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O Drama De Uma Mulher Casada 2 страница



Quando voltou a si, estava deitada no chão. David, a seu lado, parecia preocupado e segurava-lhe o pulso.

— Graças a Deus! — exclamou ele aliviado ao vê-la abrir os olhos. — Por um instante cheguei a pensar que estivesse morta. Continue deitada. Você ainda está pálida.

— Desculpe-me, por favor.

— Eué que devo pedir desculpas. Sei que não está mentindo, você é mesmo Annabel. Mas a semelhança é espantosa…

— Eu não sou Annabel Morris. Há mais de dois anos não sei quem sou.

— Dois anos? Como assim? Teve amnésia?

— O passado desapareceu completamente de minha memória. Escolhi o nome de Annabel Morris ao acaso, simplesmente por­que precisava de um. Quem é Alice?

— Minha cunhada, esposa de meu irmão.

— Aquele que morreu?

— Sim. O único problema é que Alice morreu no mesmo acidente que ele. Ambos estão enterrados na cripta da família, em Santa Amélia. E você não é um fantasma, disso tenho certeza.

Devagar, Annabel levantou-se. Ainda se sentia trêmula e fraca e foi obrigada a se apoiar contra uma árvore. Estava completa­mente desconcertada com o que acontecera.

— Você viu o corpo?

— Não. O carro pegou fogo e ambos os corpos ficaram irreco­nhecíveis. Mas ainda assim… Os dois foram vistos juntos uma ho­ra antes do acidente. A mulher que estava com ele só podia ser Alice. — David sacudiu a cabeça, confuso. — Acho melhor você me contar sua história. — Ele passou a mão pelos cabelos, num gesto nervoso. — Talvez ajude.

A tarefa levou alguns minutos, e não foi de utilidade alguma.

— Na Estação Vitória… Não havia nada com você? Uma bolsa ou uma carteira?

— Não. Apenas as roupas que eu vestia.

— Você ainda as tem?

— Sim. Aquele vestido é meu único vínculo com o passado. Nunca mais o usei mas ainda o conservo.

— Ótimo. Sente-se bem o suficiente para voltar a Londres?

— Agora?

— Sim. Quero ver esse vestido. Talvez possa reconhecê-lo.

— E se não o reconhecer?

— Vamos esperar e ver. Agora, sente-se no carro enquanto guar­do estas coisas.

Após acomodar-se, ela fechou os olhos e tentou colocar suas idéias em ordem, Alice Hamilton. O nome não significava nada para ela. E se provassem que era mesmo a cunhada de David? Tu­do parecia tão fantástico e improvável! Quem seria a mulher que fora enterrada em Santa Amélia? E como ela, Annabel, fora pa­rar em Londres se apenas uma hora antes do acidente fora vista em companhia de seu marido?

Annabel levou as mãos à cabeça, num gesto de desespero.

— Não fique tão nervosa — aconselhou David, assim que en­trou no carro. — Vamos enfrentar um problema de cada vez. Pre­ciso ver o vestido antes de mais nada.

Nenhum deles abriu a boca durante toda a viagem. Annabel fi­cou olhando pela janela, alheia à paisagem, pensando no pesadelo que vivia. E lembrar que ela se sentira tão bem naquele dia…

Ao chegarem, Annabel conduziu-o escada acima até o primeiro andar. Apesar de não fazer nenhum comentário, era óbvio que ele estava chocado com a aparência do lugar. Não era o tipo de am­biente requintado ao qual estava acostumado e, sem dúvida, era um dos últimos lugares em que esperava reencontrar a cunhada.

Com o coração aos pulos, ela tirou o vestido do guarda-roupa e mostrou-o a ele.

— Segure-o à sua frente.

Annabel obedeceu e tentou ver no rosto dele algum sinal de que reconhecia a roupa. Ao vê-lo sacudir negativamente a cabeça, sentiu vontade de gritar.

