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CAPÍTULO VIII ⇐ ПредыдущаяСтр 8 из 8
— O que está pensando, Srta. Intrometida? Que Ruy me seduziu? — Bá rbara deu uma risada histé rica. — Gostaria que tivesse feito isso. Assim, don Rafael teria que consentir no casamento, em vez de mandar Ruy embora daqui. Sei que ele está planejando isso, Vanessa. — Saiu da cama e segurou a mã o dela, implorando: — Precisa falar com o padrinho. Ele vai ouvir você. . . — Seu padrinho me ouvir! — A idé ia chegava a ser engraç ada, mas nã o havia nada para rir no estado lastimá vel em que a garota se encontrava. — Babs, ele me considera uma adolescente desmiolada, igualzinha a você. Nã o dá a menor atenç ã o a nada que digo. A nã o ser para me censurar e provocar. Há també m o problema da instabilidade de Ruy. Don Rafael acha que ele é como o pai e nã o quer que você sofra o que a mã e dele sofreu. — Nã o me interessa se o pai e a mã e dele foram infelizes. Nã o vamos viver a vida deles. Só queremos viver a nossa, em paz. Se duas pessoas se amam, o que pode ser mais importante? Se o padrinho mandar o meu Ruy embora, vou atrá s dele. Eu juro! — Isso nã o é coisa que se diga, Babs. — Madre mia! Você nã o pode entender. Nunca amou ningué m. Senã o, saberia por que prefiro ser infeliz ao lado de Ruy do que miserá vel sem ele. E me ajudaria a tentar convencer don Rafael. Ele nã o é um deus, é só um homem! — Bá rbara. . . — Por favor, por favor! — Os olhos da garota se encheram de lá grimas. Quem sabe, nã o poderia pelo menos tentar convencê -lo de que era um sentimento autê ntico, um diamante bruto, o que existia entre a afilhada e o primo? Ele també m estava apaixonado. Talvez entendesse e aceitasse. — Nã o tenho tempo para conversar sobre isso agora, Bá rbara, mas... mas vou ver o que posso fazer. — Vanessa, você é um anjo, e eu fui tã o má. — Abraç ou-a e beijou seu rosto. — Desculpe as coisas horrí veis que eu disse esta tarde. — Claro, sua boba. Sentiu um aperto no coraç ã o, ao ver a garota tã o animada. Nã o devia ter prometido nada. Era uma tarefa difí cil e, se fracassasse — e todas as chances eram contra —, Bá rbara ia sofrer muito mais do que já estava sofrendo. Para que dar falsas esperanç as? Don Rafael estava convencido de saber o que era melhor para a afilhada e, naquele caso, concordava com ele. Que argumentos ia usar? Mais uma vez, se deixara levar pelo sentimentalismo. — Volte para a cama e tente descansar. Tenho que sair agora. — Divirta-se! — Bá rbara sorriu. — É bem bonitã o o americano. Gosta dele? — Sim, eu gosto dele. Buenas noches, querida. — Buenas noches. Outra vez no corredor, Vanessa sentiu um nó na garganta. Pobrezinha da garota! E pobre dela, que cada vez se envolvia mais com aquela gente temperamental do Castelo de Ouro. Desceu a escada e encontrou Gary esperando por ela no hall. Conversava com don Rafael, mas os dois homens pararam de falar quando a viram. Nã o fazia idé ia de como estava linda, toda de branco, com suas jó ias e seus olhos de jade e o cabelo iluminado pelo enorme candelabro mourisco. Gary foi ao seu encontro. — Garota, está fantá stica! — Obrigada. Embora sorrisse para ele, sua atenç ã o estava voltada para o homem parado a alguns metros dos dois. Se don Rafael reconheceu as jó ias que estava usando, nã o demonstrou. Seu olhar continuou frio e impessoal. Acompanhou-os até a porta, desejou que tivessem uma noite agradá vel e, gentilmente, ajudou-a a entrar no carro. Quando se afastaram, descendo a alameda principal, Vanessa nã o resistiu e olhou para trá s: ele continuava lá, fumando um cigarro. — Quê hombre! — Gary disse. — Uma lâ mina do mais puro aç o de Toledo numa capa de veludo negro. Deve estar feliz de poder se afastar dele por algum tempo, hein, querida? — Sim. Tanta autoridade à s vezes chega a me sufocar. — Mesmo assim, o tirano fez uma pequena concessã o: disse que podemos voltar à s onze. Parece que, de vez em quando, ele desce das alturas e vira um ser humano. — É, de vez em quando... — repetiu, lembrando-se do señ or lhe dizendo que o amor era uma dá diva, um aperto de mã o que faz a gente sentir um arrepio. Apertou com forç a a bolsa e sentiu que seu rosto queimava tanto, que deu graç as a Deus por Gary estar concentrado na estrada. Ele nã o notou nada. Quando chegaram ao restaurante, já estava mais calma e controlada. A noite foi muito agradá vel. Gary era do tipo que falava mais do que ouvia e, no estado de espí rito em que se encontrava, Vanessa nã o estava disposta a contribuir com outra coisa, alé m de sua presenç a. O que, para ele, parecia ser suficiente. Jantaram num lugar chamado Hibisco Pá