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Batalha de Amor. CAPITULO I



Batalha de Amor

" The Love Battle"

Violet Winspear

 

 

CAPITULO I

 

Wilma suspirou de satisfaç ã o, sentindo o ventinho provocado pelo leque que abanava, despenteando seu cabelo. À quela hora do dia, sempre ficava aliviada, pois sua patroa já tinha se deitado. Assim, estava livre para descansar até a hora de seu jantar solitá rio, Naquele dia, Charmides estivera particularmente impaciente com o calor e a dor nas costas. Ela nã o era mulher de dar descanso a seus empregados. Alé m disso, o dia fora bem abafado, como era comum nessa é poca do ano na Fló rida.

Na hora do café da manhã, havia chegado uma carta que Charmides consultou vá rias vezes durante o dia. Wilma nã o sabia do que se tratava pois, como dama de companhia, nã o era informada de nada. Mas imaginou que a carta era de um dos filhos da patroa. E que por isso Charmides estava irritada com todo mundo, especialmente com ela.

Wilma bocejou e espreguiç ou-se. Era bom trabalhar ali, naquela casa em estilo grego frente à praia. Era bom estar desocupada e abanar-se. Seu cabelo fino em torno do rosto magro. Os olhos azuis-escuros tinham um brilho violeta intenso. " Olhos de feiticeira", brincava seu pai, quando ainda era vivo. Sua boca, de uma cor vermelho natural, sugeria que ela havia acabado de morder cerejas. A pele ganhara uma cor de mel, por causa do sol da Fló rida.

Wilma era bonita. Principalmente por causa dos olhos de um brilho impressionante; os olhos de uma moç a que desconfiava de qualquer um que tentasse se aproximar muito...

Havia adotado essa postura defensiva desde que viera para a Mansã o da Lua Cheia. Ali, Charmides obrigava-a a usar uniforme, talvez para disfarç ar a beleza dela e mantê -la submissa. Wilma nã o se importava com isso. Até parecia gostar do anonimato que o uniforme lhe dava. Assim, nã o passava de um dos empregados da mansã o, para quem ningué m olhava muito.

À noite, como sempre, iria à praia dar um mergulho antes que escurecesse. Desceu as escadas, passando por vá rios retratos de Charmides emoldurados em dourado. A patroa era de uma famí lia tradicional e fina, onde també m corria o sangue dos antigos piratas. Seu marido tinha sido o milioná rio armador grego Helios Demonides, que se orgulhava muito da beleza da esposa.

Mas o casamento dos dois nã o fora muito fá cil. Helios passava maior parte do tempo cuidando dos negó cios dos navios e por isso dava pouca atenç ã o a Charmides. Tiveram dois filhos: Troy, o caç ula, e Daniel, dois anos mais velho. Troy era o preferido do pai e agora cuidava dos negó cios da famí lia.

Wilma desconfiava que Daniel era um problema para Charmides, pois ela falava sempre em Troy e nunca no filho mais velho. Nem mesmo tinha uma fotografia dele no criado-mudo. Lá havia um porta-retratos com a foto de seu marido, morto há dez anos, e do filho mais novo, que parecia muito com a mã e.

Daniel Demonides era um tipo de consultor financeiro autô nomo, isto é, aconselhava onde as grandes empresas deviam investir seu capital... Na verdade, era como um tipo de jogador refinado de cassino. Devia ter herdado da mã e o sangue da pirataria e provavelmente por isso Charmides nã o o aceitava...

Wilma, como um dos empregados da Mansã o da Lua Cheia, sempre tinha ouvido falar que Daniel era um homem selvagem. Que sempre havia desobedecido as ordens do pai e negado o carinho que a mã e esperava receber. Aquela mansã o parecia envolta numa tempestade domé stica, mas Wilma gostava demais do lugar.

Ela saiu da casa, em direç ã o à praia particular. Respirava o perfume embriagante do mar. O abafamento do dia tinha dado lugar a um frescor delicioso.

Adorava aquela paisagem solitá ria, onde o mar batia furiosamente nas pedras. Naquele momento, nã o trocaria seu lugar nem com uma estrela de cinema nem com uma princesa. Nã o se importava de ser uma dama de companhia, tendo aquela paisagem à sua volta.

