela tinha desempenhado nos trá gicos acontecimentos das ú ltimas semanas.

Tudo ficou embaç ado e ela teve que combater as lá grimas que lhe vieram aos olhos. Nã o podia ficar em casa pensando em coisas tristes. . . ia dar uma volta! Por isso, arrumou-se depressa e saiu de casa. O cé u estava avermelhado pela luz do crepú sculo e da praia soprava um vento frio.

Desceu o atalho que levava ao chalé dos Lovibond, que tinha um jardim cheio de flores que cresciam por entre as pedras. A mã e de Jim estava lá colhendo alguns galhos de hortelã.

— Você vai até a praia? — ela perguntou.

— Sim, está uma tarde tã o bonita... — Luana parou um instante. — Gosto do seu jardim, sra. Lovibond. Parece uma pintura.

— Bondade sua — respondeu a mulher, cobrindo os olhos por causa do sol. — A maré vai começ ar a subir daqui a pouco, por isso tome cuidado, moç a.

— Sei nadar. — Luana deu uma risada.

— Claro, mas você está acostumada com as ondas da Cornualha? Arrastam uma pessoa pequena como você como se fosse um pedaç o de cortiç a. Nã o se esqueç a.

— Está bem — Luana concordou imediatamente, sentindo-se bem porque estavam se preocupando com ela.

Depois continuou até a praia, admirando-se com a extensã o de areias, as pedras como monstros marinhos adormecidos. Ficou olhando a paisagem, emocionada e um tanto atemorizada por aquela costa lendá ria, com ondas enormes que indicavam o perigo do mar. Gaivotas voavam por perto, em busca das pedras onde iriam passar a noite.

A praia estava deserta e Luana imaginou como aquele trecho da costa devia ser selvagem e despovoado na é poca em que os navios eram atraí dos para as pedras pelas tochas dos cornualeses, quando as cavernas eram usadas para esconder barris de conhaque contrabandeado e peç as de renda.

Lembrando-se de que a maré já ia começ ar a subir, foi se sentar numa pedra para olhar as ondas que se quebravam nas rochas, os penhascos que se erguiam majestosos atrá s dela, dourados pela luz do sol. Era um espetá culo magní fico e Luana olhava maravilhada para o sol que mergulhava no mar.

O silê ncio só era quebrado pelo piar dos pá ssaros marinhos e pelo barulho das ondas que subiam cada vez mais. Luana imaginava que estivesse sozinha quando ouviu o som de um galope pela praia, aproximando-se a cada segundo, até que um cavalo escuro e seu cavaleiro delinearam-se de encontro ao sol poente. Ela ficou imó vel, mas uma espé cie de instinto fez com que se levantasse de repente. . . no momento em que o cavalo parou, espirrando á gua e levantando areia com seus cascos,

O movimento sú bito que ela fez deve ter assustado o animal, que relinchou e se levantou nas patas traseiras, quase derrubando o homem que o montava.

— Que diabo foi isto? — O cavaleiro controlou o animal imediatamente, depois começ ou a procurar o que tinha provocado aquele susto. Seu cabelo preto voava com o vento, como a crina do cavalo.

Havia alguma coisa de primitivo nos dois, como se costumassem surgir das cavernas para tomar posse da praia quando o sol se punha e as ondas cresciam de tamanho.

Luana olhou para o rosto do homem e um resto de luz fez brilhar o azul profundo dos olhos dele. Ela o teria reconhecido em qualquer lugar. . . mas naquela praia longí nqua da Cornualha, com as ondas batendo nas pedras, ele estava em seu elemento, inconfundí vel, como se fizesse parte do cená rio.

— Entã o nos encontramos de novo! — exclamou Eduard Talgarth, levantando a voz para dominar o barulho do mar. — Você acabou vindo ver a parte do mundo onde moro. O que foi que a trouxe aqui, Luana Perry? Nã o foi o prazer de me ver, disto tenho certeza.

Enquanto falava, ele dirigiu o cavalo para perto dela, parando-o a seu lado. Depois fitou-a com um brilho irô nico no olhar.

— Posso tocá -la para ver se você nã o é um diabinho feito de algas e de magia, que apareceu para assustar o meu cavalo e me jogar nas pedras?

