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Sonhar de um estudante de engenharia, de vinte e seis anos, sem quaisquer sintomas específicos de psiconeurose, meramente “cheio de” problemas. 6 страницаra tio natural, seja desperta ou sonhando, não tem em mente qualquer ente objetivo, material ou imaterial; Ela se refere à soma de todas as maneiras de viver que lhe pertencem no momento, e de todos os modos de percepção e comportamento que constituem o “eu”. existente entre o estado desperto e o sonhar. O simples fato de o sonhar e o estardesperto serem experienciados como dois modosexistenciais distintos, que podemos distinguir um do outro,sugere umabase intuitiva parafazê -lo Duas coisas podem serdistinguidas apenas com base numa terceira que englobe a ambas. Podemosdiferenciar ovennelho do verde somente porque ambos fazemparte de algo que chamamos de cor. Enquanto nãotivermos captado anatureza da cor, nem o vermelho nem o verde podemexistir para nós. A questãoque se nos deparaagora é:qual é a coisaespecífica que une os estados de sonhar e estar desperto? No que concerne ao sonhar do nosso recruta com um gigante cruel, para tomarum exemplo,podemos legi timamentperguntar — embora a nossa perguntanão seja dirigida para qual que “interpretação do sonho”:que elemento comum encontrado nos esta do despertos antes e depois do sonharpoderiam ter dadoorigem ao mundo dosonho emsi? Notamos naessência do sonhar-com-”gigante” umestado de espírito de pânico ansioso. Oque poderia terprovocado talataque de • medo? A nossa primeira— é afreqüência incomum com que sonhos de aniquilação visitam recrutas do exércitoconto grupo. Para muitos recrutas, alistar-se significa ser repentinamente tirado da acolhedoravida familiar que existe no moderno estado debem-estar social. É porisso que tantos vêem a suaconvocação para o exército como umaconversão forçada a unia vida de subordinação;trata-se de umasubmissão involuntária à disciplina absoluta dahierarquia militar masculina, aqual, graças ao enorme poder que exerce, podeexigir esforçossobre-humanos dos novos recrutas. Considerando-se to daessas coisas, então, o simples fato decomeçar otreinamento básico era suficiente para criar no nosso sujeito o tipo de estado de ânimo depressivo • eansioso que poderiapreceder um sonho comum gigante ameaçador. O recruta tentou, é claro,ocultar este estado de ânimo quandodesperto, mas omodo existencial doseu sonhar traiuos seus esforços. O estado de ansie dad não sópersistiu, masna verdade eclodiu no sonhar,inundando e per meandtoda aexistência dosonhador. Emqualquer estado de ansiedade, por exemplo, no pânico, ocampo aberto perceptivocom qual o ser huma n basicamente existe fica limitado atal poMo queapenas os traços amea çadore de tudo aquilo que eleencontra conseguem agora penetrar no “cam p de visão” da suaexistência. Assim, aexistência do sonhador tornou-se não-receptiva aoutra coisa que não alguma imensa forçaameaçadora. Se tal estado de espírito ouafinação determina o estado de abertura para o mundo do Dasein, uma compreensãodesse estado de espírito é importante, não só noque concerne o exemplo presente, mas também para o valor tera pêutic de qualquer teoria sólida do sonhar. Pois vezes e vezes repetidas aconteceque um sonhador experienciacom intensidade não precedenteal gu estado de espírito que prevaleceu durante osonhar anterior, mas que Perdeu qualquer impacto arrebatador na existência cotidiana, comsua divi 58 são numa abundância de relações diversas. Ocorre repetidamente que um sonhador se compromete com um estado de espírito com unia intensidade e sinceridade sem precedentes em sua vida desperta. Um estado de espírito que não é adequadamente admitido na vigília pode então predominar e evocar seres e eventos oníricos que lhe correspondam, cujos significados lhe sejam apropriados — no nosso exemplo, um Golias — e que adquirem uma proximidade impressionante, inevitável e às vezes desagradável com o sonhador. Quando um paciente em terapia é levado a tomar consciência de tais fatos oníricos, ele não consegue mais desprezar seus estados de espírito e ligações despertas correspondentes. • zar realmente a vida. Mas os sonhos geralmente tenninani com o pensamento de que a seria deixar o sonho em paz e emvez disso apontaro potencial demaior auto-afirmaçãona existência desperta dopaciente.6 Exemplo 7 Eu me arrastava pelas ruas e matei uma mulher estrangulando-a com uni barbante. Não foi o único assassinato essa noite. Cometi três assassinatos ao todo, simplesmente pelo prazer de matar. As outras duas mulheres