Já estava no meio da praia quando teve uma surpresa: ali, sobre a areia, via-se uma pilha de roupas masculinas. Parou e ficou examinando as peç as. Havia uma jaqueta bege, uma calç a marrom e camisa de seda, creme, junto com um par de meias marrons e sapatos esporte de couro de camelo.

Nã o era permitido que estranhos usassem a praia, mesmo aqueles que pudessem comprar roupas caras e bonitas como aquelas. Wilma ergueu a cabeç a e franziu a testa. Sem perceber, apertou com forç a o maiô e a toalha que tinha trazido.

Uma figura alta e forte de um homem estava saindo do mar naquele momento. Era como um deus pagã o do oceano: enorme, bronzeado e imponente. Sobre os pê los escuros do peito havia uma corrente de num e uma medalha.

Wilma ficou petrificada ao lado das roupas, enquanto o estranho vinha em sua direç ã o... Queria fugir, mas sentia-se incapaz de se mexer.

O homem a olhava diretamente nos olhos, mas continuava a caminhar na direç ã o dela sem um momento de hesitaç ã o. Havia tanta masculinidade e autoconfianç a nele, que Wilma ficou sem respiraç ã o, E nã o era tanto pelo fato de nunca ter visto um homem sem roupas atiles... era que nunca havia visto um tã o à vontade em seu pequeno calç ã o. Provavelmente ele tinha consciê ncia do belo corpo que Possuí a...

O homem tinha uma expressã o decidida, mostrando um orgulho, um certo charme e um quê de crueldade. Sua figura era inesquecí vel, assim como seus olhos acinzentados, que pareciam dizer que ele nã o ligava se era amado ou detestado.

Wilma teve, de repente, a impressã o de já tê -lo visto antes, em circunstâ ncias que gostaria de esquecer. Ao examinar seu rosto, lembrou-se: nã o sabia seu nome, mas havia visto aquele homem no restaurante do Hotel Cyrano, onde ela trabalhava como cantora e tocava violã o. Ele estava instalado na suí te presidencial exatamente naquela noite... A noite em que a esposa de Myles Sadlier fez um escâ ndalo por encontrar seu marido na cama com uma " loirinha sem-vergonha''.

Wilma começ ou a tremer, sentindo o velho medo de ser descoberta. Implorava ao homem, em silê ncio, que nã o se lembrasse que ela era a cantora do hotel. Há quase dois anos tinha fugido daquele emprego...

Myles Sadlier queria que a esposa pedisse divó rcio. Para isso, passou uma cantada em Wilma. Como ela nã o aceitou dormir com ele colocou soní fero no suco de tomate que ela estava tomando... Wilma acordou na cama dele, com a esposa gritando por causa do flagrante. Sozinha e sem defesa, tinha sido citada no processo de divó rcio, apesar de nada ter acontecido naquele quarto do hotel.

Tudo havia saí do conforme o velho Myles Sadlier, famoso produtor de cinema, queria. Wilma fora apenas usada numa trama suja... Mesmo assim, ainda nã o entendia por que ele nã o fizera amor com ela, enquanto dormia. Nã o acreditava que Sadlier a tivesse respeitado por ela ser virgem...

De qualquer forma, fora uma experiê ncia bem desagradá vel para Wilma. Quem acreditaria que ela era inocente depois daquele escâ ndalo? Até os jornais tinham publicado: " Cantora inglesa na cama com famoso produtor de filmes".

Wilma abafou um gemido. Há poucos minutos, a praia da Lua Cheia era uma espé cie de paraí so para ela. Agora, olhava para o homem que vinha do mar como se ele fosse o pró prio demô nio.

O rosto dele era de um homem perigoso. Ele passou a mã o na testa, para tirar o cabelo molhado. Wilma ainda estava parada ali, sem saber o que fazer.

— A á gua está uma delí cia, se é que você vai entrar — ele disse. — Mas, se nã o vai, seja uma boa menina e fique de costas por um ou dois minutos.

Ele tinha a voz um pouco rouca, de quem fumava muito. Wilma prendeu a respiraç ã o, depois soltou-a.

— Você está invadindo... isto é uma propriedade particular!

— Sei muito bem disso. — Ele pô s a mã o no ombro dela e virou-a de costas. — Sempre achei que a nudez se torna indecente quando a gente começ a a se cobrir. Você nã o concorda?

