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CAPITULO IV
Alex ergueu os pesos pela ú ltima vez e, entã o, ficou deitado, tentando recuperar o fô lego. Estava fora de forma, pensou contrariado, e decidiu que um banho lhe faria bem. Entã o, estaria em condiç õ es de ir buscar Rachel. Quando deixou a sala de giná stica, descobriu-se pensando em Kate. Sentia-se ligeiramente embaraç ado pela maneira como a tratara, na vé spera. Perguntou-se se ela compreenderia a pressã o a que vinha se expondo, caso contasse a ela sobre Rachel. Ocorreu-lhe que talvez lhe devesse um pedido de desculpas. Enquanto se vestia, olhou em volta, observando o quarto sem o menor prazer. Havia se mudado da suí te para um dos aposentos menores, quando Pamela morrera. Embora achasse que a casa precisava de uma nova decoraç ã o, nã o sentia o entusiasmo necessá rio para tal empreendimento. Quando recuperasse a custó dia de Rachel, tudo seria diferente. A propriedade dos Wyatt situava-se do outro lado de King’s Montford. A famí lia de Conrad cultivava aquelas terras havia mais de cem anos. Alex sempre soubera que Conrad lamentava o fato de a esposa nã o ter tido mais filhos e, quando Pamela engravidara, o velho nã o escondera o desejo de que fosse um garoto. Na ocasiã o, Alex nã o dera importâ ncia a isso, pois acreditava que ele e Pamela teriam mais filhos. Conrad chegara a sugerir que Alex mudasse seu nome para Wyatt, uma vez que seu pai já estava morto. Alex, poré m, nem sequer considerara a idé ia, pois orgulhava-se de ser um Kellerman. A partir de entã o, o relacionamento entre sogro e genro começ ara a se deteriorar. Mesmo assim, Alex sempre tratara Conrad com cortesia, na esperanç a de que um dia pudessem se tornar verdadeiros amigos. Mas, entã o, Pameia morrera e o pai dela o acusara de ter planejado o " acidente". Até mesmo a mã e de Pamela, que se mantivera neutra na situaç ã o, fora forç ada a ficar ao lado do marido. Nã o era de admirar que Alex houvesse se deixado abater tanto, ele pensou agora. Sua vida havia desmoronado e ele só encontrava algum conforto quando se embriagava. Rachel era jovem demais e o sogro nã o encontrara a menor dificuldade em convencer as autoridades de que a menina deveria ficar aos cuidados dos avó s, até que o pai recuperasse a capacidade de cuidar da filha. As mã os de Alex apertaram o volante com forç a, mas ele disse a si mesmo que a pior coisa a fazer seria encontrar Conrad Wyatt com uma postura hostil. Tinha de convencer os Wyatt de que estava em plenas condiç õ es de educar a filha. O que era verdade. Agira como tolo, mas aprendera a liç ã o. Se tivesse Rachel de volta, nunca mais se comportaria de maneira tã o estú pida. Foi Jú lia Wyatt quem abriu a porta e, como esperava ser recebido pela governanta, Alex ficou apreensivo. — Alex... receio ter má s notí cias para você — ela murmurou. — Rachel nã o está muito bem. Alex havia planejado levar Rachel ao parque, para dar comida aos patos. Entã o, almoç ariam em Jamaica Hill e, à tarde, ele a levaria aos está bulos. Uma das é guas acabara de parir um potro e ele tinha certeza de que a filha adoraria conhecer o animalzinho. Mas, agora... — Ela está doente? — perguntou. — Nã o exatamente — Jú lia respondeu, lanç ando um olhar nervoso por cima do ombro. — É apenas um resfriado, mas nã o acho que ela deva sair em um dia tã o frio. — Posso vê -la? — Bem, eu nã o sei... — ela começ ou, mas foi interrompida pelo marido. — Quem está aí, Jú lia? Está frio demais para manter a porta aberta. — Quando viu Alex, o sogro exibiu expressã o dura. — Ah, é você. — Voltou a encarar a esposa. — Nã o disse a ele que Rachel nã o pode sair hoje? — Bem, eu... — Ela me disse, Conrad — Alex interrompeu-a, consciente de que seu comportamento naquele instante seria crucial. — Eu gostaria de ver minha filha. — Impossí vel. Ela está dormindo. Nã o é mesmo, querida? — Conrad lanç ou um olhar ameaç ador para Jú lia, que assentiu. — Sinto muito desapontá -lo, Kellerman, mas nã o há nada que se possa fazer. Alex cerrou os punhos, lutando contra o impulso de esmurrar o sogro. Poré m, sabia que Conrad correria até o juiz, para contar que fora ameaç ado