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The Emerald Coast 1 страница



 

 

 

The Emerald Coast

Margaret Mayo

 

 

No orfanato, todos diziam que Liane era uma garota de sorte por ter um rico protetor que queria levá -la para sua casa na Sardenha. Mas ela estava amedrontada: quem seria esse sr. Malaspina de quem nunca tinha ouvido falar? O que esperava em troca da vida de luxo que lhe oferecia?

Viajou com o coraç ã o pesado de desconfianç a, sabendo que ia se sentir um patinho feio naquele ambiente de milioná rios. A realidade, poré m, era ainda mais cruel do que imaginava. O rico italiano tinha mesmo um motivo secreto para mandar buscá -la. E seu filho Marcello humilhou Liane desde o primeiro dia. Para ele, ela nã o passava de uma aproveitadora, e o lindo tom dourado de seus olhos era o brilho da cobiç a!

 

Digitalizaç ã o: Desconhecida

Revisã o: Samuka

 


 

 

Bianca 158

Editora Abril 1982

 


 

Capí tulo 1

 

 

Liane nã o estava ansiosa para sair do Orfanato St Morrow. Sabia muito bem o que significava aquele chamado à sala da sra. Morton: o aviso de que o orfanato, sua casa durante tantos anos, ia se transformar numa recordaç ã o.

Hesitante, bateu à só lida porta de carvalho, depois abriu-a e entrou.

Liane era uma garota magra, de expressã o amedrontada, grandes olhos de um castanho-dourado, cabelos levemente ondulados.

Parou diante da enorme mesa e cruzou as mã os, nervosa.

— Nã o fique com tanto medo. — Lucy Morton disse suavemente. — Tenho boas notí cias para você.

— Encontrou algum lugar para onde eu possa ir?

A mulher sorriu e pegou uma carta.

— Você é uma jovem de muita sorte. Nã o é sempre que algué m aqui consegue essa chance. Na verdade, durante os trinta anos que passei dirigindo este lugar, acho que nunca vi nada parecido.

Liane gostaria que a sra. Morton fosse diretamente ao assunto. Nã o conseguia imaginar por que estava tã o animada.

— Sente-se. Acho que vai levar um susto.

— O que é, afinal, tia Lucy?

— Você vai para a Sardenha!

— Sardenha! — Liane repetiu, depois de um longo silê ncio.

— Mas... por quê? Quem... ? — Nã o estava entendendo. Nã o gostaria de ir para o exterior. Nã o queria sair do orfanato e, muito menos, ir embora da Inglaterra. Era um pensamento que a amedrontava. Arregalou os olhos, sem acreditar no que tinha ouvido. — Do que está falando?

— Disto. — A diretora sorriu. — Chegou uma carta do sr. Malaspina. Ele convida você para se hospedar em sua casa pelo tempo que quiser. É uma ó tima chance, Liane, e estou muito satisfeita.

A garota empalideceu.

— Sr. Malaspina? Quem é e! e? Por que me escolheu?

— É o seu benfeitor, garota. É quem manda aqueles lindos presentes.

Durante toda a vida, no dia do aniversá rio e no Natal, sempre recebia presentes caros e misteriosos. Isso acabara causando inveja à s outras crianç as e uma situaç ã o delicada para Liane, que fora se tornando cada vez mais tí mida.

— Foi uma surpresa també m para mim, mas tinha algumas esperanç as. Investiguei um pouco a vida do sr. Malaspina. Ele é um homem muito rico, Liane, com negó cios no mundo inteiro. Tem muita sorte que ele a aceite em casa. Nenhuma das outras crianç as teve essa oportunidade.

— Mas se ele me conhecia, por que esperou até agora para me convidar?

A sra. Morton deu de ombros.

— Nã o sei. Nã o está contente? Percebe que é a grande chance de sua vida?

— Sim. tia Lucy. — Liane respondeu, um pouco em dú vida, tentando sorrir. Sentia-se aterrorizada, mas era do tipo que se controla em situaç õ es difí ceis. Alé m do mais, nã o podia dizer à sra. Morton que nã o queria aceitar o convite.