— Você poderia criar problemas para si mesmo.

— Adoro criar problemas. Pode se virar agora, querida. Parece que já se recuperou do choque de me ver.

— O que... está querendo dizer com isso?

— Você me olhou como se nã o soubesse que o corpo dos garotos é diferente do das garotas.

Sorriu levemente, com ironia. Depois tirou o maç o de cigarros do bolso e ofereceu a Wilma.

— Nã o, obrigada. Eu nã o fumo.

Notou que o olhar dele tinha mudado diante de sua recusa. Ao colocar o cigarro nos lá bios, ele a examinou de alto a baixo. Parecia estudar o cabelo dela, caindo livremente sobre os ombros. Durante o dia, Wilma usava um coque, mas todas as noites ela o soltava, para sentir os cabelos esvoaç ando com a brisa do mar.

Naquele momento, sentiu-se como um gato assustado, pois nã o sabia quem era aquele homem que invadira a praia dos Demonides. Só sabia que, há dois anos, tinha sido testemunha do escâ ndalo no Hotel Cyrano. Mas o olhar dele recusava-se a confirmar ou negar que ele a reconhecia. Talvez o uniforme disfarç asse, ela pensou com esperanç a. Nã o se parecia em nada com a roupa que usava na noite fatal.

Naquela noite, estava com a blusa roxa do pijama de Myles Sadlier, pois o homem teve a coragem de trocá -la enquanto ela dormia. A blusa chegava até suas coxas, deixando as pernas de fora. Wilma havia saí do do quarto com o cabelo solto e as pupilas dilatadas por causa do soní fero. Com aquela aparê ncia, a esposa de Sadlier só podia ter pensado o pior, como pensou. Só de lembrar, Wilma ficou vermelha de vergonha.

— Uma garota com todas as virtudes, nã o é? — o estranho comentou com ironia.

— Escute — ela tentou mostrar-se digna. — Você já nadou o quanto queria. Agora é melhor ir embora. Como já disse, esta praia é propriedade particular e minha patroa nã o gosta de intrusos.

— Sua patroa? Madame Charmides, que vive em seu templo banhado de sol, nã o é?

— Sim...

— Entã o você é a empregada dela, que no fim do dia vem entregar-se aos braç os de Netuno, deus do oceano? Agora está ficando tarde e as ondas estã o muito mais violentas. É melhor você desistir de seu encontro com o deus dos mares esta noite. Nã o quer se arrebentar naquelas pedras, nã o é?

Wilma ficou parada olhando para o homem. Ele parecia saber tudo sobre aquela praia e sobre sua patroa. De repente, começ ou a desconfiar de que talvez fosse um amigo da famí lia... E se ele a reconhecesse como a garota do escâ ndalo, ela poderia perder o emprego na Mansã o da Lua Cheia.

Se havia uma coisa que Wilma sabia sobre sua patroa, é que Charmides tinha uma verdadeira obsessã o pela honestidade. Rica como era, fazia questã o de só contratar empregados com referê ncias impecá veis. Wilma tinha pedido as suas a uma ex-colega de colé gio, que achou que o pedido fizesse parte de alguma brincadeira. Aquela amiga havia se casado com um banqueiro milioná rio de Boston, entrando assim para uma das famí lias mais respeitadas do paí s. Por isso, as referê ncias que apresentou a Charmides foram decisivas. Alé m disso, Wilma tinha trabalhado como ajudante de enfermaria numa clí nica particular durante vá rios meses. Tudo isso fez com que conseguisse aquele emprego na Mansã o da Lua Cheia...

E ela nã o queria perdê -lo. Ali era seu recanto, que excluí a o contato com pessoas como os Sadlier... Mas agora o chã o parecia estar tremendo sob seus pé s. Um estranho do passado tinha aparecido de repente, e seu olhar mostrava que podia ser tã o charmoso quanto cruel, dependendo de seu estado de espí rito.

— Importa-se se eu perguntar quem é você? — ela falou, enfrentando a situaç ã o.

