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CAPÍTULO VI



 

Netta acordou com o cheiro da fumaç a.

Mal podia acreditar que tinha conseguido dormir. Nã o imaginou que seria possí vel pegar no sono quando Jos deitou-se ao seu lado. Encolheu-se toda, procurando ficar o mais afastada possí vel, no espaç o limitado da cama improvisada, puxando as dobras da capa bem junto do seu corpo para evitar qualquer contato com ele. Ficou tensa e rí gida, mas Jos nã o fez qualquer tentativa para tocá -la e, poucos minutos depois, ela percebeu que ele tinha adormecido.

Netta sentiu-se ressentida, confusa, e achou que jamais conse­guiria pegar no sono, que seus pensamentos em tumulto nunca a deixariam descansar, mas, sem que se apercebesse, a exaustã o cobrou seu preç o e ela adormeceu profundamente.

Começ ou a tossir por causa da fumaç a que enchia toda a caverna e seus olhos começ aram a lacrimejar.

— Jos, acorde! — Netta virou-se e viu que o lugar ao lado esta­va desocupado.

— Estou aqui — ele falou, baixinho, atravé s da abertura na rocha. Netta mal podia distingui-lo por entre os rolos de fumaç a escura.

— Vamos sair, estamos presos numa armadilha! — O terror a fez correr em direç ã o da abertura, à procura de ar fresco.

— O fogo é lá fora, nã o aqui. — Jos puxou-a para um lado, impedindo-a de chegar perto da passagem.

— Mas... — Netta lutou para libertar-se.

— Dê uma olhada. — Ele a sacudiu com forç a c fez com que virasse o rosto para fora, ainda segurando-a perto de si.

— O que é que eles estã o fazendo? — Vá rias formas masculinas se movimentavam por entre a fumaç a, enquanto o fogo devorava todo o mato seco que havia perto das rochas. Netta mal podia respirar. — Temos que sair daqui!

— Fique onde está.

— Nã o posso. — Ela engasgou. — Nã o estou conseguindo respirar.

— Se ficar pior, deite-se no chã o com o rosto virado para baixo. A fumaç a tende a subir e haverá oxigê nio perto do chã o.

Jos nã o desviou a atenç ã o dos homens do lado de fora da caverna e do que estavam fazendo.

— Eles nã o estã o conseguindo dominar o fogo!

— Nã o é isso que estã o pretendendo. Estã o fazendo com que se alastre ainda mais.

— Por quê?

— Nã o percebeu? Pensam que estamos escondidos no mato, que­rem aquelas pedras preciosas a qualquer custo. Isto quer dizer que ainda nã o as encontraram.

Os rebeldes estã o muito mais perto das pedras do que imaginam, pensou Netta, passando os dedos pelo có s da calç a.

— Estã o chegando cada vez mais perto — disse, vendo os homens formando uma fileira, atiç ando o fogo logo à frente da caverna.

— Certamente eles nã o sabem desta abertura, ou teriam vindo diretamente para cá.

— Se chegarem mais perto das rochas, vã o acabar descobrindo essa entrada.

— Nã o creio que virã o até aqui. Nã o sabem da caverna e vã o continuar procurando pelo mato, onde acham mais prová vel haver algué m escondido. Temos que continuar aqui e em silê ncio, é a nossa ú nica chance de nã o sermos descobertos. Agü ente firme.

— Nã o precisa se preocupar, ficarei quieta — disse Netta, bai­xinho, e ficou furiosa quando viu um sorriso cí nico começ ar a se formar nos lá bios de Jos. Resolutamente, abafou um acesso de tosse, mas precisou tirar a mã o da boca para coç ar a nuca. Alguma coisa á spera estava passando por ela.

— Ui!

— Psiu!