 

 

A pró xima visita que Liane fez ao escritó rio da sra. Morton foi no dia em que saiu do orfanato. Na vé spera, Lucy Morton havia avisado que o sr. Malaspina estava chegando para buscá -la, e desde aquele momento Liane mal conseguira dormir.

Antes de entrar na sala da diretora, ouviu a voz do sr. Malaspina, alta, profunda. E a intimidava! Nã o era o tipo benevolente de velho que ela havia imaginado.

Quase virou-se e saiu correndo, mas a porta da sala da sra. Morton se abriu e a diretora a chamou.

— Entre, Liane. Parece que o sr. Malaspina nã o estava passando bem e mandou o filho buscar você.

Olhando para aqueles olhos frios, Liane sentiu uma vontade ainda maior de fugir. O homem a olhava como se nã o gostasse dela. Parecia profundamente aborrecido com sua missã o.

Parou humildemente diante dele e baixou os olhos, sentindo que ele a analisava.

— Está pronta? — A sra. Morton perguntou. — O sr. Malaspina nã o pode perder tempo. — Estendeu a mã o para a garota. — Vou sentir sua falta. Escreva de vez em quando, contando como está passando. — Virou-se para o homem. — Até logo, sr. Malaspina. Por favor, mande minhas recomendaç õ es a seu pai. Espero que ele melhore logo.

Um carro enorme, com chofer, esperava lá fora. Liane entrou ansiosa, sabendo que estava sendo observada e se sentindo pouco à vontade com aquele homem a seu lado.

Ele nã o parecia italiano. Os cabelos eram castanhos, alourados, e tinha a pele bronzeada. Era alto, forte, e os olhos revelavam uma determinaç ã o que a perturbava.

Liane tinha sido feliz no orfanato. Nã o havia pensado muito no dia em que teria que sair de lá. Detestava conhecer novas pessoas, principalmente quando pareciam nã o gostar dela... como aquele homem a seu lado.

Ele estava sentado rigidamente e nã o a olhava; parecia nã o se importar nem um pouco com ela. O carro vencia a distâ ncia, e Liane ficava menos à vontade a cada minuto.

Quando nã o conseguiu aguentar mais o silê ncio, disse:

— Desculpe, mas acho que nã o está gostando da ideia de eu ir morar com você s. Sinto muito. Queria que soubesse que nã o fui consultada sobre esse assunto.

— Entã o, somos dois. — ele disse, friamente. — Quando meu pai tem uma ideia, ningué m consegue mudá -la.

Ele nã o tinha nenhum sotaque. Se nã o fosse aquele nome estranho, ela acharia que era inglê s. Imaginou se o pai nã o seria inglê s. Talvez a mã e fosse italiana. Ningué m falara na sra. Malaspina. Talvez o sr. Malaspina fosse viú vo e por causa disso tivesse adiado o convite para ela ir morar em sua casa. Nenhum homem quer viver com uma garotinha.

— Como seu pai soube da minha existê ncia? Sempre fiquei imaginando de onde vinham os presentes...

— Ele lhe dirá pessoalmente. Nã o tenho nada a ver com isso.

— Lamento ter perguntado. — Mergulhou no silê ncio mais uma vez. Nunca o tempo tinha passado tã o devagar. Parecia que jamais chegariam ao aeroporto.

Quando a sra. Morton lhe dissera que ia andar de aviã o, Liane se sentira nervosa. Mas agora estava mais animada. Tentou esquecer a presenç a daquele homem frio e distante e pensar apenas na viagem que ia fazer.

Sua imaginaç ã o cresceu, vendo um aviã o nos cé us voando como um enorme pá ssaro. Devia ser uma delí cia estar lá dentro. E ver Londres, lá embaixo, desaparecendo, os edifí cios cada vez menores...

Talvez voassem acima das nuvens, onde o mundo devia ser diferente, com nuvens cor de pé rola, um sol dourado, a sensaç ã o do infinito.

De repente, voltou à realidade, quando o sr. Malaspina lhe tocou o braç o. Tinham chegado ao aeroporto de Heathrow.

