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CAPÍTULO IV



 

— Parece que fiquei enraizada aqui!

Netta gemeu e começ ou a se levantar com dificuldade para atender a determinaç ã o de Jos. Sentia cã ibras, estava gelada e toda dolorida, principalmente em volta da cintura.

— Nã o faz nem duas horas que estamos aqui — disse Jos secamente, sem dar importâ ncia aos gemidos dela.

Esse homem é incapaz de qualquer sentimento, pensou Netta, ainda mais irritada ao ver que ele nã o mostrava sinal de cansaç o.

— Pois, para mim, parece uma eternidade — disse, em voz alta.

Tinham ficado deitados, escondidos entre os arbustos, desde apartida do aviã o. Netta estremeceu e passou os dedos pelo có s da calç a. As pedras preciosas eram relativamente pequenas e, aparente­mente, até um pouco achatadas, mas agora pareciam seixos de rio cortando sua carne.

— O que há com a sua cintura?

— Nada. — Nã o tinha imaginado que Jos estava percebendo o movimento. Precisava ser cuidadosa, ele nã o podia desconfiar de nada. — Estou suada e morta de fome — disse, cheia de mau humor.

— É por sua pró pria culpa. Se tivesse ficado esperando na embaixada, a esta altura estaria jantando no aviã o.

— Daqui a pouco vai começ ar a me culpar por esta guerra civil!

— Nã o, nã o vou, mas é bem possí vel que uma mulher tenha sido a causa de tudo.

— Seu...

— Nã o vale a pena começ ar outra guerra. Você nã o vai conseguir vencer, e é má polí tica entrar numa batalha de barriga vazia. — Ele se levantou e começ ou a olhar atentamente atravé s da escuridã o à volta deles. — Nã o há sinal dos rebeldes e parece que nã o há nenhuma guarda no aeroporto. Vamos, está na hora de sairmos daqui.

Jos agarrou o pulso de Netta e começ ou a puxá -la em direç ã o à cidade.

— Você nã o está pensando em voltar para lá! — Ela tentou se libertar, quando viu que começ avam a entrar no primeiro beco, entre muros altos. — Está maluco! Deví amos estar indo para o outro lado, em direç ã o à fronteira.

— Vamos chegar lá mais tarde — disse Jos, puxando-a com forç a, sem dar importâ ncia aos seus esforç os e protestos. — Primeiro vamos conseguir comida. Estamos com fome e precisamos levar alguma coisa na viagem até a fronteira. Nã o há nada daqui até lá e nã o podemos viajar cem quilô metros sem alimentos.

— Deve haver alguma cidadezinha.

— Que teremos de evitar. Será que nã o percebeu que há perigo por toda parte?

Jos continuou procurando caminhos entre os becos escuros, sem parar um minuto sequer, com passos quase felinos, como se estivesse enxergando no escuro. Finalmente chegaram a um lugar que parecia ser o jardim de uma casa. Netta pô de ver paredes altas à sua frente e um canteiro de arbustos. Passaram por ele, arranhando-se nos galhos á speros.

— Ai! — gemeu Netta, quando sentiu o chã o faltar sob seus pé s e tropeç ou contra Jos.

— Quieta! Olhe por onde anda!

— Como posso olhar? Está escuro como breu!

— Estamos entrando numa passagem subterrâ nea. Fique com as mã os na minha cintura e venha atrá s de mim.

Netta pô s as mã os sobre o cinto dele e continuou a andar com passos largos. Foi tropeç ando atrá s dele, furiosa pela sua falta de consideraç ã o, mas nem por isso se atreveu a soltá -lo, morrendo de medo de perder contato com ele naquela escuridã o.

— Pode soltar agora, chegamos.

Ele tirou as mã os dela da cintura quando chegaram num terreno plano, mas Netta soltou-se com alguma relutâ ncia. Ao contrá rio do que imaginava, nã o sentiu vontade de se separar dele. O contato com o corpo de Jos havia despertado uma emoç ã o que tomou conta de todos seus nervos, e ela começ ou a sentir uma tontura, como se tivesse tomado vá rios copos de vinho.

— Sente-se. — Ele a guiou até um banco e Netta passou uma das mã os pelos olhos, tentando desesperadamente acalmar aquele clamor que tomava conta de seu coraç ã o. Suspirou profundamente, tentando parecer normal, enquanto ele perguntava:

— Está se sentindo mal? — Pela primeira vez, uma ponta de preocupaç ã o apareceu na voz dele.

— Nã o. Acho que entrou um cisco em meu olho.

