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— Eu já lhe disse. Sim! 8 страница



Mais tarde, ao desejar boa noite aos Moore, Ross lembrou-se subitamente de que necessitava de mais algumas informaç õ es e pediu a Vincent que as escrevesse em um pedaç o de papel arran­cado de sua caderneta de endereç os. Dobrou-o, colocando-o no bolso de fora, e ao fazê -lo encontrou a outra anotaç ã o, tirando-a para ler, Jú lia sentiu que quase chegava a prender a respiraç ã o, ao mesmo tempo que ele dava de ombros e a jogava displicentemente em uma cesta de lixo, antes de colocar a nova anotaç ã o no bolso. Entã o nã o passava disso. Ele provavelmente nem sequer se lembraria de que nú mero se tratava.

A chuva havia parado, no momento em que chegaram ao desvio que levava a Marlowe. Jú lia espiou para fora enquanto o carro diminuí a a marcha, e pensou naquela noite de setembro quando a porta do carro se abrira e ela caí ra, sofrendo aquele acidente, jus­tamente naquele lugar. Devia ter estado muito confusa, a ponto de se enganar de maç aneta, pensou, eram muito diferentes uma da outra. Desviou o pensamento daquele assunto. Tudo aquilo era um fato consumado. Era coisa do passado. Nã o iria permitir que isso a preocupasse agora.

— Você nã o me disse que os Fallow haviam concordado em aba­ter cem libras no preç o da casa? — perguntou ela, e sentiu o olhar de Ross pousar-se sobre ela imediatamente.

— Sim. Por quê?

— Jill Moore está pensando que foram duzentas. — Ela esperou uns bons trinta segundos antes de voltar-se para encarar aquele perfil decidido. — Foi você quem cobriu a diferenç a, nã o é, Ross? Você foi quem colocou os outros cem.

— Sim — disse, com o mesmo tom calmo de sempre. — Desisti de minha comissã o. Posso compensar em outras vendas.

— Pare de fingir que nã o foi nada — disse ela suavemente. — Acho que foi um grande gesto de sua parte, mesmo que você tire o prejuí zo de alguma outra maneira. Você costuma ajudar jovens casais com tanta frequê ncia?

— Nã o, e nã o vai voltar a acontecer, portanto nã o perca tempo em querer pô r uma auré ola em volta de minha cabeç a. Acontece que os Moore sã o um jovem casal do qual gosto muito, eis tudo. E eu queria vê -los ficar com aquela casa. Espero que você nã o tenha proporcionado a Jill razõ es para suspeitar do que quer que seja.

— Claro que nã o! Eu mesma nã o tinha certeza.

— Você está dizendo que nã o me acredita capaz de praticar uma aç ã o impulsiva. — Ele soltou a frase sem alterar o tom, mas havia uma ligeira contraç ã o em seu maxilar. — Talvez tenha sido um cá lculo. Talvez tenha feito de propó sito, para que você descobrisse.

— Nã o acredito — disse, sabendo que ele falava a verdade. Hou­ve uma ligeira hesitaç ã o antes que ela acrescentasse com ternura: — Fale sobre como nos conhecemos, Ross. A respeito de que foi nossa primeira conversa?

— Conversamos sobre você a maior parte do tempo. — Um sor­riso abrandou seus traç os. — Você usava um elegante vestido azul com gola branca, e eu queria beijá -la durante toda a noite. É disso que eu me lembro melhor.

— E você beijou?

— Na primeira oportunidade, quando saí mos do apartamento que você dividia com duas amigas. Nã o que você estivesse inclinada a se abandonar. Levei mais quarenta e oito horas para convencê -la de que duas pessoas nã o precisavam se conhecer durante semanas a fio para se sentirem seguras de suas emoç õ es. — Parou o carro diante do portã o e acendeu os faró is de modo a iluminar o caminho que ia até a porta de entrada. — Vou levar você até a entrada antes de pô r o carro na garagem.

Jú lia pegou na maç aneta, sentiu a mã o dele fechar-se suave­mente sobre seu pulso e voltou-se lentamente a fim de encará -lo. Seu coraç ã o batia com tanta forç a que tinha a impressã o de que o ruí do enchia o automó vel. O beijo foi longo, lento, indagativo, tes­tando suas reaç õ es antes de propor outras solicitaç õ es, e deixando-a trê mula, de olhos fechados, e apoiada em seu ombro. Ele roç ou lentamente seu rosto com os dedos, permaneceu por um momento infindá vel e intenso com sua mã o quente pousada em sua nuca e finalmente debruç ou-se sobre ela e abriu a porta.