eu esfaqueei em vez de sufocar. Depois de um tempo longo fui apanhado e, apesar das minhas teimosas negativas, fui condenado à morte na forca. Acordei apavorado exatamente quando eles estavam colocando o laço em tomo do meu pescoço. Este é osonho mais suspeito entre todos os relatados por jovens considerados completamente sadios, tanto por si mesmos quanto por outras pessoas que os conhecem, O rapaz de vinte e quatro anos em questão não exibia qualquer sintoma neurótico ou psicossomático em sua vida desperta, e tampouco seu caráter era particularinente surpreendente. Ele se relacionava com mulheres, nenhuma das quais pensou em assassinar enquanto desperto. Mas à noite, ao sonhar, desfazia-se de qualquer mulher que encontrasse, não por vingaça ou por raiva, mas “só por prazer”. Uma vez que este é umsonho que do ponto de vista freudiano seria rotulado como sonho de realização de um desejo, ele propicia uma excelente oportunidade para desmantelar o conceito de realização de desejo bem coajo para ilustrar a abordagem fenomenológica. No seu sonhar não existe evidência alguma de um desejo; desejar é supérfluo,considerando que o sonhador descobre a si próprio já noprocesso de assassinar mulheres. E mesmo que tivesse sentido qualquer necessidade de matar mulheresna sua vida desperta, o que não era o caso, ainda assim seria errôneo considerar este sonho como arealização de um desejo. Não é sequer justo, apenas com base neste sonhar, atribuir “desejos de morte inconscientes” ao sonhador emsua vidadesperta. Tendo em conta a facilidade com que a psicologia moderna emprega o termo “desejo inconsciente”, nunca é demaissalientar que ele se refere a algo que não pode existir. Falar em desejos inconscientes tem a nrsnialógica do quefalar em madeira metálica. Nãoexiste nada semelhante a um de. sejar isolado. Odesejar deve existir emrelação a alguma coisa desejável, em relação a alguma presença ci4asignificação tenha sido reconhecida pelo me- nos comoalgo desejável. Todo ato de desejar pressupõe o conhecimento de umaentidade significante. Como é possível que uma pessoasaiba uma coisa e, ao mesmo tempo não saiba, seja “inconsciente” dela? Tnt’igine que contorções são necessárias para dar a este paradoxo uma aparência deviabilidade. Mas depois falaremos mais sobre isso.” Oque permanece incontestável éque o recruta assassinou todas asmulheres que encontrou enquanto sonhava. De todas asmaneiras possíveisde umjovem se comportar em relação àsmulheres, apenas a de matar se mostrou acessível a ele. Este padrão único de comportamento édiametralmente oposto àconduta de uma relaçãoamorosa normal, Oamor maduro Implica 62 em reconhecer todo o potencial de vida presente no parceiro amado, e umadisposição de lutarcom todo oseu ser pela realização plena da existência do parceiro. Mas onosso recrutanão só mata as mulheres, ele tem prazer nisse.Àgora, um Dasein humano está afinadocom oprazer sempreque lhe épermitido envolver-senum relacionamentofundamental com aquiloque encontra, edesta forma aproximar-se de uma auto-realização. Até mesmo oprocesso de preparar-se paraeliminar obstáculos aesta realização traz prazer; é um estado de prazerantecipado. Aseqüência do sonho em sifala apenas do matar prazenteiramentetrês mulheres, e de umaresultante sentença de morte, àparte 4a circunstânciaadicional de que os maus atos ocorrem à noite. Tomandotoda aexistência onírica dorecruta, no momento do seucrime o relatoacima abrange o conteúdo esignificação total do sonho. Não existe nada além disto, nem ocultonem manifesto. Se no seu estado desperto subseqüente ele é capaz dever um significado muito major nos seusassassinatos sonhados e no sentimento de culpa que sente sonhando, isto é outra estória. Um procedimento terapêutico baseado nateoria Daseinsanalítica dos sonhos principiaria fazendo com que osonhador acordado dissesse se tem alguma coisa contra as mulheres nasua vida desperta. A experiênciamostra que opaciente começaria então avisualizar mais e mais incidentes específicos dasua vida despertapassada, quecontinuam aprojetar uma sombra escura nopresente do sujeito, reduzindo toda a gama do seu comportamentoexistencial em relação às mulheres, até incluir em sonhos apenas a possibilidade de matar, Ocontexto motivacional da história de vida desperta do pacientedeveria deixar claro quemulheres adultas sempre seinterpuseram aoseu desenvolvimento rumo a uma identidade independente esegura de si, e, conseqüentemente, sópoderiam aparecer comomerecedoras deaniquilação, jamais dignas de amor. Finalmente, o paciente tomariaconsciência