tio, com mesas ao ar livre, iluminadas por velas coloridas, e mú sica de guitarras. Gary pediu rum e vermute e Vanessa quis apenas suco de tomate. — Suco de tomate! — Ele riu, depois que o garç om se afastou. — Garota, estã o treinando bem você naquele castelo maluco. Felizmente, estou aqui para salvá -la. E é o que pretendo fazer. Pelo menos, ponha um pouco de vodca nesse suco. — Meu Deus, outro macho dominador! O que será que eu tenho que faz os homens pensarem que preciso ser guiada pela mã o? — Eu sei exatamente para onde gostaria de guiar você. Daqui a mais ou menos um mê s, vamos perfurar mais uns malditos poç os de petró leo no Chile. Por que nã o faz as malas e vai comigo? Chile! Jack Conroy també m estava lá. — Esses olhos brilhantes significam que gostou da idé ia, ou que está com vontade de me dar um soco no nariz? Nã o interprete mal o convite, querida. É claro que nã o estou interessado em você como uma irmã zinha, mas tenho uma porç ã o de amigos casados no Chile que podem hospedar você e ficar de olho no reló gio toda vez que sairmos de noite para uma festinha. — Gary, está perdendo seu tempo fazendo todos esses planos. Eu nã o disse que vou. Que idé ia! Nó s nos conhecemos há poucos dias. Faz esse tipo de convite a toda garota que encontra? — Claro que nã o. Você é especial. É linda e está desperdiç ando sua beleza bancando a governanta de uma adolescente chata. O sujeito salvou a sua vida, mas isso nã o dá a ele direitos exclusivos sobre ela. Está correndo um boato na ilha de que o señ or vai se casar com uma viú va. Aposto meu salá rio como ela nã o vai querer uma jovem e bela governanta em seus domí nios. O garç om voltou com as bebidas e o cardá pio. Fizeram o pedido e Gary ergueu o copo, brindando: — Vive Ia diffé rence, como dizem os franceses. — Ningué m pode acusar você de ser convencional! — Vanessa riu. — Saú de! — E você é? Com esse seu sangue irlandê s? — Como sabe disso? — Ora, branquela, basta olhar. Até aposto que sua mã e é que era irlandesa. — E ganhou a aposta. Hereditariedade é uma coisa engraç ada, nã o acha? Nem meu pai nem minha mã e tinham este cabelo, quase vermelho, ou gê nio ruim. E eu tenho os dois. — Ó timo, adoro uma garota geniosa. Você preenche todas as minhas especificaç õ es, querida. — Estou lisonjeada. Mas, por que está tã o seguro de que você preenche as minhas? — Ei, assim você arruí na a minha reputaç ã o de conquistador. — Ele riu. — O que há de errado comigo, entã o? Todas me acham um sujeito muito simpá tico e, sem falsa modé stia, a maioria ficou muito satisfeita. Sempre me orgulhei de ser um homem que faz uma mulher se sentir mulher. Mas estava me esquecendo de que você ainda nã o teve esse tipo de contato í ntimo, nã o é? Precisamos fazer algo a respeito. — É mesmo? Já tinha ouvido dizer que os americanos trabalham rá pido, mas você deve ter batido o recorde. Ele fez uma cara inocente. — Ora, eu só estava falando em danç ar. O que acha? — Adoro danç ar. — Entã o, vamos depois ao Skylight Room. . . Ah, aí vem o nosso jantar. Enquanto jantavam, ele contou suas aventuras. Os lugares onde tinha ido perfurar poç os de petró leo, os dois anos num rancho texano, o dia em que um fazendeiro mexicano correu atrá s dele com uma espingarda. — Esse pessoal de sangue latino é fogo: tem umas idé ias estranhas sobre amor e casamento. — Você quer dizer que levam isso a sé rio — Vanessa corrigiu. — Amor é um assunto sé rio, nã o uma brincadeira. — Claro que é. Mas quando a gente leva na brincadeira, ningué m sai machucado. Eu nunca feri uma garota. Acredita? Era a primeira vez que o via tã o sé rio. Depois de um momento de hesitaç ã o, Vanessa fez que sim com a cabeç a. — Acho que acredito. Pelo menos, acredito que nunca quis ferir nenhuma dessas moç as, mas o problema é que as mulheres se envolvem mais do que os homens. É da natureza delas. E poucas conseguem brincar com amor e sair inteiras. — Nã o estou pedindo para entrar na brincadeira, doç ura. Desta vez, eu quero me envolver. Embora parecesse muito sincero, Vancí sa ficou mais divertida do que impressionada. Gary sabia tã o pouco sobre o amor, apesar de toda a sua experiê ncia româ ntica. — O amor — disse ele — pode ser uma coisa profunda como o oceano, nã o acha? — É. — Para ela, era muito mais do que isso; era uma necessidade fí sica e emocional, companheirismo, entrega total. E era assim que desejava amar e ser amada. Mas tudo aquilo parecia tã o difí cil. Afastou o pensamento triste. Era noite de sá bado, noite de se divertir. — Se vamos mesmo ao Skylight, é melhor a gente se apressar. A boate do hotel estava cheia de turistas europeus. Tinha