— Nã o pude evitar. Veja! É uma aranha enorme! — murmurou Netta cheia de raiva, atirando o inseto para longe, com uma cara de nojo. — Há uma outra aqui, devem estar fugindo do fogo. Meu Deus, isto aqui vai ficar infestado! — Ela olhou, aterrorizada, à sua volta. Havia aranhas no teto da caverna, descendo pelas paredes; faziam aquilo que Jos a tinha aconselhado a fazer: procuravam pelo ar fresco, perto do chã o.

Uma coisa enorme e monstruosa bateu no rosto de Netta. Uma aranha preta e peluda como nunca vira, nem mesmo nos seus piores pesadelos. Ela abriu a boca para gritar.

— Quieta!

A mã o de Jos se fechou sobre a sua boca. abafando o grito.

— Elas nã o lhe farã o mal. Nã o sã o venenosas.

Podiam nã o ser venenosas, mas eram horrí veis. Só com muitoesforç o, Netta conseguiu ficar quieta. Quando Jos percebeu que ela nã o ia mais gritar, tirou a mã o de sua boca e pegou-a em seus braç os, afastando-a das aranhas que infestavam o chã o. Netta estremeceu e escondeu o rosto contra o peito dele. Jos afastou-a cuidadosamente para o lado, sacudiu bem as cobertas para afastar qualquer inseto e deitou-a cuidadosamente no monte de palha onde tinham dormido.

— Esqueç a as aranhas — murmurou ele no ouvido de Netta. — Esqueç a a fumaç a. — Ele puxou um cobertor sobre ela, e sobre ele també m. — Logo vai estar tudo acabado — prometeu, com uma ternura tã o grande que Netta começ ou a imaginar se nã o estava sonhando.

Os lá bios de Jos pararam de falar e se puseram a apagar as ima­gens ameaç adoras do pensamento de Netta. Nã o havia crueldade, como antes, eles acariciavam, pressionando suas pá lpebras para que ela nã o visse as aranhas, passando por sobre seu nariz para que ela nã o sentisse a fumaç a.

Com um suspiro, Netta se rendeu à suas carí cias, entregando-setotalmente à quela paixã o impossí vel de controlar. A sensaç ã o embriagadora tomou conta de todo seu ser, afastando qualquer idé ia do perigo que corriam, da ameaç a representada pelos rebeldes lá fora. Foi como se um vé u caí sse sobre o passado e o futuro, deixando somente o presente, um presente cheio de um fogo que fez o incê ndio do mato parecer insignificante, com chamas de ê xtase que, como um raio, pareceu consumir tudo à sua volta, enchendo aquela caverna desoladora de uma luz maravilhosa que só ela... e Jos, iriam conhecer.

Estava sozinha quando acordou. Olhou cuidadosamente à sua volta, mas nã o havia mais aranhas. A fumaç a tinha, desaparecido e os insetos tinham voltado aos seus esconderijos. Netta passou a mã o pelo rosto para afastar os cabelos dos olhos e viu uma marca de fuligem na palma da mã o.

— Estou tã o suja! — gemeu, desejando um banho reparador, com á gua quente e sabonete perfumado.

Atirou os cobertores para o lado e começ ou a se espreguiç ar. Jos nã o estava na caverna, mas nã o devia estar longe. Tudo parecia diferente, mas a euforia passada ainda permanecia, enchendo-a de confianç a. Levantou-se, sentindo-se extremamente bem-disposta e começ ou a dobrar os cobertores. Logo iriam sair dali, em busca da liberdade. Quando viu a palha que servia de cama, lembrou-se de que Jos tinha dito que havia um rio ali perto.

— Á gua. Isso significa a possibilidade de um banho.

Talvez Jos tivesse ido se lavar. Netta foi até a abertura na rocha e olhou para fora cautelosamente. Nã o havia sinal de vida, os rebel­des tinham desistido. Toda a vegetaç ã o estava reduzida a cinzas e carvã o e, alé m de toda essa desolaç ã o, ela viu o rio brilhando sob o sol da tarde.

— Preciso me lavar, nã o vou me demorar — disse baixinho, para aplacar sua pró pria consciê ncia, que a aconselhava a esperar por Jos. Ele devia estar nadando mais adiante.