— De forma alguma, garota dos olhos virginais. Meu nome é Daniel. E, embora eu duvide que minha mamã ezinha fale sobre mim, tenho certeza de que já ouviu meu nome. Como na velha tradiç ã o, o filho pró digo volta ao lar. Só que nã o estou voltando sem dinheiro e com as roupas em farrapos. Puxa! O jeito que você me olha com esses olhos azuis! A cor deles é muito especial... inesquecí vel.

Wilma sentiu-se mole, como se fosse desmaiar. Quase no mesmo instante o homem a segurou pelo pulso. Ela estava pá lida. |

— Você precisa jantar — ele disse. — Com toda certeza está de pé desde cedo. Ainda mais que fica obedecendo a todas as ordens de minha querida, poré m exigente, mã e. Vamos, entã o? Quero ver se a casa continua a mesma.

Daniel ainda segurava Wilma pelo pulso e ela sentia o calor daqueles dedos até os ossos. Embora quisesse livrar-se dele, ficou quieta. Era quase certo que ele a reconhecera e talvez pretendesse brincar de gato e rato. Nã o podia deixar que percebesse o quanto estava nervosa.

Os dois caminharam pela praia até a entrada da casa. Daniel olhou devagar para a construç ã o cheia de arcos, com seu telhado vermelho.

As paredes eram feitas de pedras arredondadas e estavam cobertas de hera e outras trepadeiras. Havia um terraç o enorme que dava para a praia.

Olhar para a Mansã o da Lua Cheia era como ser transportado para uma ilha grega... Aquele era o lugar mais bonito que Wilma já tinha visto. De repente, voltou-se para Daniel, querendo saber como ele reagia ao ver novamente a casa onde havia nascido.

Ele tinha franzido a testa. Suas sobrancelhas formavam uma ú nica linha. Wilma lembrou-se de um dito popular que afirmava que, quando as sobrancelhas de um homem se encontram, o demô nio está com ele.

— Meu pai nunca pô de esquecer a Gré cia — murmurou Daniel. — Aquele paí s está presente na casa que ele construiu e na maneira como ele me tratava. Seu filho mais velho tinha de possuir todas as virtudes, mesmo que elas tivessem de ser socadas nele. E eu só queria ser Daniel, eu mesmo, e nã o a imagem de algum outro homem... Vê aquele terraç o lá em cima?

— Sim...

— Quando eu fiz dezesseis anos, tivemos uma briga. Acho que foi porque eu estava apaixonado por um esporte: o hó quei no gelo. Na verdade, andava estudando bem menos para me dedicar ao time de hó quei... De repente, durante a briga, meu pai me bateu com tanta forç a, que quase me jogou de lá de cima. Ele me segurou e depois teve a coragem de me bater de novo por fazê -lo perder a dignidade grega.

— Mas...

— Se ele queria que eu fosse um grego, devia ter me mandado estudar em Atenas. Mas ele queria as duas coisas. Queria uma educaç ã o americana para mim, mas nã o podia aceitar a liberdade de espí rito dessa educaç ã o. Nã o podia aceitar que um filho amasse sua famí lia, sem estar totalmente amarrado a ela. Na Gré cia, um filho nunca deixa de ser a sombra de seu pai, e uma filha nunca deixa de ser dominada pela mã e. Eles chamam isso de amor. Mas as crianç as deviam ser como passarinhos, livres para voar assim que soubessem usar as asas. Eu tive de voar sem a bê nç ã o e o consentimento de meus pais e eles nunca me perdoaram por isso.

Houve um pequeno silê ncio. Logo Wilma notou que a expressã o dele tinha se tornado irô nica.

— Eles nã o me deram nenhuma ajuda financeira — continuou Daniel. — Mas nã o fez diferenç a. Eu tinha minhas pró prias habilidades e soube como usá -las. Quando Troy nasceu, meu pai nã o cometeu o mesmo erro. Meu irmã o estudou sempre na Gré cia. Quando Helios começ ou a enfraquecer, Troy pegou as ré deas da firma de navios. Eu admiro meu irmã o, mas à s vezes me pergunto se ele aproveitou a vida como eu. E o que é a vida sem um pouco de loucura? Aposto que você també m pensa assim, nã o é?

