|
|||
CAPÍTULO SETECAPÍTULO SETE
Ainda era cedo quando Milos saiu para a varanda de seu quarto, em Vassilios. Embora o sol nascente já estivesse espalhando seus raios dourados sobre o mar cinza-azulado, uma sensação de insatisfação tirava a sua noção de tudo, inclusive da beleza da manhã. Dormira mal, frustrado, mal-humorado. Inferno, devia saber que a perturbação com Helen na noite anterior o deixaria com raiva por deixá-la nervosa. Mas a combinação de sua agressividade com a fragilidade dela novamente o amedrontava. Além do mais, não conseguira manter as mãos afastadas dela, o que não era bom. Ainda assim, era uma coisa emocional. Por que sentia essa necessidade de protegê-la, até contra si próprio? Por que duvidava de suas próprias crenças quando ela o olhava assustada? De qualquer modo, a festa dos Campbell não tinha sido um lugar adequado para uma conversa séria, e Milos partira o mais rápido possível. Rhea tinha reclamado. Queria ficar para a dança, que se seguiria ao bufê. Mas Milos dissera com rudeza que devia voltar com ele ou voltaria para casa sozinha. A noite fora um desastre. O que o perturbava, é que partiria para Atenas hoje. A conferência mundial sobre ecologia, à qual tinha que comparecer, começava no dia seguinte, e ele ficaria três dias fora. Precisava falar com Helen antes de partir. Precisava que ela admitisse a verdade sobre Melissa. Até Sam ficou surpreso quando Helen foi chamada ao telefone e voltou, dizendo que Rhea Stephanides a convidara, e a Melissa, para o almoço. — Não sei por que ela me convidou. Mal a conheço. — Eu conheço — exclamou a menina, olhando a mãe. — Você não recusou, não é? — N... não. Melissa ficou deliciada. — Posso ir sozinha, não preciso de babá — virou-se para o avô. — Você me leva, Sam? Helen hesitou. — Melissa... — Acho que as duas devem ir — Sam declarou e, uma vez, Maya concordou. — Milos não deve estar lá — falou ela. — Pelo que soube, vai para Atenas esta manhã. — Claro, a conferência — endossou Sam. — É uma reunião de produtores de petróleo discutindo maneiras de reduzir a poluição — explicou a Helen. — Milos é um dos palestrantes mais importantes. — Entendo. Melissa falou novamente. — Lá vem você, mãe. Não precisa se preocupar. Não é uma maneira de Milos ficar sozinho com você. — Não pensei que fosse — protestou Helen, sabendo que Maya e seu pai percebiam seu embaraço. — Gostaria que você não dissesse coisas assim, Melissa. Eu... mal conheço o homem. — Mas ele gostaria de conhecê-la — retrucou Melissa. — Rhea e eu vimos vocês juntos na noite passada, lembra? — Estávamos só conversando. — Helen olhou humilhada para o pai. — Sinceramente, ela tem uma imaginação fértil! — Não a deixe aborrecê-la — disse Sam, suavemente, piscando para a neta. — Ela está te provocando. Sabemos que Milos tem bons olhos, mas não imagino que você seja tola de levá-lo a sério. Você entendeu mal, Melissa. Acho que deve se desculpar. Melissa apenas disse: — Mamãe gosta de Milos, sei que gosta. Não tirou os olhos dela durante o jantar. Sam suspirou, mas foi Maya quem respondeu à garota. — Você está imaginando coisas. Milos sempre foi popular com as mulheres. Mas você não deve imaginar que ele possa estar interessado numa inglesa. Gregos casam com gregos. É como deve ser. — Você não... — começou Melissa, mas Sam interrompeu. — Seja o que for, Maya está certa. Milos já casou o bastante. Não creio que vá se queimar novamente. Uma hora depois, Helen estava no banco da frente do Jeep de seu pai. Ele se oferecera para levá-las à casa dos Stephanides em San