O silencioso chofer abriu a porta e ela desceu depressa. Seu companheiro estalou os dedos e um carregador apareceu, pegando as malas dela.

— Isso é tudo que você tem? — O homem perguntou, rí spido. Liane fez que sim, com um ar de quem pede desculpas.

Ele ficou sé rio e dispensou o carregador.

— Eu mesmo levo. — Liane viu que na outra mã o ele carregava uma maleta muito elegante, com as iniciais M. M. em dourado.

Depois de despachar as malas, ele perguntou:

— Quer um café, srta. Chandler? Temos que esperar meia hora.

Liane ainda estava tentando adivinhar o nome dele. Já tinha pensado numa lista enorme de nomes ingleses, como Martin e Mark. Mas depois achou que devia ser um nome italiano. Olhou bem: tinha jeito de Má rio.

Demorou algum tempo para perceber que ele havia feito uma pergunta. Ningué m a chamava de srta. Chandler; fazia com que parecesse mais velha. Aos dezoito anos, tinha convivido apenas com meninos e meninas bem mais jovens, e só naquele momento percebeu que nã o era mais uma crianç a.

— Costuma sonhar acordada, srta. Chandler?

Ele parecia aborrecido e Liane sentiu vontade de se esconder.

— Desculpe. — Murmurou, com os olhos tã o grandes e tristes que pareciam ocupar todo o rosto.

— Em que está pensando?

— Em nada. Nada de importante.

Ele ficou ainda mais zangado.

— Vamos tomar uma xí cara de café.

Que homem esquisito! Nã o gostara dele desde o começ o, mas, quanto mais tempo passava em sua companhia, menos o apreciava. Será que o pai era igual? Esperava que nã o. Nã o aguentaria conviver com dois homens tã o detestá veis.

Enquanto esperava o café, sentada ao lado dele na mesa, ela o olhou discretamente. Tinha uma expressã o autoritá ria e um queixo bem definido. O paletó de camurç a modelava os ombros largos. Parecia um homem importante, cheio de dinheiro e que sabia como aproveitá -lo. Nã o havia nele nenhum calor, nem a sugestã o de que poderia ser um bom amigo. Era duro e amargo, a julgar pela seriedade do rosto. Liane estremeceu de repente e desviou os olhos, observando os outros passageiros que també m esperavam o café.

O contraste era marcante. Por toda parte havia risos, espontaneidade e conversas. O homem da mesa ao lado, que devia ter mais ou menos a idade do sr. Malaspina, conversava com uma garota de uns dezoito anos, sorrindo muito e explicando que era uma bobagem o medo que ela sentia de aviõ es.

Por que nã o tinha a sorte de viajar com algué m parecido?

Seu acompanhante colocou a xí cara sobre o pires.

— Você nã o parece muito feliz por ir viver com meu pai na Sardenha. Devia estar agradecida por esta chance que ele está lhe oferecendo.

Ela o olhou rapidamente, sabendo que nã o poderia afastar do olhar o ressentimento que sentia.

— Nã o pedi para ir para lá, sr. Malaspina. — Havia um certo desafio em sua voz, o que nã o era um comportamento comum. Poré m, aquela nã o era uma situaç ã o comum.

— Mesmo assim, acho que devia se mostrar um pouco mais entusiasmada. Meu pai está doente, e nã o quero que ele se arrependa da decisã o que tomou.

De repente, Liane lamentou seu desabafo. Devia mesmo se sentir agradecida. Cruzou as mã os por baixo da mesa, num gesto infantil. Oh, Deus, por favor, faç a com que o pai dele seja diferente! Depois, disse:

— Tudo é muito estranho e novo para mim. Nunca viajei de aviã o; portanto, é natural que me sinta nervosa.

Ele pareceu satisfeito com a resposta e voltou a atenç ã o para a xí cara de café. Será que estaria com vergonha de ser visto junto com ela? Sabia que, ao lado das roupas caras dele, seu vestido feito em casa devia estar parecendo pouco elegante.

