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CAPÍTULO VI



 

Quando Dom Diablo lhe disse que teria que se ausentar por uma semana, Paula nã o disfarç o, sua sensaç ã o de alí vio! Finalmente poderia ficar livre de seu olhar vigilante, ainda que fosse por pouco tempo!

— Parece muito satisfeita com esta minha viagem — disse ele secamente. Contou-lhe entã o que iria para a Argentina, onde trataria de negó cios relacionados com gado e cavalos. — Pode ir comigo, se quiser — sugeriu. — Vou comprar um garanhã o e umas é guas, uma das quais poderá ser sua, se quiser montar. Por um breve instante se sentiu tentada com a perspectiva de uma viagem, poré m desejava ainda mais ardentemente ficar livre uns dias, durante os quais talvez pudesse retomar contato com Gil Howard.

— Enquanto estiver fora, senhor, posso usar o seu carro? Juan Feliz poderá me levar à cidade para ver as lojas, isso me distrairia um pouco desta monotonia do campo. Por favor, deixa?

Dom Diablo arqueou as sobrancelhas ao ouvir a sua voz tã o doce, quase suplicante, e disse:

— Está sendo muito convincente! Estou quase me arrependendo e me decidindo a levá -la comigo. Nã o me agrada deixá -la sozinha uma semana inteira...

— Sozinha? — Seu coraç ã o começ ou a bater descompassadamente como um aviso de que devia ser mais cautelosa, senã o acabaria outra vez em seus braç os possessivos. — Tenho a certeza de que daria ordens severas para que Juan Feliz nã o me perdesse de vista um segundo sequer...

— Quanto a isso nã o resta dú vida. Eu nunca lhe perguntei antes, Paula, mas você sabe dirigir? — Olhava para ela tentando adivinhar o que ela escondia sob aquela má scara de brancura. Apesar de nunca ter tirado a carteira de motorista, aprendera a dirigir com Marcus, que aliá s fora bastante eficiente como professor. Marcus lhe ensinara tantas coisas, a ú nica que nã o lhe ensinara fora jogar cartas, com todas as suas artes e trapaç as. Sob alguns aspectos ele era muito conservador. Achava que a eficiê ncia de uma mulher nã o devia comprometer sua feminilidade. Na verdade, Paula sempre dirigira o carro com Marcus ao seu lado.

— Sei. Mas Marcus nunca me deixou dirigir sozinha. Sempre estava a meu lado — respondeu Paula, tentando parecer normal. – À s vezes dizia que ia me comprar um carro, mas morreu antes de cumprir sua promessa. Meu aniversá rio estava pró ximo e o carro seria o meu presente. Foi o destino que decidiu assim... Pobre Marcus! – Um pouco agitada, Paula mordeu os lá bios esperando que mencionando o nome de Marcus desviaria a atenç ã o do assunto dela poder guiar ou nã o. Poré m, Dom Diablo continuava com o cenho franzido. Levantou-se entã o abruptamente, o charuto seguro entre os dentes.

— Tenho que escrever algumas cartas — disse ele e dirigiu-se à porta da sala de estar, parando um instante para olhar para ela. — Muito bem, fique entã o na fazenda se preferir. Talvez nã o queira fingir que é uma esposa feliz diante de meus amigos. Darei ordens a Juan Feliz para que a leve à cidade quando quiser, mas nada de tapeaç õ es, ouviu?

— Sim, senhor — respondeu Paula. Poré m ela só se sentiu mais tranqü ila quando a porta se fechou atrá s dele. Fez-se silê ncio na sala, persistindo apenas o perfume de seu charuto e o eco de suas palavras... Paula deixou-se cair no sofá. Ele se tornava demoní aco quando provocavam a sua ira e Paula sabia que quando ele estivesse fora nã o resistiria à tentaç ã o de pegar o carro, escondida do chofer. Ele nã o poderia punir Juan Feliz por algo que ela fizesse. Seria uma injustiç a, pois Juan tinha uma famí lia grande para sustentar. Se conseguisse alguns momentos de liberdade, poderia até aceitar o castigo que viesse depois. O fato de ser constantemente vigiada fazia com que se tornasse mais intensa a sua sede de liberdade. Poderia bater um papo despreocupado com Gil Howard novamente sem ter que ficar na defensiva o tempo todo como quando conversava com Dom Diablo.