O sol estava muito quente e o caminho até a margem do rio era difí cil. Quando chegou perto, Netta deu um gemido de desâ nimo.

A á gua era suja, opaca, cheia de detritos, mais parecia um caldo grosso e malcheiroso.

— Vou só molhar minhas mã os e passá -las no rosto — murmu­rou. Perto da margem havia marcas de patas de animais, formando poç as mais fundas na lama seca.

— Netta, nã o...

No mesmo instante em que ouviu o grito de Jos, sentiu o chã o fugir sob seus pé s, quando a camada de lama seca afundou sob seu peso. Viu que estava atolada num lodo escuro e pegajoso.

— Jos! — desesperadamente, Netta tentou dar um passo para trá s, mas só conseguiu afundar ainda mais.

— Fique quieta! Nã o tente lutar!

Netta ouviu-o gritar e vir correndo pela margem na sua direç ã o, em pâ nico. Jos agarrou suas mã os e começ ou a puxá -la com forç a e, finalmente, Netta viu-se novamente em terreno firme, cambaleando por causa do susto e da camada de lama que chegava aos tornozelos. Jos agarrou-a pelos ombros e sacudiu-a.

— Sua doida! Por que nã o ficou na caverna? Por que nã o esperou por mim?

— Pare de me tratar como uma crianç a! Já estou farta de tudo isto! Primeiro foi aquele monte de aranhas e agora estou toda enla­meada! — Netta apontou para suas pernas.

Jos abaixou-se e arrancou os sapatos dos pé s de Netta.

— Calma, calma! Eu vou dar um jeito nisso.

Nesse instante Netta se distraiu e abaixou-se para apanhar da lama um animalzinho prateado com a aparê ncia de uma enguia.

— Largue isso! Largue! — Sem esperar que ela obedecesse, deu-lhe um tapa na mã o para que soltasse o peixinho.

— Nã o grite comigo!

— Ai! Maldiç ã o! — Jos sacudiu a mã o violentamente. Por um segundo, a criatura pareceu ficar presa entre seus dedos até que ele sacudiu novamente a mã o e ela descreveu um arco, caindo na á gua.

— Ele me mordeu!

— Nã o seja bobo, era só um peixinho. — Netta deu uma risadinha de sarcasmo.

— A mordida dessa criatura inocente tem um veneno mortal. Depressa, ajude-me com essas folhas!

O sorriso desapareceu do rosto de Netta.

— Por que quer as folhas? Vamos, deixe-me olhar o ferimento.

— Nã o há tempo. — Ele esmagou algumas folhas e esfregou-as sobre o lugar onde o peixe havia mordido. Chocada, Netta viu que a mã o de Jos estava ficando roxa e inchada. — Essas folhas tê m umlá tex que age como antí doto.

Desesperadamente, Netta começ ou a pegar mais folhas com mã os trê mulas. As fibras cortavam seus dedos e o lá tex deixava manchas escuras mas ela nã o se incomodou. Se tivesse esperado Jos...

— Eu nã o sabia — murmurou, pedindo desculpas.

— Eu gritei, tentei impedi-la de chegar perto da á gua.

— Vi pegadas de animais, achei que era seguro, um lugar onde eles viessem beber á gua.

— Nã o há perigo para eles, a mordida desses peixes nã o consegueatravessar o pê lo de suas patas. Pessoas nã o tê m esse tipo de proteç ã o.

— Ajude-me a voltar para a caverna. — Netta estava esfregando as folhas no ferimento e ficou surpresa quando ouviu a voz de Jos se transformar num sussurro fraco. Sentiu um arrepio gelado quando olhou para o rosto dele. Estava pá lido, acinzentado. Rapi­damente apanhou um punhado de folhas, colocou-o no bolso e am­parou Jos pela cintura.