— Você gosta de dizer coisas estranhas. . . — Ela jogou o cabelo para trá s. — Preciso voltar para casa e é melhor você ir embora, se nã o quiser ser pego pela maré.

— Onde você está hospedada?

Ela nã o queria dizer, mas sabia que ele era suficientemente teimoso para prendê -la naquele lugar até que a á gua estivesse em seus tornozelos.

— Estou em Pencarne e, durante as fé rias, vou tomar conta da filha de. . . um amigo.

— Num daqueles chalé s? — Ele mostrou o penhasco com o chicote.

— Sim — disse ela, com relutâ ncia. — Num chalé chamado " Porto de Pedras".

—Ah, é interessante saber. E agora é melhor você voltar correndo para o seu porto antes que eu a carregue na garupa do meu cavalo.

Ela olhou espantada, antes de correr em direç ã o aos penhascos, seguida pela risada que ele deu.  

No meio da escada, sentiu-se compelida a acompanhar com o olhar o cavaleiro e sua montaria até que desaparecessem, engolidos pela areia. Entã o St. Avrell ficava naquela direç ã o e ela nã o poderia evitar outros encontros com Eduard Talgarth.

Seu coraç ã o bateu mais depressa. O que foi mesmo que Charme tinha dito? " Ele quer uma mulher no castelo... podia tê -la pedido em casamento se você nã o mostrasse tã o claramente que o achava odioso. "

De repente, ela ficou com medo. E se sua irmã de criaç ã o tivesse acertado? E se Talgarth começ asse a persegui-la, agora que estava num lugar tã o afastado?

Luana subiu o resto da escada correndo, como se ele já estivesse atrá s dela. Era uma loucura comportar-se assim, mas só se acalmou depois que chegou em casa. Acendeu a luz e se encostou na porta fechada, com a respiraç ã o ofegante e o rosto vermelho. Pouco depois, mais controlada, deu uma risada. Como se Eduard Talgarth pudesse ter algum domí nio sobre ela contra a sua vontade! Nã o estavam no misterioso Oriente nem na Inglaterra vitoriana! Nos dias atuais uma moç a nã o precisa temer homem nenhum.

 

Estava se dirigindo para a sala de estar quando notou um prato coberto na cozinha. Levantou a tampa e o delicioso aroma das sardinhas em escabeche abriu seu apetite. Havia també m um pedaç o de torta de maç ã, com um potinho de creme, e um girassol do jardim dos Lovibond para que ela soubesse quem tinha deixado aquele jantar.

— Eles sã o maravilhosos — murmurou, sentando-se para jantar e afastando da mente a lembranç a de um rosto moreno iluminado por dois olhos azuis muito perigosos. Olhos estranhos, que pareciam iluminados por uma chama!

Luana foi para a cama por volta das nove horas e leu um pouco à luz de um lampiã o. Seu quarto era encantador e se comunicava por uma porta com o quarto de Patrí cia. Podia ouvir o barulho do mar, batendo na praia num ritmo calmo e constante, que mais parecia um murmú rio: " Durma e sonhe. . . durma e sonhe. . . "

Apagou o lampiã o e preparou-se para dormir.

No dia seguinte iria buscar Patrí cia — um tá xi velho viria apanhá -la pela manhã,

atravessariam as charnecas para pegar a estrada para PortPerryn, onde o navio da Bretanha atracaria. Luana estava ansiosa para conhecer Patrí cia, ver se ela se parecia com o pai. Hugh Strathern era muito bom e com ele se sentia segura, pois sabia que nã o lhe recusaria ajuda caso alguma coisa a amedrontasse ou a aborrecesse.

Fechou os olhos e pô s-se a ouvir o barulho do mar. . . e, embora nã o quisesse se lembrar daquele estranho encontro na praia, descobriu que cada detalhe estava gravado em sua mente. Sentia de novo o cheiro de maresia e via a pelagem brilhante do cavalo saudá vel e bem exercitado, a cabeç a escura do cavaleiro delineada de encontro ao cé u do crepú sculo. . . Gostaria de se esquecer do rosto forte e queimado de sol. . . A boca daquele homem tinha linhas profundas, que mostravam autoridade, e uma risada franca.  