— Você nã o tem um lenç o? Posso tirar o cisco para você. Ali perto da grade deve ter luz suficiente.

Só entã o Netta percebeu que a luz do dia estava começ ando a aparecer por entre algumas aberturas acima de suas cabeç as. Come­ç ou a procurar seu lencinho nos bolsos, relutante em entregá -lo a ele, que logo ia descobrir que nã o havia nada de errado com seus olhos.

— Eu tinha um comigo, mas nã o consigo encontrá -lo, devo ter deixado cair em algum lugar. Nã o faz mal, meu olho já está bom, acho que foi só um cí lio.

Ficou feliz por nã o ter encontrado o lencinho. Nã o podia se arris­car a ser tocada novamente, a proximidade de Jos despertava nela sentimentos que nã o podia deixar transparecer.

— Eu vi você com um lenç o — afirmou ele rispidamente.

— É... Acho que foi enquanto está vamos escondidos perto da pista do aeroporto. — Netta agora se lembrava bem de que tinha usado o lencinho para enxugar as lá grimas que estava tentando esconder dele. — Onde é que estamos? — perguntou, para desviar o assunto.

— No lugar mais seguro possí vel. — Jos deu um sorriso brinca­lhã o que o fez parecer muito mais jovem. — No porã o da embaixada.

— O quê? — Ela se levantou de um salto, fazendo o banco de madeira balanç ar perigosamente.

— Psiu! Fale baixo! — Jos segurou-se a tempo de nã o cair no chã o.

— Você me disse que a embaixada tinha sido evacuada — come­ç ou Netta, baixinho —, e essas vozes?

— É verdade. Todo o pessoal estrangeiro foi embora. Agora os rebeldes estã o usando o pré dio como quartel-general.

— Quer dizer... — Netta engoliu em seco, chocada com as palavras que estava ouvindo. — Você sabia disso e voltou para cá? E me trouxe també m?

— É o ú ltimo lugar onde pensarã o em procurar pela oposiç ã o. — Jos continuava com o mesmo tom brincalhã o.

— Oposiç ã o? — A palavra teve o poder de afastar toda a tontura que estremecia o seu corpo. — Por acaso está pensando em ficar aqui para organizar uma resistê ncia?!

— Nã o. — Para alí vio de Netta, Jos balanç ou a cabeç a e seu rosto ficou muito sé rio. — Minha missã o em Lak está terminada. Qualquer resistê ncia aos rebeldes deverá ser feita por parte das forç as governamentais. A minha parte está feita.

— E qual era a sua parte? — Apesar da sua determinaç ã o em parecer totalmente indiferente a Jos, Netta estava interessada. — Quem é você? O que é você? Afinal, tenho o direito de saber quem é o homem com quem me casei. — A aura de misté rio que havia em torno dele ao mesmo tempo a atraí a e repelia, apesar de Harry Fraser ter dito que Jos era um homem de bem.

— Vim a Lak a pedido do governo daqui e do nosso, para retirar a famí lia real com vida, no caso de a tensã o polí tica se transformar numa insurreiç ã o.

Eles estavam sentados no banco e Jos falava baixinho, sem qual­quer ê nfase, como se esse tipo de serviç o fosse a coisa mais comum na vida dele. També m nã o parecia aborrecido com as perguntas de Netta e mostrava-se disposto a dar todas as informaç õ es que ela quisesse.

— A famí lia real de Lak? — Ela ficou surpresa com a revelaç ã oinesperada. Nã o duvidou de que ele estivesse falando a verdade. Sentia que Jos era o tipo de homem que podia ficar calado, mas se falasse nunca mentiria. — Nã o é de admirar que Harry nã o queria comentar nada sobre a sua pessoa. Disse-me que você era um dos adidos, mas nã o quis entrar em detalhes.

— Bem, foi uma boa cobertura. — Ele se levantou. — Agora vou sair um pouco. Precisamos de comida.

— Nã o me deixe aqui sozinha. E se você nã o voltar?

— Nã o se preocupe, eu voltarei. Nã o saia daqui.

Ela nem o ouviu chegando. Jos reapareceu ao lado dela com os mesmos passos silenciosos que o levaram para fora do porã o.

— Que tal? — perguntou ele, orgulhosamente, mostrando os braç os carregados. — Pã o, queijo, presunto, frutas... uma garrafa de vinho.

— Onde foi que conseguiu tudo isso? Por acaso assaltou alguma mercearia?

— Pelo contrá rio, foi tudo muito legal. Como membro da em­baixada, tinha todo o direito de me servir da despensa.

