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Capítulo 5



 

― Nã o foi para tanto! ― defendeu-se Kirsten incorporando-se, apoiando-se nos travesseiros e cobrindo-se com o lenç ol.

― Como nã o? ― exclamou Shahir.

― Foi uma simples mentira...

― Uma simples mentira? ― repetiu Shahir ficando em pé. ― Eu disse que nã o a tocaria se fosse virgem e você mentiu. Enganou-me e isso nã o foi bom, nã o foi justo.

― Eu decidi assim e deve respeitar minha escolha ― insistiu Kirsten.

― Se tivesse me dito que era virgem, eu teria decidido nã o tirar sua inocê ncia. Acabo de trair meus princí pios ― respondeu Shahir entrando no closet, pegando roupa limpa e entrando no banheiro.

Kirsten ouviu a á gua correr e sentiu uma horrí vel vontade de chorar. O castigo para sua mentira tinha chegado mais rapidamente do que ela temia.

Tinha entregado sua virgindade a um homem que nã o a amava e que nã o parecia apreciar o fato de que a tivesse dado porque o julgasse especial.

Acaso era especial de verdade?

Kirsten necessitava desesperadamente que Shahir a consolasse, que se mostrasse amá vel e afetuoso com ela e, em lugar de fazer isso, ele estava se comportando com ela como se tivesse cometido o pior dos crimes.

Era verdade que tinha mentido, mas jamais o faria. Nessa ocasiã o, a idé ia de perdê -lo, de nã o fazer amor com ele lhe tinha nublado a razã o e lhe tinha feito faltar à verdade.

Shahir voltou a aparecer, ainda mais bonito que antes, embelezado com um lindo terno cinza sob medida e Kirsten se apressou em desviar o olhar.

― Me perdoe por mentir, mas nã o pensava no que fazia ― desculpou-se em voz baixa. ― Nã o devia ter mentido.

Em Shahir produziu uma imensa admiraç ã o que Kirsten fosse uma pessoa que pedisse desculpas tã o cedo, pois isso significava que era uma boa pessoa. Entretanto, se tal e como ele queria, passasse a fazer parte de sua vida, precisava aprender a liç ã o e ter muito claro que ele nã o tolerava mentiras em sua casa.

― As mentiras minam a confianç a ― comentou. ― Como vou poder confiar em você agora?

― Talvez nada disto tivesse ocorrido... ― lamentou-se Kirsten com pesar.

― Nã o somos crianç as, Kirsten. Aconteceu o que querí amos que acontecesse.

― Isto foi a coisa mais estú pida que fiz em minha vida!

― Nã o foi muito inteligente nem da sua parte nem da minha, mas o que a simples vista pode parecer um erro pode transformar-se em algo positivo.

― Nã o sei como... ― respondeu Kirsten enrolando um lenç ol no corpo e levantando-se da cama.

Teria gostado de poder fechar os olhos e desaparecer. Por que demô nios nã o se foi enquanto Shahir estava no banho? Estava tã o envergonhada pelo ocorrido que, enquanto recolhia sua roupa, nã o se atrevia nem a olhá -lo. Como tinha tido coragem de se deitar com um desconhecido? Aquele comportamento nã o era pró prio dela.

A impressionante intensidade de suas emoç õ es e a atraç ã o sexual tinham destroç ado o respeito que deveria ter sentido por si mesma.

Ao Shahir tinha bastado olhando-a e tocando-a para lhe fazer perder o sentido comum e o controle. Como negar que sentia algo por ele? Teria se apaixonado? A verdade era que nã o tinha podido deixar de pensar nele desde que se conheceram, mas isso nã o era desculpa para o que acabava de acontecer.

― Espere... ― disse Shahir agarrando-a.

― Tenho que voltar ao trabalho.

― Nã o ― disse Shahir sentando-a em uma cadeira. ― Me escute. Agora somos amantes.

― Nã o preciso que me recorde isso! ― exclamou Kirsten aflita.

― Tampouco nã o precisa ficar assim. O que aconteceu entre nó s nã o é para tanto.

― Fico como me dá a vontade ― interrompeu-o Kirsten.

― Pense que isto poderia ser o começ o de uma nova vida para você.

― De que está falando?

― Obviamente, depois do ocorrido, nã o pode continuar trabalhando aqui, mas nã o quero que volte para a casa de seu pai. A partir de agora, eu me faç o responsá vel por você.

― Nã o entendo.

― Estou lhe propondo que se vista, que suba no carro comigo e que nã o olhe para trá s.

Kirsten o olhou atô nita.

― Está me pedindo que vá com você?

― Estou lhe pedindo que seja minha amante.