Ele partiu repentinamente numa manhã. Antes de sair, entrou no quarto de Paula para lhe dizer adeus. Inclinou-se sobre ela, recostada nos travesseiros, o cabelo brilhante espalhado sobre a seda branca da fronha, e abraç ou-a fortemente.

— Posso esperar que sinta a minha falta? — perguntou, olhando-a fixamente. Apesar de ele ter passado parte da noite em claro, tentando salvar um potro que caí ra no fosso, seu corpo emanava forç a e vitalidade. Paula o ajudara e até chorara quando conseguiram tirar o potrinho que correu imediatamente para junto da mã e. Sentia-se trê mula, os nervos à flor da pele...

— Por Deus, como você é bonita! — exclamou ele em voz baixa. — Nã o pode imaginar como está maravilhosa aí na cama, tã o loira, tã o frá gil! Eu poderia quebrá -la com as minhas mã os, e saiba que é o que farei se você me trair ou mesmo olhar para outro homem. Você é minha e eu nã o queria deixá -la sozinha. Venha comigo! Tenho certeza de que vai gostar!

— Nã o! — virou o rosto, apertando-o contra o travesseiro e comprimindo, involuntariamente, os seios com as mã os como se para se proteger. — Dê -me um pouco de tempo antes que eu possa encontrar os seus amigos. Nã o conseguirei fingir que estou loucamente apaixonada por você, bem sabe disso. — A estas palavras, seguiu-se um silê ncio constrangedor. Forç ou-a a olhar para ele, segurando-a pelos ombros, num gesto firme.

— Entã o, pelo menos, me dê um beijo de despedida, mas um beijo de verdade!

— Está bem! — concordou passivamente, enquanto os lá bios dele comprimiam os seus. Entã o, como se a sua condescendê ncia gelada tivesse desencadeado nele o demô nio, seu beijo tornou-se cruel e exigente, queimando a sua boca. Os olhos dele se detiveram nela como se quisesse memorizar todos os detalhes de seu corpo e de seu rosto antes de deixá -la. Tomou entre os dedos uma mecha de seus cabelos, levando-a aos lá bios. Foi entã o que Paula se lembrou da noite anterior quando ele salvou o potrinho. Os lá bios dele pousaram em seus ombros nus. Ela puxou os lenç ó is para se cobrir, tornando-se entã o distante e fria como um bloco de gelo em seus braç os. Ele entã o deixou-a e levantou-se da cama, ajeitando a gravata e os cabelos negros e lisos.

— Vim para lhe dizer adeus, Paula. Podia ao menos me desejar boa viagem! Será que está fazendo votos para que o aviã o caia? — perguntou. Antes que ela pudesse responder, ele se dirigiu à porta e acrescentou: — Diz o ditado: " O demô nio cuida do que é seu". Por isso, eu, em seu lugar, nã o teria muita esperanç a de ficar viú va.

Com estas palavras deixou o quarto. Paula estava perplexa. Um arrepio percorreu seu corpo. Atirou as cobertas para o lado e correu para a porta. Nã o podia deixá -lo ir embora assim, pensando que ela era tã o má, principalmente depois da noite anterior. Ele lutara tanto para salvar o potrinho que nã o podia ser duro e frio como queria demonstrar!

— Senhor! — gritou, mas o corredor estava vazio e sua voz ressoou em vã o. Ouviu entã o o barulho do motor. O carro já saí a pelos portõ es da fazenda, deixando-a como tanto desejara, sozinha e dona de seu nariz!