— Nã o devia ter se arriscado. E se...

— Os patetas que estã o lá em cima ainda nã o conhecem o pré dio, estã o muito ocupados brincando de soldados. Nã o descobriram que há uma outra cozinha no andar de cima para servir o salã o de banquetes. Vamos, pegue um copo de papel, começ aremos com um gole de vinho.

— Assim está bom. — Netta fez um sinal com a mã o. — Nã o estou acostumada a beber.

— Beba, vai lhe fazer bem. É feito aqui mesmo, é doce e nã o muito forte.

Encorajada pelas palavras dele, Netta tomou um golinho da bebi­da. Era realmente doce, mais parecia um licor, e ela bebeu com vontade, sedenta, sentindo um calor se espalhar pelo corpo, reno­vando suas energias. Logo ela e Jos estavam comendo e conversando como se nunca tivesse havido qualquer antagonismo entre eles.

— Como conseguiu retirar a famí lia real daqui? — perguntou Netta, depois de recusar outro pedaç o de presunto.

— Eles foram de aviã o, junto com o pessoal da embaixada.

— Pretende voltar a Lak depois que tudo terminar? — Enquanto falava, Netta mexeu distraidamente no anel de ouro de Jos que estava em seu dedo e parou abruptamente. Naturalmente, devia exis­tir alguma moç a esperando por ele na Inglaterra e, a primeira coisa que iria fazer, chegando lá, seria cuidar da anulaç ã o do casamento.

— Nã o, nã o pretendo voltar. Tenho que cuidar de Thimbles, já está na hora de esta raposa voltar à toca — disse, com um sorriso, como se estivesse feliz com a idé ia.

— Thimbles? Ah, é mesmo, Wendy me falou nela. É a sua casa, nã o é? — Netta apanhou o copo para tomar o ú ltimo gole de vinho e franziu a testa, surpresa. — Que engraç ado, ainda está cheio! — Podia até jurar que já tinha bebido muito mais da metade.

— Beba. Eu vou embrulhar o que sobrou da comida para a viagem — disse Jos, sem dar atenç ã o à observaç ã o dela.

Sua voz parecia estar muito longe e, quando Netta olhou para ele, viu que seu rosto parecia fora de foco. Ela piscou com forç a e nã o conseguiu segurar um bocejo.

— Estou... ficando... com sono.

— Ó timo. — Jos reaproximou-se dela. — Nã o tente lutar contra ele, entregue-se. — Ele a amparou nos braç os quando ela tentou se levantar e cambaleou. — O vinho vai fazer você dormir até eu voltar.

Netta sentiu que ele a deitava sobre alguma coisa quente e macia. Provavelmente tinha pegado um cobertor num dos quartos da em­baixada. Seu ú ltimo pensamento antes de adormecer, antes de perder totalmente a consciê ncia, foi cheio de rancor contra Jos. Ele mal tocara na bebida! Mais uma vez tinha usado de um mé todo pouco escrupuloso para fazê -la obedecer à sua vontade. Primeiro tinha sido aquele beijo para que ficasse calada. Nunca iria perdoá -lo por isso! Agora tinha sido o vinho; ele sabia que era forte e a enganou. Tinha sido traí da! Desesperadamente, tentou lutar contra o sono, ouvindo o riso dele, esforç ando-se para dizer a Jos o quanto o odiava...

Quando Netta acordou, escutou vozes à sua volta. Abriu os olhos e viu um rosto escuro de um homem bem pró ximo dela, uma mã o se estendendo para tocar seus cabelos vermelhos. Sentou-se abrupta­mente, com os olhos arregalados.

— Nã o precisa se assustar. Ele é um amigo.

— Como vou adivinhar? Nã o há nada escrito na testa dele! — Netta estava furiosa.

O estranho se dirigiu a Jos.

— Você poderia passar por nativo, com roupas apropriadas, mas essa mulher nunca iria conseguir.

Mulher! Que desaforo! Os olhos de Netta brilhavam de raiva. Jos parecia estar se divertindo.

— A cor desses cabelos a denunciariam imediatamente — con­tinuou o homem — e o gê nio dela també m. Nossas mulheres sã o do tipo submisso.

— Bem, pois eu nã o sou desse tipo! — Netta levantou-se de um salto, atirando o cobertor para longe.

— Concorda com o que eu disse? — O homem encolheu os ombros, desanimado. — Se os cabelos fossem pretos, ainda pode­rí amos tentar enganá -los. Podemos tentar uma tintura.