pelo genro. Alé m disso, um comportamento impensado só reforç aria o que Conrad afirmara na ocasiã o do acidente: que Alex era um homem violento e descontrolado, incapacitado para cuidar de uma crianç a. — També m sinto muito — disse, antes de virar-se para a sogra. — Poderia me informar sobre a saú de dela, amanhã? — Ah, sim, mas receio que... — Eu sei — Alex voltou a interrompê -la. — Nã o poderei vê -la amanhã. Diga a ela que estive aqui e que lhe mandei um beijo, por favor. Tenho certeza de que posso confiar na senhora para isso. — Está insinuando... — Conrad começ ou, furioso, mas Alex já voltava para o carro. Uma vez na estrada, a raiva deu lugar a uma dor profunda, provocada pela saudade da filha. Apesar de todos os seus esforç os, a situaç ã o nã o mudara e Alex tinha vontade de chorar, ao pensar no mal que fizera a si mesmo. Bem, de nada adiantaria permitir que a atitude de Conrad o deprimisse e, assim, Alex decidiu visitar Wayside e fazer as pazes com Lacey. Poré m, lembrou-se de que deveria informar a governanta de que Rachel nã o iria almoç ar com eles. Agnes Muir ficaria tã o decepcionada quanto ele. Quando entrava no haras, teve de brecar bruscamente, para nã o atropelar uma adolescente. A menina parecia indecisa quanto a tomar a direç ã o da casa, ou dos está bulos. Era relativamente alta e esbelta e usava uniforme escolar. Embora tivesse certeza de que nã o a conhecia, Alex notou algo familiar no rosto jovem. Abriu a janela. — Posso ajudá -la? — Alex inquiriu. — Estou procurando... por minha mã e... — a menina gaguejou. — Ela trabalha aqui... Chama-se Kate... — Kate Hughes? — Sim. — É filha dela? — Alex perguntou, surpreso, pois nã o sabia que Kate era casada. — Se entrar no carro, posso lhe dar uma carona até os está bulos. — Bem, eu... — Sou Alex Kellerman. Tenho certeza de que sua mã e a ensinou a nã o aceitar caronas de estranhos, mas sou o dono desta propriedade. Entre. — Abriu a porta e, assim que a menina se acomodou, perguntou: — Nã o deveria estar na escola, a esta hora? Ela lhe lanç ou um olhar maroto. — É exatamente o que mamã e vai dizer, mas nã o vou voltar para lá. Ao menos, nã o hoje. — Algum problema? — Alex indagou. — O que quer que tenha acontecido, nã o poderia esperar até a noite? — Mamã e també m vai dizer isso. Ela fala muito em boa educaç ã o e coisas assim, mas nem sempre é tã o fá cil quanto parece. — Está enfrentando problemas — ele afirmou, enquanto punha o carro em movimento. — Nã o é fá cil convencer as pessoas de que está dizendo a verdade. Eu sei como é isso. — Imagino que saiba — ela declarou, mas voltou a corar. — Desculpe. Nã o deveria dizer isso, pois nã o sei nada sobre o senhor. — O que nã o impediu muita gente de emitir suas opiniõ es — Alex replicou com ironia. Entã o, sorriu, satisfeito por encontrar algué m capaz de admitir seus pró prios preconceitos. — Bem, já que sou uma autoridade no assunto, por que nã o me conta o que a está perturbando? Que escola frequenta? — Lady Montford. — E está encontrando dificuldades nos estudos? — Nã o! — ela exclamou, indignada. — Nã o tenho dificuldades para aprender. E essa é justamente uma parte do problema. Alex avistou os está bulos e lamentou que o trajeto fosse tã o curto. Estava gostando de conversar com ela e queria descobrir o que a levara até ali. — E qual é o problema... Bem, você ainda nã o me disse o seu nome. — Joanne. — Muito bem, Joanne. Por acaso, suas colegas a estã o perturbando por que você é melhor do que elas, nos estudos? — Nã o. Alex gostaria de continuar, mas já haviam chegado ao seu destino. — Bem, seja o que for, tenho certeza de que sua mã e será capaz de compreender. — Acha mesmo? — Joanne mostrou-se cé tica. — Nã o conhece mamã e como eu. Alguma vez, já fez alguma coisa que sabia estar errada e, depois, se arrependeu, sr. Kellerman? Algo que gostaria de deixar para trá s, mas que algumas pessoas nã o permitem que se esqueç a? — Todos nó s fazemos coisas das quais nos arrependemos. No meu caso, foi escolher a esposa errada, mas nã o vamos discutir isso. O que você pode ter feito de tã o errado? Quantos anos tem? — Doze. — Com doze anos, o que você pode ter feito de