uma boa orquestra e uma pista bem escura. Vanessa era uma boa danç arina e, quando fechou os olhos, foi quase como se estivesse novamente nos braç os de Jack. Imaginou o tio, sentado ao lado do toca-discos, fumando seu cachimbo. Entã o, um outro personagem surgiu em sua fantasia: um homem alto, moreno, parado na varanda da fazenda, olhando para o casal com um ar de reprovaç ã o. Sacudiu a cabeç a para expulsar aquele fantasma. A mú sica terminou. Foram até o bar e, desta vez, Vanessa aceitou algo mais forte do que suco de tomate. Gary tomou outro rum com vermute e já estava meio alterado. Apertou-a mais junto do corpo, quando voltaram para a pista. — Gosto desse perfume — disse no ouvido dela. — Como é o nome? — Nã o sei. — A pressã o dos braç os dele começ ava a alarmar Vanessa. — Acho que foi feito especialmente para a mã e de don Rafael. Estou ocupando a suí te que era dela. — Você nã o me parece muito maternal. Está se divertindo, doç ura? — Nã o me divirto tanto há... semanas. — Eu també m. Tenho nos braç os uma garota linda, de cabelo de fogo, olhos de jade e cheirosa como uma flor exó tica. O que mais um homem pode querer? — Mas ele queria muito mais, porque logo depois perguntou: — Vamos até o terraç o? — Nã o. — Por quê? — Seu há lito cheirava fortemente a rum. — Sei tudo sobre garotas... sei que elas gostam das mesmas coisas que os homens... — Acho melhor voltarmos para casa, Gary. — Sua bobinha! Nã o deve nada ao maldito espanhol! Quando ele se casar, vai botar você para fora de lá. Vamos para o Chile! Pode ficar na casa de uns amigos meus. Nã o estou fazendo nenhuma proposta desonesta. Chile! Ver Jack novamente! Ele era o ú nico amigo de verdade que tinha. — Diga que vai comigo, e prometo levar você para casa depois dessa mú sica, feito um bom garoto. — Está bem. — Era ela mesma quem estava dizendo aquilo? — Mas tem que me prometer se contentar com a minha amizade. Nã o tente conseguir nada que eu nã o esteja disposta a dar. — OK, sem truques. Só quero ver o que don Rafael vai dizer. Será que é capaz de tentar impedir? — Talvez tente. Mas, como você mesmo disse, ele nã o tem direitos exclusivos sobre a minha vida e o que faç o dela. Era amigo de meu tio e quis me convencer a sair de lá, antes que a situaç ã o ficasse muito perigosa. Já conhece a minha teimosia. Quero deixar logo aquele castelo, Gary. Sempre quis. Mas devo tanta coisa a ele. . . — Deixe de escrú pulos bobos! — Deu uma risada. — Don Rafael é o sujeito mais rico da ilha. — Nã o é esse o problema. Ele é um homem generoso. Só que, quando a gente sente que algué m está sendo generoso por mera obrigaç ã o... Bem, odeio aceitar qualquer coisa dele. Nossas/ relaç õ es sã o difí ceis, tensas, ameaç ando explodir... — Respirou fundo. — Estou trabalhando para ele para poder comprar a minha liberdade. — De qualquer maneira, ele salvou a sua vida. E, mesmo que só tenha sido por senso de responsabilidade, acho que agora a coisa mudou um pouco. Duvido que nã o goste de ter no castelo uma raridade igual a você. — Até parece que sou uma relí quia de museu. — Você sabe o que eu quis dizer. — Encostou o rosto no dela. — Nã o é todo dia que um cara encontra uma garota assim. Vanessa sentiu-se culpada. Mas nã o podia dizer a ele que ia para o Chile por causa de outro homem. E se fosse sozinha? Seu salá rio daria para pagar a passagem de aviã o... e devia haver por lá famí lias europé ias que contratariam uma babá ou uma governanta. Sim, talvez fosse melhor partir sozinha. . . A mú sica terminou e Gary cumpriu a promessa de levá -la para casa. Mas a mã o que pousou no ombro dela tremia tanto que Vanessa chegou a duvidar de que ele estivesse suficientemente só brio para guiai. O problema é que o carro era americano e ela estava acostumada com os ingleses: se atrapalhava toda com os controles do lado esquerdo. Ao chegarem no estacionamento, descobriu que nã o era só o á lcool o responsá vel pelo descontrole de Gary. Antes de entrarem no carro, ele a abraç ou, selvagem. — Nã o agü ento mais ser bem-comportado, boneca. — Pare com isso, Gary. Já está ficando tarde... Um beijo violento e faminto abafou os protestos de Vanessa. Quando ele finalmente a soltou, tinha um olhar cí nico. — O que é que há? É fria ou se acha melhor do que as outras? — Só um pouquinho antiquada. E ser agarrada num estacionamento nã o me parece nada româ ntico. Por que você tinha que estragar nossa noite? — Estragar? — Abriu a porta para ela. — A maioria das garotas até se ofende, se a gente nã o tenta nada. Pelo jeito, vou morrer gelado no Chile. Bateu a porta com forç a e saiu cantando pneu. Logo deixavam a cidade