— Mas você conhecia todas as roupas de sua cunhada?

— Não, é claro. De qualquer modo, nunca vi esse vestido antes.

Ainda segurando a roupa, ela voltou-se para o espelho e acari­ciou o tecido acetinado.

— É um vestido finíssimo, de alta qualidade. Não tenho condi­ções de comprar outro parecido… A palavra Honore significa algo para você?

Honore! Por que quer saber?

— É o nome que está na etiqueta do vestido. Tentaram locali­zar lojas ou fabricantes com esse nome, mas não conseguiram.

— Deixe-me ver. — Ele ficou em silêncio, olhando para a eti­queta, o rosto impassível. Depois disse: — Honore é o nome de uma butique finíssima em Charlotte Amalie.

— Charlotte Amalie? Não é a capital da parte americana das Ilhas Virgens?

— Exatamente. Fica na ilha de São Tomás. Foi lá que aconte­ceu o acidente, pouco depois de você e Paul chegarem à ilha. Não se recorda de nada?

— Nada.

Paul. Era a primeira vez que ouvia David mencionar o nome do irmão. O marido dela. Não, não podia ser verdade! Uma mu­lher não esqueceria tão facilmente que tinha um marido. E no en­tanto era possível. Na época em que a encontraram, havia a marca ele um anel na sua mão esquerda, uma pequena faixa de pele não bronzeada no dedo anular. Ninguém havia estranhado a cor bron­zeada de sua pele, já que naquele ano a primavera fora excepcio­nalmente quente, na Inglaterra.

— Sinto-me tão estranha.

— Sente-se um pouco.

Ela não se deu ao trabalho de explicar que a estranheza era men­tal, e não física. Durante dois anos vivera sem um passado. Ago­ra, ofereciam-lhe um, do qual ela não se lembrava e que, no entanto, parecia verdadeiro.

— Fale sobre Alice. Talvez eu consiga relembrar algo.

— Não sei por onde começar. Nem sabíamos de sua existência até o dia em que chegou a Santa Amélia com Paul. Ele a conheceu na Suíça, onde se casaram.

— Paul casou-se assim, sem mais nem menos? Apareceu em casa com uma esposa sem um aviso prévio?

— Paul podia ser tudo, menos previsível. Ele a conheceu, a de­sejou e se casou com você. Foi o que ele nos contou, pelo menos.

— Há quanto tempo foi isso?

— Menos de três meses antes do acidente, o que serviu para tor­nar o fato mais dramático ainda aos olhos dos que não sabiam o que estava acontecendo na época.

— E o que é que acontecia?

— O casamento estava praticamente por um fio.

— Sabe qual o motivo?

— O principal era absoluta incompatibilidade de gênios. Você… Bem, isso não tem importância agora: O que interessa é descobrir como você veio parar aqui na Inglaterra.

— E quem era a outra também.

— Que outra?

— A mulher que foi enterrada em meu lugar. Isto é, se eu for mesmo Alice Hamilton.

— Não tenho a menor dúvida disso. A etiqueta em seu vestido é prova suficiente.

Ela não podia deixar de concordar com David. Uma ou duas coincidências podiam ser obra do acaso. Mas o que tinham diante de si eram provas incontestáveis, não meros indícios.

— Você sabe alguma coisa sobre minha vida antes do casamen­to com seu irmão?

— Seu nome de solteira era Cosgrove. Segundo o que nos dis­se, você ficou órfã ainda criança e foi criada por uma tia que lhe deixou algum dinheiro ao morrer.

— O suficiente para que eu fosse para a Suíça?

— Parece que sim. A propósito, você tem vinte e três anos, e não vinte e quatro. Você fez vinte e um em abril daquele ano.

— Em que dia?

— Catorze. E isso é tudo o que sei. Você sempre foi muito re­servada a respeito de seu passado.

— Pelo seu tom de voz, percebo que você não aprovou o casa­mento. E o resto da família?

