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Na Voragem da Paixão 1 страницаAnne Mather “Valley Deep, Montain High”
CAPÍTULO I
Andréa Connolly sentou-se em frente à janela da sala de estar, na suíte do hotel aonde estava hospedada, contemplando a paisagem sem o menor prazer. Não via nada de notável nos hotéis e restaurantes, pintados com cores muito vivas, que se sucediam uns aos outros ao longo da rua principal de Grossfeld, ou nas montanhas coroadas de neve que se elevavam acima dos telhados da cidadezinha, impressionantes em sua magnificência. Já conhecia aquele tipo de cenário. Não era a primeira visita à Áustria e não queria estar ali. Era um absurdo que seu pai tivesse procedido daquela forma, enviando-a para lá como se fosse uma criatura indesejada, só porque não aprovava suas amizades! Pela primeira vez desejou ter uma mãe a quem pudesse recorrer. Contraiu os lábios com rebeldia. O que ele pretendia? Como poderia ter certeza de que ela não conheceria pessoas igualmente poucas recomendáveis naquele centro de esportes de inverno tão conhecido? Mas isto jamais aconteceria, porque ele enviara Janete para ficar de olho nela, e sem dúvida, sua acompanhante saberia como manter a distância os admiradores mais afoitos. Ao olhar para sua prima que se ocupava da bagagem, Andréa sentiu-se envergonhada. Aquilo não era justo. Janete era uma jovem agradável e atraente. Não era culpa dela se não tinha gostopara se vestir ou se tia Lavinia invejava o sucesso do cunhado, a ponto de viver procurando razões para criticar o estilo de vida de Andréa. Mas Patrick Connolly, o pai de Andréa, não pensara duas vezes, nem mesmo quando a própria Andréa admitiu que tinha certas dúvidas sobre sua entrada na universidade, no próximo ano. Atribuiu tudo aquilo ao grupo de jovens com quem ela andava, um bando de estudantes, artistas e marginalizados da sociedade, para quem o dinheiro era uma palavra suja. Sua cunhada concordava inteiramente com ele. Há muito que Lavinia não gostava de uem contraste com o que sucedia com sua filha Janete, que tinha de empreender uma luta constante para atingir e manter um certo status. Patrick teria de bom grado custeada a educação de Janete, mas seu irmão, Joe, declinou sua oferta. Em conseqüência Lavinia teve de orientar suas ambições para outras direções. As garotas agora estavam com dezoito anos; Janete deixara os estudos e parecia gostar de seu trabalho em uma agência de turismo. Andréa esperava o momento de entrar na universidade. Isto deixara Lavinia furiosa, mas o pai de Andréa encarava a coisa diferentemente. Andréa ouviu o barulho da porta que se fechava e olhou para a prima. Não eram nada parecidas. Janete era de estatura média, propensa a gordura, como sua mãe, e tinha olhos escuros. Seu cabelo era castanho-claro, com algumas mechas alouradas, e possuía uma ondulação natural de belo efeito, Andréa por outro lado, era quase tão morena quanto uma latina e seus olhos eram verdes e brilhantes. Era também alta e extremamente esbelta. Quase sempre usava jeans e blusas, para grande contrariedade de seu pai, enquanto Janete, influenciada por sua mãe trajava saias incômodas e blusas cheias de babados. Andréa morria de vontade de ver sua prima usando calças bem talhadas e blusas justas, e seu maior desejo era subtraí-la à influência opressiva de sua mãe. Talvez a oportunidade estivesse aí, agora. . . Janete abria as portas dos quartos, explorando os aposentos que deveriam ocupar durante um mês inteiro. — Que quarto você quer, Andréa? — perguntou com sua voz infantil e contida: — Ambos são ótimos! Andréa tirou o casaco de pele de carneiro e sentou-se em uma das poltronas de cetim. — Escolha você — respondeu sem muito entusiasmo. — Não me importo, contanto que tenha cama. — Oh, Andréa! — Janete deu um risinho e entrou cm um dos quartos. Voltou após alguns momentos, admirada. — Sabe, há um banheiro em cada quarto. Não é uma maravilha? Imagine, dois banheiros para nós duas! — É. Não daria para usar o mesmo banheiro ao mesmo tempo — observou Andréa secamente, sentindo-se arrependida no mesmo instante, ao contemplar a reação desolada de Janete. O fato de não querer ter vindo para aquele lugar não era razão para agredir Janete. E, afinal, Janete