— Tingir meus cabelos? Nunca! — As mã os de Netta se levan­taram num gesto de defesa de seus cabelos avermelhados.

— Nã o, nã o será preciso — disse Jos. — Viajaremos à noite. A escuridã o vai nos ajudar.

Netta olhou para ele, surpresa. Nã o esperava que Jos a apoiasse. Tinha certeza de que iria obrigá -la a tingir os cabelos, só para provocá -la.

Mais uma voz de homem se ouviu no porã o.

— Você s precisarã o de capas para viajar, e nã o podem perder mais tempo, se quiserem sair vivos. — Ele lanç ou um olhar estranho na direç ã o de Netta e fez um sinal para Jos e outro homem. — Quero falar com você s em particular.

Esses homens sã o mesmo impossí veis, pensou Netta, furiosa. Estã o me tratando como se eu nem existisse!

O pior de tudo é que pareciam estar falando dela, pois o homemque havia chegado por ú ltimo fazia vá rios sinais na sua direç ã o. Alé m disso, estavam falando numa lí ngua incompreensí vel, apesar de antes terem conversado num inglê s muito bom. Estava a ponto de exigir que contassem a ela sobre o que estavam falando quando viu o olhar de Jos sobre ela.

Em resposta a um gesto mais violento de um dos homens ele se virou para ela com um olhar duro como pedra. O que eles tinham falado para causar isso? Depois, com o mesmo gesto abrupto, Jos se virou para os homens e começ ou a discutir com eles, balanç ando a cabeç a, acabando com qualquer argumento. Depois, um deles enco­lheu os ombros e os dois sumiram na escuridã o, tomando a direç ã o do tú nel que levava aos jardins.

— O que aconteceu?

Netta tentou controlar-se mas a tensã o apareceu na sua voz e nas suas atitudes, quando se dirigiu a Jos. Estava preparada para se defender de algo que nã o sabia o que era; daquele olhar cheio de uma raiva fria, que endurecera os olhos e modificara a expressã o de Jos desde o momento em que tinha se virado para ela e ficara parado durante alguns minutos, que pareceram interminá veis, exa­minando seu rosto cuidadosamente. Jos ainda tinha essa expressã o fria e sombria quando falou:

— O que fez com as jó ias que roubou? — Sua voz era rí spida. — As pedras que você tirou das jó ias que escondeu na gaveta de seu quarto no hotel?

— Jó ias que roubei? — Netta olhou para Jos, espantada. — Eu nã o roubei — negou ardentemente —, eu...

— Nã o minta — ordenou ele rispidamente. — Esses homens que acabaram de sair daqui sã o pessoas de minha inteira confianç a. O que chegou por ú ltimo me informou que os rebeldes invadiram o hotel e encontraram jó ias sem as pedras preciosas, escondidas numa gaveta, que tinha roupas de mulher. E você era a ú nica mulher naquele hotel.

Entã o era esse o motivo pelo qual o homem a olhara com aquele ar esquisito!

— É sobre isso que estavam discutindo?

— Eu estava fazendo de tudo para impedir que ele a entregasse à s autoridades imediatamente, o que, neste momento, significaria entregá -la nas mã os dos rebeldes.

— Nã o podem fazer isto! — Netta olhou para Jos, apavorada. — Você acabou de me dizer que eles sã o de sua inteira confianç a, sã o seus contatos! Certamente nã o devem simpatizar com os rebeldes!

— As jó ias que foram encontradas eram peç as antigas, tradicio­nais — lembrou Jos, secamente. — Aqueles homens nã o tê m ne­nhuma simpatia pelo movimento, mas també m nã o vã o aceitar que um estrangeiro roube tesouros nacionais.

— Eu nã o roubei! — gritou Netta, furiosa.

Sabia, melhor do que Jos, o que aquelas jó ias representavam. Tinha que tentar convencê -lo de seu direito de estar com elas paraque Jos pudesse persuadir aqueles estranhos. Enquanto estivesse perto dele, sabia que nã o corria perigo, tinha visto o modo como impusera seus argumentos sobre eles, mas agora, longe de Jos, podiam mudar de idé ia quanto a entregá -la aos rebeldes. Ficou paralisada só em pensar no que poderia acontecer. Nã o podia contar a Jos onde escondera as pedras preciosas, ele a forç aria a entre­gá -las para garantir sua seguranç a. Tinha prometido a Ranjit... nada a impediria de cumprir sua palavra. As pedras teriam que ir com ela, fosse para onde fosse, até alcanç arem a seguranç a do cofre de seu cliente, na Inglaterra.