Kirsten nã o podia acreditar no que estava escutando.

― Mas...

― Me escute antes de responder. Tenho uma casa em Londres em que poderia viver no momento. Quando tiver encontrado uma que goste, a comprarei para você e me farei responsá vel de todos os seus gastos.

Kirsten compreendeu o que ele lhe estava oferecendo e a surpresa e a fú ria se apoderaram dela.

― Nã o me respeita absolutamente, nã o é verdade? É porque sou uma faxineira ou porque me deitei com você sem pensar duas vezes?

Shahir a olhou desconcertado.

― O respeito nã o tem nada que ver com tudo isto...

― Já me dei conta! Comportei-me como uma estú pida, mas isso nã o quer dizer que esteja disposta a me converter em uma vadia.

― Nã o é isso o que eu lhe proponho. O que quero é que passe a fazer parte de minha vida.

― Nã o acredito! ― exclamou Kirsten com lá grimas nos olhos. ― O que acontece é que nã o acha que eu seja digna de nada melhor e me reserva para a cama. Muito bem. Isso nã o importa, mas o que nã o entendo é que tenha se rebaixado a me tocar se me tem em tã o pouca estima.

Cega pelas lá grimas, recolheu sua roupa, entrou no banheiro, limpou-se no bidê e se vestiu a toda velocidade.

Como Shahir tinha se atrevido a lhe propor semelhante coisa? Aquela oferta tinha sido horrivelmente humilhante. Claro que, o que esperava? Ter uma relaç ã o de igual para igual com um prí ncipe quando suas vidas nã o tinham nada em comum?

Nã o deveria ter se deitado com ele.

Teria gostado de poder reviver o maravilhoso momento de uniã o que se produziu entre eles antes que tudo se estragasse, mas era impossí vel.

Kirsten tomou ar e, ao abrir a porta, encontrou Shahir passeando pelo quarto com expressã o grave no rosto.

Quando ele ficou a só s, seu intelecto havia tornado a reagir e a fria ló gica se deu procuraç ã o de sua mente. Sua existê ncia perfeitamente orquestrada e racional saiu dos trilhos.

Shahir era um homem disciplinado e nã o estava acostumado a equivocar-se, mas devia admitir que se comportou sem escrú pulos. Acaso inteirar-se de que Faria se casou o tinha afetado mais do que acreditava?

É obvio, a sugestã o de Pamela de que Kirsten mantinha relaç õ es com outros homens lhe tinha caí do muito bem para acreditar que era mais fá cil e para julgar seu desejo por ela mais aceitá vel.

Agora que podia pensar de novo com clareza, dava-se conta de que nada, absolutamente nada, podia desculpar o fato de que se deitou com uma empregada.

Em lugar de ajudar uma jovem que estava passando por um momento espantoso em sua vida, aproveitou-se dela, tinha traí do sua confianç a e se comportou muito mal.

Era responsá vel pelo dano que tinha causado a Kirsten e agora se dava conta de que lhe propor que se convertesse em sua amante tinha sido ainda pior.

Sentia-se envergonhado por seu comportamento e sabia perfeitamente o que tinha que fazer.

― Kirsten, eu gostaria de falar com você ― disse-lhe ao vê -la aparecer.

Kirsten nã o queria nem olhá -lo, estava conseguindo manter a compostura com muita dificuldade e nã o queria chorar diante dele.

― Nã o é preciso que diga nada mais. Suponho que o aliviará saber que nã o vou continuar trabalhando no castelo e que vou embora de Strathcraig.

― Nã o, me dizer isso nã o me alivia absolutamente. Aonde vai? ― perguntou Shahir franzindo o cenho.

― Tenho planos.

― Os planos nã o sã o suficientes. Nã o permita que o que aconteceu entre nó s a faç a tomar uma decisã o equivocada. Nã o está passando por um bom momento e eu nã o tenho feito mais que lhe complicar as coisas.

― A verdade é que estava bem até ter me proposto que ganhasse a vida como uma prostituta! ― exclamou Kirsten deixando-se levar pelo orgulho ferido.

― Nã o vou me defender dessa acusaç ã o ― admitiu Shahir. ― Jamais deveria ter dito nada parecido.

Que ele lhe pedisse perdã o com tanta facilidade comoveu Kirsten, que terminou de vestir-se e decidiu sair dali o quanto antes.

― Bom, já nã o temos nada mais que nos dizer ― murmurou indo para a porta.

― Equivoca-se. Devo-lhe uma explicaç ã o. Quero que entenda meu comportamento.

― Nã o.

― Por favor...