estava acostumada a morar em casas com apenas um banheiro. Forçou um sorriso zombeteiro e acrescentou: — Além do mais, acho que sua mãe não aprovaria você usar o mesmo banheiro que eu. Você poderia ficar contaminada com meu temperamento imprudente! — Oh, Andréa! Bem, já é uma hora. Que tal almoçarmos antes de desfazer as malas? O hotel Kiitzbuhl era realmente muito confortável, com sauna e piscina no subsolo. No térreo havia um grande salão de estar, do qual se avistavam as pistas de esqui, no fundo do hotel; dois bares e um restaurante muito bem iluminado, que dava para a rua do comércio, sempre fervilhante de gente. Andréa encarava tudo aquilo com a naturalidade de quem estava habituada ao conforto, mas Janete fazia comentários excitados a cada nova descoberta. — Vamos nos divertir muito — assegurou, ao se acomodarem em uma das mesas do restaurante, que não estava muito cheio àquela hora do dia. Janete, experimentando Schnitzel pela primeira vez olhou para a prima, tomada de dúvidas. — Você vai gostar, não é mesmo. Andréa? Eu sei que você já esquiou antes, dezenas de vezes, mas o tio Pat disse que você nunca esteve em Grossfeld. — É verdade, não estive — reconheceu Andréa. Levantando o copo contemplando o vinho em seu interior. — Mas todas as estações de esporte de inverno se parecem. — O que quer dizer com isso? Andréa suspirou, olhando pensativa em torno do restaurante. — Bem, deixe-me ver. Para início de conversa, as pessoas são as mesmas. — Fez uma pausa. — Sabe, aqui a gente só encontra dois tipos de pessoas: as que têm dinheiro e as que gostariam de ter. — Mas que observação mais cínica! — Janete estava chocada. Ela também olhou disfarçadamente para a saia. — Toda essa gente me parece muito simpática. — Janete. Eu não sou mais velha do que você, porém tenho um pouco mais de experiência, acho. Uma garota sozinha em um lugar como Grossfeld é prato cheio para qualquer caça-dotes, que aliás vêm para cá de todos os pontos da Europa. Espere e verá. Claro, há também jovens viajando com o dinheiro do papai, mas os homens totalmente atraentes nunca têm um centavo, e a gente logo percebe que eles nos fazem a corte unicamente com o olho no dinheiro. — Mas quem sabe, com alguma sorte, a gente encontre coisa melhor. — observou Janete, e Andréa teve de sorrir. — Você diz isto, Jan, mas é muito melhor a gente ser amada por aquilo que é. É por isso que eu saio com aquele bando de gente, quando estou em casa. Eles, pelo menos, são pessoas reais e não cópias um do outro. — Fez uma pausa. — Quer mais vinho? — Não tenho o costume de beber vinho ao almoço. — Mamãe não gostaria, não é? — disse Andréa em tom de zombaria. — Não disse isso. Está bem, aceito, obrigada. Enquanto enchia o copo da prima, Andréa sentiu-se ligeiramente envergonhada. — Desculpe, Janete — disse. — Acho que não estou sendo lá muito boa companhia. Prometo melhorar. Janete tomou um pouco de vinho. — Não a compreendo, Andréa, juro que não. Você tem tudo: boa aparência, dinheiro, é atraente! Eu seria feliz, se tivesse uma dessas três coisas. — Seria mesmo? — Andréa parecia momentaneamente aborrecida. — Oh, Jan, não seja tola! Você é muito atraente, ou melhor, seria, se usasse roupas mais apropriadas. — O que há de errado com minhas roupas? — É claro que você não precisa que eu lhe diga! Janete ficou vermelha. -— Você é muito pouco gentil, Andréa! Eu não critico o modo como você se veste; por que você implica comigo? — O que você teria a dizer a respeito de minhas roupas? São limpas e baratas, só isso. — Você parece uma daquelas estudantes que a gente vê no noticiário da televisão, indo participar de piquetes de greve e coisas desse gênero. — E daí? Minhas roupas me cobrem, não é mesmo? Não sou nenhuma indecente. — Depende. Esses jeans que você usa são apertados demais. — Ah, é mesmo? — Eu, em todo caso, não aprovo essas roupas gênero hippy. Escolho muito as lojas onde compro o que uso. — E onde é que você faz compras? Na Sears? Janete ficou vermelha que nem pimentão. — Andréa! Como você é má! — Levantou-se precipitadamente, no momento em que um casal entrava no restaurante. Janete deu de encontro com o homem e ele segurou-a rapidamente pelos ombros, para impedir que ela perdesse o equilíbrio. O