De volta ao quarto olhou ao seu redor. Sentiu uma sensaç ã o estranha. Pela primeira vez, apó s vá rias semanas, tomaria sozinha o café da manhã. Uma curiosa e desagradá vel sensaç ã o se apoderou dela enquanto se dirigia ao banheiro e se olhava no espelho imenso. Era por ter uma figura esguia e loira, ali refletida no espelho, que se encontrava agora naquela fazenda. Dom Diablo gostara de seu corpo jovem e ela, ingenuamente, por se encontrar em situaç ã o desesperadora, deixara-se enganar... Ao entrar no chuveiro, abriu tanto as torneiras que a á gua jorrou com forç a sobre seu corpo como que para apagar de sua pele as marcas das carí cias do marido. Paula nã o queria sentir, queria se transformar em uma está tua de má rmore...

Estava no quarto pronta para se vestir quando a porta se abriu e, como sempre, Carmenteira entrou sem bater... A velha carregava um vaso de camé lias brancas para colocar sobre uma mesa de bambu. Paula sabia que as flores eram somente um pretexto que a velha usava para ter acesso à intimidade de seu quarto.

— Vai ficar sozinha por uns tempos, senhora? — perguntou Carmenteira enquanto arrumava as flores. — Mas, conhecendo bem Dom Diablo como conheç o, imagino que ele deve tê -la deixado satisfeita por pelo menos duas semanas... Pensei que fosse com ele... Nã o tem medo, senhora, que ele encontre por lá uma mulher bonita que o console da solidã o? Sabe como é, ele é um pedaç o de homem, nã o é?

Paula olhou firme para ela que, por sua vez, olhava maliciosamente para a cama do casal.

— À s vezes umas fé rias fazem bem para um casal — explicou, irritada por ter que suportar a curiosidade daquela mulher que morava ali há tantos anos e que se dava ao luxo de se intrometer na sua vida! Os olhos penetrantes da velha se pousaram na roupa que Paula acabara de pô r: uma calç a branca de pescador, amarrada logo abaixo do joelho, e uma blusa de mangas bufantes.

— Roupa de garoto! Por que usa esse tipo de roupa, senhora? Precisa usar trajes masculinos para ter mais confianç a em si mesma? Nã o gosta de ser mulher? As mulheres latinas sã o diferentes, sã o mais femininas! Desde que nascem sã o educadas para ser fonte de prazer e alegria para o homem... Mas a senhora se rebela contra seu destino!

— Destino? — repetiu Paula com desdé m. — Eu nunca teria vindo para cá se meu pai nã o tivesse estado aqui, se nã o tivesse abandonado minha mã e antes mesmo de eu nascer! Acho que o amor tem um significado diferente para o homem e para a mulher. Para a mulher significa apenas renú ncia, enquanto para o homem apenas prazer! Mas fique sabendo que nenhum homem, nem mesmo o seu patrã o, me transformará numa escrava idiota, que ronrona como uma gata quando ele está perto. Eu sou como sou, e me basto!

— Você é uma tola — disse Carmenteira. — Se pensa mesmo assim nã o merece ser dona desta fazenda, uma das mais luxuosas do Mé xico. É uma mulher frí vola e ingrata. Dom Diablo vai perceber logo a bobagem que fez se casando com você. A sua figura loira e frá gil conquistou-lhe os olhos e nã o o coraç ã o. Aliá s, sabe disso, nã o é?

— Como se atreve a ser tã o insolente? — Paula tremia de raiva por estar no meio desta gente que nã o a compreendia, nem lhe demonstrava a menor amizade. Conseguiu evitar um soluç o. Nã o queria fazer papel de idiota diante daquela velha. — Saia! — ordenou. Sua voz era dura e seus olhos estavam embaç ados. Apontava a porta. — Já ouvi demais suas insinuaç õ es malé volas! Você nã o passa de uma velha intrigueira! Mal esperou Dom Diablo virar as costas para vir aqui lanç ar seu veneno. Sei que nã o gosta de mim, nem você nem as outras pessoas desta casa. Ficam sempre me comparando com a outra mulher de Dom Diablo! Pois bem, ela morreu e eu estou viva! Nã o vou mais tolerar que entre no meu quarto sem ao menos ter a consideraç ã o de bater na porta. Sou muito inglesa e os ingleses fazem questã o de sua intimidade, ouviu bem? Como já disse, Carmenteira, eu sou a dona da fazenda e, como tal, nã o vou mais permitir que você ou qualquer dos outros empregados sejam malcriados comigo. Está entendido?

