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Sonhar de um estudante de engenharia, de vinte e seis anos, sem quaisquer sintomas específicos de psiconeurose, meramente “cheio de” problemas. 1 страница



 

Na noite passada eu sonhei...

 

Medard Boss

 

3ª edição

Editora summus – 1979

 

Coleção novas buscas em psicoterapia volume 9

 

SOBRE O TÍTULO DA OBRA No original alemão este livro recebeu o título de “Es tráumte mir vergangene Nacht”. As traduções para o inglês — “1 Dreamt Last Night” — e para o português — “Na noite passada eu sonhei...” — mantem-se fiéis à intenção do autor na medida em que este escolheu, como ele próprio faz ver no início do primeiro capítulo, uma expressão que caracteriza a forma pela qual pacientes costumam iniciar seus relatos de sonhos. Contudo, faz-se necessáiia uma observação. Em português e inglês temos uma forma verbal ativa — eu sonhei e I Dreamt — que em alemão corresponderia a Ich habe getreiumt. Oautor preferiu, porém, a forma passiva es trdwnte niir, que poderia ser traduzida comome ocorreu um sonho, me veio um sonho, ou,usando uma expressão da gíria atual,me pintou” um sonho. Tal escolha não é fortuita e está intimamente relacionada com concepções de Medard Boss, com as quais o leitor travará contato no último capítulo “ANatureza de Sonhar e do Estar Desperto.” Preferimos manter a forma mais comum e consagrada — Na noite passada eu sonhei... chamando porém a atenção do leitorpara este detalhe, que julgamos de importânciapara a compreensão doespírito que nortela a abordagem de Medard Boss. O Tradutor 9

APRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO BRASILEIRA
A idéia de traduzir o livrodo Prof.Dr. Medard Boss “ES Trãuinte mir vergangene Nacht” e a sua posterior efetivação foi decorrência do recente seminário que teve lugar em São Paulo, sob sua direção, no setor de pósgraduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, tendo como tema “A compreensão Daseinsanalítica dos Sonhos”.
Esse seminário, que despertou grande interesse, serviu de estímulo não somente para una nova maneira de compreender os sonhos, mas também para a Daseinsanálise demodo geral. Assim sendo, não surpreendeu que logo após a partida do Prof. Boas, os ensinamentos por ele trazidos no que diz respeito a uma maior e mais plena compreensão do homem tivessem acolhida. Foi precisamente para que esses ensinamentos pudessem alcançar maior n4 mero de interessados, tivessem eles ou não já algum contato com as idéias do Prof. Medard Boas, que esta obra sobre os sonhos teve a sua tradução realiuda.
“Na noite passada eu sonhei” éo seu segundo livro sobre os sonhos. Oprimeiro foi publicado em 1953 sob o título “Der Traum und seine Aimlegung “O Desvelanrnto dos Sonhos” e ainda não se encontra traduzido pala o português. Apesar do interesse que esta primeira obra possa ter, ela não érequisito indispensável para o desenvolvimento dostemas aqui aborda. dos, pois quando estamos verdadeiramente empenhados na bnde compreensão de algo não importa por onde Iniciamos, desde que sempre tenhamos diante denós aquilo que procuramos. O presente livro abreessa oportunidade para quem quiser aprofundar-se no fenômeno dosonhar. ‘Na noite passada eu sonhei “aborda aspectos tanto teóricos quanto práticos. No seu aspecto mais teórico, a tentativa de Medard Boas éesclarecer como nos afastamos da compreensão dos sonhos quando, àsemelhança das alucinações e delírios, dizemos que eles não correspondem àrealidade. Neste sentido,
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eles já aparecem comoalgo secundário, máscara do real ou, simplesmente, menos verdadeiros.Esses significados também se mostram nasexpressões de usocotidiano tais como “ele éapenas um sonhador, longe da realidade”.
Mas o que quer dizer Realidade?
Martin Heidegger retoma essaquestão voltando ao mundo gregonuma tentativa derecuperar seu sentidoprimordial. Realidade era chamada de Thesis, quequeria dizer: por algo em evidência, tomá-lo presente, etambem de Fisis (Natureza),que queria dizer: criar algo, deixaralgo crescer e torná-lopresente. Nodecorrer do tempo, sob a influência e o domúiio crescentes doraciocúiio científico-matemático-tecnológico, o real se estreita para se tomarapenas objetocoisificado. Desta forma realidade é oque — ser provado e certificado através de umraciochiio lógico noconfronto entre os objetos representados e a representaçãoque se dá no interior de um sujeito pensante. Nessa objetivaçãoficam também-enredados os conteúdos dos sonhos que são então tomados comomeros objetos de pesquisa edecifraçáó. É dessa forma tambémque na expressão “tive umsonho” o verbo Ter estámais ligado à noção de posse de umobjeto, como nas expressões “tenho um carro” ou“tenho uma casa”, do que a ummodo de relacionamento comonas expressões “tenho frio” ou “tenho fome”. Assim, por maisperfeitas que sejam, todas as teorias de interpretação e explicação dos sonho8,uma vez queestão assentadas sobre essa concepção de realidade, nãoescapam do perigo de distorcê-los e de seafastarem desua compreensão; os sonhos continuam sendotomados como fenômenos secundáriosencobrindo uma realidade quenunca se mostra e cujo acesso somente se dá pela decifração e decodificação.
Superando a
restrita noção de realidade, Martin Heidegger, retoma o seu sentido primordialintroduzindo o significado de Ser-no-mundo nasua ontologia fenomenológica. Medard Boss, baseadonesta fenomenologiahermenêutica, aprofunda-se na problemática dossonhos. Oexistir-huniano — Dasein —‘ tanto no estado de vigília como no estado de sonhar, é uma clareira quepossibilita perceber, compreender e entender a totalidade dos significados de tudo que encontra no mundo. Sonhar e estar acordado sãodiferentes maneiras deexistir de um mesmoser humano e tem de fato váriascaracterísticas em comum como aafinação (disposição) básica, desdobramento depossibilidades oupoder-ser, liberdade deoptar e assumir responsabilidades, entreoutras. Medard Boss, após o estudo de inúmeros sonhos, mostraque não existe ruptura entre o modo de ser no sonhar e o modo deser navigília. Podemos, por exemplo, vernos sonhos situações de medo, desoluções científicas, de mentiras e de vivências referentes ao divino, que sempre correspondem àmesma problemática do estado de vigília. Entretanto, Medard Boss também esclarece algumas diferenças básicas e importantes entre o modo deexistir oníricoe o davigília. Nosonhar presencia-