homem era alto, devia ter um metro e oitenta, imaginou Andréa. O corpo era esguio, musculoso, e os cabelos, grisalhos e compridos, cobriam-he a nuca. Janete olhou-o com os olhos rasos de lágrimas, murmurou uma desculpa e saiu correndo pelo hall, em direção à escada. Andréa contemplara aquela cena com irritação, tomada por um sentimento de culpa. Não era justo tornar sua prima o bode expiatório dos erros de seu pai. O casal que entrou no restaurante no momento em que Janete se retirava dirigiu-se para uma mesa apartada das demais. Andréa notou que a mulher era alguns anos mais velhos do que o seu companheiro, que nesse momento se voltou para Andréa e seus olhares se cruzaram. Ela se sentiu perturbada, porque aqueles olhos cinza e frios denunciavam com clareza que o homem sabia que ela era a responsável pela mágoa causada a Janete. Andréa desviou o olhar e concentrou-se na comida em seu prato. A carne esfriara, mas ela decidiu que não daria a ele ou a Janete o prazer de saber que a haviam perturbado. Com uma determinação que seu pai teria admirado, obrigou-se a terminar de comer com calma. Ao sair do restaurante, teve certeza de que aquele par de olhos cinza seguia-lhe através das mesas, e a curiosidade fez com que ela olhasse por cima dos ombros. O homem parecia entretido com sua companheira e nem sequer levantou os olhos. Andréa comprimiu os lábios e dirigiu-se para o hall. — Andréa! Alguém a saudava com efusão e ela perdeu um pouco aquela compostura estudada. Voltou-se lentamente e viu a garota que, junto com um grupo de rapazes e moças, entrava no hotel. Em trajes de esqui, acabavam de chegar das pistas, rostos corados, eram a verdadeira imagem de saúde. Quase todos os rapazes olharam para Andréa com admiração, o que para ela não era nenhuma novidade. Não era vaidosa, mas sabia o efeito que causava no sexo oposto. — Alo, Susie — respondeu para a garota que a chamara e todos se uniram em torno dela. Tinham estudado no mesmo colégio. — O que está fazendo aqui? — indagou Susie. — Achei que você não gostasse de lugares como este. — Estou aqui com minha prima. Ela nunca fez esqui. E você? —Oh, vim com mamãe e papai e acabei encontrando a turma — respondeu Susie sorrindo. — Você vai ficar muito tempo, Andréa? — A pergunta foi formulada por um jovem a seu lado, de cabelos negros e olhos castanhos cheios de paixão. — Vou passar um mês aqui — respondeu ela sorrindo, e ele pareceu ter ficado imensamente satisfeito. — E nós, nos veremos mais tarde? — perguntou o rapaz de cabelos negros. Nesse momento uma garota a seu lado deu-lhe uma cotovelada nas costelas. Andréa desviou o olhar do rosto tão convidativo de Roy e Susie disse: — Deixe-me apresentar-lhe a turma... — Desfilou vários nomes, mas Andréa só guardou o de Roy Stevens. — Bem, vou indo — disse ela, no momento em que percebeu que as garotas da turma não eram tão amáveis quanto seus companheiros. — Janete deve estar se perguntando que fim teve. — Janete? — Susie franziu o cenho. — Ah, sua prima? Andréa fez que sim e Susie informou: — Bem, quase todos nós estaremos no bar Tirolês mais tarde. Provavelmente a gente ainda se cruze novamente. — Provavelmente — concordou Andréa e, com um sorriso de desculpas, afastou-se. Janete estava no quarto, deitada de costas, com os olhos inchados de tanto chorar. Andréa apoiou-se no batente da porta e olhou-a com comiseração. — Mas o que é isto, Jan, você não sabe encarar uma piada? — Não foi uma piada! — replicou Janete. — Você estava falando sério, sei que estava, Oh, como me arrependo de ter vindo para cá! — Não diga uma coisa dessas. Está bem, sinto muito. Desculpe-me. Não tive a intenção de magoá-la, — Teve, sim. Janete não se convencia com facilidade, e Andréa sentou-se impulsivamente do outro lado da cama e olhou-a fixamente. — Janete, ouça-me! Estou certo, talvez eu tenha sido um tanto brusco, mas as minhas intenções eram as melhores. — Fez uma pausa. — Suas roupas estão fora de moda! Com roupas apropriadas e maquilagem correta você será um sucesso, pode crer! Olhe, que tal fazermos umas compras hoje á tarde? Papai me deu um bom dinheiro, e nestas estações de inverno sempre há butiques incríveis. Janete fungou e apoiou-se nos cotovelos, — Mas para que fazer