Ele nunca tinha sido um homem sonhador; toda a sua vida havia sido ativa e parecia que ele tinha se divertido com isso. O nariz era dominador, o queixo tinha uma fenda. . . que parecia esconder um diabo. Sua voz mostrava entonaç õ es estrangeiras, uma heranç a do bretã o que havia nele, intensificada por anos de viagem para lugares longí nquos. Eduard Talgarth era profundo, como um desses poç os solitá rios nas charnecas. Como o mar que batia em sua porta e corria em seu sangue.

Ele era insensí vel por natureza ou havia se tornado assim pela vida que levara? Em todo o caso, era melhor manter-se longe. Nã o queria ser perseguida como uma corç a vislumbrada entre a folhagem, para lhe conceder o divertimento da caç a. Nã o ia perder tempo com ele.  

Luana tinha conhecido a alegria de ser amada e, pelo que podia ver, nã o havia

ternura no coraç ã o daquele homem, tã o diferente de Tarquin.

— Tarquin. . . — murmurou repetidas vezes antes de adormecer.

 

Luana protegia os olhos da luz refletida pela á gua da baí a enquanto o navio atracava. Pouco depois, os passageiros começ aram a desembarcar, mostrando passaportes e papé is a funcioná rios de uniforme azul-escuro.

As malas começ aram a aparecer no cais, onde carros e tá xis estavam de prontidã o.

Luana procurava a menina de cabelos vermelhos acompanhada por uma freira de há bito cinzento e touca engomada. Os passageiros continuavam a sair do navio e, por fim, Luana viu a figura alta de uma freira. Levantou a mã o e seus olhos se encontraram com os da menina. Teve certeza de que era Patrí cia. Ela disse alguma coisa para a freira e as duas olharam para Luana. A menina sorria, mas as sobrancelhas da freira estavam franzidas enquanto ela examina Luana da cabeç a aos pé s.

O vestido de Luana era vermelho e a saia curta voava, agitada pela brisa do mar. O cabelo castanho-avermelhado estava penteado para trá s.

Parecia muito esbelta e frá gil, como se tivesse saí do das urzes altas que cobriam os penhascos acima do porto.

Irmã Grace desembarcou, mostrou os dois passaportes, e por fim se aproximou de Luana, segurando uma valise em uma das mã os e a menina na outra. A touca branca parecia aumentar sua altura e sua dignidade, reduzindo Luana quase a uma escolar.

— Você é a srta. Perry? — ela perguntou. — Que vai tomar conta de Patrí cia?

— Sim, irmã. — Luana ficou imediatamente na defensiva. — Asseguro-lhe que o pai dela, o dr. Strathern, tem toda a confianç a em mim.

— Você é muito jovem... nã o muito mais velha que Patrí cia. Será que vai dar conta? As duas sozinhas num chalé nas charnecas?

— O chalé nã o é na charneca, irmã. — Luana deu um sorriso que nã o foi correspondido. — Ao lado moram um pescador e a mã e, duas pessoas muito boas que trabalham para o dr. Strathern.

— A mulher cozinha?

— Nã o, eu sei cozinhar. — Luana estava começ ando a se aborrecer. — Sou perfeitamente capaz, irmã. O pai de Patrí cia nã o me encarregaria de cuidar dela se eu nã o fosse responsá vel.

— Os homens nem sempre julgam bem o cará ter das mulheres — disse irmã Grace explicitamente. — Muitas vezes deixam-se levar por um rosto bonito.

— Ningué m pode dizer que eu seja uma mulher fatal. . . — Luana nã o sabia se achava graç a ou se ficava aborrecida. Os olhos verdes de Patrí cia brilhavam; ela estava se divertindo com a situaç ã o, mas Luana sabia que a freira nã o estava querendo entregar a menina a algué m tã o jovem. Devia ter pensado nisso e se vestido com mais austeridade. Mas queria agradar Patrí cia, que estava esperando aquelas fé rias com tanta ansiedade.