Durante todo o tempo, Carmenteira olhou para Paula com seus olhos negros e brilhantes, mas estranhamente sem o menor sinal de raiva.

— Entã o, apesar de tudo, a inglesa tem alguma coisa dentro dela! — exclamou. — Nã o é a criatura feita só de leite e mel como parecia! Apesar de tudo, senhora, nã o tem o direito de impedir uma pobre velha, que trabalhou a vida inteira para essa famí lia, de dizer o que pensa. Será que tem medo de ouvir verdades?

— Nã o tenho medo, mas sou humana. Ressinto-me poré m com as comparaç õ es que você s fazem entre mim e aquela que você s gostariam que estivesse aqui, viva, no meu lugar. Provavelmente ela a chamava todos os dias aqui no quarto para fazer confidê ncias; contar-lhe tudo sobre suas esperanç as a respeito dos futuros herdeiros desta casa. Sinto muito nã o entrar nesse esquema, mas sou inglesa e nada neste mundo fará com que eu me torne como as mulheres latinas, nem mesmo as suas bruxarias!

Carmenteira já na porta, olhava para Paula cujos olhos, cheios de lá grimas, brilhavam de raiva.

— Isso é verdade! Nunca será como uma de nó s, pois você nã o quer dar uma porç ã o de filhos a Dom Diablo! Mas seja como for, ele vai querer pelo menos um filho seu, já que se deu ao trabalho de ir até a Inglaterra só para buscá -la! Parece-me que ele soube da sua existê ncia por aquele funileiro que morou aqui há uns tempos atrá s.

— Ele era meu pai — respondeu Paula com dignidade serena. — Diga-me Carmenteira, ele está sepultado aqui nesta propriedade? Já pensei tanto sobre isto! Nã o o conheci, mas parece que ele amava minha mã e. A sua maneira, bem entendido...

— Há um pequeno cemité rio atrá s da capela — disse Carmenteira. — É lá que serei sepultada. Sabe, eu já sou muito velha. Conheci a avó de Dom Diablo quando era menina, assisti seus ú ltimos dias, segurando sua mã o na hora da morte. Mas a senhora nã o segurará a minha, quando eu estiver morrendo, nã o é verdade?

Ao ouvir essas palavras paté ticas, Paula mordeu os lá bios, pois nã o era má. Nã o gostava de fazer os outros sofrerem.

— Tenho certeza de que vai viver pelo menos até cem anos. Diga-me, Carmenteira, Dom Diablo nã o tem irmã os?

— Tinha um irmã o mais moç o, mas morreu de poliomielite, há alguns anos. Um belo jovem chamado Alvarado, alguns anos mais moç o do que Dom Diablo.

Ao ouvir isto, Paula prendeu a respiraç ã o e se lembrou do que o marido dissera a respeito da limpeza da praia, onde haviam estado.

— Que pena! Ele nunca me contou que tinha um irmã o!

— Talvez a senhora nunca tivesse perguntado. Dê um pouco de atenç ã o ao lado humano de seu marido, caso contrá rio ele poderá se transformar no demô nio que você crê que ele seja. Corre nas veias dos homens Ezreldo Ruy o sangue cruel dos colonizadores, mas uma mulher inteligente pode transformar esta crueldade em bondade...