compras? — Vou lhe dar de presente um novo guarda-roupa. — Você não vai fazer uma coisa dessas! — Por que não? Não me custa nada. — O tom de Andréa era lacônico. — Talvez até mesmo me divertisse. Janete sentou-se, animada. — Mas mamãe. . . Papai. . . não aprovariam. — Seu paisinho não ficará sabendo, pelo menos enquanto durarem as férias. Depois será tarde. — Sei lá, Andréa. . . Andréa voltou-se e pôs-se a estudá-la. — Deixe-me ver — prosseguiu, como se sua prima não tivesse feito nenhum comentário —, calças, blusas e uns dois vestidos para a noite. Acho que, para início, está bom. — Mas eu não costumo usar calças! — exclamou Janete, muito sem jeito. — Você não sabe o que pode usar a menos que tente, Janete levantou-se, sentindo que os olhos ardiam. —Vou lavar o rosto e tentar disfarçar que estive chorando, — Eu, no seu lugar, não ficaria muito preocupada com isso — disse Andréa, à guisa de consolo, — Todo mundo vai pensar que é por causa do frio. Vou esperar você na saía. Completamente despida daquelas roupas desajeitadas que costumava usar, Janete parecia ridiculamente vulnerável, e Andréa sentiu-se meio insegura. Entretanto, um pouco mais tarde, ao ver a prima com uma calça bem justa e uma blusa em estilo militar, sentiu-se recompensada por ter feito aquela sugestão. Sem franjas, babados e tecidos rendados, Janete parecia bem proporcionada e nada gorda. Um vestido de crepe de seda cor de abricó dava a ilusão de aumentar-lhe a estatura, e um cafetã de jérsei modelava discretamente suas curvas. Enquanto regressavam ao hotel com os braços carregados de caixas, Janete conversava animada com sua prima. — Mamãe vivia dizendo que tenho pernas curtas demais para usar calças compridas e que elas não eram apropriadas para uma mulher. Mas isto não é verdade, não é mesmo? Nunca percebi antes. — Você é feminina — comentou Andréa secamente — mas isto não está necessariamente nas roupas que você usa. Se você for suficientemente feminina, pode usar o que quiser. — Oh, mas esses vestidos são um sonho! Ao lado deles os outros vestidos que tenho parecem um rebotalho. Será que estréio um deles hoje à noite? — Acho que você deve — declarou Andréa com convicção, entrando no hotel. Deteve-se ao perceber um homem apoiado negligentemente ao balcão da recepção, conversando com a funcionária de plantão. Era o homem do restaurante, no qual Janete esbarrara ao sair, o mesmo que olhara para Andréa de maneira perscrutadora. Suas calças estreitas ressaltavam a musculatura poderosa de suas pernas. — Guten Tang, Fräulein. Wie geht es Ihnen? — disse ele dirigindo-se a Janete, e Andréa teve uma reação de impaciência, mas sua prima estava excitada com aquele encontro inesperado. — Sinto muito, mas não compreendo — respondeu Janete, articulando cuidadosamente as palavras e falando em tom ligeiramente mais alto do que o necessário, como se ele fosse surdo e não de outra nacionalidade. — A senhorita é inglesa, é claro. — O homem falava o idioma delas com um sotaque ligeiramente gutural. — Devia ter imaginado. Janete respondeu com desenvoltura. — Foi muita gentileza de sua parte ter se lembrando. — Bitte schon. Não há de que. — Seu sorriso era ligeiramente irônico, mas deixou Andréa irritada. — Não é todo dia que uma linda inglesa se atira em meus braços. — Oh! — Janete riu deliciada. — Quanta galanteria! Ele sacudiu a cabeça, com os olhos fixos nos embrulhos que ela carregava. — Posso ajudá-la, nein? A senhorita está com pacotes demais. — Nós damos um jeito, obrigada. Andréa respondeu antes que Janete aceitasse seu oferecimento, e os olhos do homem percorreram-lhe o rosto, ainda queimado de sol, devido há uns dias passados nas Bermudas com seu pai, no mês de novembro. — Como quiser, Fràulein — ele disse. Inclinou-se mais uma vez, mas desta feita diante das duas. — Auf Wiedersehen. Olhando Andréa com ar um tanto aborrecido, Janete dirigiu-lhe um Auf Wiedersehen e, muito ousada, acrescentou: — Está hospedado aqui no hotel, Herr... Herr. . . ? — Von Mahlstrom, Fràulein — ele respondeu com muita polidez, subitamente formal. — Barão Axel von Mahlstrom, a seu serviço, Fràulein. Sinto muito, mas não estou neste hotel. Os lábios de Janete articularam a palavra Barão, porém ela não a disse em voz