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O Drama De Uma Mulher Casada 1 страница



O Drama De Uma Mulher Casada

Time out of mind”

Kay Thorpe

 

Um paraíso de praias brancas, palmeiras esguias, vegetação luxuriante. Uma ilha do Caribe onde Alice vivera um dia, antes de perder a memória. Agora estava de volta, querendo resgatar o passado perdido. Tudo o que lhe diziam era que fora casada com Paul Hamilton. Mas havia outro homem: David, seu cunhado, o amante que a fizera pecar.

Ele de novo a seduzia, querendo reviver momentos de delírio sensual. Alice o desejava com loucura, mas as sombras do passado ainda a impediam de aceitá-lo. Como confiar num homem que traíra o próprio irmão?

 

 

Digitalização: Rita Cunha

Revisão: Alessandra Maciel

 


Copyright: Kay Thorpe

Título original: Time out of Mind

Publicado originalmente em 1987 pela

Mills & Boon Ltd., Londres, Inglaterra

 

 

 

 

Capítulo I

 

Não ter um passado é algo assustador. No entanto, essa era a realidade de Annabel Morris. Para todos os efeitos, sua vida co­meçara dois anos atrás, quando acordara na estação Vitória, em Londres, sem saber quem era nem o que estava fazendo lá.

Mesmo o nome que adotara fora escolhido ao acaso: Annabel porque gostara do poema de Edgar Allan Poe com esse título; Mor­ris porque fora o primeiro sobrenome que encontrara ao abrir a lista telefônica. No hospital haviam estimado que tinha por volta de vinte e dois anos. Vinte e nove de abril, a data em que fora en­contrada, passara a ser o dia de seu aniversário. E como fosse ju­nho, estava começando o terceiro ano de sua nova vida.

O psiquiatra com quem se consultava desde então dava mostras de estar perdendo as esperanças e não tardaria a sugerir que encer­rassem as sessões. Seria um alívio para ela, já sem esperanças de recobrar a memória.

A polícia fizera tudo o que estivera a seu alcance para ajudá-la a resgatar o passado. Haviam até mesmo colocado seu retrato nos jornais, sem, porém, obter qualquer resultado positivo. Se alguém conhecia sua identidade, achara melhor não revelá-la. Talvez com bons motivos…

Agora, ali estava ela, num ônibus, mais um rosto entre a multi­dão londrina, rumo ao trabalho.

Annabel ergueu-se e caminhou para a porta do veículo, pois tinha de descer no ponto seguinte. Estava atrasada, pela terceira vez em apenas duas semanas, e nem podia se desculpar dizendo que residia muito distante da loja. Afinal, não era a única trabalhado­ra a morar longe da firma. Teria de acordar meia hora mais cedo, se quisesse manter o emprego.

O dia prometia ser quente e ensolarado. As ruas já estavam re­pletas e o trânsito era intenso. Como a faixa de segurança mais próxima ficasse ainda a uns cem metros de distância, Annabel não resistiu à tentação de atravessar a avenida ali mesmo, aproveitando-se da baixa velocidade dos veículos.

Havia dado poucos passos quando ouviu a buzina e o guincho dos freios. Parou, sobressaltada, e olhou para o carro azul, para­do a poucos centímetros dela. Ufa! Escapara por pouco! Com o coração agitado e as faces vermelhas, ela olhou para o rosto seve­ro do motorista e murmurou um pedido de desculpas.

O trânsito agora estava completamente parado, e ela fez o resto da travessia sem problemas, apertando o passo ao chegar na cal­çada, rumo ao familiar edifício onde trabalhava.

Foi uma agradável surpresa descobrir que não se atrasara, afinal. Seu relógio é que estava adiantado. Teria de mandá-lo sem demora para o conserto. Isto é, quando sobrasse dinheiro, pois os relojoeiros cobravam muito caro pelo serviço.