 

Mais tarde, com uma aparê ncia fresca e perfumada, Paula atravessou o jardim até chegar à capelinha, circundada por enormes á rvores antigas. Suas paredes eram cobertas de trepadeiras floridas. Paula achou a capela fria e sombria. O piso era de má rmore polido e a virgem vestida de azul, estava num pedestal, cercada de velas acesas. Sentiu uma grande paz em seu coraç ã o. Quando Carmenteira a deixara, sentira-se muito triste e confusa. Aqueles momentos na capela pareceram aliviá -la. Foi depois até o pequeno cemité rio, carregando as camé lias brancas que Carmenteira pusera em seu quarto. Caminhou silenciosa entre os tú mulos até que finalmente encontrou um, muito simples e com uma inscriç ã o que a chocou terrivelmente:

" Charles Lennox Paget partiu deste mundo para o outro, aos quarenta e quatro anos. "

Ajoelhou-se no gramado verde e colocou as flores no tú mulo. Os pá ssaros cantavam alegremente. Ali, longe da Inglaterra, jaziam os restos do homem que ela mal conhecera e no qual poucas vezes pensara. Para ela Paget já estava morto há muito tempo. Devotara a Marcus toda a sua afeiç ã o. Como era estranho, apó s todos esses anos estar ali, junto ao tú mulo de seu pai! Lá grimas traiç oeiras encheram-lhe os olhos e Paula enxugou-as rapidamente com a mã o. Separou entã o uma camé lia e começ ou a procurar o outro tú mulo, o do jovem cunhado que nã o conhecera.

Quando saiu do cemité rio; resolveu dar um passeio pelo pomar. Entre figueiras e amoreiras havia milhares de abelhas zumbindo e trabalhando, pois existia uma grande quantidade de mel nas á rvores floridas. Respirou o ar perfumado. Era uma sensaç ã o maravilhosa, quase de embriaguez.

 

Nos dias que se seguiram Paula se preocupou em se familiarizar com a casa. Foi só no meio da semana que resolveu pedir a Juan Feliz para levá -la à cidade. Preferiu nã o arriscar indo sozinha. Durante esses poucos dias, refletiu melhor sobre suas responsabilidades. Deu-se conta de que havia muitas pessoas que dependiam de seu marido e que durante a sua ausê ncia, iam depender dela. Uma manhã, ouviu gritos estridentes vindos da cozinha. Correu para lá. Duas empregadas se engalfinhavam, agarrando-se pelos cabelos, os rostos desfigurados pela raiva e fazendo mil imprecaç õ es! Uma outra criada informou Paula que as duas estavam brigando por causa de Lothario, um rapaz que, segundo a informante, estaria enganando as duas. Apó s observar a cena por alguns instantes, Paula foi até a pia, encheu uma jarra de á gua e jogou-a sobre as duas. No mesmo instante se separaram, olhando muito chocadas para Paula. A á gua lhes escorria pelo rosto e pelo pescoç o. Os cabelos estavam ensopados!

— Nã o adianta se comportar desta maneira aqui nesta casa! — disse Paula em espanhol, calma e disposta a ser obedecida. — Se pensam que vã o fazer o que bem entendem só porque estou sozinha se enganam muito! Se isto acontecer outra vez dispensarei as duas! Esta cozinha nã o é um cortiç o! — Uma das jovens começ ou a chorar e a outra ameaç ou usar uma faca, se ela olhasse para seu namorado outra vez.

— Nã o seja idiota, Pilar. Se o rapaz é tã o mulherengo e namorador nã o vale a pena, é melhor que você ache outro namorado. É ridí culo lutar assim por um homem!

— A senhora nã o lutaria se seu homem fosse roubado por outra mulher? — replicou Pilar.

— Acho que teria um pouco de orgulho e dignidade.

— Orgulho! O que significa orgulho quando se ama algué m? — zombou Pilar.

— Se uma mulher nã o tem um mí nimo de amor-pró prio, ela nã o tem nada...

— Prefiro ter o amor, a paixã o... senhora — a jovem mexicana começ ou a sorrir, seus dentes muito brancos brilhavam. — Nã o tem o nosso sangue, por isso nã o consegue entender. Nó s conquistamos, lutamos por ele e depois tratamos de conservá -lo. Se Loreta olhar mais uma vez para meu namorado, vou lhe arrancar os olhos e farei churrasco com eles! — Ao ouvir isto, Loreta soluç ou alto e saiu correndo da cozinha. Pilar, com um ar de triunfo, continuou ali, muito empertigada.