alta. Limitou-se a dar um sorriso neutro e saiu apressada, pois Andréa a esperava impaciente. Enquanto subiam, Janete arregalou os olhos para a prima. — Você ouviu? — ela perguntou, pasma. — Ele é barão, Andréa. Um barão de carne e osso! Você acha que é austríaco? — Austríaco, alemão, qual é a diferença? — Andréa não se deixara impressionar. Tirou a chave da bolsa e entrou. — Um título destes não significa nada nos dias de hoje. Você se lembra do que conversamos hoje à tarde? Sobre os caça-dotes? Janete ficou surpresa. — Você não está sugerindo que... O Barão von Mahlstrom é um caça-dotes? — Diria que é mais do que provável. — Por que? — Oh, Jan, seja sensata! Não viu como ele nos olhava, decidindo qual das duas valia a pena ser abordada? — Andréa, mas que coisa horrível você está dizendo! — Como eu disse antes, Jan, dê-me algum crédito por eu ter um pouco mais de experiência. — Mas ele mostrou-se tão gentil, tão simpático... — Mas eles sempre agem assim. E não esqueça de dizer que ele é muito atraente — acrescentou Andréa secamente. — Oh, sim! — Janete juntou as mãos, com uma expressão sonhadora no olhar. — Ele é lindo, não acha? É o tipo de homem que a gente nunca espera conhecer. Lembrou-me Steve McQueen. Andréa virou os olhos para o céu. -— Sinceramente, Jan, ainda bem que seu pai não é rico. Você seria presa fácil para qualquer Casanova que a rondasse. — E daí? Eu também me divertiria, não é mesmo? Não me importaria se estivessem atrás do meu dinheiro, contanto que os tivesse juntado a mim. — Oh, Janete! Se sua mamãezinha pudesse ouvi-la! Janete corou. — Bom — disse em atitude de defesa — você consegue fazer piada com uma coisa dessas, mas eu não. Talvez esta seja a minha única oportunidade de conhecer um homem como ele. Andréa olhou pensativamente o rosto petulante da prima e uma idéia começaram a desabrochar em sua mente. Recordou-se vividamente do rosto sardônico do barão von Mahlstrom. A possibilidade de atrapalhar os planos dele e proporcionar a Janete uma aventura era uma tentação irresistível. Janete sentia-se atraída por ele. Então por que ela, Andréa, não lhe proporcionaria todas as oportunidades para atraí-lo também? Andréa constatou com cinismo que ela se imaginava a fada madrinha que agitava a varinha mágica e presenteava a Gata Borralheira com um príncipe, porém, não conseguia negar que sentiria um certo prazer em ver o barão expor-se ao ridículo. Claro, ele talvez não mordesse a isca, e nesse caso não haveria nenhum mal. Mas se ele mordesse. Mordeu o lábio. Qualquer sentimento de culpa que ela porventura experimentasse poderia ser facilmente superado pelo fato de que ela sabia que ele era tão culpado quanto ela. Aliás, mais culpado ainda, E isto poderiam dar novas perspectivas a todo aquele mês, tão aborrecido. — Jan — ela disse, levantando-se da cadeira e desabotoando o casaco. — Jan, estive pensando. . . — Sim? O rosto redondo de Janete encerrava uma expressão de expectativa, e subitamente Andréa não conseguiu prosseguir. Que mau-caráter era, pensou, fingindo que queria ajudar Janete quando o que ela pretendia era agredir aquele tipo arrogante! — Oh... hum... — Agora procurava desesperadamente algo para dizer. — Acabo de pensar... Poderíamos levantar cedinho e irmos nadar na piscina antes do café da manhã. A expressão de Janete perdeu a animação. Abaixou-se para pegar uma das caixas que tinha caído do divã e assentiu. — ótimo, mergulharei os pés na piscina. Você sabe que não sei nadar. — Não sabe? — Andréa ficou surpreendida. Em seguida sorriu: — Eu a ensinarei. — É mesmo? -— Janete sorriu. — É o que meu pai vivia dizendo, mas eu jamais consegui. — Bem, vou arrumar minhas coisas e tomar um banho antes do jantar. Janete concordou. — Primeiro, eu irei pendurar estas coisas e em seguida farei o mesmo. Que vestido você acha que devo usar? O abricó ou o cafetã? — Acho que o cafetã. Não prefere guardar o vestido de seda para uma ocasião especial? — Que tipo de ocasião? — Um jantar com o barão, por exemplo — sugeriu Andréa com ironia, e Janete suspirou, estática. — Você acha que ele me convidaria? Andréa hesitou, tentada em pôr seus planos em prática. Limitou-se, porém, a sacudir a cabeça, e abriu a porta do quarto. — Como é que posso saber?