Ao entrar no vestiário da loja, Annabel encontrou duas colegas conversando animadamente. As moças cumprimentaram-na com desinteresse e voltaram a conversar enquanto ela vestia o unifor­me da loja. Durante os dezoito meses em que trabalhara ali não fizera nenhuma amizade devido ao temor de que descobrissem seu embaraçoso segredo. Algumas garotas até haviam tentado rom­per seu isolamento, mas as tentativas amistosas delas foram repe­lidas, o que lhe valera a fama de presunçosa e orgulhosa.

Annabel não se importava com isso. Tudo o que queria era que a deixassem em paz. Só havia uma pessoa a quem essa regra não se aplicava: Larry. Graças a ele, conseguira um emprego, um lu­gar para morar e, o mais importante, forças para superar os mo­mentos de depressão e desespero. Com a ajuda de Larry havia atravessado a fase mais dura de adaptação, por isso seria grata a ele para sempre.

Já vestida, Annabel tirou um pente da bolsa e pôs-se à frente do espelho. O rosto bem-feito, os olhos verdes, os lábios carnudos, eram-lhe familiares, mas ela ainda se recordava da estranhe­za que sentira quando se olhara num espelho no hospital. Sem dúvida, gostara de sua aparência, mas era como se estivesse vendo o rosto de outra pessoa, e não o seu. Uma sensação bastante per­turbadora…

Com o passar do tempo, ela fora se acostumando a ser uma mu­lher sem passado, vivendo num ambiente estranho, e agora era até capaz de exibir um ar de segurança, apesar de, vez ou outra, ainda ser assaltada por dúvidas inquietantes. Quem seria ela? De onde viera? O que estaria fazendo na estação Vitória? A explicação que lhe haviam dado era a de que talvez tivesse sido atacada por assaltantes e depois deixada no toalete feminino, onde fora encontrada. Mas, que importância tinha isso agora? Precisava pensar no fu­turo, não no passado.

Mais um dia de trabalho começava. Annabel trabalhava na seção de artigos masculinos, um departamento bastante calmo da loja. Naquele dia o movimento estava ainda mais fraco do que de costume e, quase sem querer, ela pôs-se a divagar. No dia seguinte trabalharia apenas meio expediente, depois viria a sexta-feira e de­pois, finalmente, o fim de semana. Uma pena que Larry fosse viajar, gostava muito de sua companhia e tinha certeza de que ele também gostava de sair com ela. No entanto, Larry bem que me­recia aquela viagem, já que habitualmente sua dedicação ao tra­balho ele assistente social era completa e apaixonada.

A chegada de um freguês veio interromper os devaneios de An­nabel. Armando-se de seu melhor sorriso, ela voltou-se para o recém chegado. O sorriso logo desapareceu ao reconhecer o ho­mem. Apesar de ter visto aquele rosto bronzeado apenas por alguns instantes, a imagem dele ficara bem nítida em sua mente para que houvesse qualquer possibilidade de erro: era o motorista que quase a atropelara.

Ele também não parecia ter dúvidas quanto a sua identidade. Durante alguns instantes ele ficou olhando para ela em silêncio, com uma expressão curiosa no rosto.

— Vim apenas ver se você está bem — disse ele por fim. — Não se machucou?

— Não… foi muito gentil de sua parte ter vindo até aqui. Sei que não devia atravessar a rua daquele jeito, mas imaginei que es­tivesse atrasada. Como soube que eu trabalhava aqui?

— Vi a direção que tomou, e como era cedo demais, achei que devia ser uma funcionária, e não uma freguesa. Estou na loja há alguns minutos, procurando por você.

— E o que faria, caso eu trabalhasse nos escritórios?

— Acho que ficaria um tanto desconcertado — ele respondeu, rindo. — De qualquer modo, eu a encontrei…

Annabel não sabia o que dizer. Nunca vira aquele homem antes, mas havia algo nele que a perturbava. Aparentando trinta e poucos anos, alto, forte, elegante, ele era, sem duvida, bonito. Ti­nha lábios finos e bem delineados, traços duros, olhos cinzentos e penetrantes, e transbordava sensualidade.