— Nã o quero mais saber de briga — advertiu Paula. — Nã o permitirei que isso aconteç a outra vez...

Ao sair da cozinha, percebeu que as outras criadas a olhavam com respeito!

Ao enfrentar essas pequenas crises, deu-se conta do peso de sua responsabilidade. Sentiu-se entã o com o direito de algumas horas de distraç ã o na companhia de Gil Howard. Apó s ter dito a Juan Feliz para tirar o carro da garagem foi até o quarto e escolheu um vestido azul e bege que lhe caí a muito bem. Resolveu usar o colar e os brincos de pé rolas que tinham sido de sua mã e. Quando terminou de se vestir, achou-se elegante demais para um mero passeio pelas lojas. Se a velha Carmenteira a visse, ficaria desconfiada. Paula espiou do alto da escada. Estava decidida a ir até a cidade, nã o desistiria só por medo dos mexericos da velha! Carmenteira estava no saguã o, espanando os vasos de cerâ mica. Vendo-a passar, nã o resistiu:

— Entã o nã o usa mais calç as compridas? Está tã o elegante, parece pronta para ir a uma festa com um amigo...

— Como esposa de Dom Diablo, tenho que me vestir bem — replicou, tentando desarmar Carmenteira. — Nã o posso comprometer o nome de meu mestre e senhor, nã o é verdade?

— Bem, uma coisa é elegâ ncia, outra é exagero... À s vezes as culpas e os pecados de uma mulher podem estar ocultos sob um traje bonito...

— Culpas, pecados? — Paula nã o queria dar satisfaç ã o de seus atos, mas nã o conseguia evitar. — De que eu deveria me sentir culpada?

— Sabe melhor do que eu. Estive estudando as folhas de seu chá, hoje de manhã, e vi um dedo acusador e um espetá culo de fogos de artifí cio. É bem significativo, nã o acha?

— Isto é idiotice! — Percebeu que Carmenteira estava tentando adivinhar para onde ia, provocando-a. Deu um sorriso e dirigiu-se ao pá tio onde Juan Feliz esperava. Entrou no carro e disse ao chofer que a levasse à cidade para fazer compras. Juan Feliz parecia també m achar estranho o comportamento de sua patroa.

Enquanto o carro deslizava pela estrada, Paula chegou à conclusã o que todos eles a observavam, como que à espreita de qualquer erro de sua parte. Deveria ter posto um vestido mais simples, teria sido mais prudente! Afinal nã o pretendia fazer nada de mais, queria apenas bater um papo alegre e despreocupado com Gil Howard, isto é, se o encontrasse... Poderia entã o lhe falar de sua intenç ã o de sair do Mé xico, talvez ele a pudesse ajudar.

Uma hora depois o carro entrou na pequena vila, Paula retocou a maquilagem. Logo chegaram à praç a principal. A perspectiva de encontrar novamente aquele americano simpá tico a deixara de muito bom humor, embora um pouco ansiosa!

— Quanto tempo vai demorar, senhora? — perguntou Juan, ajudando-a a descer do carro.

— Quer que eu a acompanhe para carregar os pacotes?

— Mais ou menos uma hora — disse ela, dirigindo-lhe um sorriso e tentando parecer despreocupada. — Nã o pretendo comprar muita coisa. Se você quiser pode ir a um bar tomar alguma coisa. Mais ou menos à s quatro estarei de volta. Nã o se preocupe comigo... Nã o vou fugir nem deixar que Dom Diablo se zangue com você.

— Fugir! — exclamou ele, subitamente alarmado. — A senhora nunca poderia fazer uma coisa dessas!

— Está certo, Juan, eu nã o o deixaria em maus lenç ó is, conheç o bem o temperamento de meu marido. Até logo!

Caminhou rapidamente em direç ã o à s lojas, sabia poré m que Juan a acompanhava com os olhos. Rezou para que ele nã o a seguisse. Quando se viu longe do alcance de suas vistas, dirigiu-se à joalheria. Subitamente sentiu uma timidez absurda. Ficou olhando a vitrine, como se estivesse procurando algo para comprar, sem coragem de entrar. Olhava um reló gio de jade, que poderia servir para seu criado-mudo, quando sentiu uma sensaç ã o estranha como se algué m a estivesse observando. Voltou-se um pouco irritada, talvez Juan tivesse resolvido vigiá -la...