Como o vestido, a maior parte das roupas que levava na mala tinha sido feita no orfanato. Liane gostava de costurar. Era um passatempo que a acalmava, Gostava també m de ler e de escrever poesias. O que o sr. Malaspina diria, se visse suas poesias?

— Alguma coisa me diz que você é uma idealista. — O homem a seu lado falou de repente. — E que, se nã o gosta das situaç õ es que está vivendo, se isola num mundo à parte, um mundo que você mesma cria.

Os olhos dela brilharam.

— Verdade. Como adivinhou? Sempre passei muito tempo sozinha e acho que era o ú nico jeito de me divertir.

— Nã o tinha companhia? Pelo que sei, o orfanato está cheio de meninos e meninas.

— Eles nã o gostavam muito de mim. De certa forma, a culpa nã o era deles, mas de seu pai.

Ele ficou ainda mais sé rio. Suas sobrancelhas escuras se juntaram.

— Por quê?

— Por causa dos presentes. As crianç as nã o entendiam por que eu recebia presentes caros, quando elas nã o tinham nada. Costumavam tomá -los de mim. No fim, acabei nã o mostrando mais nada. Na verdade, gostaria que nunca tivessem me mandado nada.

Ele sorriu cinicamente.

— Vou dizer isso a meu pai. Ele vai custar a acreditar que seus presentes nã o foram apreciados.

— Prefiro que nã o conte nada. Nã o quero que ele pense que sou uma ingrata.

Ele ficou quieto e ela achou melhor mergulhar no silê ncio novamente. Minutos depois, uma voz anunciava pelo microfone que os passageiros do voo para a Sardenha deviam se apresentar no portã o 12. Eles se levantaram em direç ã o ao aviã o, que esperava na pista.

Liane estava animada demais para pensar no homem difí cil que a acompanhava. Olhou pela janelinha do aviã o e sentiu-se ansiosa para partir.

Era tudo como havia imaginado. O aviã o subiu como um pá ssaro gigante e em poucos segundos, estavam acima das nuvens.

Ela se virou para o companheiro, com uma expressã o de contentamento, e esqueceu por um momento que ele devia ser um viajante experiente.

— Nã o é maravilhoso?

Seu entusiasmo pareceu diverti-lo.

— Como você é infantil!

O encanto sumiu. Abaixou a cabeç a, ressentida com a crí tica que percebeu no olhar dele. Eram olhos de leã o, um leã o que sente um prazer intenso em destruir a presa.

Virou-se para a janela, procurando controlar as lá grimas. Nã o importava o que acontecesse, nã o ia deixar que o sr. Malaspina a visse chorando. Isso só confirmaria sua opiniã o de que ela nã o passava de uma crianç a.

Durante um perí odo que pareceu uma eternidade, ficou observando o cé u, e só voltou sua atenç ã o para dentro do aviã o quando lhe trouxeram uma refeiç ã o.

Comeu automaticamente, mal sentindo o sabor da comida. Aquele homem horrí vel estava estragando todo o seu divertimento. Voar teria sido uma experiê ncia fascinante, se ele nã o estivesse ali. Sua presenç a tinha transformado a viagem em pesadelo.

Depois da refeiç ã o, ele fechou os olhos e nã o os abriu até que o comandante anunciou que se aproximavam de Roma.

Como Liane gostaria de conhecer Roma! Tinha lido muito sobre as obras de Michelangelo, na Capela Sistina, sobre a praç a Sã o Pedro, no Vaticano. Era um mundo que a fascinava. E agora que parecia estar tã o pró xima de tudo, estava, na verdade, completamente distante. Só tinham uma hora de espera, antes de seguirem viagem.

— Quer tomar alguma coisa? — Ele perguntou. Era a primeira vez que falava nas ú ltimas duas horas.

— Aceito uma limonada.

Novamente, ele deu aquela risadinha irritante.

— Nã o, acho que vou tomar um café. — Ela corrigiu depressa. Ele nã o disse nada, mas Liane percebeu o que pensava. Ficou com raiva outra vez, Nã o precisava ficar com aquele ar condescendente!