— Sinto muito pelo susto que lhe dei. Se fosse atropelada, a culpa seria toda minha.

— Não vim até aqui para exigir um pedido de desculpas, mas se você faz questão… Jante comigo hoje à noite e estará perdoada.

— Agradeço, mas não será possível.

— Ou seja, você não sai com estranhos. Certo? Mas isso não é problema. Meu nome é David Hamilton, sou de Santa Amélia.

— Santa Amélia? Onde fica isso?

— No Caribe, Ilhas Virgens Britânicas. Produzo rum.

— Interessante. Agora, se me dá licença, tenho de atender uma freguesa.

Mas a providencial chegada de uma cliente resultou em nada. Após atendê-la, Annabel viu o desconhecido no mesmo lugar, es­perando pacientemente por ela.

— Você não me disse seu nome.

— Não achei necessário. Obrigada pelo convite, mas não posso aceitá-lo. Já tenho um compromisso para hoje à noite.

— Compreendo — ele respondeu, resignado. — Nesse caso, vou embora. Tome cuidado ao atravessar a rua.

Ao vê-lo ir embora, Annabel mordeu o lábio, arrependida. Não custava nada ser gentil com o homem, nem que fosse pelo esforço que ele fizera para encontrá-la. Além do que, ela não tinha com­promisso algum. Paciência… Era tarde demais para se arrepen­der, e talvez fosse melhor assim. Tratava-se apenas de um turista de passagem pela cidade, à procura de uma companhia qualquer. E, atraente daquele jeito, ele não ficaria sozinho por muito tempo.

Foi um dia longo e monótono. Pelo jeito, os turistas estavam aproveitando a onda de calor para passear por Londres. Assim que o tempo piorasse, eles voltariam correndo para as lojas. Annabel só esperava que as condições continuassem favoráveis até o dia se­guinte, já que pretendia tomar sol à tarde.

Às cinco e meia, cansada, ela saiu da loja. Parou por alguns ins­tantes na porta, ajustando a sandália que estava frouxa, quando ouviu uma voz familiar:

— Precisa de ajuda?

— Não, obrigada. — Ela ergueu o olhar para o fascinante rosto de David Hamilton. — A sandália estava frouxa, só isso.

— Surpresa por me ver aqui?

— Francamente, sim.

— Pensou que eu aceitaria um "não" tão facilmente?

— Não está acostumado a ter seus convites recusados?

— Acho que não — respondeu ele, rindo. — Estou aqui desde as quatro e meia.

— Por quê?

— Porque ainda gostaria de levá-la para jantar.

— Mas eu lhe disse que…

— Lembro-me muito bem do que disse, mas senti que foi ape­nas uma desculpa.

— Acha tão absurdo que eu tenha um compromisso para hoje?

— Pelo contrário. Mas seu tom de voz não me convenceu. É claro que posso estar enganado… Afinal, você tem ou não um com­promisso para hoje à noite?

— Não. Era mesmo uma desculpa.

— Ainda bem que sou persistente. E então? Poderíamos tomar um drinque em algum lugar antes de jantar.

— Creio que não estou vestida de modo apropriado.

— Bobagem. Está perfeita, elegante o suficiente para ir ao Ritz.

— Ah, não! Prefiro um restaurante um pouco mais simples.

— Iremos ao restaurante que você escolher. Agora vamos. Dei­xei o carro estacionado em local proibido. Se não tiver uma multa a essa hora, será um verdadeiro milagre.

E como milagres não aconteciam tão facilmente, lá estava a multa no pára-brisas do carro.

— É a terceira hoje — ele confessou, guardando-a no porta-luvas. — Devia ter juízo e usar táxis enquanto estou no país, só que detesto ser conduzido. Estou hospedado no Claridge's. Que tal se bebêssemos alguma coisa por lá?