e pegavam a estrada de terra, onde dirigir a mais de oitenta era uma temeridade... e o Chevrolet corria a quase cem. — Muito rá pido para você? — Gary perguntou, insolente. — Pensei que estava louca para chegar em casa. Daquele jeito nã o iam chegar a lugar nenhum. Mas ela nã o disse nada. Ficou de olho no velocí metro e suspirou, aliviada, quando avistou o castelo. Graç as a Deus estava perto de casa! Casa? Era estranho pensar isso de um lugar de onde queria fugir. Nã o tinha mudado de idé ia sobre ir para o Chile, procurar Jack. Só desistira de ir com Gary. . . O carro freou de repente, jogando-a de encontro ao painel. — Pelo amor de Deus, Gary, tenha mais cuidado. — Estou acostumado com estradas ruins. Depois, está quase na hora de a Cinderela perder o encanto. — Deixe-me dirigir. Falta pouco para chegarmos. . . — Tudo tem que ser sempre do seu jeito, hein? — Tirou a mã o do volante e pousou no joelho dela. E foi nesse momento que o carro caiu num buraco, deu um solavanco e derrapou. Gary agarrou a direç ã o, mas o á lcool havia prejudicado seus reflexos. Era tarde demais: o pesado Chevrolet saiu da estrada e o mundo começ ou a girar. A ú ltima coisa que Vanessa viu foi o corpo de Gary numa posiç ã o esquisita, parecendo um boneco partido. Depois, o silê ncio e a escuridã o. No fundo do barranco, o que havia sido o carro de Gary Elsing se transformou num monte de ferro retorcido. Oh, aqueles tambores, por que nã o paravam? Por que nã o iam embora? Tio Len havia sido tã o bom para aquela gente. . . nã o podiam querer fazer mal a ele, ou a ela! Que cheiro forte era aquele, tã o adocicado e enjoativo? Estava na floresta? Eles iam pegá -la! Nã o, nã o! E aquela luz. . . Era fogo. O incê ndio. Tio Len! — Ela está voltando a si, señ or. Nã o conhecia aquela voz de mulher. Señ or? Ele. . . saindo do escritó rio do tio. . . com uma arma na mã o. Tã o alto, tã o moreno. Tã o zangado com ela! Fez um esforç o para abrir os olhos. A cabeç a doí a. — Vanessa. . . — Um rosto de homem foi aos poucos entrando em foco junto do dela. — Você me reconhece? Sim, é claro. Ele costumava visitar tio Len. . . Alguma coisa tinha acontecido com seu tio? — Ele está ferido? — Tentou se levantar, mas mã os fortes a impediram. —- Oh, por favor, eu. . . eu preciso ir vê -lo. . . — Acho que ela está preocupada com o rapaz — ele falou para algué m que Vanessa nã o podia ver. — Graç as a Deus saiu do estado de coma. Era uma mulher. . . com uma espé cie de. . . halo na cabeç a. Uma enfermeira? Por quê? — Quer um pouco de caldo de galinha, querida? A enfermeira se sentou ao lado da cama e colocou uma colher entre os lá bios de Vanessa. Ela engoliu o lí quido e viu o halo se voltar na direç ã o do homem moreno. — Essa crianç a está faminta, señ or. Bom sinal. Logo estará boa e forte novamente. Ele respondeu em espanhol. Vanessa quis virar a cabeç a, mas nã o pô de. Estava enfaixada, era isso? Compreendeu que tinha ficado doente... ou ferida. Mas nã o lembrava o que havia acontecido. Precisava lembrar, precisava... — A cabeç a está incomodando, querida? — A enfermeira pousou a mã o fria em sua testa. — Nã o deve se preocupar. Tudo está bem, agora. Feche os olhos e durma. Quando acordar, vai se sentir bem melhor. Nos dias seguintes, Vanessa se recuperou e, aos poucos, as lembranç as voltaram. Irmã Isabel, a enfermeira, contou-lhe que Gary tinha sofrido fraturas no corpo todo, quando o Chevrolet capotou no barranco, perto do castelo. Vanessa fora atirada para fora do carro e batera com a cabeç a numa pedra. Um ferimento sé rio. Mas agora já estava bem e teria alta do hospital naquela manhã. Ainda nã o podia levantar-se. Por isso, irmã Isabel ficaria cuidando dela, no castelo, por mais uma semana. — Quantas flores! — A enfermeira sorriu, ao entrarem no quarto. — Nã o está feliz de voltar para casa? Alé m das flores, havia uma cesta com frutas, caixas de doces, revistas inglesas. . . e um enorme vidro de á gua-de-colô nia " de Bá rbara, com carinho". A garota passara para vê -la, mas as visitas estavam proibidas até a hora do almoç o, irmã Isabel informara. — A senhora é uma tirana — Bá rbara falou bem alto, para que Vanessa soubesse que ela estava lá. — Esta casa está cheia de tiranos. — E foi embora. Entã o, tudo continua na mesma, pensou Vanessa. Don Rafael nã o havia mudado de idé ia sobre mandar Ruy embora. Pobre garota! Sua cabeç a, agora livre das ataduras, ainda doí a um pouco. Sentia-se fraca e impaciente. Nunca tinha ficado doente, presa numa cama. Mas, no í ntimo, era um alí vio saber que nã o precisava mais cumprir a promessa feita a Bá rbara. Nem contar a don Rafael