Wilma prendeu a respiraç ã o, sentindo o rosto ficar vermelho até a raiz dos cabelos. Naquele momento, soube que Daniel nã o havia esquecido nenhum detalhe da cena no Hotel Cyrano. Era atento demais para esquecer qualquer coisa que acontecesse em sua vida. E ele també m pensava dela o que todo mundo pensou na é poca do escâ ndalo... Que ela era a amante de Myles Sadlier e que os dois tinham sido apanhados em flagrante pela esposa enfurecida.

Esperava que o passado estivesse morto e enterrado, mas agora ele tinha voltado, juntamente com o filho de Charmides. E havia qualquer coisa naquele homem que dizia que ele era capaz de muitas coisas... Daniel provavelmente acreditava que Myles Sadlier se divertira muito com ela e pensava que talvez ele mesmo pudesse aproveitar um pouco.

— Você se importaria de soltar meu pulso? — perguntou Wilma, afinal.

— Nã o tenho certeza se quero soltá -lo. — Ele ergueu o pulso dela e estudou-o com atenç ã o. — Como é que você veio parar aqui, para trabalhar como empregada de minha mã e?

— Eu... sou dama de companhia. Estou aqui há quase um ano e gosto do trabalho.

Falou claramente na defensiva. Aquele homem tinha o poder de mandá -la embora da Mansã o da Lua Cheia. A consciê ncia disso era como uma espada suspensa entre os dois, brilhante e afiada.

Aquela casa à beira da praia havia se tornado um lar para Wilma... Ela simplesmente nã o tinha para onde ir se saí sse dali. Sua casa na Inglaterra há muito tempo fora vendida. Depois da morte de seu pai, sua mã e mudou-se para a Franç a, onde casou com um francê s.

Wilma adorava o pai, que compunha mú sicas para filmes e propagandas. Ele a tinha ensinado a cantar e tocar violã o e piano. E era assim que ela ganhava a vida antes do escâ ndalo em Monte Carlo. Mas nã o gostava daquela vida e nã o queria retomá -la.

Olhou para Daniel Demonides e percebeu uma coisa muito importante: ele negava seu lado grego exatamente por ter um espí rito muito mais grego do que americano. No fundo, Daniel só respeitava uma mulher que fosse pura e recatada. E agora que se lembrava do escâ ndalo, ficava claro que jamais a respeitaria ou aceitaria como dama de companhia de sua mã e.

A expressã o dele fez o coraç ã o de Wilma disparar. Seu pulso já estava doendo, de tanto ser apertado.

— O que você fez para conseguir referê ncias? — ele perguntou bruscamente. — Falsificou alguma para trabalhar na Mansã o da Lua Cheia? Conheç o minha mã e e sei que é muito difí cil de ser enganada. Você deve ser tã o boa atriz quanto cantora e amante...

Wilma ficou chocada ao ouvir aquilo. Entã o ele admitia que a conhecia... Mas precisava lutar contra seu pró prio medo.

— Você nã o vai ganhar nada em ficar me atormentando — disse, secamente. — Vá e conte a sua mã e imediatamente que sou a famosa Wilma Bird, que cantava em Monte Carlo! É verdade, ela nunca me ligou à quele escâ ndalo pois eu usava um nome artí stico. Aqui, ela me conhece por Wilma Grayson, meu nome verdadeiro. Mas se pretende me denunciar aos pouquinhos, eu mesma contarei tudo ainda esta noite. Nã o pretendo brincar de gato e rato com ningué m, muito menos com você!

— Nenhum rato teria olhos como os seus, nem um cabelo tã o sedoso e tã o dourado. Pena que esse seu olhar de pureza e graç a nã o passe de uma grande mentira! Aposto que foi por causa desse jeito seu que minha mã e caiu no conto, nã o é? Com certeza ela acreditou que você era por dentro o que parece por fora.

— Por que tinha de voltar para a Mansã o da Lua Cheia? Nem sua mã e tem paciê ncia com você!

— Acertou de novo. Você e eu somos mais ou menos as ovelhas negras deste lugar. Só que, no seu caso, a lã parece mais dourada e tosquiada.

— Oh! Seu...

— Entã o pensa que eu vou denunciá -la aos pouquinhos, nã o é? Você nã o me conhece, querida.

— Eu nã o sou sua querida. Nem pretendo ser, se é isso o que está querendo. E nã o adianta me chantagear, ouviu?

— Chantagear você? Minha queridinha, provavelmente eu ganho em uma hora o que você ganha em um mê s.