Foi com alí vio que ouviu a chamada para o pró ximo voo. Aos poucos, o cé u escurecia. Nã o dava para ver nada pelas janelas. Teve que voltar sua atenç ã o para o interior do aviã o.

O sr. Malaspina lia uma revista, mas colocou-a de lado quando percebeu que ela havia parado de olhar pela janela.

— Por que nã o tenta dormir? Ainda temos uma hora antes de chegarmos a Alghero.

— Nã o estou com sono.

— Mas parece cansada.

Obrigada pela cortesia, ela pensou, seu queixo se erguendo num ar de desafio. Mas nã o disse o que pensava, comentando apenas:

— Nã o tenho dormido bem, ultimamente. Só isso. Mas nã o estou cansada.

— Vai estar, antes de chegarmos. Teremos ainda que viajar mais dois quilô metros de carro, cruzando a ilha, antes de chegar a Porto Cervo.

Isso significava que nã o chegariam à casa do sr. Malaspina antes da madrugada. Nã o tinha imaginado que a viagem fosse demorar tanto. Sentiu-se desanimada.

— Você mora em Porto Cervo? A sra. Morton nã o me disse nada. Como é a cidade? Fica à beira-mar?

— É na extremidade nordeste da ilha. Fica na chamada Costa Esmeralda. Era quase despovoada, há bem pouco tempo, mas agora se transformou no parque de diversõ es da alta sociedade. A regiã o foi desenvolvida por Aga Khan nos anos 60, e agora é ocupada por tropas do Exé rcito para evitar sequestros. Você vai ver todo tipo de pessoas: nobres, estrelas de cinema, milioná rios e até reis.

Agora ela sabia por que ele a havia olhado com ar de pouco caso. Para que tipo de mundo estava sendo levada? Será que ia se adaptar?

— Acho que ficou espantada, mas devia ser avisada.

— Estou contente que tenha me avisado. — Pelo menos, era melhor do que ser atirada de cabeç a no desconhecido. Talvez devesse ter adivinhado que nã o ia viver numa casa comum. Os presentes caros já tinham sido um indí cio de que a famí lia Malaspina era rica, e aquele homem tinha um ar tã o importante quanto o dos artistas de cinema.

Liane já imaginara muitas vezes como seria viver num mundo em que o dinheiro nã o era problema, onde era natural ter um armá rio cheio de vestidos novos, uma casa linda com jardins e piscina.

Mas isso tinha sido apenas sonho. Nem mesmo em seus momentos mais loucos de fantasia, pensara que acabaria morando num lugar assim. Coisas desse tipo nã o aconteciam com ó rfã s.

— Acha que nã o vai se acostumar?

— Nã o sei.

— Claro que vai ser uma vida completamente diferente da que teve até agora.

— Já percebi isso.

— Pode ter dificuldades em se adaptar.

— Acho que sim. — Suspirou, entendendo o que ele estava tentando lhe dizer. Já tinha deixado bem claro que ela ia para a Sardenha contra sua vontade. Bem, nã o era novidade.

— Apesar de tudo, acho que meu pai vai ficar encantado. Você tem o ar de garota desprotegida de que ele tanto gosta. Parece mesmo a orfã zinha desamparada que é.

Realmente, ele nã o fazia nenhum esforç o para ser gentil.

— Desculpe se nã o sou o que você esperava.

— Oh, está enganada. É exatamente o que eu esperava.

O voo parecia nã o ter mais fim. Ela procurou se entreter, olhando os outros passageiros e imaginando o que iriam fazer na Sardenha. Passar fé rias, talvez? O homem de terno do lado esquerdo carregava uma maleta; certamente, estava viajando a negó cios. De qualquer maneira, todos pareciam ansiosos para chegar. Provavelmente, se sentiam mais felizes do que ela.

Seu acompanhante começ ou a ler uma revista. Liane olhou-o de lado e notou que tinha mã os bonitas e unhas bem cuidadas. O punho branco da camisa estava preso por uma abotoadura de ouro. Tudo nele era muito elegante. Sentiu o perfume suave da loç ã o de barba e associou-o ao perfume de um homem. A masculinidade dele a envolveu docemente. Percebeu, de repente, que era um homem muito atraente. E isso foi uma descoberta, o contato com alguma coisa muito nova em sua vida.