— Por mim, tudo bem. O que vai fazer a respeito das multas? Vai entrar com algum recurso?

— Não. Parto no final de semana. Terão de me perseguir até o Caribe para receber o dinheiro.

A caminho do hotel, Annabel olhou disfarçadamente para Da­vid, apreciando o perfil bem delineado, o brilho dos cabelos cas­tanhos, lisos e bem penteados. Quando observou-lhe a mão, viu um anel em seu dedo. Ouro, sem dúvida, com as iniciais DH en­trelaçadas. Ela engoliu em seco, sentindo um desconforto repenti­no e inexplicável.

— Está se sentindo bem? — perguntou David, como que perce­bendo algo de errado na fisionomia dela.

— Não foi nada — mentiu ela, lutando para recuperar a cal­ma. — Este carro é seu?

Se David percebeu que a pergunta era apenas uma tentativa de desviar o assunto, preferiu não comentar o fato.

— Alugado. E não pense que sou um vigarista. Deixarei dinheiro suficiente para as multas.

Annabel permaneceu em silêncio. Sentia-se estranha, presa de uma agitação sem motivo aparente. Os ruídos do tráfego lhe che­gavam abafados, como se tivesse algodão nos ouvidos. E aquele anel… Mesmo sem olhar para ele, tinha sua imagem nítida na me­mória. Aquela jóia significava algo para ela… Mas o quê? Se ao menos pudesse romper a barreira que a separava de seu passado!

Uma vez no hotel, sentiu-se senhora de si. Os sons agora eram nítidos e o anel deixara de incomodá-la. Apenas suas pernas ainda tremiam um pouco.

— É melhor tomar um conhaque — sugeriu ele, já no bar, ajudando-a a sentar-se. — Pensei que fosse desmaiar no carro.

— Não foi nada, sinto-me bem. E depois, detesto conhaque. Que tal gim-tônica?

— Como quiser.

Depois de pedir as bebidas, David voltou-se para ela e sorriu:

— Ainda não sei o seu nome.

— Annabel Morris.

— Annabel? É um nome pouco comum, não?

— Foi um dos motivos que… — Ela se interrompeu bruscamen­te. Estivera prestes a dizer que fora justamente por isso que o es­colhera. — Foi um dos motivos que levaram meus pais a escolhê-lo.

Apesar de não fazer comentários, era óbvio que a momentânea confusão não passara despercebida a David. Felizmente, as bebi­das chegaram naquele instante. Depois de um gole, ela foi capaz de encará-lo com firmeza outra vez.

— Você disse que morava numa ilha. É grande?

— Não, não muito.

— A quem pertence?

— A mim, o único homem que ainda é vivo na família. Tinha um ir mão, só que ele morreu há alguns anos.

— Sinto muito. Tem alguma irmã?

— Uma. E minha mãe ainda é viva. Ambas moram comigo.

— Você disse que produzia rum, não é?

— Sim, temos nossa própria destilaria. Já foi ao Caribe algu­ma vez?

Annabel negou com um gesto de cabeça. Talvez tivesse ido, mas achava improvável.

— Deveria ir. É a região mais linda do globo. Tem praias lin­díssimas.

David devia ficar irresistível em trajes de banho. Os braços longos e fortes, com um bronzeado uniforme, o peito largo e musculoso, coberto de pêlos negros e sedosos… Annabel surpreendeu-se com a nitidez da imagem que formara na mente. Que absurdo! Aquele homem era quase um desconhecido!

— Você tem sorte de viver em um lugar tão bonito — ela disse, tentando ando aparentar calma.

— A família Hamilton vive na ilha há quase trezentos anos. Te­nho certeza de que não conseguiria morar em nenhuma outra parte do mundo.

— Mas se você é o último da linhagem…

— Terei de me casar e ter um filho. — Ele sorriu com uma pon­ta de cinismo. — Se eu não conseguir, minha irmã pode se casar e persuadir o marido a mudar o sobrenome para Hamilton.