mos em geralapenas o imediato em formasensoxialmente perceptível. Apesar dapredominância no mundoonírico do sensorialmenteperceptível como modo depresença dossignificados e dos contextos referenciaisque o constituem, é somente no estado de vigíliaque podemos refletir e compreender ossonhos demaneira mais própria e ampla. Há, portanto, diferenças básicas no modo como o Dasein no estado onírico e na vigília temporaliza, espacializa, percebe, cdmpreende eentende tudo o queencontra na sua abertura existencial.
Tudo isso é mostrado por Medard Boss não somente no seuaspecto mais teórico, masprincipalmente através do relato de grande número desonhos, cuja finalidade éfamiliarizar o leitorcom a sua maneira de compreendê-los eapontar em que medida esta compreensão pode trazer benefícios terapêuticos. Os exemplos práticos, com sem correspondentes esclarecimentos, possibilitam justamente queocorra a Repetição, estaessencial para o aprofundamento de qualquer questão. Como nosdiz Boss:“Qualquer exercícioprecisa se basear na repetição”. No entanto, não devemos tomar repetição como costumeiramente a encaramos,isto é, umprocesso automático relativo a um mesmo acontecimento ou ato. O exercício de repetição de que Boss nosfala não é arepetição automática de umatabuada que precisa ser decorada. Repetição aqui é compreendida na amplitude Heideggeriana, onderepetir recobraseu sentidoprimordial. Re-petir é fundamentalmente pedir devolta, dirigir-se de novo para,buscar outra vez,voltar a procurar. Este é o sentido do exercício de repetição propostos por Boss. A cada exemplo, a cadaesclarecimento, existe asolicitação para trazermos diante de nós, outra vez, a temática do mundoonírico e junto comesta a reflexão de modo geral dacondição humana sonhando ou em vigília. É portanto claro que os esclarecimento de Medard Boss a respeito dos sonhos e suas eventuais decorrências psicoterapêuticas devem a todo momento ser vistoscomo Possibilidades de Repetição e nunca como Modelos de Imitação, pormais tentadorque seja. Boas adverte o leitor para “não adotar as medidas aqui expostas como novas armas no seu arsenal terapêutico”. Quando os modelossão o que norteia a nossa conduta, não estamos buscando uma compreensãomais clara e ampla daquestão mas, pelo contrário, no congelamento imitativo e esquematizado dos modelos, dela nosafastamos cada vez mais, apesar da fluidasegurança doconsenso.
Não setrata, portanto, de aprender novas técnicas de utilização dos sonhos nas sessõespsicoterapêuticas, justapondo-as às já existentes num complexomosaico. Também não se trata de rejeitar os conhecimentosque precederam estas várias técnicas e as possibilitaram; pelocontrário, trata-se de superá-las através de umamaneira diferente depensar que ultrapassa oslimites do determinismo, dainterpretação causalista e dosubjetivismo cartesiano. Essa maneira de compreender os fenômenos, que está neces-

sariamente distante dos dogmas,nio por negao mas por sua superaçio, solicita a todo momento umaaproximaçffo vivencial dessesmesmos fenômenospor caminhos próprios e pessoais. Ésomente esse caminho pessoal que podenos levar a umacompreensâo adequada da possibilidade fundamental do Dasein de desvelarseu próprio ser, na descoberta doque vem a seu encontronum mundoque primordialmente co-habita, eque de fato possibilitam o entendimento da aberturaque Medard Boss nos dánessa reflexffo sobre os sonhos. SolonSpanoudis DavidCytrynowicz MARÇO DE 1979. 14

 


 


 

PREFÁCIO Este volume representa a minha segunda tentativa depenetrar na natureza dos sonhos; de obter uma compreensão nova, não tendenciosa doseu significado; e de chegara aplicações práticas a serem utilizadas por sociólogos, educadores, psicoterapeutas e práticos religiosos. A tentativa Inicial, feita cerca de vinte anos atrás, encontrou expressão num livro intitulado Der Traum und seine Auslegung (O Sonho e a sua Interpretação). Há muito esgotado, este trabalho pode ser encontrado somente em suas edições não- -alemãs. £ apropriado que agora, justamente quando a presente obra está sendo impressa, que o seu predecessor receba uma segunda edição a1emL Pois o conteúdo deste volume expande idéias salientadas na obra mais antiga. Em contraste com o intuito mais histórico, classificatório e teórico do estudo de 1953,a ênfase em Na noite passada eu sonhei acha-se colocada basicamente sobre o aspecto prático. A presenteinvestigação, sendo de naturezasuplementar, dirige-se diretamente para o cerne da questão. Com base em espécimes de sonhos conaetos e diversos, o leitor éprimeiramente reeducado a olhar para os sonhos sem o viés teórico tradicional, enxergando na experiência onírica apenas aquilo que pode ser fatualmente percebido como existente. Imediatamente após, segue-se uma discussão do que esta compreensão nova dos sonhos tem a oferecer ao sonhador quando este desperta, na forma de benefícios práticos-terapêuücos, pedagógicos e espirituais. Opresente volume tem por objetivo, portanto, ser um simples livro de exercício. Mas exercitar envolve repetição constante. Somente denxonstrando o mesmo fato em toda uma série de exemplos éque este livro pode servir o seu propósito mais importante. Somente o exercício constante pode produzir uma compreensão nova dos sonhos, urna compreensão que seja verdadeiramente fenomenológica e existencial (daseinsanalyilsch). 15