Nã o que o fato dele ser atraente fizesse alguma diferenç a. Continuava a ser detestá vel e nã o demonstrava o menor interesse por ela. Mas por algum motivo inexplicá vel, tornou-se muito consciente da presenç a dele, sentindo um certo calor e uma vibraç ã o estranhos quando seu ombro tocava o dela. Percebeu que a observava.

— E qual é sua opiniã o? — Perguntou, divertido e com um brilho intenso no olhar.

— Nã o sei o que quer dizer.

— Você me observou atentamente, nos ú ltimos minutos. Nã o chegou a nenhuma conclusã o?

Liane sentiu-se embaraç ada. Ele era esperto.

— Nem percebi que estava olhando para você.

— Nã o?

— Bem... é que nã o havia mais nada para fazer. Oh, desculpe! Nã o quis ser indelicada.

— Nã o me importo. Só queria saber que pensamentos passaram pela sua cabeç a.

— Eu estava admirando suas roupas.

Ele a olhou, arrogante.

— Comparando-as com as suas, sem dú vida?

— Minhas roupas foram perfeitamente adequadas até agora, sr. Malaspina.

— Ainda bem que reconhece o " até agora". Isso mostra que percebe uma coisa: elas nã o sã o adequadas para conviver com as pessoas que conhecerá daqui para a frente.

— Pior para elas. — Aquele homem nã o tinha nenhum direito de tratá -la como uma pessoa inferior. Só porque havia nascido numa famí lia rica, nã o era melhor do que ela.

— Nã o gosto de sua atitude, srta. Chandler. Devia ser mais agradecida.

— També m nã o posso dizer que gosto de suas atitudes. — Respondeu, com os olhos castanho-dourados lanç ando chispas de fú ria. — E, na verdade, nã o sei por que deveria ser agradecida. Parece que vou ser tudo, menos feliz.

Ele ficou tenso e seus olhos cor de â mbar escureceram.

— Ah, essas desamparadas mal-agradecidas...

Liane respirou fundo. Nunca, em toda sua vida, algué m tinha lhe falado assim.

— Como se atreve? — Gritou, sem perceber que havia levantado a voz. Depois viu que os outros passageiros olhavam os dois e se calou.

— Tenho todo o direito. — Ele disse, calmamente. — E por favor, olhe para mim quando eu falar com você.

O olhar dela estava cheio de ressentimento.

— Desculpe, sr. Malaspina. Sei que nã o devia ter respondido.

— A ironia nã o combina com você, menina.

Devia contar que nunca tinha falado com algué m como falara com ele? Lucy Morton ficaria chocada, se a ouvisse. Sempre achara Liane uma das garotas mais comportadas do orfanato.

— Acho que agora você vai emburrar e ficar em silê ncio.

Os olhos dele estavam fixos nela. Eram bonitos, apesar de frios.

— Nunca fico emburrada.

— Ó timo. Nã o aguento gente que nã o pode ouvir certas verdades.

Liane respirou fundo e contou até dez. Verdades eram uma coisa; insultos, outra.

— Nó s teremos que conviver, depois que chegarmos em casa?

— Posso perguntar por que está fazendo essa pergunta?

— É claro que nã o combinamos, sr. Malaspina, Pelo que vi, acho melhor ficarmos longe um do outro.

— Concordo plenamente. Mas vai ser difí cil; estou sempre em casa.

— Nã o trabalha?

— Vamos dizer que trabalho em casa. Temos um computador instalado lá e posso entrar em contato com nossas empresas sem sair de minha cadeira.

Liane tinha visto documentá rios na televisã o mostrando essas coisas.

Mas imaginara que eram má quinas do futuro.

— Vejo que nã o está acreditando. Mas garanto que é verdade. Meu pai vai lhe mostrar tudo. Ele gosta disso.