Esperou que ela entrasse antes de pô r o motor em movimento e levar o carro para a garagem. Shan veio correndo da sala de estar para festejá -la, parando ao pé da escada, enquanto subia até o quarto a fim de tirar o casaco.

No andar té rreo a porta da frente abriu-se e fechou-se novamen­te. Ouviu-se o barulho costumeiro do ferrolho que se fechava, uma ordem dada a Shan em voz baixa, e em seguida Ross subiu as escadas de tá bua lavada e entrou no quarto.

 

                                                   CAPÍ TULO VII

 

Estava começ ando a amanhecer quando Jú lia acor-dou, e ela permaneceu por alguns momentos olhan­do para o teto antes de voltar a cabeç a cautelosamente para o outro travesseiro. Ross estava deitado de bruç os, com um dos braç os pas­sado em torno da cintura dela. O sono eliminara a tensã o de seu rosto. Com os cabelos desmanchados daquele jeito parecia mais jovem, quase um menino. Com um gesto leví ssimo ela afastou os cabelos de seus olhos, sentiu-o movendo-se e voltou a contemplá -lo mais uma vez, relembrando o terno calor de suas mã os e de sua voz na noite, a paixã o nascente de seus beijos e o modo arrebatado corno ela pró pria reagia. Aquele era seu marido, disse a si mesma, e estava apaixonada por ele. Agora nada mais lhe importava, a nã o ser isso. Nada mais tinha de importar.

Deslizando devagar c cuidadosamente, escapou do braç o que a rodeava e saiu da cama. Pô s os chinelos e o roupã o e, indo até a janela, espiou aquele mundo lá fora mergulhado na neblina, em que as á rvores despontavam como sentinelas fantasmagó ricas no meio do jardim. Havia no ar uma umidade fria que até mesmo o aquecimento central nã o conseguia anular totalmente. Jú lia tre­meu um pouco e fechou ainda mais o roupã o em torno de si: ao voltar-se, deparou com Ross apoiado no cotovelo olhando-a, com um sorriso nos lá bios.

— Alô — disse ele suavemente, e estendeu-lhe a mã o. — Ve­nha cá.

Foi até ele sem hesitar, pegando em sua mã o e deixando-se envolver no cí rculo rijo e seguro de seus braç os.

— O vento parou de soprar — disse. — Conseguirei varrer no­vamente as folhas.

— Hoje nã o. — Tocou seu queixo com a ponta do dedo. — Hoje é um dia especial. Nã o irei trabalhar e ficarei com você. Somente nó s dois. Você gostaria de ir a algum lugar?

— Nã o tenho nada em mente. — Apoiou a cabeç a no peito mo­reno e liso e abandonou-se, sem a menor censura. — Só quero ficar perto de você. Estou parecendo uma tola?

— Acho que nã o. Esperei durante vá rias semanas para ouvi-la dizer isso. — Acrescentou calmamente: — Nenhum arrependimento?

— Por quê? Por estar casada com você? — Ela riu. — Acho que provavelmente foi a melhor coisa que fiz na vida. Se me arrependo de alguma coisa é de nã o poder me lembrar quando foi que o vi pela primeira vez, mas, se eu nã o conseguir realmente, sempre posso levar em conta o momento em que despertei no hospital e você estava a meu lado.

— Isso é um bom sinal. Você agora pode fazer piadas com isso. — Ele a contemplou: sua expressã o passou por uma mudanç a sutil. Parecia estar a ponto de dizer algo mais, poré m mudou de idé ia. Deu uma pancadinha em seu queixo e disse, decidido: — Vamos tomar o café da manhã, senã o ficaremos aqui o dia inteiro. Com­binaremos o que vamos fazer durante o dia, enquanto comermos.

Jú lia estava fritando bacon quando ele desceu. Usava um jeans surrado e um sué ter branco bem folgado e trazia um mapa da regiã o.