— Minha mãe não gostou muito da idéia. Tinha esperanças de que o caçula se casasse com alguém que pertencesse a uma família tradicional. Quanto a Madalyn, minha irmã, ela não estranhou muito. Ela tem convicções todas suas, bem próprias.

— Ou seja, ela se recusou a me considerar uma caça-dotes, co­mo sua mãe o fez? Foi isso o que pensaram, não é? Que eu me casei com ele porque estava atrás de um marido rico?

— Para uma desmemoriada, até que você chegou bem perto da verdade. Foi uma hipótese que levamos em consideração. Paul me disse que você se recusou a ir para a cama com ele antes de se casarem.

— Nenhum homem seria capaz de se casar só para levar uma mulher para a cama.

— Paul seria. O que ele desejava, conseguia de qualquer jeito.

— Pelo visto, você não o estimava muito, não é?

— Éramos muito diferentes. Só isso. E então? A conversa ser­viu para alguma coisa?

— Não. Não me lembro de nada.

— Tem certeza? Ontem você me pareceu bastante perturbada quando eu apareci na loja.

— Isso porque eu o reconheci como o homem que quase me atro­pelou. E, para ser honesta, não tenho certeza se quero mesmo re­cobrar a memória.

— Por quê? Não gostou do que ouviu?

— Não. Pelo menos não de sua versão.

— Posso estar errado. Nunca se sabe.

— É claro que está! Mesmo perdendo a memória, eu não pode­ria ter mudado de caráter radicalmente. Se hoje não tenho cora­gem de me casar por dinheiro, também não teria feito isso naquela época.

— Está tentando me dizer que amava Paul?

— Meu Deus, eu não sei! Mas devo ter amado.

— Bem, isso agora não tem importância. O que interessa é o que vamos fazer. Sabia que você tem direito a cinqüenta por cento da propriedade?

— O quê?

— É isso mesmo. Na condição de viúva de Paul, você tem di­reito a todos os bens dele. A propriedade lá da ilha normalmente recairia sobre o primogênito, mas eu cedi metade a Paul. Hoje is­so pertence a você, além dos outros bens que ele deixou.

— Eu não os quero!

— Você é a viúva dele, e isso é um fato. Tem de voltar para Santa Amélia, Alice.

Alice, Alice. Aquele não era o seu nome! Nem se chamava Annabel. Ela não era ninguém, e nunca seria, a não ser que recobras­se a memória. E isso só poderia acontecer em Santa Amélia. Algo de muito grave acontecera naquela ilha, de modo a fazê-la fugir para a Inglaterra. O que David lhe estava oferecendo era a opor­tunidade de encontrar a si mesma. Será que podia se dar ao luxo de recusar essa oferta?

— Tem certeza de que sou sua cunhada?

— Não tenho dúvida alguma. Você está um pouco diferente, mas não tanto a ponto de me fazer duvidar de sua identidade. Hou­ve momentos, ontem à noite, em que… — Ele se interrompeu brus­camente e caminhou até a janela. — Você é Alice Hamilton. Quero que acredite nisso.

— Eu acredito, mas não sei se devo abandonar tudo o que cons­truí nestes dois anos.

— E o que foi que você construiu? — David olhou ao redor com desprezo. — Isto não é um lar, e seu emprego não é o que eu cha­maria de uma carreira promissora. A menos que haja outra razão mais importante… Um homem, talvez?

— Se houvesse algo sério, eu não teria aceitado o seu convite para sair.

— Então o que a impede de voltar para Santa Amélia?

— Você é um dos motivos. Sua atitude em relação a mim mu­dou desde que descobriu minha verdadeira identidade.

— Nada mais natural. Você é a viúva de meu irmão, e durante dois anos acreditei que estivesse morta. Preciso de tempo para me acostumar a essa nova situação.