que ia para o Chile. Como atraí do por seu pensamento, ele bateu na porta exatamente naquele momento e entrou, sorridente. — Está com ó tima aparê ncia, pequena. Se importa se eu me sentar aqui ao seu lado? Claro que se importava. Mas concordou, com a cabeç a, e ficou olhando, ansiosa, enquanto ele puxava uma cadeira para perto da cama. O que será que tinha para dizer? — Estou atrapalhando sua siesta? — Nã o... é só que... nã o esperava que viesse. Tem alguma coisa importante para me dizer? — Queria saber como está se sentindo. O ferimento na cabeç a foi bem sé rio, hein? — Tocou delicadamente a pequena cicatriz na tê mpora de Vanessa. — Isso vai desaparecer com o tempo. Irmã Isabel diz que você está se recuperando depressa. Mas há certas informaç õ es que só você pode dar. Por exemplo: até que ponto esse acidente alterou os seus planos? Seus planos! Entã o, ele sabia que estava pensando em deixar o castelo. Mas como? Teria falado, enquanto estava inconsciente? — Conversei com o señ or Elsing no hospital e ele me disse que você s tinham combinado ir juntos para o Chile. É verdade? — Eu. .. eu tinha resolvido ir, sim. Mas sozinha. — Nã o queria discutir aquele assunto agora. Segurou o queixo dela. — Ei, por que está tremendo desse jeito? — Nã o pode me impedir de viajar — Vanessa quase gritou, descontrolada. — Nã o entende que preciso ter a minha pró pria vida? Aqui. . . aqui nã o há futuro para mim. — E no Chile, há? Vanessa nã o respondeu e abaixou os olhos. Don Rafael forç ou-a a levantar a cabeç a e encará -lo. — Pretende se casar com esse maluco que quase matou você? Vi quando a levaram para o hospital, toda coberta de sangue. É uma coisa de que nunca vou me esquecer. E a culpa foi dele. Um irresponsá vel que estava dirigindo bê bado. Quer que eu acredite que ama um homem desses? — Nã o, eu nã o o amo. . . — Cristo! Isso nã o faz sentido. Nã o o ama, e mesmo assim ia com ele para o Chile? Ela sacudiu a cabeç a, desesperada. — Nã o. Só concordei no começ o. Depois, mudei de idé ia. — Ele deu motivos para mudar de idé ia? Tentou fazer alguma coisa com você? — Ele me beijou, só isso. Señ or, está me machucando! Soltou o rosto dela, envergonhado. — Desculpe. É que estou com tanta raiva desse sujeito, desde o acidente, que perdi a cabeç a. Entã o, ele a beijou. E você nã o gostou? — Nã o, eu nã o gostei. — Olhou para ele, implorando. — Por favor, por que esse interrogató rio? Já disse que nã o vou viajar com Gary. . . — Entã o, é claro que quer ir para lá por causa do jovem Conroy, nã o é? — Como sabe? — Esqueceu-se de que eu era o confidente de seu tio? Ele me contou que você costumava escrever para o rapaz. O endereç o era o de um hotel em Santiago. Logo. . . — Inclinou-se para ela e olhou bem dentro dos olhos verdes. — Está tã o ansiosa assim para correr para os braç os desse rapaz que fica em pâ nico só de pensar que posso tentar impedi-la? Acha que sou um monstro feito de aç o? — Nã o. Nã o é todo feito de aç o. — Sorriu, ao vê -lo tã o sé rio. É capaz de se emocionar com um bebê ou com um pô r-de-sol. Acho que foi um garoto mimado demais, que de repente perdeu o pai e a mã e e nã o suporta mais nenhum tipo de perda, por mais insignificante que seja. Ele també m sorriu, mas os olhos continuaram frios. — É, talvez seja isso. Mas sou um bom perdedor, embora nã o tenha muita experiê ncia nisso. Sei que nã o adianta argumentar com uma mulher, quando ela mete alguma coisa na cabeç a. Se deseja tanto ir ao encontro do jovem Conroy, deve ir. Tinha a esperanç a de que se esquecesse dele. — Deu de ombros. — Mas, se nã o consegue, é porque deve estar mesmo muito apaixonada. Nã o tenho o direito de impedi-la. . . — Señ or, será possí vel que nã o entende? Jack e eu somos apenas bons amigos! — Muito britâ nico! Pode ficar tranqü ila, pequena, nã o vou criar o menor problema. De certa forma, é um alí vio saber que nã o está envolvida com o tal Elsing. Se estivesse, eu nunca permitiria que saí sse daqui. Mesmo que fosse preciso trancá -la numa torre. Levantou-se e foi até a janela. Vanessa tinha vencido, mas era amargo o gosto daquela vitó ria. Ficaram em silê ncio durante alguns momentos. Entã o, ele se virou e perguntou, zangado: — Por que diz que nã o há futuro para você aqui? — O senhor nã o vai se casar logo? Imagino que sua mulher nã o vai me querer no castelo. Alé m do mais, sempre deu a entender que tinha planos para Bá rbara. Planos de casamento. E já que estamos falando nisso, gostaria que soubesse que ela está muito infeliz. De verdade. Sabe que vai mandar o señ or Alvadaas embora e me disse que pretende fugir com ele. Don Rafael voltou para