O que mais estaria reservado para ela? Tinha tido uma surpresa por minuto até entã o. O que a perturbava era perceber que nã o escaparia daquele homem. A vida ia ser difí cil, um contraste completo com a que conhecia.

A variedade é o tempero da vida, disse a si mesma. Sabia que teria que enfrentar grandes mudanç as, que ia ver muitas coisas novas. Só nã o sabia se seriam mudanç as para melhor.

Logo em seguida, aterrissaram no aeroporto de Fertilia, e um carro esperava por eles.

Liane estava curiosa a respeito daquele estranho paí s, mas só conseguia ver os nomes das cidades passando nas placas da estrada. Primeiro passaram por Alghero, cujas luzes brilharam entre palmeiras. Depois o caminho começ ou a subir, e seu acompanhante explicou que estavam indo para o interior, a regiã o dos vales.

Logo passavam por Sassari, a segunda cidade da ilha em importâ ncia: um lugar digno de ser visitado.

Agora o sr. Malaspina parecia mais afá vel. Liane imaginou se ele se sentiria assim por estar chegando o momento de entregá -la ao pai.

A pró xima cidade foi Tempio; depois, Olbia. Em seguida, passaram por uma rocha onde estava escrito " Costa Esmeralda". Estavam quase em casa.

Momentos depois, chegavam a Porto Cervo. O carro parou Liane, que havia cochilado, abriu os olhos e descobriu, horrorizada, que tinha encostado a cabeç a no ombro do sr. Malaspina.

— Uma crianç a cansada. — Ele disse, irô nico.

Ela nã o respondeu. Desceu do carro e olhou ao redor com interesse.

As luzes lá fora iluminavam um pá tio. Das sombras surgia uma casa que parecia afundada na rocha. Nã o conseguiu distinguir completamente os contornos.

O sr. Malaspina caminhou a seu lado e o motorista os seguiu com as malas. Liane notou que agora sua mala parecia ainda mais velha e que suas roupas nã o combinavam com coisa alguma, ali. Sentiu-se desajeitada e insegura.

Desejou nã o ter vindo. Tinha sido tudo um erro. Devia ter dito à sra. Morton que nã o queria sair da Inglaterra. Mesmo que tivesse que morar numa das pensõ es que detestava tanto, seria melhor do que aquilo.

E entã o, de dentro da casa, surgiu um velho. Parecia doente e usava um roupã o sobre o pijama. Sorriu, lhe dando as boas vindas, e seu sorriso a compensou de todo o sofrimento que tinha enfrentado.

— Liane! — Ele estendeu os braç os. — Até que enfim! — Abraç ou-a com forç a e ela se permitiu relaxar de encontro a ele, sentindo que sua alegria era sincera.

Quando a afastou gentilmente, Liane viu que havia lá grimas em seus olhos.

— Você é linda como uma pintura. Exatamente como sua mã e.

Ela arregalou os olhos.

— Conheceu meus pais? — Aquilo a surpreendeu. Nunca tinha pensado nisso. Mas, é claro, ele devia conhecer seus pais; senã o, como saberia de sua existê ncia?

— Conheç o você mais do que imagina. Mas acho que está cansada, depois dessa longa viagem. E deve estar com fome també m. Vamos conversar mais tarde, depois que tiver descansado. Marcello, leve Liane para o quarto dela. O jantar está servido na sala. Encontro você s dois lá.

Marcello! Entã o era esse o nome dele. Parecia muito italiano.

Mas, olhando-o, ela podia jurar que era inglê s.

Ele se parecia com o pai. Ambos tinham o mesmo tipo de corpo, o maxilar firme e o nariz reto. Só os cabelos eram diferentes. Os do pai eram pretos, e a pele, mais escura.

Fá cil ver de quem Marcello tinha puxado os traç os marcantes. O velho tinha a aparê ncia de um homem duro, e o filho parecia respeitá -lo.

Esta observaç ã o surpreendeu Liane. Ele dava a impressã o de ser o tipo de pessoa que nã o respeita ningué m. De certa forma, sentiu-se satisfeita. Seria agradá vel ouvir algué m falar com ele no mesmo tom que usara para conversar com ela.



  

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