— Olhe, nã o preciso de um cã o de guarda! — disse ela e parou subitamente. À sua frente estava Gil Howard, muito bem vestido: o blazer creme, combinando com a calç a marrom, realç ava seu bronzeado.

— Pensei que uma apariç ã o tivesse chegado à cidade — disse ele. — Vi você passando ali da loja de artigos esportivos. Estava procurando um maiô e uma raquete de tê nis. Nã o pude acreditar e saí correndo para me certificar que era você mesmo!

— Eu... eu vim à cidade para comprar um reló gio — disse ela, feliz por tê -lo encontrado, poré m ainda um pouco constrangida. — Este aqui de jade, gostaria de vê -lo melhor...

— Olhe aqui, nã o gostaria que fizesse um mau negó cio. Seu marido deve ter reló gios mais bonitos e mais valiosos que este, na fazenda. A propó sito, onde está seu dono?

— Você nã o deveria falar desse jeito — protestou.

— Será que ele me tiraria a pele por isso? Como é que ele pode cuidar de negó cios, deixando uma mulher bonita como você sozinha andando por esse mercado...

Quando Gil mencionou sua beleza, Paula percebeu que mudara de expressã o. Sentiu entã o que só dependia dela o rumo que tomaria aquela amizade... Ou permitiria que aquilo continuasse ou teria que parar por ali, antes que se tornasse um namoro. Sabia que se encontrava na posiç ã o vulnerá vel de mulher dominada mas nã o amada, portanto era normal que desejasse algué m que a amasse um pouquinho!

— Meu marido foi resolver uns negó cios na Argentina.

— Puxa, foi bem longe, desta vez! E entã o você resolveu aproveitar a sua ausê ncia para comprar um reló gio...

— Se acha que nã o vale a pena, nã o falemos mais nisso, sr. Howard!

— Acho bom, mas por favor, doç ura, nã o seja tã o formal, chame-me de Gil, afinal falamos a mesma lí ngua, e é ó bvio que gostamos um do outro!

— Nã o seja tã o pretensioso! Nã o nego que estou contente por vê -lo, mas faç o questã o de esclarecer que nã o sou uma esposa à procura de distraç ã o! O que eu quero é uma pessoa com quem possa conversar amigavelmente...

— Entendo perfeitamente, Paula; nã o precisa ficar assim preocupada — sorria mais amigá vel, quase indulgente. — Eu nã o gostaria de estragar esse nosso encontro; sei muito bem que nã o está à procura de aventuras. Basta olhar para você para ver que é uma moç a distinta, uma verdadeira senhora. Escute, conheç o um lugar simpá tico onde poderí amos tomar uma xí cara de chá com pã ezinhos de minuto, você nã o gostaria?

— Claro que sim! — apertou o estô mago como se estivesse com fome. — E onde fica este lugar maravilhoso?

Ele hesitou um instante e, aproximando-se um pouco mais dela, disse:

— Meu apartamento, doç ura. Fica só a alguns passos daqui. Eu lhe prometo que comigo estará segura como um gatinho recé m-nascido junto da mã e. Nã o vou engolir você, fique tranqü ila.

Foi Paula entã o quem hesitou. Sentia novamente aquele sinal de perigo, como se o chã o se movimentasse sob os seus pé s. A sensaç ã o era tã o forte que segurou o braç o de Gil.

— Eu gostaria de tomar uma xí cara de chá e creio que posso confiar em você!

— Isso é importante — disse ele e sorriu. — Entã o, vamos!

— Está bem — concordou ela e o acompanhou. Estava um pouco atordoada, sentindo-se uma meninazinha ingê nua e tola. Dom Diablo estava a milhares de quilô metros de distâ ncia e jamais saberia que ela passara uma hora com outro homem.

 

 



  

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