perto da cama, as mã os nos bolsos, o olhar sombrio. — Sei que pensa que sou severo demais com Bá rbara mas só estou pensando no melhor para ela. Tem um temperamento muito apaixonado e era inevitá vel que se sentisse atraí da por um homem cheio de charme como o meu primo. Temia que ela se encantasse por ele, mas nã o consegui evitar. Bá rbara está fascinada, só isso. — Talvez nã o seja amor de verdade, mas o sofrimento é verdadeiro. — Segurou o braç o dele, num gesto impulsivo. — Ela está obcecada pela idé ia de que o senhor quer forç á -la a se casar com algué m escolhido pela famí lia. Nã o acredito nisso, mas ela, sim. Por favor, tente se colocar no lugar de Bá rbara: gostaria que escolhessem sua esposa, sem consultá -lo? — Nã o se trata de escolher ningué m. Apenas acho que o cará ter é mais importante do que a aparê ncia. — Nã o. O mais importante é o amor. — Está certo, mas há pessoas que nã o merecem ser amadas, e essa é uma delas. Por todos os motivos, inclusive porque só está interessado na fortuna de Bá rbara. Ele jogou fora em farras a heranç a que recebeu dos pais e agora precisa arranjar quem financie a boa vida que está acostumado a levar. Bá rbara nã o pode amar um homem que nã o presta. Mas se foi cega o bastante para se apaixonar, algué m tem que impedi-la de estragar para sempre sua vida, casando-se com ele. Ruy vai embora, e ponto final. Dentro de alguns dias, começ a a festa da colheita, e algum rapaz bonito e decente tomará o lugar dele no coraç ã o dela. Fiesta, mú sica cigana e danç a sempre trazem o amor para a ilha. Enquanto falava, sentou-se na beira da cama. Agora, segurava a mã o de Vanessa, que tremia. — Parece fraca. Cansei você? Sacudiu a cabeç a, emocionada demais para falar. Sim, estava fraca, mas era a fraqueza de uma mulher que nã o agü entava mais sufocar as emoç õ es. Queria que ele soltasse sua mã o e fosse embora. Queria acabar com aquela tortura de estar tã o junto dele e nã o poder. . . nã o poder. . . — Ainda nã o viu os danç arinos de flamengo, viu? Vai gostar. — Mas... eu vou partir. — Nã o antes de estar completamente recuperada, e na semana que vem vamos dar uma festa no castelo. Ainda estará aqui. Uma festa? Uma festa de noivado, sem dú vida. — Claro, señ or, ficarei para a festa. Ele se levantou e saiu, sem dizer mais nada. Agora, podia chorar à vontade. Que tola tinha sido por nã o entender antes o que realmente sentia por don Rafael! Ela o amava! Pensar que estaria presente à festa de seu noivado deixava seu coraç ã o sangrando. Deus, precisava fugir daquele castelo. Morreria, se tivesse que assistir també m ao casamento dele com Lú cia Montez! Os dias seguintes foram uma tortura. Até Gary telefonou, para lhe tirar a paz. Estava com remorso e ao mesmo tempo indignado, porque don Rafael tinha proibido que voltasse a pô r os pé s no castelo. — Tenho que ver você, querida. Preciso lhe dizer como sinto por tudo o que aconteceu. O que houve? Ele manté m você prisioneira aí? — Nã o seja ridí culo. — Riu, mas lembrou que don Rafael tinha dito que a prenderia na torre, se fosse preciso, para afastá -la do americano. — Como está se sentindo, Gary? Soube que se machucou muito. Foi grave? — Eu mereci, por dirigir feito um doido. Vanessa, e a nossa viagem. . . nada feito? — Acho que nã o. — Foi idé ia sua ou uma ordem do maldito espanhol? Diabo, quem ele pensa que é? Criou um caso infernal, me acusou de quase ter matado você e mandou cassar a minha carteira de motorista por um ano... acredita nisso? — Bem, só assim você aprende. — Está do lado dele? Só queria saber o que foi que ele fez para você desistir da viagem... — Don Rafael nã o teve nada a ver com isso. Eu é que mudei de idé ia. . . — Entã o, nã o tenho nenhuma chance? Nã o vai me deixar provar que nã o sou aquele louco que jogou o carro no barranco? — Nã o é nenhuma tragé dia, Gary. Logo você vai encontrar outra garota e me esquecer. Conversaram mais algum tempo, até ele se convencer de que nã o havia mesmo a menor esperanç a. Desejou a Vanessa toda a felicidade do mundo e desligou. No dia seguinte, quando tomava sol no terraç o, uma empregada lhe entregou um pequeno pacote, trazido por um mensageiro. Dentro de uma caixinha de camurç a, havia um cordã o de ouro e um trevo de pedras verdes. O sí mbolo da Irlanda! Aquele Gary. . . Leu o cartã o: " Sou um cara melhor, depois de ter conhecido você, branquela. E na pró xima vez que encontrar uma garota de cabelos meio avermelhados, olhos verdes e gê nio ruim, nã o vou deixar escapar. Prometo". Naquela tarde, irmã Isabel deixou que descesse para lanchar com os outros. Usou o colar e, de alguma forma, o