— E entã o? — Jos sacudiu-a pelos ombros, interpretando mal seu silê ncio. — Foi por este motivo que veio a Lak? Conte-me a verdade — exigiu. — Eu també m tenho o direito de saber com quem me casei, e quero saber se você é uma...

— Ladra? — Netta levantou á cabeç a, num gesto de orgulho.

— Pode ficar sossegado — acrescentou friamente. — E antes de agir como juiz, jú ri e carrasco, queira fazer a gentileza de ouvir o meu lado da histó ria.

— Vá em frente. — Seu rosto continuava duro e ele ainda a segurava pelos ombros.

— Você já sabe quem é meu pai — começ ou Netta, mais calma­mente, resistindo a um impulso de passar o dedo pelo có s das calç as.

— Vim a Lak para buscar algumas jó ias de um cliente, que vã o ser remodeladas. — Ela mencionou o nome de Ranjit e viu pela sua expressã o que Jos o conhecia. — Costumo fazer isto com fre­qü ê ncia. Sou eu que, na maioria das vezes, faç o os contatos com os clientes de meu pai, mas esta é a primeira vez que sou acusada de roubar jó ias que vim buscar. — Netta terminou, cheia de amargura na voz.

— Por acaso tem o há bito de extrair pedras das montagens? — perguntou Jos, cheio de sarcasmo, fazendo-a corar.

— Geralmente espero até chegar em casa; nã o é sempre que me vejo entre um bando de rebeldes e a ameaç a de ser revistada por pessoas em quem nã o posso confiar.

Netta falou no mesmo tom de voz que Jos havia usado e ficou satisfeita em sentir os dedos dele se afrouxando em seus ombros.

— As pedras em si sã o a parte mais valiosa daquelas jó ias e, como eu era responsá vel por elas, nã o tive outra escolha senã o escondê -las. Se quiser confirmar minha histó ria, é só falar com Ranjit.

Jos ficou olhando fixamente para ela durante longos minutos, com uns olhos cor-de-ouro que pareciam perfurá -la. Netta sustentou esse olhar com a mesma expressã o altiva.

— Vai ter que deixar as pedras onde estã o, arriscando que sejam encontradas — disse Jos, finalmente. — Nã o pode voltar para bus­cá -las agora, os rebeldes devem estar esperando por você no hotel, imaginando que vai voltar para pegá -las.

Ele nã o tinha desconfiado!

Está pensando que escondi as pedras no hotel! Uma onda de alí vio passou pelo seu corpo. Netta baixou os olhos com medo que Jos percebesse a alegria que havia neles.

— Bem, isto explica o caso das jó ias, mas nã o justifica o desa­parecimento dos filmes.

— Filmes? — Netta até havia se esquecido deles. — Eles estã o comigo. — Onde aprendi a ser tã o fingida?, perguntou a si mesma, surpresa com a sua facilidade em mentir. Tinha dito que os filmes estavam com ela, deixando implí cito que tinha deixado as pedras no hotel. — Sã o apenas fotos que tirei na viagem, pode ficar com eles, estã o na minha bolsa. — Ela fez um movimento para pegá -la, mas Jos impediu.

— Nã o é preciso pegá -los agora, talvez precise deles para con­vencer as autoridades, no caso de sermos apanhados.

— Por que se preocupariam com um negativo, se nem mesmo foram fotos batidas aqui em Lak? — Netta estava verdadeiramente intrigada e Jos suavizou a expressã o em seu rosto.

— Só uma vida totalmente isenta de culpa poderia fazer de você uma pessoa tã o ingê nua. — A observaç ã o nã o soou como um cum­primento. Jos soltou os ombros de Netta e continuou a falar, tentando parecer paciente: — Tente ver as coisas do ponto de vista dos rebel­des que invadiram o seu quarto: descobriram que você tinha saí do do hotel e que nele havia jó ias sem as pedras, e como se só isso nã o bastasse, encontraram um sofisticado equipamento fotográ fico sem um ú nico negativo nem mesmo na câ mara. A que conclusã o poderiam chegar, senã o de que eram tã o valiosos como as gemas?

— E daí? — Netta nã o estava conseguindo entender o que Jos estava insinuando.

— Dai-me paciê ncia, Senhor! — ele explodiu. — Nã o percebe? As coisas que você deixou no hotel nã o só a comprometem como ladra, mas també m como espiã.

— Espiã? Que besteira, parece uma novela policial de terceira categoria! Se formos apanhados, poderei explicar facilmente...