Então David era solteiro… Não que isso tivesse importância pa­ra ela, já que duvidava que viesse a encontrá-lo depois daquela noite.

— Já falamos muito a meu respeito, Annabel. Que tal me contar algo sobre você?

— Não há muito o que dizer. Moro aqui mesmo em Londres, e você já sabe onde trabalho.

— Não tem parentes?

— Não que eu saiba.

— Entendi. Você não quer falar sobre o assunto.

— Não é bem assim. Mas, se eu acho aborrecido falar de mim, os outros também acharão. Não concorda?

— Não, mas não vamos discutir isso. Gosta de comida italiana?

— Gosto.

— Ótimo. Vou telefonar e fazer as reservas. Volto num instante.

Ao ver-se sozinha, Annabel ficou sem saber o que fazer. O bom senso dizia-lhe para aproveitar a chance e ir embora. David Ha­milton era um homem fascinante e ela não o esqueceria facilmen­te. Ele despertava-lhe emoções estranhas, perturbadoras. De certo modo, chegava a ter medo dele. Aqueles olhos cinzentos, penetrantes, pareciam capazes de ler seus pensamentos.

David voltou antes que ela chegasse a uma conclusão.

— Tudo arranjado. Sete e meia é um bom horário para você?

— Está ótimo, mas pensei que…

— O quê?

— Bem, pensei que, vindo de uma região tropical, você costumasse jantar mais tarde.

— Sub tropical — corrigiu ele. — E depois, não há nenhuma regra rígida. A hora certa de se comer é quando se sente vontade E depois, passei o dia inteiro fora, e estou faminto.

— O dia inteiro não. Você já esteve no hotel depois de me encontrar.

— Como sabe?

— É simples. Você está usando uma camisa diferente e barbeou-se outra vez.

— Observadora, não? Mas não há nada pior do que uma barba malfeita quando se quer impressionar uma mulher.

— É isso que está tentando fazer, impressionar-me?

— É claro. E não devo ser o primeiro a fazer isso. Você é uma garota adorável, Annabel.

— Agora há pouco eu era uma mulher. Por que fui rebaixada a garota?

— Já vi que terei de tomar cuidado com o que lhe digo — respondeu ele, rindo. — Qual é a sua idade?

— Vinte e quatro.

— Era o que eu imaginava. Isso me dá uma vantagem de dez anos. Acha que sou muito velho para você?

— Considerando que você vai embora no final de semana, isso não tem a menor importância.

— Você é terrível mesmo, Annabel.

O fascínio que sentia por aquele homem crescia a cada instante. Ao vê-lo sorrir, a vontade de acariciar-lhe o rosto, de percorrer com os dedos o contorno dos lábios firmes e sensuais, tornou-se quase irresistível. David era especial…

No decorrer da noite, a imagem que fazia dele tornou-se ainda mais atraente. Após um jantar delicioso, durante o qual a conversa foi franca e agradável, ela sentiu-se mais e mais envolvida pelo charme masculino. Enquanto dançavam, a emoção cresceu e ela ficou alheia a tudo e a todos. Nunca tivera uma noite como aquela.

— Sabe que você me impressionou por mais de um motivo? Você é incrivelmente parecida com uma pessoa que conheci. — Annabel sentiu o sangue fugir-lhe do rosto. — Dizem que todos nós temos um sósia em alguma parte do inundo — prosseguiu ele.

— Tenho outro traço em comum com essa pessoa, além da se­melhança física?

— Não, não — respondeu ele, após alguns instantes de hesitação. — Só a aparência. Uma semelhança extraordinária, nada mais. Vamos repetir este passeio antes de minha partida?