contato do pequeno trevo em sua pele ajudou-a a enfrentar o que a esperava. Felizmente don Rafael nã o estava em casa. Só encontrou Bá rbara no pá tio, e parecia pé ssima. Ruy tinha partido para Madri. . . —... Mas o pior, Vanessa, foi ver a cara dele. Estava alegre, despreocupado, um turista. Fui só um passatempo na vida dele. Acabei com os homens. Eles dizem que amam a gente, mas só querem se divertir. Nã o quero nunca mais saber de homens! — Nem todos sã o iguais. E é conhecendo tipos como Ruy que você vai dar valor aos outros, aos que valem a pena. Encantamento e amor sã o duas coisas diferentes, como o tempo e a maré. Um é eterno; o outro, vai e volta. A firme determinaç ã o de Bá rbara de nunca mais olhar para um homem começ ou a ser posta à prova naquela mesma noite, quando os convidados da festa do dia seguinte começ aram a chegar. Entre eles, havia um jovem portuguê s, moreno e de olhos negros, uma beleza de se olhar. Ah, Vanessa pensou, vendo Bá rbara fazer charme, que aquele devia ser o escolhido de don Rafael! Ele conhecia tã o bem as mulheres, e no entanto ia ficar noivo de uma que nã o o merecia. A viú va era artificial demais; uma atriz, como dona Manuela tinha dito. A velha senhora percebeu que ela nã o se sentia bem. — Está tã o quietinha, minha filha. Sentindo alguma dor? — Nã o, tudo bem — respondeu, sem tirar os olhos do casal que acabara de entrar no salã o. — Está elegante a señ ora Montez, nã o acha? Lú cia e don Rafael conversavam com um grupo de amigos, afastados delas, mas o perfume exó tico que a viú va usava e seus risos enchiam a sala. Ele a abraç ava pela cintura e Vanessa sentiu o ciú me pesar no coraç ã o. Queria fugir dali, sem amanhã à noite, sem festa, de noivado. — Formam um belo casal — disse, tentando disfarç ar. Dona Manuela nã o respondeu. Naquele momento, Bá rbara tornou-se o centro das atenç õ es. Tocava guitarra muito bem e, a pedido do padrinho, ia cantar uma das belas mú sicas dos nativos. Vanessa esperava tudo, menos ouvir a mesma melodia que o pescador tinha cantado, no dia em que chegou à ilha. A que falava do mar e do amor, dizendo que ambos eram belos e crué is. Oh, sim: o amor era cruel. Mais do que qualquer coisa no mundo, quando você ama e nã o é amada. Nã o agü entava mais ficar ali. Fugiu para o jardim. Ainda podia ouvir a guitarra. Sentia que onde quer que fosse, durante o resto da vida, ouviria aquela mú sica. E que, por mais que amasse don Rafael, nunca deixaria de ser uma estranha em seu jardim. . . — Por que está chorando? A voz era terna, e os braç os que a envolveram, protetores. Deixou que ele a apertasse contra o peito. — Vamos, nina, por que está chorando aqui, sozinha? Nã o sabe que logo vai estar nos braç os do homem que ama? Estava nos braç os do amado, mas ele nunca saberia disso. — Agora, diga-me o motivo de tanta tristeza. Será que está com um pouquinho de pena de nos deixar? — É — murmurou, com medo de quebrar o encanto daquele ú ltimo abraç o. Já havia estado nos braç os dele, mas nunca como uma mulher apaixonada. Já havia sentido sua respiraç ã o no cabelo, mas nunca desejando sentir també m o calor de seus lá bios. Amava aquele homem... amava... Mas era uma loucura! Afastou-se e fez um esforç o para encará -lo. À luz do luar, os olhos dele brilhavam de uma maneira estranha... — Tolinha! Ainda insiste em que me odeia? — Segurou o rosto dela. — Adorada, você me odeia? Adorada! Ele tinha mesmo dito isso? — Nã o. Eu o amo, Rafael. Ser beijada por ele foi como descobrir um mundo novo e maravilhoso. Sentiu seus lá bios no rosto, no pescoç o, nos ombros. . . Mas, nã o! Estava tudo errado! Lú cia era a mulher com quem ele ia se casar. Como podia fazer aquilo com ela — com elas — na vé spera do noivado? Lutou para se libertar. — Por quê, Vanessa? Tem tanto medo assim do amor? Eu a adoro! — Nã o deve dizer isso. Nã o é a mim que você ama. . . — Dió s! — Suas mã os tornaram-se violentas. — Você está no meu sangue, na minha pele, no meu coraç ã o. Como se atreve a dizer que nã o a amo? Quem mais eu poderia amar? A viú va ambiciosa que só deseja ser a dona do castelo? O coraç ã o de Vanessa batia tã o rá pido que ela se sentia sufocar. — Você me ama? — Adoro, desejo, sou louco por você. Há muito tempo. Mas você preferiu pensar que era outra coisa. Isso me deixava desesperado. Quando eu ia a Ordaz, era para ver você. Porque nã o conseguia tirar da cabeç a uma adolescentezinha inglesa que nem sabia se eu estava vivo ou morto. Ela riu e deitou a cabeç a no ombro dele. Depois, acariciou o cabelo negro, o rosto moreno, os lá bios, que ainda há pouco sorriam para Lú cia Montez. — Você nã o