— Acha que esperarã o para ouvir as suas explicaç õ es? — inter­rompeu Jos bruscamente. — Eles atirarã o antes de fazer qualquer pergunta.

— Devem pensar que fui no aviã o.

— Já estã o sabendo da verdade. Encontraram seu lenç o entre os arbustos, pró ximo da pista do aeroporto. Estava preso num galho, como uma bandeira, confirmando a sua passagem por lá.

— Nã o o deixei lá de propó sito. — Netta nã o admitia ser acusa­da de mais uma coisa, da qual nã o tinha a menor culpa.

— Se fosse esse o seu propó sito, nã o poderia haver meio melhor. Os rebeldes logo somaram dois mais dois e agora tê m certeza de que você perdeu o aviã o e continua em Lak.

— Isso significa...

— Que ficarã o muito felizes em saber onde você está escondida. Vã o fazer tudo o que for possí vel para reaver as pedras e só você sabe onde elas estã o.

— O que vamos fazer? — sussurrou Netta, lembrando dos rostos contorcidos que tinha visto na praç a.

— Vamos viajar à noite. Um dos homens vai trazer duas capas para nó s, que servirã o como um disfarce bastante razoá vel, se nã o formos vistos de perto.

Netta nã o acreditava que os homens fossem voltar. Mas a con­fianç a que Jos depositava neles era justificada. Logo depois que anoite caiu, eles chegaram com dois pacotes e partiram sem dizer nada. As capas eram peç as de vestuá rio muito comuns e bastante adequa­das para enfrentar as bruscas mudanç as de temperatura naquela regiã o, onde as noites eram muito frias por causa da altitude.

— Será que eles...

— Pode ficar tranqü ila, jamais nos trairiam. — Ele respondeu à pergunta que Netta nã o se atreveu a fazer. — Experimente a capa — disse, estendendo o pacote menor para ela.

— Está comprida demais.

— É porque você está com ela nos ombros, como eu. Só os homens a usam deste jeito; as mulheres cobrem a cabeç a. — Ele levantou a capa e cobriu os cabelos de Netta. — Assim está melhor, vai poder andar sem tropeç ar nela, o que vai ser muito ú til se tivermos que correr.

— Parece um há bito de freira.

— Você nã o parece nem um pouco com uma freira.

Inesperadamente, ele puxou-a para junto de si, pegou sua cabeç aentre as mã os e levantou seu rosto.

— Você nã o foi feita para ser freira — observou Jos suavemente e baixou a cabeç a até seus lá bios tocarem levemente a face macia de Netta, explorando a seguir a linha bem-feita do maxilar até encontrar o ponto onde havia uma covinha que aparecia quando ela ria.

Netta estremeceu, mas ficou imó vel. Fez um esforç o para nã o corresponder, mas foi inú til, seu coraç ã o começ ou a bater forte e o desejo de abraç á -lo se tornou irresistí vel. Quando tentou levantar os braç os percebeu que estavam presos pela capa. Jos ajeitou as dobras do tecido, envolvendo-a mais completamente, e deu uma risada divertida.

— Estas capas tê m vá rias utilidades — murmurou. — Os homens de Lak gostam que suas mulheres sejam submissas.

— Nã o sou uma mulher de Lak! — Mais uma vez, Netta estava furiosa. Odiava aquele homem quando ele caç oava dela. — E, alé m do mais, nã o sou submissa.

— Se espera enganar os rebeldes, vai ter que aprender a ser.

Seus lá bios agora procuraram a boca de Netta, impedindo-a de responder. Ela tentou resistir, mas foi em vã o. Sua mente gritava que tinha de lutar contra ele, mas seu coraç ã o se recusava a obedecer.

— Nã o posso lutar contra você, nã o posso — gemeu, quando finalmente ele a soltou.

— Até que para uma primeira tentativa, você nã o se saiu tã o mal — aprovou Jos. — Continue assim submissa e poderá até passar por uma mulher de Lak.

Netta se afastou dele como se tivesse levado uma bofetada.

— Seu... seu... — Um soluç o estrangulou sua garganta. Mais uma vez ele a tinha enganado, forç ando-a a corresponder ao seu beijo, brincando com os seus sentimentos como um violinista brinca com as cordas do seu instrumento, só para mostrar que o domina.

— Nunca mais me toque, entendeu? Nunca... nunca... — Num frenesi de raiva, Netta afastou as dobras da capa e levantou a mã o para bater nele.