Um misto de alegria e tristeza tomou conta dela. Mais dois dias, no máximo, e ele iria embora. Provavelmente nunca mais se encontrariam. Talvez fosse melhor acabar com tudo naquele instante, mas não foi o que ela fez…

— Se você quiser…

— Se não quisesse, não a convidaria. Posso apanhá-la na loja amanhã, no mesmo horário?

— Amanhã só trabalho meio expediente.

— Melhor ainda. Podemos fazer um piquenique em Brighton e jantar depois. O que acha?

— Perfeito.

Pelo jeito, ela estava mesmo disposta a se machucar. Mas, o que fazer? Todo prazer tinha o seu preço.

Annabel ficou entre aliviada e desapontada quando David não insistiu em levá-la para casa. Ele limitou-se a colocá-la em um táxi, pagou a corrida antecipadamente e repetiu mais uma vez:

— Não se esqueça: amanhã, meio-dia e meia.

Mais algumas horas e ela teria todo um dia pela frente na companhia de David Hamilton. E dizer que até aquela manhã nem sa­bia da existência dele! Era mesmo um homem estranho, intrigante… Não tentara beijá-la, nem fizera qualquer outro tipo de investida, ao contrário do que ela esperava. O que estaria pensando de tudo aquilo?

Era quase meia-noite quando Annabel desceu do táxi, em fren­te à velha casa vitoriana onde morava. A maioria das janelas ain­da estava iluminada, e mesmo ali da rua era possível ouvir uns dois ou três toca-discos ligados em volume alto. Ela relacionava-se com os outros moradores da casa apenas superficialmente. O vizinho que morava no mesmo andar que o seu era um homem de seus qua­renta anos, tão tímido que ficava vermelho sempre que a cumpri­mentava. Parecia tão atormentado quanto ela…

O quarto de Annabel era pequeno, e ela fizera o possível para torná-lo mais atraente: reformara a pintura descascada e velha e instalara cortinas em cores vivas, combinando com as almofadas. De qualquer modo, já não agüentava mais morar ali. Depois do aumento de salário, começaria a procurar um local mais espaçoso e confortável.

O sono custou chegar, pois não conseguia tirar David do pensa­mento. Era seis anos mais velho que Larry, mas não era apenas esse detalhe que o tornava diferente do rapaz como o dia da noite. David pertencia a outro mundo, tinha um estilo de vida muito di­ferente, e, provavelmente, nunca tivera de se preocupar com o alu­guel nem correra o risco de ter a água ou a eletricidade cortadas por falta de pagamento. Larry, sem dúvida, não a fascinava do mesmo modo que David. Mas de que adiantava pensar naquilo? David iria embora…

Annabel finalmente adormeceu e sonhou com sol, praias de areias brancas e finas, mar azul e brilhante… e a sombra sempre presente de um homem a seu lado. Não era David, disso ela tinha certeza. Seria apenas um sonho? Ou memórias de sua vida passa­da? Não havia como responder a essa pergunta…

Ao meio-dia e meia em ponto, Annabel saiu da loja e encontrou David a sua espera. Desta vez, ele vestira-se com menos formali­dade: usava uma calça clara e um paletó esporte bege. Estava sem gravata, e a camisa, desabotoada no colarinho, revelava um tre­cho de pele bronzeada coberta de pêlos negros.

— Tenho uma gravata no porta-luvas — observou ele, perce­bendo a direção de seu olhar. — Está muito quente para forma­lidades.

— Você está ótimo assim. Deve estar acostumado a usar bem menos roupa nas Ilhas Virgens, não é?

— Ah, sim, sem dúvida. Mas você também está adorável. Es­pero que esteja com fome, pois eu trouxe uma tonelada de comida.

— Que ótimo! Estou faminta.

Naquele instante, uma das funcionárias da loja saiu à rua e olhou com curiosidade para o casal. No dia seguinte, haveria comentários, sem dúvida. Mas Annabel não estava preocupada. Nunca se sentiu tão feliz em toda a vida, e não deixaria que comentários maliciosos viessem a estragar seu humor.