— Você vai me desculpar se estou preocupada. — Irmã Grace lanç ou um olhar para a aluna. — Patrí cia nã o está muito bem de saú de e, no convento, preocupamo-nos com ela. Sei que o dr. Strathern é um homem ocupado, mas mesmo assim. . .

— O dr. Strathern nã o escreveu para a escola, irmã, avisando que uma jovem iria tomar conta  da filha? A senhora tem que admitir que um homem como ele dificilmente escolheria uma companheira para Patrí cia em quem nã o confiasse. Eu trabalho, irmã Grace, e logo vou fazer vinte anos. A senhora nã o deve se impressionar com a minha juventude!

— Você acha que estou sendo intrometida? — Pela primeira vez irmã Grace sorriu. — Talvez eu leve os meus deveres muito a sé rio e espere o mesmo de todo mundo. Como você disse, o dr. Strathern é um homem muito importante, que lida com muita gente todos os dias e talvez esteja mais apto a julgar o cará ter das pessoas do que os outros homens. Por acaso você é enfermeira?

— Nã o, trabalho com antigü idades.

— Embora pareç a tã o jovem! — Irmã Grace riu do que tinha dito.

Depois tornou a ficar sé ria e se virou para Patrí cia. — Você vai se comportar direito, nã o é? Vai usar chapé us quando ficar no sol e nã o se cansar demais nas á guas turbulentas desta Cornualha de que gosta tanto. Você me promete?

— Irmã Grace, chega de conselhos! — Patrí cia sorriu e seu rosto pá lido ganhou um ar travesso. — Luana me parece maravilhosa, e també m divertida, e adoro meu pai porque vou poder passar as fé rias com ela.

— Está certo, entã o. Menina, onde está a sua mala?

— Ali, junto com as outras. — Patrí cia apontou para uma pilha de malas no cais.

— Vá pegá -la! Todas as suas coisas estã o lá, junto com a renda.

— Renda! — Patrí cia fez uma careta enquanto ia buscar a mala.

— Uma ó tima menina, mas um pouco teimosa demais — disse irmã Grace. — Você vai ser firme com ela? Nã o é bom que os jovens faç am tudo o que querem, especialmente agora, quando parece que os pais estã o perdendo a autoridade. Patrí cia nã o é muito forte, e gosta de entrar no mar. . . Você precisa tomar cuidado. Ela é muito sujeita a gripes.

— Prometi ao pai dela fazer todo o possí vel. Ele gosta muito da menina e quer que ela se divirta nas fé rias.

Luana olhou para Patrí cia, que voltava carregando uma mala. A menina tinha pernas compridas e o uniforme fazia com que aparentasse menos do que os seus dezesseis anos. Tinha os olhos do pai e uma tranç a de cabelo ruivo estava escapando do chapé u ridí culo. Luana resolveu comprar-lhe um chapé u novo assim que irmã Grace partisse.

As trê s caminharam pelo cais e a irmã perguntou se pretendiam voltar imediatamente para Pencarne.

— Nã o, vamos almoç ar em algum lugar por aqui e depois dar uma olhada em PortPerryn antes de voltarmos para casa. — Luana sorriu enquanto falava, mas seu tom era firme. Tomaria cuidado com Patrí cia, mas a deixaria à vontade. Hugh queria que a filha tomasse ar puro e comesse bastante, e Luana iria providenciar que fosse assim. — A senhora quer almoç ar conosco? — convidou.

Irmã Grace desculpou-se, pesarosa. Precisava chegar logo à casa da

irmã. Chamou um tá xi e pouco depois afastava-se, segurando a valise de couro que continha suas roupas, seus livros e, sem dú vida, presuntos e tortas da Bretanha para a irmã, que estava convalescendo de uma operaç ã o.

— Ela é uma boa pessoa, mas — Patrí cia sorriu para Luana — por que as pessoas muito boas sã o tã o sé rias?

— Elas só pensam no dever e tê m medo de se divertir. Mas, sem elas, o mundo seria terrivelmente mau. — Luana pegou a mala e convidou Patrí cia: — Vamos comer num lugar chamado " Camelot".