— Você sabe a que eu estava me referindo. Faz parte da tradiç ã o, nã o é? A pobre empregadinha fica à mercê do filho da patroa. Só que eu iria a pé até a estaç ã o de trem só para nã o ter de suportar isso de você!

— Mas quanta imaginaç ã o! E como seus olhos brilham como raios quando fala assim! Devia ter ido para Hollywood, onde esse tipo de encenaç ã o lhe daria fama e fortuna. O que levou uma mulher bonita como você a trabalhar como dama de companhia? Está tentando cavar um lugarzinho dentro do testamento da minha mã e?

Aquilo foi demais! Wilma sentiu toda a raiva que vinha guardando desde o escâ ndalo em Monte Carlo. Com a mã o livre, lascou um bofetã o no rosto dele.

Daniel recuou ao sentir o golpe no nariz. Logo depois largou a mã o dela para tirar um lenç o do bolso. Wilma ficou olhando, fascinada e horrorizada, o lenç o branco manchar-se de sangue.

Daniel segurou o lenç o contra o nariz durante alguns segundos. Wilma ainda o olhava com certa curiosidade.

— Você dá um belo bofetã o — ele comentou, afinal. — Ningué m faz meu nariz sangrar desde meus tempos de escola.

— Agora tem uma coisa a mais para contar a sua mã e — Wilma respondeu com frieza. — Mas me diga uma coisa, os gregos nunca esquecem ou perdoam?

— Depende muito do que eles tê m de perdoar. Se quer saber, eu nã o tenho a menor intenç ã o de denunciá -la a minha mã e. Foi ela quem a contratou e cabe a ela despedi-la. Você está há quase um ano na Mansã o da Lua Cheia, nã o é?

— É

— Deve ter um bocado de paciê ncia. Minha querida mã e nã o é uma das pessoas mais fá ceis de se conviver. Como patroa, deve ser simplesmente infernal!

— Nó s nos entendemos razoavelmente bem. Seu nariz parou de sangrar?

— Tudo bem. Você bem que gostou de me dar um bom bofetã o e sabe disso.

— Gostei mesmo.

Wilma admitiu aquilo mas por dentro estava assustada. Nã o costumava enfrentar um homem. Só havia reagido daquela forma por medo. Afinal, Daniel Demonides aparecera no meio da noite, trazendo consigo lembranç as que ela queria esquecer... Era quase impossí vel provar sua inocê ncia... Daniel a tinha visto sair do quarto de Sadlier seminua...

Se ela dissesse ali, agora: " Eu fui drogada por aquele canalha. Ele queria se divorciar e me usou para conseguir isso", Daniel só iria olhá -la com desdé m. Na verdade, ele era um grego em corpo e alma. Para ele, as mulheres tinham duas funç õ es na vida: ser boas esposas e mã es. Qualquer mulher que estivesse fora da esfera domé stica serviria só para uma coisa: proporcionar prazer. Sabia que, para ele, cabia nessa ú ltima categoria. E de repente ficou magoada por ser vista daquela forma. Mas se nã o tinha intenç ã o de revelar o passado dela a Charmides, o que pretendia?

— Você pretende ficar na Mansã o da Lua Cheia? — Wilma perguntou bruscamente.

Lembrava-se agora da carta que Charmides tinha recebido pela manhã.

— Pretendo — ele confirmou, guardando o lenç o cuidadosamente. — Você tem alguma objeç ã o, minha jovem? Por acaso minha mã e teve um acesso de raiva ao abrir minha carta e saber que eu ficaria aqui algumas semanas? Será que, de raiva, ela jogou todos os perfumes e poç õ es pela janela?

— Sua mã e nã o disse uma palavra sobre sua possí vel chegada. Foi por isso que eu fiquei tã o... tã o surpresa ao ver você no mar.

— Saindo do mar. Como o demô nio. O terror da noite! Deve ter sido um belo choque para você ver algué m que poderia reconhecê -la como a jovenzinha apaixonada de Monte Carlo.

— Eu nã o estava apaixonada.

— Entã o pior ainda, minha crianç a. O amor pode, à s vezes, justificar a loucura de um casal num quarto de hotel. Mas admitir que nã o estava apaixonada! Que falta de vergonha!

— Ora, pense o que quiser!