Aquilo não era verdade, e ambos sabiam disso muito bem. David não confiara na cunhada enquanto ela fora esposa de seu ir­mão, e devia existir um bom motivo para isso. No entanto, aquela era sua única chance de recuperar a memória.

— Muito bem. Eu aceito.

— Ótimo. De quanto tempo precisa?

— Preciso pedir demissão do emprego. O aluguel do apartamento está pago por mais dois meses.

— Ninharias. Se algum dia voltar para a Inglaterra, será como uma mulher rica.

— Ainda assim, preciso de uma semana. Por que não vai na frente?

— Você não pode fazer a viagem sozinha. Precisa de alguém que não a deixe esquecer de quem é.

David tinha razão. Mesmo depois de todas as provas, ela ainda não se havia acostumado à idéia de que era Alice Hamilton. Preci­sava se convencer, de uma vez por todas, de que Annabel Morris não mais existia.

 

Chovia forte no dia do embarque para Nova York. Quando as condições meteorológicas finalmente permitiram que o avião de­colasse, Alice contemplou com melancolia a terra cinzenta que es­lava deixando para trás. Quando voltaria a vê-la?

Sua última semana na Inglaterra fora de atividade frenética. Ha­via pedido demissão sem especificar motivos, preferindo que to­dos acreditassem que arrumara um emprego melhor. Uma ou duas pessoas atreveram-se a lhe fazer perguntas, mas não conseguiram arrancar-lhe resposta alguma. As colegas não se reuniram para lhe dar um presente de despedida. É claro que Alice não esperava que o fizessem, já que nunca conseguira mais do que um relacionamento superficial com elas. Estava partindo sem deixar saudades.

Larry foi a única pessoa a quem contou toda a verdade. Apesar de satisfeito com a possibilidade de ela vir a recuperar a memória, ele ficou apreensivo, já que previa dificuldades no relacionamento da moça com a família Hamilton. Fez questão de ir ao aeroporto no dia da partida, e fez tantas recomendações a David, que este chegou a lhe dizer, categoricamente, que o rapaz estava apaixona­do por ela. Alice negou, é claro.

Graças aos esforços de David, foi possível obter uma cópia da certidão de nascimento de Alice Cosgrove. Os nomes dos pais nada significavam para ela. Conseguir em Friburgo, na Suíça, uma cópia da certidão de casamento também não foi difícil, e, graças aos documentos, foi possível obter um passaporte em nome de Alice Hamilton e um visto de entrada nos Estados Unidos. No entanto, mesmo de posse desses documentos, ela continuou presa da mes­ma insegurança. Podiam chamá-la pelo nome que quisessem, pois ainda se sentia como um ser a parte, um rosto sem identidade.

— Café, sra. Hamilton? — perguntou uma aeromoça, sor­ridente.

— Puro, por favor.

Sra. Hamilton! Será que algum dia se acostumaria a ser chama­da assim? Só o futuro diria. Agora, a única coisa a fazer era espe­rar, e esperar um bocado, já que tinham uma longa e tediosa viagem pela frente. De Nova York embarcariam para São Tomás, no ter­ritório americano das Ilhas Virgens, onde passariam a noite. De lá, ainda de avião, iriam para Tortola, a maior ilha da parte britâ­nica do arquipélago, e depois, finalmente, seguiriam de barco pa­ra Santa Amélia. E ela já realizara aquela viagem antes, ao lado de seu marido. Como teria se sentido na ocasião?

Alice suspirou, resignada. Não adiantava nada perder tempo com perguntas sem resposta. Não era desse modo que iria recobrar a memória. Se é que isso viria a acontecer…

Durante toda a viagem, David manteve sua atenção inteiramen­te voltada para o livro que comprara no aeroporto. Alice, cons­ciente do choque que fora aquela fantástica revelação de sua identidade, tinha certeza de que essa atitude era apenas um pre­texto para não conversar com ela. Não sabia exatamente como de­via tratá-lo agora. Mesmo não sendo um inimigo, ele também não podia ser considerado um amigo. Tratava-se agora apenas de um homem íntegro, justo, disposto a restituir à cunhada aquilo que legalmente lhe pertencia. Se ele ao menos soubesse… Alice daria qualquer fortuna para sentir a felicidade dos momentos que pas­sara em companhia dele antes da revelação.