se comportou como um homem apaixonado, quando me trouxe para Luenda. — Ah, nã o? — Beijou-a no pescoç o. — Acha que foi fá cil ficar com você naquele barco, desejando fazer amor com você e sabendo que tinha medo de mim. . . sabe Deus por quê? E ainda havia o tal Conroy. Nã o parava de falar nele. Estava disposta até a viajar para o Chile. Ia fazer uma pé ssima troca, mocinha. — Estava fugindo de você, Rafael, porque pensava que nã o me queria. — Lá grimas rolaram pelas faces, e ele a abraç ou mais forte, beijando seu cabelo. — Nunca deixei de querer você, meu anjo. Se algumas vezes parecia cruel e tentava feri-la, era porque você me deixava inseguro. Fazia com que me sentisse fraco, vulnerá vel. Alé m disso, percebia que havia muitas diferenç as entre nó s, pontos de vista opostos. Eu queria.. . nã o, nã o é a palavra certa... eu ansiava por poder falar dos meus sentimentos, mas tinha medo de que você nã o compreendesse. Ou, pior ainda, de que nã o correspondesse. Entã o, eu fingia. Como você també m fingiu, outro dia, quando fui ao seu quarto. — Eu pensava que você ia casar com Lú cia. — Lú cia sempre soube que eu nã o a amava. Mas ela é do tipo que nã o desiste de um homem, até vê -lo no altar com outra mulher. — Mas até a sua avó estava certa de que era com ela que você ia se casar. — Madrecita quer tanto me ver casado que, para ela, toda mulher que conheç o é uma noiva em potencial. Mas na semana passada, quando você sofreu o acidente, ela percebeu, pela minha angú stia, que eu era um homem desesperadamente apaixonado. Gosta de você e ficou toda feliz, quando me viu sair da sala ainda há pouco. Deve estar morrendo de curiosidade, agora, e rezando para que eu tenha me declarado. — Seu bandido! Acho que você usou Lú cia, esta noite, para me fazer ciú me. — A situaç ã o estava ficando desesperadora, meu amor. Você parecia tã o decidida a ir embora... Mas, para ser sincero, foi de madrecita a idé ia. Combinamos que, enquanto eu me desmanchava em gentilezas com Lú cia, ela ia ficar perto de você, observando sua reaç ã o. Sempre que você estivesse olhando para nó s, ela usaria o leque: era um sinal para que eu abraç asse Lú cia, sorrisse para ela ou qualquer coisa assim. E esta noite, madrecita usou aquele leque como nunca. . . Nã o reparou? — Riu e deu um beijo na ponta do nariz dela. — Ah, claro que nã o. Como poderia ter notado, se nã o tirava os olhos de mim? — Parecia feliz e orgulhoso em dizer isso. Vanessa riu també m e depois brincou, fingindo preocupaç ã o: — Pobre Lú cia! Deve estar agora cheia de falsas esperanç as. Que coraç ã o diabó lico o seu, Rafael! — Isso é que nã o, minha adorada! Sinta só. — Colocou a mã o dela no peito. — Ele bate dentro de mim, mas pertence a você, Vanessa. Nã o tem medo de que um homem a ame tanto assim? Sempre tinha sentido medo dele, menos agora. Seu amor era tã o grande, que nã o havia lugar para nenhum outro sentimento. A nã o ser, excitaç ã o. Mulher de Rafael de Domerique, sua esposa, sua eleita! — Tenho vontade de prender você na torre, para que seja só minha, toda minha — disse, entre beijos. — Quer viver comigo nesta ilha, para sempre, corazó n? — Sempre fui sua prisioneira, meu amor, só que nã o sabia. Toda vez que tentava escapar, alguma coisa me trazia de volta. — E toda vez que eu sentia que você queria fugir, deixava uma porta aberta, para ver se teria coragem de ir. — Segurou o rosto dela entre as mã os e estudou-o, à luz do luar. — Nunca mais vai escapar, depois que se tornar minha mulher. — Tudo o que eu quero é ficar aqui. Queria que a dominasse. Como a uma tigresa, que ama e ataca o domador. Voltaram para o castelo, ansiosos para contar a todo mundo que, naquele ano, a festa da colheita seria comemorada junto com um casamento. Dona Manuela parecia a mais feliz das mulheres quando, diante de todos os convidados, seu neto colocou um anel de diamantes e rubis no dedo de Vanessa. A expressã o de Lú cia Montez era mais de decepç ã o do que de infelicidade. Dava a impressã o de lamentar nã o a perda do noivo, mas a perda da magní fica jó ia, que estava certa de que seria dela. Bá rbara, de braç o dado com o portuguê s bonitã o, sorria. E seu sorriso parecia dizer: " Vanessa tinha razã o, o verdadeiro amor é eterno como o tempo". E era amor eterno a chama que brilhava nos olhos verdes de Vanessa, quando colocou a grossa alianç a de ouro no dedo do noivo. Estouraram champanhe e todos ergueram as taç as, fazendo brindes. Brindes tipicamente espanhó is, desejando muitas felicidades ao casal. . . e uma dú zia de chiquititos loiros e morenos
FIM
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