Jos desviou o golpe com facilidade, prendendo fortemente o pulso dela. Nesse instante, ouviram uma voz na entrada do tú nel.

— Está na hora.

— Estamos prontos. — Jos soltou a mã o de Netta, completamen­te indiferente à sua raiva e à possibilidade de ela tentar atingi-lo novamente. — Cubra bem esses cabelos — ordenou rispidamente.

Pô s o braç o em volta dos ombros dela e dirigiu-a para a passa­gem que dava para o jardim.

— Nã o precisa me empurrar!

— Entã o fique bem atrá s de nó s.

Os trê s homens atravessaram o jardim com passos largos e Netta foi tropeç ando atrá s deles, esforç ando-se para acompanhá -los. Logo estavam se esgueirando pelos becos escuros e abafados da cidade.

— Acho que as mulheres daqui devem ser treinadas como cavalos de corrida para poderem acompanhar os seus homens — disse Netta, com dificuldade, tentando recuperar o fô lego, quando o grupo fez uma pausa antes de atravessar uma das ruas.

— Acontece que as mulheres daqui sã o espertas, ficam dentrode casa — observou Jos num tom cí nico. — Só as senhoritas de reputaç ã o duvidosa é que se aventuram a sair à noite.

— Isto nã o significa que eu seja uma delas.

— Pois é o que espero que pensem, se formos vistos.

Os quatro continuaram seguindo por uma rua mais larga e, quando chegaram numa esquina, Netta viu, cheia de pavor, que estavam na mesma praç a onde ela vira os rebeldes, quando estava tentando chegar à embaixada. Jos falou alguma coisa para os homens em lí ngua nativa, fez um sinal com a mã o e eles se afastaram, misturando-se na multidã o.

— O que aconteceu? — perguntou Netta.

— O trabalho deles está terminado. Daqui em diante, vamos por nossa conta.

Netta olhou para a praç a cheia de grupinhos de homens que riam, discutiam e gritavam frases que pareciam terrivelmente ameaç adoras. Muitos deles usavam capuz. A noite estava muito fria.

— Nã o há nenhuma mulher entre eles. Nã o pense que vou passar no meio deles. Você nã o pode me obrigar!

— Nã o há outro jeito. A estrada que leva até a fronteira fica do outro lado.

Netta estava paralisada de medo. Jos pegou-a pelos ombros e obrigou-a a caminhar. Um grupo de rebeldes passou por eles e os homens gritaram alguma coisa quando a viram e começ aram a dar gargalhadas maliciosas. Ele rosnou algumas palavras na mesma lí ngua e puxou Netta para perto de si com um gesto cheio de brutalidade. Com um braç o, Jos segurou a sua cintura e com o outro puxou as dobras da capa para cobrir melhor a sua cabeç a. Ela se sentiu sufocada, presa numa armadilha e, dominada pelo pavor esqueceu de todo o perigo que corria e começ ou a lutar para se libertar.

— Largue-me, seu... — Nã o chegou a terminar. Jos a silenciou com um beijo arrebatador, machucando os lá bios de Netta contra seus dentes.

Incapaz de falar, pois o rosto de Jos pressionava o dela, como uma má scara, e seus lá bios doí am, Netta começ ou a atacá -lo com socos e pontapé s, tomada de uma fú ria cega contra aquela selva­geria. Arranhou o rosto de Jos e ele atirou a cabeç a para trá s, soltando um palavrã o. Vá rias vozes se levantaram por entre os grupos de rebeldes e alguns deles se aproximaram para apreciar a briga entre os dois, rindo e gritando conselhos para Jos. Netta nã o podia entender uma ú nica palavra, mas conseguia compreender a situaç ã o.

Apavorada, percebeu o que estava fazendo, e cambaleou, quase num desmaio. Sentiu o braç o de Jos voltar a sua cintura e pegá -la pelos joelhos, levantando-a no colo, segurando-a com forç a junto ao seu corpo, escondendo seu rosto nas dobras de sua pró pria capa Netta agarrou-se a ele, petrificada. Uma confusã o de gestos e gritos se formou em torno deles e ela sentiu mã os grosseiras tentando alcanç á -la. Jos rosnava respostas na lí ngua nativa e seus gritos faziam seu peito vibrar contra o ouvido dela. Ele girou o corpo com forç a e os pé s de Netta, que estavam em posiç ã o horizontal, bateram em alguma coisa macia que logo se afastou. Jos a estava usando como arma! Netta arriscou uma olhada por entre as dobras da capa e viu um cí rculo de homens se formando em volta deles. Jos apro­veitou a oportunidade e passou por uma brecha, carregando-a nos braç os com facilidade, como se ela fosse uma presa que tinha aca­bado de conquistar. Depois, os gritos foram diminuindo atrá s deles e as luzes foram desaparecendo até dar lugar a uma escuridã o abenç oada. Jos continuou correndo, sem dizer uma ú nica palavra; um pouco depois começ ou a diminuir o passo.