— Prefiro pessoas de cará ter mais brando. — Patrí cia deu uma risada, enquanto tirava o chapé u. Seu cabelo era de um ruivo dourado e seu rosto tinha uma malí cia que o chapé u de abas largas escondia. — Você entende o que quero dizer? Simpá ticas, mas nã o com a alma vendida ao demô nio.

Há muitas pessoas assim. . . Sir Lancelot foi uma delas. . . Nesta parte há muitas lendas sobre o Rei Arthur e os Cavaleiros da Tá vola Redonda!

Sir Lancelot é o seu favorito.

— É claro! Ele era tã o corajoso, e é uma pena nã o ter podido ir à procura do Santo Graal porque amava a rainha. — As duas caminhavam juntas pela rua. — Como você ficou conhecendo o meu pai? Fiquei muito contente quando ele escreveu contando que tinha encontrado uma pessoa jovem e encantadora para passar o verã o comigo. Você é um encanto, sabia? Pops ficou louco por você? Isto seria bem divertido! Os homens se acomodam muito quando nã o há uma mulher para animá -los.

— Ora essa! — Luana nã o pô de impedir uma gargalhada. — Seu pai operou um... um amigo meu, salvando-lhe a vida. Foi assim que ficamos nos conhecendo. Eu estava desempregada e ele sugeriu que eu cuidasse de você durante o verã o.

— Ele deve ter achado que uma podia tomar conta da outra — Patrí cia sugeriu, com um brilho malicioso no olhar. — Pops é maravilhoso, nã o é mesmo? Do tipo rude. Gosto de homens que parecem que podem tomar conta do mundo... homens com autoridade. Quero me casar com um assim, isto é, se encontrar algué m que nã o se incomode com cabelos ruivos.

— Seu cabelo tem um tom dourado que é muito raro. Eu gosto dele e acho que seu homem autoritá rio vai querer algué m com espí rito.

— Você é muito amá vel, Luana. Fala comigo como se eu fosse adulta.

— Mas você vai ficar um dia, nã o é?

— Mas dezesseis anos é uma idade tã o difí cil! A gente nã o é mais crianç a e ainda nã o é adulto. Costumava ler os contos da Tá vola Redonda como se fossem lendas, e agora percebi que sã o histó rias de amor!

— Isto nã o torna a vida mais excitante?

— Estas fé rias vã o ser maravilhosas! — Patrí cia comentou com uma risada. — Minha prima Vai fazia com que eu me sentisse uma crianç a. Nã o podia andar sem os sapatos e quase desmaiava quando eu saí a de barco com Jim.

—Vamos fazer tudo para que estas fé rias sejam boas — Luana prometeu. — É a primeira vez que venho para a Cornualha e estou muito impressionada com os penhascos e as praias. Parece um outro mundo.

— O povo da Cornualha é diferente e alguns homens sã o tã o morenos que parecem latinos. Este é um lugar excitante, Luana. s Qualquer coisa pode acontecer.

— Imagino. —Luana olhou com prazer a paisagem de PortPerryn, com seu emaranhado de ruazinhas pavimentadas com seixos redondos, casas de pedra e a longa amurada do porto, cheia de redes de pescadores.

As gaivotas grasnavam e um pescador cantava enquanto calafetava seu barco.

Patrí cia gostou de almoç ar no Camelot. E durante a refeiç ã o, fez a pergunta já esperada por Luana:

— De onde você é? Ficou conhecendo meu pai em Londres?

Luana sacudiu a cabeç a e depois, respirando fundo, falou de Avendon, tentando nã o pensar no homem que tinha tornado a cidade divina, até o momento em que a fitara com os olhos de um estranho. Falou do rio e dos cisnes, do teatro atingido pelo raio, da ponte com o moinho.

— Você gosta de teatro? — perguntou Patrí cia.

— Sim, sempre gostei. Bem, o que vamos pedir de sobremesa? — Luana queria mudar de assunto. — Você pode escolher.

— Hum, vamos comer uma coisa que você nã o conhece. . . trovã o com raios!

Luana olhou espantada para Patrí cia e por um momento seus olhos refletiram dor e choque de ver o MaskTheatre depois que havia sido atingido pela ira do cé u.

— Nã o é assim tã o ruim! — Patrí cia riu. — É uma espé cie de sorvete com calda e creme.