Rocco, depois de Melissa tê-la assombrado, desculpando-se por aborrecer a todos. — Estamos quase chegando — falou Sam, apontando as paredes brancas da casa, visíveis acima de algumas árvores. — A casa de Aristotle é no alto e não tem piscina — falou para Melissa —, mas a vista é maravilhosa. — Você já foi lá? — Muitas vezes. Como sabe, os Stephanides são parentes distantes de Maya. — Ela não nos deixa esquecer — falou Melissa, pensativa, acrescentando: — Desculpe. Parece ótimo. — É. Não é tão moderna quanto a casa de Milos, mas acho que você gostará. Rhea saiu para encontrá-los quando o Jeep apareceu. Usava uma saia longa de enrolar e uma blusa sem mangas amarrada na barriga, e Helen percebeu que Melissa verificava a sua aparência enquanto saía do carro. As duas garotas se cumprimentaram calorosamente, mas, mesmo com Rhea convidando Sam a entrai-, ele recusara. Rhea também ofereceu para providenciar que Helen e Melissa voltassem para casa, poupando-o de outra viagem. Helen também ficou aliviada vendo Rhea aparentar a sua idade, mais velha e madura. Na noite passada, a semelhança entre as duas garotas parecera mais óbvia. — Vocês duas estão ótimas — comentou ela, olhando suas convidadas enquanto entravam pelo fresco corredor da casa. — Foi gentil por nos convidar — disse Helen. — Melissa se divertiu muito no outro dia, em Vassilios. — S-i-m — Rhea quase soletrou a palavra. — Mas não creio ser a pessoa a quem deva agradecer o convite. — Desculpe... Helen tentava entender quando uma sombra surgiu na passagem em arco, à direita. — Não — falou Milos, agradável, sorrindo para Melissa, que tinha se virado com um sorriso triunfante para a mãe. E, quando os olhos de Helen se ajustaram à luz, ele acrescentou. — Receio ser o culpado. Estou perdoado? Helen hesitou e depois, olhando de Milos para Rhea e depois novamente para ele, disse: — Eu pensei... isto é... Maya disse que você ia para Atenas hoje. — Vou — era uma figura alta, perturbadora, de camisa preta e jeans combinando. Ele olhou para a irmã. — Rhea, por que não pede para Marisa trazer alguma bebida para nós? Estaremos na varanda. — Vou com você, Rhea — disse Melissa, imediatamente. — Está bem para você, Milos? Rhea olhou pedindo a aprovação do irmão. Todos se submetiam a este homem arrogante. Deus, por que concordara em vir? — A varanda é por aqui — disse Milos educadamente, quando estavam sozinhos, e Helen seguiu-o por um corredor fresco, azulejado, cujas paredes grossas protegiam do calor. — Meu avô construiu este lugar há mais de sessenta anos — contou ele, enquanto andavam. — Não havia estrada naquela época e era um esconderijo conveniente para os membros das forças de resistência, durante a última guerra. — Interessante. Helen foi irônica, mas não conseguiu evitar perder o fôlego de surpresa, quando saíram para a varanda. Do alto, a colina exibia as casas brancas da vila ao longe, com as torres de igrejas aparecendo através das copas das árvores. Era deslumbrante. — Impressionante, ne? — murmurou Milos, encostando no muro de pedra que circundava a varanda. — Foi construído originalmente como casa de veraneio. O calor do verão em Atenas não é recomendável. — Você tem sorte por ter escolha. Então, onde estão seus pais? — Cruzando o Pacífico. E antes de você fazer outro comentário seco, devo dizer que meu pai teve um ataque do coração no início do ano e foi forçado a se aposentar. Se não, ele mesmo iria à conferência em Atenas. — Sinto muito. — E sentia. Depois de um momento Milos virou-se, colocando a mão perto da dela, que ficou