tã o mau? — Nã o é preciso ser maior de idade para infringir a lei. Ah, meu Deus! Mamã e vai me matar, quando descobrir! Alex estudou-a por um momento. Joanne parecia estar falando sé rio. O que quer que tivesse feito, acreditava que causaria sofrimento à mã e. Mas, o que ela fizera? Matara aulas? Desrespeitara um professor? Tomara drogas? Alex foi tomado de profunda apreensã o, ao mesmo tempo em que dizia a si mesmo que aquela garota nã o tinha nada a ver com ele. Ainda assim, nã o pô de se conter. — Você nã o cheirou cola, ou algo parecido, nã o é? — Nã o sou idiota, sr. Kellerman. Nunca tomei drogas, embora já tenham me oferecido. Alex ficou horrorizado. Haviam oferecido drogas a uma garota de doze anos! Para onde o mundo ia, afinal? Seria possí vel que as crianç as nã o pudessem mais ter infâ ncia? — Fico contente em ouvir isso — disse, esforç ando-se para esconder os verdadeiros sentimentos. — Se nã o tomou drogas, nã o creio que tenha motivo para se preocupar tanto. — O senhor nã o sabe de nada! — Joanne exclamou, irritada, e saiu do carro. — Tente dizer à minha mã e que eu nã o queria roubar o batom. Alex suspeitou que ela nã o havia planejado contar-lhe a verdade e, pela expressã o no rosto dela, Joanne já se arrependera. Quando já se preparava para manobrar o Range Rover, Alex deu-se conta de que Joanne continuava parada, sem saber para onde ir. Ignorando a voz interior que o advertia contra envolver-se naquela questã o, desligou o motor e saiu do carro. — Joanne — chamou. — O escritó rio fica ali — apontou. Ela se virou e, quando se aproximava da porta, Kate apareceu. — Joanne! — exclamou, ignorando Alex, exceto por um olhar rá pido e nervoso na direç ã o dele. — O que está fazendo aqui? — Mamã e.., — Nã o deveria estar na escola? Ainda sã o onze horas! Aconteceu alguma coisa? Sua avó... — Vovó está bem. — Entã o, por que o sr. Kellerman... — Eu a encontrei no portã o — ele explicou, percebendo que Kate tremia de frio. — É melhor você s duas entrarem no escritó rio, antes que fiquem doentes. — O quê? — ela indagou, parecendo confusa. —Ah, sim... Joanne, acabei de preparar chá. Entre e sirva duas xí caras. Os lá bios de Alex se curvaram. — Uma atitude muito apropriada, considerando-se o que fiz ontem — murmurou. — Bem, eu... — Mais uma vez, a ansiedade de Kate tornou-se ó bvia. — Se quiser se juntar a nó s, sr. Kellerman, será bem vindo. — Serei? Estudou-a com olhar cí nico, pensando que era muito fá cil desconsertá -la. Entã o, foi invadido por um sentimento de pesar, provocado pelo fato de ela ser casada e, portanto, estar fora de seu alcance. Com a experiê ncia que tivera, ele jamais submeteria outro homem ao que ele mesmo tivera de enfrentar. — Quem sabe um outro dia — replicou por fim, lanç ando um olhar para a porta aberta, que Joanne acabara de atravessar. — E vá com calma. Acho que sua filha está atravessando um momento difí cil. — Acha o quê? — Kate inquiriu, sem esconder o ressentimento provocado pelo comentá rio. —A maneira como trato minha filha nã o lhe diz respeito, sr. Kellerman. E nã o creio que o senhor esteja em posiç ã o de julgar. As ú ltimas palavras atingiram-no em cheio, especialmente depois do que Conrad Wyatt fizera, pouco antes, mas Alex decidiu nã o discutir. — Talvez nã o. Eu apenas dei uma opiniã o. Se fosse o pai dela... — Mas nã o é — Kate interrompeu-o com veemê ncia. — O pai de Joanne está morto, sr. Kellerman. Morreu em um acidente de automó vel, antes que ela completasse dois anos de idade. — Sinto muito... — Eu nã o. Ele nã o estava sozinho no carro, quando morreu. — Ah... Alex assentiu e sua aparente compreensã o desarmou Kate. — Desculpe se fui rude — ela murmurou. — Sua filhn está esperando no carro? — Minha filha nã o virá. — Ah... Espero que nã o haja nada de errado com ela — Kate falou com sinceridade. — Ela virá um outro dia — Nã o se meu sogro puder evitar — Alex respondeu, mas, ao perceber que estava prestes a lhe contar todos os seus problemas, deu meia-volta e encaminhou-se para o carro — Gostei da sua filha. Você devia ser pouco mais que uma adolescente, quando ela nasceu.
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