— Oh, agora estou entendendo. — Luana forç ou-se a sorrir, embora ainda houvesse uma sombra em seu olhar. — Sim, preciso experimentar tudo o que é cornualê s.

A sobremesa estava muito boa e num instante a conversa de Patrí cia a distraiu. Quando saí ram da hospedaria onde ficava o restaurante, e foram passear por uma rua com lojinhas pitorescas, Luana já nã o estava sentindo tanto a falta de Tarquin.

Compraram dois chapé us de palha e saí ram correndo em direç ã o à praia. Um homem sentado na quilha de um barco virado voltou a cabeç a muito devagar para olhá -las, a fumaç a do charuto embaciando o brilho dos olhos azuis.

 Quando chegaram na areia, Patrí cia parou de repente, olhando o homem sentado no barco.

— É o amigo de Pops! — ela exclamou. — O que ele está fazendo em PortPerryn?

Luana també m reconheceu o homem imó vel como uma figura de proa,

delineado de encontro ao mar.

— Ele costumava navegar pelo sete mares — Patrí cia murmurou, excitada. — Mas agora desistiu, para ficar com seu primeiro amor.

— Ela deve amá -lo muito para ficar esperando enquanto ele veleja pelo mundo — disse Luana, um tanto confusa, lembrando-se do que Charme havia dito sobre ele.

— Nã o estou falando de uma moç a! — Patrí cia deu uma risada, um som jovem e musical que deve ter chegado até o homem que estava fumando sozinho. — Se ele amasse uma moç a da Cornualha, ele a teria levado també m. . . ele é desse tipo, Luana.

— Do que você está falando, entã o? — Sem querer Luana estava curiosa.

— Ele queria ser escultor. Mas, quando o pai morreu, falido, Eduard Talgarth teve que ir para o mar, para recuperar os bens da famí lia. O pai dele jogava tanto que se tomou famoso na Cornualha. Pois o moç o conseguiu! Comprou de volta a casa da famí lia, e até algumas coisas que haviam se dispersado, como retratos antigos e mó veis feitos com a madeira dos navios da Invencí vel Armada. Ele é um homem muito decidido e, de certa maneira, excitante.

— Excitante? — Luana murmurou, reparando no homem que se levantou e se aproximava com passos longos e seguros. Usava calç a bem talhada e uma camisa branca, bem modernas, mas dava a impressã o de pertencer a outro sé culo, a outra é poca. O vento agitava seu cabelo e seus olhos brilhavam à luz do sol.

— Dizem que ele tem o demô nio no corpo — sussurrou Patrí cia. Os Talgarth sempre tê m.

— A jovem Patrí cia. Nó s nos conhecemos no ano passado, quando você veio para St. Avrell com seu pai. — Ele estendeu a mã o para a garota, que ficou muito vermelha. Depois deu um sorriso irô nico, como se soubesse muito bem que as duas estavam falando dele.

— Alô, sr. Talgarth.

— Nã o tí nhamos resolvido que seria Eduard?

— Sim, mas você podia ter esquecido.

— Nunca me esqueç o de quem quero me lembrar. — Ele olhou acintosamente para Luana, que estava muito tensa, vivamente consciente do brilho daqueles olhos azuis.

— Ela está fazendo companhia para mim — disse Patrí cia sofregamente. — Luana Perry.

— Já nos conhecemos. Ela nã o lhe contou? — Ele deu uma risada, olhando para Luana. — Por um estranho capricho do destino, encontramo-nos de novo, e estou curioso em saber por que, entre todos os lugares, ela resolveu vir para a Cornualha.

— Porque meu pai pediu. — Patrí cia olhava para os dois, curiosa. — Pops operou um amigo de Luana que estava muito mal. Ela ficou tã o agradecida que concordou em tomar conta de mim durante o verã o.

— Quanta generosidade, srta. Perry, e como vai ser bom para Patrí cia ter sua companhia nas fé rias. — Ele fitou Luana diretamente nos olhos, com um brilho de malí cia no olhar. — Será que conheç o esse seu amigo? Por acaso nã o fomos apresentados enquanto estive em Avendon?