— Apó ie-se em mim — disse, e ficou aterrorizada quando eleobedeceu. Jos, que era tã o forte, que se encarregava de tudo, estavase apoiando nela como uma crianç a doente. Foi tudo por minha culpa, pensou Netta, e foi o remorso que lhedeu energias para conseguir arrastar Jos até a caverna, onde ele praticamente desabou sobre o chã o, semi-inconsciente.

— Viu algué m... — ele ainda estava pensando nos rebeldes.

— Nã o, as colinas estavam vazias. — Netta olhou para fora outra vez, com olhos desesperados, desejando ver algué m. Teria ficado feliz mesmo que fosse algum rebelde, qualquer coisa que pudesse significar um tratamento mé dico para Jos.

— Dê -me sua mã o. — Ele nã o parecia ter escutado. Estava com os olhos semicerrados, olhando vagamente na direç ã o dela, e a vida parecia estar rugindo de seu rosto.

— Fique... — ele murmurou.

— Vou ficar, nã o se preocupe.

Durante toda a noite, que nã o parecia mais ter fim, Netta ficou massageando o ferimento dele com o lá tex das folhas, enquanto Jos se debatia, delirando de febre, murmurando palavras desconexas. Só quando as folhas se acabaram e ela nã o tinha mais o que fazer senã o ficar ao lado dele, rezando desesperadamente para que me­lhorasse, foi que prestou atenç ã o no que ele estava dizendo.

— Tara... fique...

Jos tremia de frio e Netta segurou-o em seus braç os, tentando aquecê -lo com o calor de seu corpo. Depois a febre começ ou a queimar e ele atirou os cobertores para longe. Ela teve que fazer um enorme esforç o para mantê -lo deitado, sabendo que, a qualquer momento, ele sentiria frio de novo.

— Tara... Tara... fique...

Netta franziu a testa. Quem seria Tara?

Quando Jos tinha dito, " fique", pela primeira vez, pensou que ele estivesse se referindo a ela, pedindo que o ajudasse, que nã o o abandonasse, mas agora estava sentindo uma onda de desâ nimo tomar conta de seu corpo. Nã o era ela. Netta, que Jos queria. Estava cha­mando por Tara.

— Tara... fique...

O nome parecia irlandê s. Netta teve visõ es de uma moç a morena, de pele clara, com os traç os delicados, do tipo que é tã o comum na Irlanda.

— Tara... fique...

Impulsivamente, Netta pressionou seus lá bios contra os dele, ten­tando abafar aquelas palavras que a feriam como punhaladas, tentan­do fazer com que ele percebesse que era ela quem estava ao seu lado e se esquecesse da necessidade dessa moç a.

— Jos, sou eu, Netta. Vou ficar com você. Nã o vou abandonar você.

Estou com ciú mes, reconheceu Netta, sem pudor ou surpresa. Sentiu que odiava aquela desconhecida, tanto quanto amava Jos.

— Vou ficar com você — disse, afastando os cabelos molhados de suor da testa quente. — Nunca vou deixá -lo, Jos. Nunca.

— Fique... Tara... fique...

Ele nã o podia ouvi-la. Nã o a queria. Só queria Tara.

— Jos, eu o amo. — As lá grimas começ aram a correr pelas faces de Netta e ela pressionou o rosto contra o dele, fazendo uma prece silenciosa para que Jos a reconhecesse, que chamasse por ela... que a quisesse ao lado dele...

— Jos, sou sua esposa. — O brilho do anel de ouro que estava em seu dedo parecia caç oar da sua angú stia. — Agora sou realmente sua esposa, sua mulher — murmurou, e seus lá bios trê mulos repen­tinamente formaram uma linha cheia de determinaç ã o. — Nada vai alterar isso. Nada... nem ningué m.

Nem mesmo Tara, jurou a si mesma. Nem ela poderia apagar o que tinha havido entre eles... A nã o ser...

Netta sentiu uma pontada gelada atravessar seu coraç ã o. A nã o ser que Jos tivesse feito amor com ela simplesmente para fazê -la esquecer das aranhas e da fumaç a.

Simplesmente... e mais uma vez... para fazê -la ficar quieta.

 



  

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