Uma hora depois, Annabel e David já estavam fora da cidade, indo ao campo, com todos os vidros do carro abertos. Absorta, ela pôs-se a imaginar David em sua ilha, à direção de um carro esporte sem capota, o vento batendo-lhe no rosto, fazendo esvoaçar seus cabelos castanhos… A julgar pela cor de sua pele, ele de­via passar boa parte do tempo ao ar livre. Sem dúvida, um felizardo.

Finalmente, eles escolheram um recanto agradável para o piquenique, no campo, de onde se tinha uma vista esplêndida. David estacionou o carro à sombra de uma árvore. Logo Annabel retira­va a comida da cesta e a colocava sobre uma toalha xadrez. Reparou que ele não se esquecera nem mesmo do champanhe!

— Uma taça para cada um — disse ele, servindo-a. — Se for preso por dirigir bêbado, quero companhia.

— Que desculpa boba! A verdade é que você quer me embebedar para tornar as coisas mais fáceis… — Ela enrubesceu ao perceber a tolice que dissera. — Desculpe, foi uma piada sem graça.

— Nem tanto. Talvez essa tenha mesmo sido minha intenção ao encomendar o champanhe.

— Agora quem está fazendo piadas é você. Não acredito que você precise desses métodos quando deseja uma mulher.

— Às vezes, quem sabe… Não nego que gostaria de fazer amor com você, mas acho que você não é do tipo que se deixa seduzir por um homem que mal conhece.

— E você não vai ficar no país por tempo suficiente para me fazer mudar de idéia.

— Posso prolongar minha permanência na Inglaterra. Você me faria companhia?

— Humm… Vou pensar no caso.

— Faça isso. A idéia me agrada muito.

Eles ficaram em silêncio durante alguns instantes, escutando o canto dos pássaros e o murmúrio das folhas sacudidas pela brisa preguiçosa. De repente, David estendeu a mão e pôs-se a acariciar-lhe o rosto suavemente. Depois, não percebendo resistência, beijou-a.

Annabel ainda tinha a taça na mão. Sentiu o líquido gelado cair-lhe sobre a pele, até que ele, gentilmente, pegou o copo e colocou-o na toalha. Depois, a fez deitar-se sobre a grama.

Deliciada com o contato daqueles lábios quentes e sensuais, An­nabel não esboçou protesto algum quando ele começou a acariciar-lhe os seios, desnudando-os lentamente. Um arrepio de prazer percorreu-lhe a espinha ao sentir os cabelos castanhos roçando-lhe a pele nua. Ela desejava aquele homem…

De repente, David afastou-se. Annabel viu o rosto dele trans­formado pela raiva, os olhos cinzentos fixos em seus seios.

— É apenas uma marca de nascença — explicou ela, adivinhan­do o que ele olhava, e incapaz de compreender por que estava tão zangado. — Uma pequena lua crescente.

— Sei muito bem o que é. — Ele a segurou pelos braços com rudeza e indagou com voz irada: — Que joguinho é esse, Alice?

 

 

Capítulo II

 

Os alegres ruídos da natureza pareciam subitamente abafados para Annabel. Um zumbido insistente e penetrante crescia nos ou­vidos dela, impedindo-a de pensar com coerência. Incapaz de es­boçar qualquer reação, limitou-se a encarar David enquanto ele a sacudia pelos ombros.

— Vamos, responda, Alice! Responda de uma vez!

— Eu não sei do que está falando… Quem é Alice?

— Pode parar de fingir. Não sei por que está fazendo isso, mas o jogo tem de acabar. Não pode haver duas pessoas tão parecidas, com a mesma marca de nascença, no mesmo lugar.

— Sinto muito… — falou ela num tom quase inaudível, pouco mais do que um gemido. E, de repente, um tremor insuportável dominou-lhe o corpo. As imagens começaram a dançar na sua fren­te e tudo ficou escuro.



  

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