de que um dosdois seguhitesconjuntos de circunstâncias é decisivo para o seu últimosonho. Ou sua mãe esuas sucessoras oviolaram impedindo o seu crescimento humano, ou eleseria surpreendido com o conhecimento do fato de que a suaprópria ligaçãoinfantil com a mãe lhe permitira enxergá-la apenas como unia prisão que lhe negava acesso à maturidade. Talvez ele reconhecesse simultaneamente ambas as circunstâncias como motivos para o seu recente sonho de estar matando mulheres. Obviamente, sua mãe jamais aparece no sonhar, que gira em tomo de três mulheres totalmente estranhas, Não hánada nessas mulheres capaz de amparar a alegação de queelas na verdade“significavam” asua mie:as mulheres sonhadas são estranhas, nada mais. Se uma pessoa, con»resultado docomportamento patogênico da mie ou poralguma fraqueza pessoal, permanece uma criança subordinada até muito depois de ter atingido sua maioridade oficial, geralmente lhe permanece uma percepção reduzi- 63 i da patologicamente, e não apenas Infantil. Da infância em diante, sua existência tomou-se rigidamente estabelecida como um “campo de visão” restrito; o que explica por quê, como adulto, ele continua a ver todas as mulheres no papel de mãe; e, se o comportamento da sua própria mãe lhe era venenoso e tolhedor, todas as mulheres são vistas como criaturas más que merecem a morte. No entanto, o que se passa aqui não é umamudança “dentro” do sonhador, dando a entender especificamente uma “transposição”, “transferência” de afetos na verdade pertencentes a uma representação “interna” da mãe - Ao contrário, a existência da pessoa como sendo um campo de percepção, de visão, persiste da maneira como foi na infincia, de modo que o rapaz precisa enxergar todas as mulheres exatamente como as via e experiendava nasua infinda. Aabordagem Daseinsanalítica oferece também uma visão de todas as outras variedades de “sonhos de culpa” que ocorrem em seres humanos neuróticos e sadios, ainda que muitas dessas pessoas semantenham totalmente inconscientes daquilo de que sentem culpa, ou são acusadas de fazer, durante o sonhar. Tais pessoas freqüentemente sabem menos a respeito de si mesmas enquanto sonham do que o nosso recruta assassino, jamais citegando a reconhecer a fonte de sua culpa. Dependendo das perguntas de um terapeuta experiente, o significado de todos os tipos de “sonhos de culpa” pode ser entendido. Àluz do seu padrão desperto de existência, os pacientes podemperceber que a culpa que experienciaram ao sonhar- seja ela revelada em sonho através de uma pessoa específica, uma tarefaconcreta oualgo ainda vago— acha-sebaseada naculpa mais fundamental, existencial detoda a humanidade. A culpaontológica dos sereshumanos écaracterística fundamental porque aspessoas nunca conseguem desenvolvertodas suas possibilidades existenciais, e portanto contraem uma dívida consigomesmo. Em qualquermomento, umser humano écapaz de se engajar em apenas uma dasmúltiplas relações possíveis queconstituem a sua existência. Todas as outras possibilidades permanecem irrealizadas naquele momento. Alémdisso, novas exigências estãoconstantemente lhe acenando do futuro,exigências estas que eleainda não está apto a responder, e cujasatisfação precisa ser então adiada. Aculpa é, portanto, parte inerente da existência humana; elajamais podeser exterminada, sejapela psicanálisefreudiana, sejapela psicologiaanalítica deJung, s4a pelaDaseinsanálise. Ovelho sonho de Freud deutilizar a psicanálise para restaurar apresumida inocência dos selvagens dostempos primitivos, ou de uma criança,está ultrapassado. Entretanto,nem todo mundo precisaatravessar o sofrimento deter sonhos de culpa, apesar daculpa existencialuniversal do homem. A experiência nos contaque os sonhos de culpa só atormentam aqueles cuja dívidacom seu desenvolvimento existencial é consideravelmente maior do que o absolutamente necessário. Pode ser que eles obstinadamente se recusem aatender todo e qualquer chamado deseres com osquais o engajamentonuma relação seria muitoimpor. tente para seu desenvolvimentoexistencial. Pode sertambém que alguma redução neurótica,pseudomoralista na sua receptividade existencialtenha sidoprovocada numa idade muitoprematura, impedindo-os de se relacionar livremente com essesmesmos entes.Sonhos de culpaneuróticos desaparecemfreqüentemente quandotais pessoas se libertampor meio da terapia. Pois entãolhes é permitido responder com todo oseu ser a qualquer coisaque se lhes dirija;isto é, aprendem a viver de forma verdadeiramente humana.
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