Uma vez em Nova York, tiveram de esperar uma hora até em­barcar para as Ilhas Virgens. Houve, portanto, tempo suficiente para saborearem um drinque.

— Nada como viajar com requinte — comentou ela, apôs to­mar um gole reconfortante de gim-tônica.

— O vôo de amanhã será bem diferente. Iremos num avião bem pequeno e um tanto desconfortável.

— Já que a viagem é curta, isso não tem importância. E depois? Santa Amélia fica muito longe de Tortola?

— Meia hora. Como estamos na estação seca, teremos uma tra­vessia calma. De qualquer modo, você nunca teve problemas com barcos. Já navegamos juntos algumas vezes.

— É mesmo?

— Sim. No Seajade, uma escuna de quinze metros.

— Dois mastros…

— Você se lembra do barco? — ele perguntou, surpreso.

— Não. Devo ter lido esse tipo de informação em alguma revista.

Não era exatamente a verdade. Ao ouvi-lo falar sobre a embar­cação, ela tivera uma súbita visão de velas enfunadas, ondas, sol… E que podia muito bem não ser uma recordação de uma experiên­cia passada, mas simplesmente uma imagem vista em algum filme ou programa de televisão.

— Não deixa de ser interessante — ela murmurou, sorrindo. — Se você me levou para passear de barco, isso significa que eu não era uma pessoa tão ruim. Não acha?

David estava prestes a responder, mas a entrada repentina de mais uma pessoa no bar veio interrompê-lo. A recém-chegada, uma loira alta e esbelta, muito bem vestida, olhou à sua volta e, ao per­ceber a presença de David, caminhou em direção à mesa, sorridente.

— Imogen! Como é bom vê-la novamente!

— Eu que o diga!

Ela o abraçou e beijou-lhe os lábios. Era óbvio que havia algo mais do que uma simples amizade entre os dois, e essa constata­ção foi um choque para Alice.

— Soube que você estava para voltar neste fim de semana e re­solvi mudar meus planos só para vê-lo. Você passou um bocado de tempo fora, David!

— Bem mais do que eu esperava. Algo inesperado aconteceu.

— Eu sei. Madalyn contou-me tudo. — Os olhos azuis da bela mulher voltaram-se para Alice. — Olá. Como vai?

— Bem, obrigada.

— Vocês nunca se viram antes — explicou David. — Esta é Imogen Barrymore. Mora em São Tomás.

— É uma pena não poder ajudá-la — lamentou Imogen. — Só que não cheguei a conhecer nem mesmo seu marido. Deve ser hor­rível perder a memória.

— Talvez ela venha a recuperá-la depois de algum tempo em Santa Amélia. Sente-se, Imogen. Quer beber algo?

— Não, obrigada. Vão chamar nosso vôo a qualquer instante.

— Sempre organizada, não?

— É claro. A propósito, falei com Madalyn há apenas uma ho­ra. Vocês vão passar a noite em nossa casa. Sabe como meus pais se sentiriam caso vocês fossem a São Tomás e ficassem num hotel.

— Sim, sei. Madalyn falou se alguém iria nos buscar em Roadtown?

— Sim. Haverá uma lancha à espera de vocês.

— Ótimo. Assim não terei de telefonar.