Ao ouvir aquela palavra dos lá bios de Shahir, Kirsten sentiu lá grimas nos olhos. Era ó bvio que Shahir se arrependia do que tinha acontecido entre eles e aquilo doeu em Kirsten ainda mais que a terrí vel proposta de converter-se em sua amante.

Ao olhá -lo de relance, voltou a maravilhar-se de sua beleza masculina e recordou o roç ar de sua pele enquanto faziam amor.

― Vou pedir que nos tragam café ― anunciou Shahir.

― Nã o, por favor, prefiro que terminemos o quanto antes com isto.

Shahir ficou olhando-a aborrecido.

― Eu nã o gosto de ver você assim. Ou melhor, as coisas nã o foram bem entre nó s porque ambos está vamos com a cabeç a em outro lugar, pensando em outras coisas.

― Em outras coisas? ― disse Kirsten.

― Sim, você em seu pai, que te bateu e eu... E eu també m tinha motivos para estar pensando em outras coisas porque esta manhã me inteirei que uma mulher que era importante para mim se casou com outro homem.

Kirsten sentiu que o sangue lhe gelava nas veias, baixou o olhar e pensou que aquilo era como se Shahir lhe acabasse de cravar uma faca no coraç ã o.

Uma mulher que era importante para ele.

Obviamente, estava falando de uma mulher por quem estava apaixonado. A Kirsten parecia inconcebí vel que o prí ncipe Shahir se apaixonasse por uma mulher que o tivesse rejeitado.

Mas isso era o que ele lhe acabava de contar e o fato era que estava apaixonado por outra mulher, que seu coraç ã o pertencia a outra.

Kirsten sentiu que lhe rasgava a alma ao compreender que Shahir estava apaixonado por outra mulher e que, como nã o podia tê -la, deitou-se com ela, que nã o tinha sido para ele mais que uma distraç ã o, o prê mio de consolaç ã o.

Aquilo a fez sentir-se magoada e humilhada.

― Como ela se chama?

Aquela pergunta pegou Shahir de surpresa.

― Faria...

― Nã o precisava ter me falado dela ― disse Kirsten.

De fato, teria preferido que nã o o tivesse feito porque, ao lhe contar a verdade, tinha afetado sua dignidade e a tinha enchido de vazio e de angú stia.

― Sim, eu precisava. Nã o estou acostumado a me comportar como o tenho feito hoje. Aproveitei-me de você e quero recompensá -la por isso. Só me ocorre uma maneira de fazê -lo.

― O que está feito, feito está.

― Se case comigo ― murmurou Shahir.

Kirsten esteve a ponto de estourar em gargalhadas, mas tinha ficado tã o surpresa, que nã o conseguiu articular palavra.

― Está louco... ― disse por fim.

― Nã o, nã o estou. Vivemos em uma comunidade que nã o é muito liberal e você cresceu em uma casa em que o sexo fora do casamento é completamente inaceitá vel. Entendo perfeitamente que esteja magoada pelo que passou entre nó s hoje e tem direito de estar. Aproveitei-me de sua confianç a e de sua vulnerabilidade e nã o me orgulho absolutamente disso.

― Mas, pedir que me case com você...

Kirsten estava completamente aniquilada ante a mudanç a de atitude de Shahir. Agora compreendia por que a tinha tratado com tanto carinho na cama. Obviamente, estava pensando em Faria.

― Por que nã o? Algum dia terei que me casar com algué m.

― Sim, mas nã o acredito que queira fazê -lo com uma qualquer ― respondeu Kirsten.

― Você é bonita.

Kirsten se sentiu mal, pareceu-lhe uma ignomí nia que a apreciasse somente por seus encantos fí sicos, mas nã o devia esquecer que, obviamente, isso era a ú nica coisa que o tinha atraí do nela.

Em todo caso, se lhe houvesse dito a verdade, se tivesse confessado que era virgem, Shahir jamais teria feito amor com ela, assim de nada servia jogar toda a culpa nele porque ela també m tinha sua parte de responsabilidade no ocorrido.

Shahir estava pedindo que se casasse com ele porque se sentia culpado e ela nã o estava disposta a ser tã o indecente para aceitar uma proposta tã o importante naquelas condiç õ es.

― O melhor será que nos esqueç amos de tudo isto ― disse-lhe. ― Nã o me deve nada. Nã o o culpo por nada. Nã o é preciso que proponha que me case com você.

― Claro que é preciso ― insistiu Shahir.

― Obrigada pela oferta. Nã o quero parecer mal educada, mas acredito que nã o é difí cil de entender que nã o quero me casar com um homem que nã o me ama.

― É sua ú ltima palavra?

― Sim ― respondeu Kirsten. ― Posso ir agora?

― Faç a o que quiser ― respondeu Shahir.