— Acho. . . acho que você o viu na festa de minha irmã. E també m quando ele interpretou Shakespeare no MaskTheatre.

— Ah, o ator bonitã o!

— Sim. — O coraç ã o de Luana começ ou a bater rapidamente e ela sentiu de novo o antagonismo, uma vontade de ferir aquele homem que parecia rir dela, como se fosse a mulher mais ingê nua do mundo.

— Entã o ele ficou doente? Passou mal?

— Ele ficou muito ferido quando um raio caiu no teatro. O sr. Strathern salvou-lhe a vida.

— E você veio para a Cornualha.

— Como você pode ver. — Levantou o queixo, enfrentando o olhar de curiosidade daquele homem que sabia de sua amizade com Tarquin. . . que havia dito que ela poderia sofrer por causa de uma ilusã o. Era perturbador saber que Eduard Talgarth podia ler em seus olhos e descobrir que tinha fugido porque Tarquin já nã o a amava.

— Você é muito reservada, Luana! — Patrí cia interrompeu a conversa dos dois. — Nem contou que já conhecia o sr. Talgarth!

— Foi um relacionamento muito superficial — disse ele devagar. — Talvez a srta. Perry prefira ignorá -lo. Em todo o caso, é bom encontrar você s duas, pois eu estava me sentindo um tanto solitá rio.

— Parece mesmo. — Patrí cia sorriu para ele. — O que você está fazendo em PortPerryn logo hoje, que estou chegando para as fé rias? Pops andou escrevendo para você?

— Nã o. — Havia provocaç ã o no sorriso que ele deu. — Nã o tenho mantido contato com o seu pai.

— Entã o você é adivinho! Eles costumam ter olhos azuis.

— E longas barbas brancas — ele completou.

— Todo mundo diz que sua avó era vidente e que podia prever o futuro. Ela profetizou que a famí lia perderia o castelo por muitos anos.

— Provavelmente porque sabia do amor que o filho tinha pelas cartas. — Ele olhou para Luana. — Você já falou à srta. Perry a respeito do demô nio dos Talgarth, que só pode ser exorcizado de cada homem da famí lia pelo amor de uma jovem sincera?

— É uma histó ria intrigante — Luana murmurou e seus olhos detiveram-se por um instante na fenda do queixo dele. — Mas você acredita nela?

— Como já falei muito e vi uma porç ã o de coisas estranhas, fico imaginando se nã o seria melhor o ú ltimo dos Talgarth arranjar uma noiva. — Ele deu um sorriso atrevido. — Uma noiva carinhosa. . .

— Tenho certeza de que você nã o terá problemas nesse sentido — disse Patrí cia, os olhos pregados nos ombros largos e na pele escura como madeira contra a brancura da camisa. — Gostaria de tê -lo conhecido quando você tinha dezenove anos e ganhou uma taç a por ter derrotado o campeã o de luta romana de Penzance.

— É verdade, minha flor? — Ele tinha uma expressã o tolerante. — Deixe-me ver. . . poderia ter empurrado seu carrinho quando você era bebê, mas nã o sei como isto influiria em minha reputaç ã o como lutador.

— Nã o amole — respondeu Patrí cia. — Gostaria de ter pelo menos uns dezesseis anos nessa é poca.

— Eu estava de partida para o Extremo Oriente, flor. Nó s estarí amos nos separando por um longo tempo.

— Você nã o me levaria junto, se eu fosse sua namorada?

— Naquela é poca nã o era dono de meu navio, Patrí cia.

— Você sente falta do mar? É por isso que veio para PortPerryn. . . para olhar para os navios?

— Sim, lembrando o passado, como se o futuro nã o pudesse ser tã o bom quanto os dias que já vivemos, com suas horas tristes ou alegres.

Luana o fitava, tã o alto e moreno, com o horizonte azul atrá s e o azul do mar nos olhos. Tã o perspicaz, tã o experiente, deixando-a indefesa quando pediu com os olhos que se tornassem amigos para agradar Patrí cia.

— Quero que você s dois sejam amigos. — Nos olhos verdes havia aquela expressã o dos jovens que querem amor e alegria, e nã o palavras amargas. — Seja camarada, Luana. Nã o seremos convidadas para ir ao castelo, se você s nã o se apertarem as mã os, esquecendo-se de qualquer briguinha que possam ter tido. O castelo é maravilhoso. . .