tensa. — Gostaria de ver onde moro quando estou na ilha? — A voz dele estava mais rouca, e Helen precisou se controlar para não se afastar. — Por quê? Melissa me contou sobre ela. — Ouvir dizer é diferente — insistiu ele, suavemente. Os olhos dele passaram pelos seus lábios, antes de abaixar para o decote. — Venha comigo, Helen. Quero provar que não sou o bastardo egoísta que me julga. — Eu não o julgo, nem bem nem mal. Melissa e sua irmã estão demorando. Acha que devemos apressá-las? — Acho que você devia ficar exatamente onde está — respondeu Milos, rouco. De repente, a mão dele fechou no seu pulso. — Quanto tempo vai ficar assim, Helen? Negando que me queria como eu a queria, anos atrás? — Querer é uma palavra operacional. — Ela estava quase sem fôlego. — Você esquece que eu não sabia que era casado, Milos. Eu mudei de idéia quando sua esposa explicou porque, realmente, você tinha ido à Inglaterra. — Minha esposa explicou? — Milos parecia incrédulo, mas apertou o pulso dela, puxando-a para mais perto. — Minha esposa e eu estávamos separados havia muito tempo, quando fui para a Inglaterra. Não sei de quem recebeu informações, mas posso garantir que isso é verdade. — Pena que sua esposa não via assim. Solte-me, Milos. Ou quer que sua irmã veja quão mal trata os seus hóspedes? — Você não imagina quão mal posso tratá-la. E não me importo com o que Rhea possa pensar. Imagino como você reagiria se estivesse nua. Teria qualquer efeito em sua pequena alma desleal? — Teria qualquer efeito na sua? — Ah, sim. — A resposta dele foi imediata, virando-se e apertando-a contra a parede, o corpo rijo pressionando o dela. — Agora, diga-me que não significamos nada para você. Diga que não tem lembranças duradouras daquela noite. O pânico a invadiu. Tudo isso seria uma sedução planejada para fazê-la confessar? Era esperto. Porque, exatamente agora, ela estava tentada a desistir, sentindo o seu corpo contra o dela. Felizmente, não aconteceu. Os lábios dele mal tinham roçado os seus quando ouviram vozes. Melissa e Rhea se aproximavam, rindo e conversando. Milos gemeu, se afastando. Helen não se recuperou tão facilmente. Seu rosto estava afogueado e sabia que Melissa notaria. Mas, se o fez, não disse nada, deixando a preocupação para Rhea. — Aqui está quente demais para você, Helen? — Não... estou bem — mas Rhea pareceu em dúvida. — Podemos sentar na sombra — ela falou, acenando para um alpendre coberto de buganvílias. — Marisa já vem com a bandeja. — Que bom. — Rhea e eu vamos até a praia nadar, mãe. Se quiser, pode vir conosco — exclamou Melissa. — Parece convidativo — disse Helen, mas Milos interveio. — Estou planejando mostrar à sua mãe um pouco da ilha esta manhã. Acho que ela viu muito pouco até agora. — Ah, acho que nadar parece melhor do que andar num carro quente — protestou Helen. — Você pode nadar em Vassilios — declarou ele, determinado. — Tenho certeza de que Rhea e Melissa não precisam de uma acompanhante, não é? — É, mãe — concordou Melissa, enquanto Marisa chegava com a bandeja, e aproveitou para encerrar a discussão. — Mmm, adoro limonada! — Então... está combinado. — Milos sentou diante de Helen. — Bem, nos encontraremos aqui para o almoço, né? Depois que as garotas partiram no buggy de Rhea, Helen olhou-o, com raiva. — Eu não vou, Milos. Podemos conversar aqui. Não em Vassilios. — Está com medo de mim, Helen? Estava, mas não ia admitir. — Só acho que seria mais... sensato, se ficássemos aqui. Melissa e Rhea não vão demorar. — Vão demorar o suficiente. Vamos, o que tem a perder?
|
|||
|