 


Obviamente, o capítulo final volta a abordar os assuntos “teóricos”, dos quais se tratou na última parte de Der flaum und reineAuslegung. O tÍtulo dado à conclusão daquela obra foi, então, ‘tie Fiage nach dciii Wesen des Traumens iii ganzen” (A Busca da Natureza Geral dos Sonhos). Carecendo de suficiente conhecimento, fui forçado a restringir meus esforços quase que inteiramente àformulação doproblema em si. Acredito que, nestes anos que separam ambos os trabalhos, examinando alguns milhares de relatos de sonhos àluz deste problema, algo mais me tenha sido ensinado, O capítulo finaLdeste volume tem portanto o título “A Natureza do Sonhar e do Estar Desperto”.
Entre os relatos de sonhos encontram-se dezenas de relatos dados por não-europeus, sadios e doentes. Algumas dessas pessoas chegaram a viajar procurando-me para análise; outras estavam sob os cuidados de terapeutas locais, que me permitiram ter consultas com elas no decorrer de minhas viagens internacionais. Os resultados são descriçõcs de experiências onízicas de norte-americanos de todas as cores: brancos, negros, amarelos e vermelhos; de sul-americanos brancos e negros, de índios dos extremos norte e sul daquele subcontunente; de homens emulheres indonésios, extraídos de cidades grandes conto Jacarta e Jogokata, mas também dos maisrecônditos cantos da ilha de Java;finalmente, há sonhos colhidos na China e no Japão. A “natureza” dosonho elaborada no capitulo finalpode ser vista, portanto, com alguma justificação, como a natureza dos sonhos humanos contemporâneos em si, e não apenas de um grupo de gente limitada social e geograficamente.
Este capítulo final, todavia, procurando definir a natureza geral dos sonhos, éescrito especiflcamente para o leitor contemplativo. Em vez de possuir um valor prático direto, ele constitui um fundo para a compreensão e aplicação das instruções terapêuticas práticas acima mencionada Pois com certeza a experiência mostra repetidamente que aqueles queacreditam queum conhecimento de regras técnicas aparentemente superficiais basta para a aplicação terapêutica de uma compreensão científica do sonhar, com freqüência aplicam suas técnicas nahora errada e nocontexto errado.
Comrespeito àterminologia, devo ressaltar que mé propus a mar “sonhar”, em lugar de “sonho”. Creio queo primeiro émais descritivo da atividade em si. Esta escolha também foi feita de modo a evitar uma objetificaç ao precipitada e exagerada daquilo que o sonhar realmente é.
A Swiss Natio,wJ Finance Foundation merece agradecimentos por seu apoio financeiro. Tambémsou grato a todos os meusalunos pelas suas sugestões e correções. E, finalmente, gostaria deagradecer a meu editor pela sua atenção costumeira e cuidadosa na elaboração e impressão deste livro.
Medard
Boss
16

 


 

ÍNDICE
Nota do Tradutor 9
Apresentação da Edição Brasileira 11
prefácio 15

Capítulo 1
Os atuais estados de conhecimento acerca dos sonhos 17
Capítulo 2
A compreendo fenomenológica ou daseinsanalítica
dos sonhos 35
Capítulo 3
A transformação do ser-no-mundo oníxico de pacientes,
no decorrer da terapia daseinsanalítica, em sua concretização ôntica 127
Capítulo 4
Comparação entre uma compreensão fenomenológica do
sonhar e a “interpretação desonhos” das “psicologias profundas” 143
Capítulo 5
A natureza dosonhar e do estar desperto 171

 


 

CAPÍTULO 1
OS ATUAIS ESTADOS DE CONHECIMENTO
ACERCA DOS SONHOS

 


Interpretações de Sonhos das
Psicologias Profundas

“Na noitepassada eusonhei...” é oinício de uma sentença que psiquiatras, psicoterapeutas epsicólogos contemporâneos ouvemmilhares de vezes. A razio de a ouviremcom tanianha freqüência é o interesseque geralmente eles têm no sonhar dos pacientes. Contudo, o interesse no sonhar nio se restringeaos psicoterapeutas modernos.Ele é tio velhoquanto o próprio homem.’