Netta agora sentia frio, um frio terrí vel, que enregelava seu corpo onde a capa tinha escorregado. Começ ou a tremer; Jos parou e a pô s no chã o, segurando-a para dar-lhe apoio.

— Já estamos quase chegando.

Netta estava exausta demais para perguntar onde.

— Consegue ficar em pé? — Ele mal esperou pelo sinal dela. — Entã o comece a andar, o movimento vai aquecer você.

Ela tropeç ou, mas Jos forç ou-a a continuar. Netta sentia uma dor horrí vel nos pé s e nas pernas, que estavam gelados e adormecidos, e o frio da madrugada quase fez com que perdesse a respiraç ã o.

Estavam atravessando um terreno desigual, cheio de maio á spero, que dificultava a marcha e machucava o corpo.

— Nã o posso continuar. — Fia começ ou a dobrar os joelhos.

— Ande! — ordenou Jos rispidamente, endireitando o seu corpo e empurrando-a para a frente. — Temos que chegar à caverna antes do amanhecer.

— Caverna? — Os modos rudes de Jos estavam surtindo efeito. Apesar de ainda estar andando aos tropeç õ es, Netta começ ou a sen­tir-se mais consciente, aquecida pelo movimento.

— É pouco mais do que um buraco no meio das rochas, do outro lado do morro. Os inimigos nã o sabem da sua existê ncia; só meus homens que moram por aqui a conhecem. Lá encontraremos comida, á gua e alguns cobertores.

Continuaram andando e logo chegaram a um terreno pedregoso, sem vegetaç ã o, que parecia terminar numa parede de rocha só lida. Guiada por Jos, Netta viu uma abertura suficiente para dar passagem a uma só pessoa, e com certa dificuldade. Um de cada vez entrou por ela e Netta tropeç ou em alguma coisa macia. Teria caí do, se Jos nã o a tivesse segurado.

— Eles trabalharam bem! — disse ele, enquanto acomodava Netta sobre a pilha de cobertores que cobria o chã o da caverna.

— Há luz aqui! — Ela ficou surpresa em enxergar perfeitamente o rosto de Jos.

— Sim, e chegamos bem a tempo.

O sol se levantou com a mesma rapidez com que tinha se posto na noite anterior. Há poucos minutos eles estavam tropeç ando na escuridã o e, de repente, já clareava.

— Seu rosto está ferido.

— Você me arranhou. — Jos passou o dedo pelos arranhõ es e Netta percebeu um brilho de raiva nos olhos dourados. — Nã o precisava ter exagerado na sua atuaç ã o.

— Minha atuaç ã o? E o que devo dizer da sua atitude?

— Tive que fazer você calar a boca. Você estava gritando em inglê s. — Ela encolheu os ombros, sem ligar para a acusaç ã o.

— E é o melhor modo que conhece para fazer uma mulher ficar quieta! — lembrou ela.

— Sempre funciona.

A indiferenç a do tom de voz de Jos soou como um insulto à feminilidade de Netta.

— Bem, agora vamos comer e depois dormir. — Jos dirigiu sua atenç ã o à quilo que, obviamente, considerava mais importante.

— Nã o estou com fome!

— Mesmo assim, vai ter que comer — disse ele, pondo um pedaç o de carne e uma fatia de pã o em suas mã os.

Netta começ ou a comer, cansada demais para teimar inutilmente com ele. Quando ambos terminaram, Jos arranjou os cobertores sobre um monte de palha que estava arrumado mais para dentro da caverna.

— Será que essa palha nã o está cheia de espinhos? Já estou toda machucada.

— Nã o, venha aqui ver, eles a recolhem de um rio aqui perto. — Jos levantou o cobertor que estava por cima, esperando que, com isso, ela se acomodasse na cama improvisada.

— Onde é que você vai dormir? — Assim que as palavras saí ram de sua boca, ela se arrependeu de tê -las pronunciado, mas ficou olhando para ele, esperando a resposta.

— Aqui, com você, é claro. — Jos viu os olhos de Netta se arregalarem de espanto e acrescentou, impaciente: — Nã o há pro­blema algum. Somos casados... lembra-se?

 



  

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