Enquanto os dois conversavam, Alice sentia-se cada vez mais isolada e infeliz. Pela primeira vez depois que descobrira sua iden­tidade, David mostrava-se alegre e comunicativo. Não havia dúvi­da de que ele gostava muito de Imogen. E a conversa dos dois prosseguiu, ininterrupta, mesmo depois, já dentro do avião. Co­mo a primeira classe estava praticamente vazia, Imogen pôde es­colher um lugar ao lado deles. E só por uma vez durante a conversa ela se preocupou em dirigir a palavra a Alice:

— Você deve estar exausta, não é, querida? A viagem até Nova York é tão longa.

— Nem tanto. E a viagem foi mais tediosa do que cansativa. Eu já havia assistido ao filme que foi exibido.

— Quer dizer que David não a entreteve durante a viagem? Que­rido, querido, como pôde fazer uma coisa dessas?

— Ninguém é perfeito — ele respondeu.

O tom irônico do comentário de Imogen não escapou a Alice. Dali em diante, teria de tomar mais cuidado com o que dizia na frente daquela mulher. Apesar da gentileza com que ela a tratava, estava claro que vira em Alice uma possível rival.

Depois de algum tempo, cansada de ser posta de lado, Alice fe­chou os olhos e fingiu dormir. Acabou mesmo por adormecer. Teve um sono tranqüilo, tomado por sonhos estranhos, povoados de personagens sem rostos dizendo coisas sem sentido. Foi acordada por David, cinco minutos antes da aterrissagem. Lá embaixo, em meio à escuridão, brilhavam as luzes de uma cidade.

— Sente-se descansada?

Ela fez que sim com a cabeça, duvidando de sua capacidade de emprestar firmeza à voz. A verdade era que estava ansiosa e com medo. Aquelas ilhas eram o ponto de partida em sua busca de um passado perdido.

 

 

Capítulo III

 

A casa dos Barrymore situava-se em uma das colinas ao redor de Charlotte Amalie, capital das Ilhas Virgens Americana. Como Alice previa, tratava-se de uma residência suntuosa, com uma es­plêndida vista da cidade e do porto.

Os pais de Imogen tinham por volta de cinqüenta anos e obvia­mente adoravam a filha. Tinham um filho também, temporaria­mente ausente, mas que era esperado a qualquer momento. O próprio David foi recebido como se fosse um membro da família. Como a sra. Barrymore explicou durante o jantar, haviam conhe­cido os Hamilton um ano e meio depois da morte de Paul, mas era como se tivessem sido amigos durante toda a vida. Pelo visto, não era apenas Imogen quem esperava pela união das duas famílias.

— Santa Amélia é tão isolada! — queixou-se a sra. Barrymore. — Quando sentir vontade de fazer compras ou de mudar de am­biente, precisa vir para cá. Será um prazer hospedá-la.

— É muita bondade sua — agradeceu Alice, não com certa reserva.

— Se estiver cansada, não espere por nós. —- David sugeriu, adi­vinhando o desconforto dela. — Ninguém vai se importar se for cedo para a cama. Afinal, está cansada, e ainda temos meio dia de viagem pela frente.

— É isso mesmo, querida — disse Imogen. — Quer que eu a leve até seu quarto, ou acha que consegue chegar até lá sozinha?

— Pode deixar, que eu chego lá. Sra. Barrymore, o jantar esta­va uma delícia, e sinto muito não ter feito justiça a ele. Boa noite a todos.

O quarto que lhe haviam reservado ficava na parte de trás da casa, com vista para o pátio interno, repleto de plantas, e bastante iluminado. Ao entrar, Alice abriu a janela que dava para a sacada e ali ficou, olhando para a piscina, aspirando o ar fresco da noite, enquanto tentava reordenar seus pensamentos confusos. Sentia-se sufocada naquele lugar, em meio àquelas pessoas, e nem ao me­nos podia contar com o apoio de David. E pensar que ele confes­sara seu desejo por ela…

Mais tarde, ela estava deitada, sem conseguir dormir, quando ouviu vozes no pátio. Mesmo ditas em voz baixa, as palavras lhe chegavam com nitidez aos ouvidos.