— É mesmo? — Luana murmurou, e impulsivamente estendeu a mã o para Eduard Talgarth, preparando-se para o contato com aqueles dedos finos que podiam modelar a pedra, a prata ou o ferro de acordo com sua vontade. Luana se surpreendeu com a delicadeza do toque, pois ele segurou a sua mã o como se fosse um passarinho.  

Os olhos dele demoraram-se no escaravelho azul do anel dela.

— Parece ser verdadeiro. Tem alguma inscriç ã o? À s vezes há alguma coisa escrita debaixo da asa.

— Há algumas palavras — ela admitiu, sentindo ainda o calor dos dedos dele —, mas nã o sei o que significam.

— Posso tentar?

Ela hesitou. Depois, percebendo o olhar de Patrí cia, entregou o anel para Eduard, que o estudou durante alguns minutos.

— Sim, está escrito em á rabe — disse ele finalmente. — Nã o dá para traduzir, mas o anel é um talismã para afastar o azar.

Luana o olhou rapidamente, perguntando-se se ele imaginava quem lhe tinha dado o anel. Ele nã o lhe havia dado sorte, embora ela o guardasse com carinho pelas recordaç õ es que trazia.

— Posso experimentar, Luana? — Patrí cia pediu. — É um anel tã o diferente.

— Nã o. — Eduard sacudiu a cabeç a, pegando na mã o direita de Luana, para recolocar o anel. — O escaravelho é como uma alianç a: pode perder sua magia se outra pessoa o usar. Vou lhe dar um anel que tenho no castelo, quando você s duas forem jantar comigo.

— Que tipo de anel? — Patrí cia estava encantada com a idé ia de receber um presente dele.

— Um anel de princesa, como os usados pelas danç arinas tailandesas quando executam as danç as rituais nos templos.

— Vou adorar. — Ela passou o braç o pela cintura de Luana, como se estivesse com vontade de abraç ar aquele homem que a fitava com ar divertido. — Você viajou pelo mundo inteiro? — perguntou. — Até o Himalaia?

— Sim, visitei os templos mí sticos em Katmandu, onde os sinos tocam como se fossem feitos de gelo. Vi cú pulas douradas ardendo ao sol, morei numa casa de chá ao lado de uma ponte de bambu, dormi num diva forrado de peles de tigres da Sumatra e fiquei amigo de um prí ncipe da Manchú ria. — Ele sorriu e suas narinas se retesaram ao respirarem o ar da Cornualha. — Agora voltei para St. Avrell. . . o ú ltimo dos Talgarth.

— Você tem sorte em ser homem e poder fazer o que quer — comentou Patrí cia.

— Nã o é bem assim. — Ele deu um sorriso enigmá tico. — O que você s vã o fazer à tarde? Descansar na praia, tomar chá e depois voltar para casa?

— Adivinhou! — Patrí cia riu. — Em suas viagens, você deve ter aprendido a ler pensamentos.

— Talvez. — Ele procurou os olhos de Luana. — Posso ler os seus?

— Sou eu quem vai ler os seus — respondeu Luana, sorrindo. — Você nã o tem nada para fazer agora e gostaria de passar a tarde conosco. Com certeza Patrí cia vai adorar.

— E você? — ele perguntou, com a voz arrastada.

— Como você lê. pensamentos, deve saber a resposta — Luana respondeu ironicamente, e virou-se, escondendo um sorriso. Será que imaginava que ela estava tã o ansiosa para passar a tarde com ele quanto Patrí cia?

Eles se estenderam na areia aquecida pelo sol, perto do mar. A voz grave de Eduard chegava em ondas até Luana. Ela cobriu os olhos com o chapé u de palha e deixou que ele distraí sse Patrí cia com suas histó rias, pois, como todos os viajantes, tinha muitas coisas para contar. A menina sentia-se atraí da por ele, mas Luana estava na defensiva. Como Eduard sabia a respeito de Tarquin, ele a fazia lembrar-se das coisas que queria esquecer.

 



  

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