Ato seguido, Kirsten saiu a toda velocidade de seu quarto e Shahir ficou ali, de pé, confuso. Nem por um segundo tinha lhe passado pela cabeç a que Kirsten fosse recusar sua proposta.

Agora, a ú nica coisa que podia pensar era em que jamais voltaria a tê -la em sua cama.

Kirsten acabava de sair da mé dica quando se encontrou com Jeanie.

― Onde se meteu? Estou procurando-a já há um bom momento ― disse-lhe sua amiga. ― Pelo visto, desapareceu uma jó ia e estã o nos fazendo abrir os armá rios de todos.

Kirsten seguiu Jeanie até os porõ es, onde ficava os armá rios do pessoal de limpeza e, enquanto a senhora Cook, a chefe do pessoal de limpeza, abria um depois do outro, nã o podia deixar de pensar em Shahir.

O que teria acontecido se tivesse aceitado sua proposta? De verdade teria se casado com ela? Nã o parecia muito pró prio de um prí ncipe pedir algo que nã o estava disposto a cumprir. Entã o, teria se convertido em uma princesa? Teriam sido felizes? Ele teria esquecido de Faria e teria terminado apaixonando-se por ela?

― Kirsten, poderí amos conversar? ― disse-lhe a senhora Cook depois do registro.

Continuando, enquanto Kirsten seguia à chefe a seu escritó rio, fez-se um incô modo silê ncio.

― Encontraram isto em seu armá rio ― disse a senhora Cook lhe mostrando um impressionante diamante.

― Isso é impossí vel... ― respondeu Kirsten olhando a jó ia, que conhecia perfeitamente porque a tinha visto vá rias vezes no quarto de Pamela Anstruther.

― Há uma testemunha que afirma que a viu guardar isso em seu armá rio durante o descanso do almoç o ― insistiu sua chefe.

Surpresa pela acusaç ã o, Kirsten se lanç ou a defender sua inocê ncia e o que teve lugar a seguir foi a pior experiê ncia de sua vida.

Morag Stevens, uma das ajudantes da senhora Cook, resultou ser a testemunha que a tinha visto guardando a jó ia e assim o disse sem olhá -la nos olhos.

Uma hora depois, informaram-lhe que tinha sorte de que lady Pamela nã o a denunciasse por roubo, entregaram-lhe seus pertences e a puseram, literalmente, na rua.

Ali a estava esperando Jeanie.

― Nã o fui eu, Jeanie, juro! ― exclamou Kirsten.

― Eu sei ― tranqü ilizou-a a ruiva.

― Por que diabos haverá dito Morag que me viu guardar o diamante em meu armá rio se sabe que nã o é verdade?

― Talvez porque foi ela que o roubou, há se posto nervosa e o escondeu no primeiro armá rio que viu, que resultou ser o seu. Lembra-se que ela tem a chave de tudo, mas eu suspeito mais de lady Esnobe.

― De lady Pamela? Por que? O que ela ganha me acusando? ― respondeu Kirsten atô nita.

― Nã o tenho nem idé ia, mas nã o é trigo limpo. O que vai fazer?

Kirsten recordou o cartã o de visita que Shahir lhe tinha entregado quando se conheceram e decidiu que devia chamá -lo.

Estava certa de que ele nã o permitiria que a acusassem de algo que ela nã o tinha feito. Estava certa de que Shahir nã o acreditava que ela fosse capaz de roubar. Se ficasse sabendo do ocorrido, poderia fazer com que se investigasse em profundidade e, no final, saberiam da verdade.

― Se seu pai ficar sabendo que a demitiram por roubo, vai ficar furioso ― comentou Jeanie preocupada.

― É sexta-feira, assim tenho todo o fim de semana para contar ― murmurou Kirsten nervosa.

― Kirsten, nã o conte para ele. Venha para minha casa.

― Nã o posso...

― Se acontecer algo, me chame por telefone. Já sabe que pode vir para minha casa quando quiser. Meus pais nã o se importam.

Depois de despedir-se de sua amiga, Kirsten pedalou a toda velocidade e, ao chegar em casa, subiu de dois em dois os degraus que levavam a seu quarto e, uma vez ali, discou o nú mero do celular de Shahir.

― Preciso ver você ― disse quando ele atendeu. ― É urgente.

Produziu-se um breve silê ncio antes que Shahir lhe dissesse que se veriam em uma hora no mirante que havia a um quilô metro de sua casa.

Kirsten se disse que tudo ia ficar bem, que por seu tom de voz Shahir ainda nã o se inteirou do que tinha acontecido.

Do outro lado do telefone, Shahir desligou o aparelho com expressã o austera no rosto.

 

 



  

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