No entanto,a pesquisasistemática, do tipoque podeser alegado própriopara a ciência moderna, tem existidoapenas desde otrabalho pioneiro de Freud. A interpretaçio dos Sonhos foi publicado na virada doséculo. Aqui, Freud gosta de comparar oseu método de elaborar sobre os sonhos com o processo de decifração de textos antigos por arqueólogos. Atémesmo estes decodificadores de escrita cuneiforme,prossegue ele, até ametade do séculopassado ainda eramconsiderados visionários outapeadores. Com o tempo, porém, oscríticos foram sendo silenciados pela notávelconcordância mostrada eminterpretações do mesmo texto feitas por arqueólogos diversos.Numa analogia precisa, interpretações de um e único sonhopor numerosos “analistas corretamente escolados” deveriam corresponder àsmais elevadasexpectativas do ramo daciência freudiana.
Entretanto, foi precisamente nisto, na
sua maioresperança científica,

que Freud e todos os semdiscípulos meramente imitadores iriam ficar amar gamente desapontados. Sem suportar osimensos gastos detrabalho teórico das últimas décadas, hojetrês quartos de século depois- aopinião crítica está cada vez mais erodindo asteorias psicológicas profundas referentes à interpretação de sonhos. Osmais céticos dentre estes críticos surgemdos própriosanalistas. Seus comentários carregam um peso incomparavelniente

 


maior do que toda a oposição, os reproches emotivos levantados contra a psicanálise na sua infância por colegas de Freud que não tinham a mais vaga idéia da metodologia analítica.
Os quatros exemplos a seguir, extraídos de um largo corpo de evidências críticas, revelam bastante da situação catastrófica em que se encontra hoje “a arte de interpretação de sonhos da psicologia profunda. Todos os quatro provêm de testemunhas experientes e irrepreensíveis. A primeira dessas testemunhas, LUdWig Wittgenstein, autodenomina-se “discípulo” e aluno de Freud. Ele é também um dos pais da lógica científica moderna, e desta fonna particularmente qualificado para avaliar a validade científica da teoria freudiana dos sonhos. E ele o faz, meticulosaniente. Os três críticos citados em seguida são psicanalistas praticantes, “corretamente escolado?’. Portanto, também eles sabem muito bemo que é a psicanálise. Dentro da esfera lingü ística alemã, Ott3 me precedeu ao chamar a atenção para o testemunho de Wittgensteia4 O segundo crítico aqui citado é Richard M. lones. 5 Os dois julgamentos finais foram feitos pelos psicanalistas M. D. Zane e 1.1. H. Eckhardt, e podem ser encontrados num livro editado por 3. H. Masserman6
Na terceira de suas ‘Palestras sobre Estética”, nas quais este termo é empregado no seu sentido mais amplo significando “a percepção do centeCido,” Wlttgenstein ilustra a sua noção dos limites da linguagem científica através de uma crítica à teoria freudiana dos sonhos. Ele menciona um exemplo que Freud chamou de ‘lindo sonho”. Neste sonho, uma paciente desce de uma elevação, avista flores e arbustos, quebra um galho de árvore, e outras coisas mais. Preud, escreve Wittgenstein, interpretaria o sonho com base puramente em associações sexuais, “o material sexual mais grosseiro, as mais abomináveis Indecências - indecências de A a Z,por assim dizer”? “Mas”, Wlttgenstein imediatamente replica, “o sonho em si não foi lindo? Eu diria àpaciente: ‘Estas associações deixam o sonho feio? Ele foi lindo, e por que não haveria de ser?’ Sinto-ar inclinado a pensar que Freud tape ou a sua paciente.” Naturalmente Wittgenstein não pretende dizer que Freud levou a paciente por um caminho errado intencionahnente. Apenas quer dizer que Freud lhe ofereceu uma explicaçãb que não condiz com o conteúdo da sua experiência onírica, uma interpretação que pretende ser uma explicação mas não é.‘Pois explicações genéticas jamais captam (nem sequer parcialmente) o conteúdo experiendal de algo!’
Num trecho posterior da mesma palestra, Wittgenstein retorna ao problema do “lindo sonho” e diz: “As sentenças que nos dizem que ‘Isto é n1z realidade outra coisa’ são aquelas que, acima de tudo, assumem a forma de persuasão, querendo dizer que somos persuadidos a negligenciar certas distinções que na verdade existem.” Wittgenstein conclui a sua crítica ao caráter científico da teoria freudiana comentando: “Isso me faz recordar o