— David, você sabe o que sinto por você. Pensei que o senti­mento fosse recíproco.

— E não tem motivos para duvidar disso — ele respondeu, com uma ponta de irritação. — Só que preciso levar Alice para casa.

— Aquela casa não é o verdadeiro lar dela. Alice só usa o nome Hamilton porque se casou com Paul.

— Ainda assim, é a dona de cinqüenta por cento da propriedade.

— Pode-se dar um jeito nisso.

— Como? Está sugerindo alguma espécie de acordo?

— Algo assim.

— De qualquer modo, ela precisa recuperar a memória.

— Talvez isso nunca aconteça.

— Tem de acontecer! Quero saber o que aconteceu entre ela e Paul naquele dia. Só ela pode me revelar isso.

— E se ela não lhe disser nada?

— Vamos enfrentar um problema de cada vez. Ainda é muito cedo para pensar nisso. Até lá, tenha paciência.

— Você é um homem duro, David.

— Sou terrível! — Pelo tom de voz, Alice teve certeza de que ele estava sorrindo. — Deixe-me resolver esse problema e depois pensar no futuro.

Foi então que reinou o mais completo silêncio. Imóvel na cama, mal se atrevendo a respirar, Alice imaginava os dois abraçados, os lábios sensuais que ela conhecera acariciando os de Imogen… Aquela víbora! Imogen sabia muito bem qual quarto Alice ocupa­va e levara David para baixo daquela janela justamente para que ela ouvisse a conversa.

Num gesto inconsciente Alice acariciou a marca de nascença que tinha no seio, e, pela primeira vez, pôs-se a imaginar como David podia ter conhecimento daquele sinal. Será que Paul lhe havia con­tado tal particularidade ou ele mesmo a vira de biquíni? Quando ela fora descoberta, havia em seu corpo a marca de um biquíni bastante ousado, do tipo que atualmente não teria coragem de usar.

Devia ter mudado muito… É claro que agora era mais velha e, sem dúvida, um pouco mais discreta do que fora aos vinte anos. De uma coisa, porém, tinha certeza: em nenhum momento de sua vida se­ria capaz de se casar por dinheiro. Na época de seu casamento, ela devia estar apaixonada por Paul.

Mais uma vez o silêncio da noite foi quebrado. Uma risada sua­ve, murmúrios abafados, o som de passos que se afastavam. E de­pois, nada mais além do murmúrio das folhas sacudidas pelo vento.

O sol quente da manhã brilhava sobre São Thomas, oferecendo a Alice uma vista esplêndida da cidade e do porto onde estavam ancorados dois transatlânticos. As ruas e praias deviam estar co­loridas, cheias de gente, e, no entanto, ela sentia um desejo irresis­tível de deixar a cidade o quanto antes. Ao mesmo tempo, porém, a idéia de encontrar o resto da família Hamilton fazia com que suasse frio. Por enquanto, nada lhe parecera familiar, e ninguém podia lhe garantir que em Santa Amélia as coisas fossem diferentes.

Além dela e dos criados, a única pessoa acordada na casa era David, já instalado numa mesa do terraço, tomando seu desjejum. Imogen provavelmente estava cansada demais, depois de passar a noite em claro nos braços dele…

— A que horas vamos embarcar para Tortola? — perguntou ela, após pedir frutas e cereais a uma empregada.

— Por volta de meio-dia. — Ele examinou o rosto de Alice en­quanto ela se servia de café. — Pelo jeito, você teve uma boa noi­te. Parece leve, descansada…

— Talvez o clima tenha efeito calmante. O tempo é bom assim durante o ano inteiro?

— A média é de vinte e seis graus, mas a umidade é baixa devi­do aos ventos alísios, e, portanto, o calor não chega a ser insupor­tável nem mesmo quando a temperatura ultrapassa os trinta. Por que não comprou um guia turístico das Ilhas Virgens? Teria todas as informações necessárias.



  

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