CAPÍTULO II
Andréa deitou-se de costas na cama, fitando o teto. Uma luz branca filtrava-se através das cortinas, e ao consultar o relógio viu que passava das seis Janete ainda estava dormindo. A noitada começara bastante cedo, no restaurante. Após o jantar tinham ido encontrar Susie Nichols e seu grupo no bar e as coisas começaram a se animar. Os amigos de Susie eram, em sua maioria, muito acolhedores, e assim que as garotas perceberam que Andréa não estava interessada em seus namorados tornaram-se muito mais simpáticas. Janete também foi bem recebida e, aos poucos, adquiria maior confiança em si mesma. Andréa sentiu-se contente. Tia Lavinia mantivera Janete sob seu domínio por um tempo excessivo. Aquela noite não houve o menor sinal do atraente barão, notou Andréa com alivio, apesar de sentir que Janete ficara desapontada pelas mesmas razões. Os olhos da prima tinham varrido o bar quando elas entraram. A despeito dos protestos dos demais, Andréa não quis dançar muito. Limitou-se a olhar os pares, sentados em um canto ao lado da enorme lareira, tomando um coquetel de vodca e suco de frutas. À noite transcorreu bastante neutra até as onze horas, quando chegaram o amigo de Susie, Roy Stevens e sua namorada, Entraram no bar à procura de sua turma, com o rosto afogueado pelo frio e dirigiram-se imediatamente para os lados da lareira. Nesse momento Roy viu Andréa e sentou-se no banco de madeira, ao lado dela. Ignorando o olhar furioso da garota com quem tinha entrado, colocou o braço no encosto do lugar de Andréa. — Olá — disse, com o rosto muito próximo ao dela. — Sentiu falta de mim? Andréa sorriu ligeiramente. — Por acaso deveria ter sentido? — Claro. Você ouviu Ruth dizer que íamos ao Míihlrad, não é mesmo? — Ruth? A sua... Namorada? -— Amiga, com certeza, mas namorada, talvez... — ele declarou, malicioso. Andréa voltou-se e olhou de relance para Ruth. — Sua. . . Namorada não vai gostar disso. — Disso o quê? Andréa olhou-o um tanto contrariado. — Não banque o inocente! A julgar por seu comportamento, imagino que esta não é a primeira vez que você age desse jeito. Ele assumiu um ar de mágoa. — Que falta de gentileza! Você então acha que eu sou de me envolver com a primeira pessoa que olha para mim? — Sim. — Andréa encarou-o de frente. — E sinto muito por Ruth. Eu no lugar dela não me sujeitaria a isso. Ele tornou-se subitamente sério. — Talvez nem precisasse. Talvez, se Ruth fosse mais semelhante a você, ela também não precisaria. — Isto não é desculpa — Nem pretendo que seja. — Roy acariciou ligeiramente seus cabelos negros. — Dance comigo. — Convide Ruth para dançar. — Não quero dançar com Ruth. Se você não quiser dançar comigo, encontrarei alguém que aceitará. Andréa acreditou nele e sacudiu a cabeça. Ele era muito persuasivo e ela pouco dançara aquela noite. — Está bem — concordou finalmente. — Mas é só porque eu sinto que comigo você se comportará melhor do que com qualquer outra garota. — Não confie muito nisto — disse ele, sorrindo e levando-a para a pista de dança. Enquanto o seguia, Andréa notou a expressão preocupada de Janete. Não duvidava de que ela, a exemplo de alguns dos presentes, considerava seu comportamento afrontoso. Ela, porém, não provocara aquela situação e Ruth deveria ser sensata e não se envolver com alguém como Roy.
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