maravilhoso dito: ‘Cada coisa éo que é,e não outra coisa qualquer’ “ Mas aqui Wittgenstein, o lógico,já está se referindo a uma metodologia inteiramente diferente, não menos capaz do que a pesquisa científica natural derevelar a verdade, ci4aelaboração constitui o alvo único deste livro. Pois presumivelmente, ao citar seu “maravilhoso dito”, Wittgenstein tinha em mente o aforismo de Goethe: “Não procure nada por mis dos fenômenos; eles próprios são a lição!”° E também o grito de Husserl: “Voltem às coisas mesmas!” Ambos são convites a uma nova maneira de pensar, uma maneira que podemos chamar de fenomenológica. Este novo pensar significa afastarse, radical e penuanentemente, detodos os procedimentos científicos anteriores. Estes investigadores adeptos das ciências naturais tendem a abandona,, o mais depressa possível, os seus objetos com suas diferentes qualidades conforme são percebidos de imediato, em favor de “mbstratos” quantiflcáveis e processos energéticos meramente presumidos como existentes em algum lugar por trás das qualidades observáveis. A abordagem fenomenológica, ao contrário, procura evitar conclusões exclusivamente ‘lógicas” e em lugar disso apega-se às coisas fatualmente observáveis, visando penetrar no seu significado e contexto com umrefinamento e precisão sempre maiores, até que aprópria essência delas sejatotalmente reconhecida.
Por outro lado, R. M. Jonespropõe-se à gigantesca tarefa de fornecer um apanhado geral de todas as modernas teorias de sonhos, de Freud a Erlkson. Sua pesquisa culminana resignada admissãode que a literatura sobre sonhos até hoje não tem sidonada mais doque uma multiplicidade de especulações, nenhuma delas merecendo preferência sobre as outras. Jones, fazendo eco aSnyder, compara os pesquisadores de sonhoscom os proverbiais cegos que tentam descobrir a natureza do elefante. Cada um deles toca uma parte distintado corpo do animal. Um, segurandouma perna, toma-o erroneamente por unia coluna; outro agarra a cauda e conclui que o elefante éuma borla de mobulia;e assim pordiante.
Ainda mais deprimentes são as críticas àteoria freudiana dos sonhos que apetecem nos artigos dos psicanalistas M. D. Zane e M. H. Eckhardt. Ambos os artigos acham-se incluídos nos capítulos finais do livro editado por Masserman, Dream Dynarnics.” Os autores percorrem vias semelhantes às percorridas uma vez pelaRoyal Asiatic Society, quando suas investigações deantigos escritoscuneiformes inspiraram Freud com tão grandes esperanças para a sua teoria de sonhos. A diferença é que os resultadosproduddos porZane e Eckhardt foramda mesmaespécie que teria confirmado as críticas aos intérpretes de textos cuneiformes. Zane e Eckhardt relatam os resultados de umsimpósio sobre sonhosorganizado, por um período de cinco anos, pelos membros da Academia Americana de Psicanálise. A avaliação dosimpósio feita por Zane principia com umcomentário estarrecedor: “Nada parece mais importante para o nosso campo do queconfrontar a recorrente



  

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