Wilma abriu a porta violentamente. No hall de entrada, havia muitas malas de couro, pacotes e um enorme casaco de pele de lhama. Ao olhar para fora, só naquele instante percebeu um carro esporte estacionado.

Daniel entrou no hall atrá s dela, carregando o calç ã o e a toalha.

Ali, à plena luz, ela pô de vê -lo detalhadamente. Daniel tinha um corpo forte sob as roupas extremamente elegantes. E o cabelo, ainda molhado, parecia a lã de um carneiro negro. Nos seus olhos, havia um brilho irô nico de quem conhece bem a vida... Era um homem que parecia sempre tornar as coisas mais vivas e carregadas de sentido...

Ele apalpou o nariz. Depois, soltou uma gargalhada tã o baixa, que mal se podia ouvir.

Wilma nunca tinha ouvido ningué m rir daquela maneira. Aquela risada era como uma promessa de vinganç a pelo bofetã o recebido. Sentiu seu coraç ã o quase parar de medo. Ela nã o seria denunciada a Charmides, mas o que custou? O pior é que nã o era o que Daniel Demonides pensava: uma garota experiente e capaz de roubar o marido de outra.

Tinha vinte e dois anos e nunca se apaixonara realmente. També m nunca havia tido nenhum contato um pouco mais í ntimo com homem algum... Mesmo assim, ali estava ela; uma empregada na Mansã o da Lua Cheia, sendo olhada pelo filho da patroa de um jeito que nunca fora olhada antes.

As pupilas de Daniel estavam tã o dilatadas que quase preenchiam toda a í ris acinzentada. Wilma reparou nisso e sentiu como se estivesse mergulhando na escuridã o. Era como se estivesse caindo numa armadilha fatal...

Daniel aproximou-se mais dela e disse suavemente:

— O suspense, minha querida, é uma das sensaç õ es mais excitantes que podemos sentir.

— O que você está querendo dizer com isso?

— Nã o sou fofoqueiro, Wilma Bird, por isso seu segredo está a salvo comigo. Mas se continuar na Mansã o da Lua Cheia, estará arriscando seu lindo pescocinho.

— É mesmo? — Sentiu uma sensaç ã o esquisita, como se o ar fosse saltar a qualquer momento. — Você está insinuando... que vai tirar vantagem da minha posiç ã o aqui?

— Por que nã o? Eu vim esperando umas fé rias bem aborrecidas por aqui. Mas, de repente, encontro na Mansã o uma linda ladra de maridos bancando a dama de companhia. O cená rio já está se formando sozinho, minha pequena.

— Entã o, está me ameaç ando? Ou eu pego minhas coisas e desapareç o, ou você vai tentar me seduzir? É essa a histó ria que está escrita?

— Exatamente. Mas será que o tipo de mulher que você é pode ser seduzido?

Os olhos de Wilma soltaram faí scas e ela ficou tã o vermelha quanto a cor natural de seus lá bios. Detestou cada centí metro de Daniel Demonides... E ele era altí ssimo!

— Vá para o diabo! — disse, finalmente. — Você nã o vai me expulsar de um emprego que me agrada. Tem um belo nariz grego, sr. Demonides, e eu vou fazê -lo sangrar novamente se tentar me tocar contra minha vontade!

Dizendo isso, virou-se e subiu a escada correndo. Atrá s dela, ainda pô de ouvir Daniel rindo novamente. Mais ou menos no meio da escada, virou-se e olhou para ele mais uma vez. Ele representava o demô nio que tinha invadido seu paraí so e ela o odiava com fú ria.

Naquele instante, Daniel estava encostado no pilar da escada e olhava para ela cheio de ironia. Era como se tivesse absoluta certeza de que ela olharia para trá s. Sem dú vida, Daniel estava acostumado a dominar qualquer garota na hora em que bem entendesse!

Ao ver novamente aqueles olhos, Wilma sentiu que precisava fugir, como se o pró prio demô nio a perseguisse. Mas conteve aquele impulso e virou a cabeç a desdenhosamente. Ainda pô de ouvi-lo cantarolando baixinho: " Quando um cara mau, mau como eu... Encontra uma garota boa, boa como você... "

Aquele homem era capaz de uma ironia insuportá vel!

 

 



  

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