— Você conhece Stonehenge? — perguntou Ross, desdobrando o mapa sobre a mesa, sem se importar com o que estava por baixo. — Se bem me lembro, podemos deixar o carro em Amesbury e andar, mais tarde voltaremos por um caminho diferente. Vai ser um dia lindo, assim que o sol sair. É o tempo ideal para andar. — Olhou-a, levantando as sobrancelhas. — Que lhe parece?

— Acho uma boa idé ia. — Jú lia nã o se importava muito com o que fizessem, contanto que aquela sensaç ã o de calor e seguranç a permanecesse. Ficar com Ross durante o dia todo já lhe parecia suficiente. Naquele momento seu horizonte parecia povoado por aquela necessidade. — O que devo usar?

— Uma roupa quente e confortá vel: proteja principalmente os pé s. — Sorriu à vontade. — Nã o consigo suportar as mulheres que vã o para uma excursã o vestidas como manequins.

Jú lia també m sorriu.

— Alguma vez fiz isto?

— Nã o exatamente. Uma ocasiã o você teve a idé ia de tentar subir trezentos metros em uma montanha na Á ustria usando san­dá lias, mas consegui fazer você desistir. A garota com quem me casei é uma tí pica moradora da cidade!

— Pare de caç oar — replicou. — Você també m era antes de se mudar para cá.

— No corpo, talvez, mas nã o no espí rito. Nã o havia nada de que gostasse mais do que sair da cidade nos fins de semana.

— Sozinho? — perguntou ela, colocando um prato diante dele enquanto ele voltava a dobrar o mapa.

— Sim. — Urna leve sombra passou momentaneamente sobre seus olhos, — Naquele tempo nã o me importava de levar quem quer que fosse comigo. — Deixou o mapa de lado, pegou a faca e o garfo, cortou o bacon e disse: — Esse roupã o que você está usando eu comprei na Á ustria.

— A palavra certa é penhoar — disse ela. Examinou o tecido, — Por que foi que você comprou?

— Porque você gostava e ficava bem nele. Eu queria comprar outro, mas você disse que era escandalosamente caro e que nã o valia o preç o. Lembro-me de que me congratulei comigo mesmo por ter encontrado uma esposa tã o econô mica quanto bonita. Pensando bem, aquelas trê s semanas foram muito compensadoras.

Subitamente ela sentiu um aperto doloroso na garganta. Ele estava falando de sua lua-de-mel, de um tempo que os casais re­cordam juntos. Chegaria um tempo em que ela e Ross poderiam fazer o mesmo? Com certeza aquele bloqueio em sua mente nã o poderia durar pelo resto da vida,

Inconscientemente sua mã o percorreu a fonte, na regiã o onde seus dedos podiam tocar as cicatrizes ligeiras e apertou-as, como se atravé s daquela pressã o ela pudesse reconstituir a parte do cé ­rebro que se recusava a funcionar. Se pelo menos ela pudesse se recordar!

— Jú lia. — Ross debruç ou-se e pó s a mã o em seu rosto. — Nã o fique assim. Você está com uma expressã o idê ntica à do dia em que eu a trouxe para casa.

— Desculpe-me. — Tentou sorrir e recuperar o estado de espí rito em que estivera. — Prometi a mim mesma que tentaria nã o pensar mais nisso, mas nã o é assim tã o fá cil.

— Entã o teremos de nos empenhar em manter sua mente ocu­pada com algo mais — disse ele com deliberaç ã o. — Talvez fosse melhor combinarmos de agora em diante nã o fazer a menor menç ã o ao que passou. É no futuro que temos de pensar, aconteç a o que acontecer.

— Nã o. — Ela sacudiu a cabeç a teimosamente. — Essa nã o é a soluç ã o. Tenho de aprender a aceitar as coisas como elas sã o. Aliá s, nó s dois temos. — Dessa vez seu sorriso foi mais descontraí ­do. — Sempre tive vontade de conhecer Stonehenge. Como foi que você adivinhou?

Partiram logo depois das nove e meia, e Shan foi acomodado no banco traseiro. Na verdade Ross nã o havia planejado levar o ca­chorro, mas este tinha dado demonstraç ã o de ter sua pró pria opi­niã o em relaç ã o ao assunto, esgueirando-se e pulando para dentro do carro no momento em que a porta foi aberta.

— Pressinto que minha autoridade está começ ando a nã o sig­nificar nada neste lar — observou Ross enquanto o carro seguia pela alameda. — Imagino que ele tenha dado grandes passeios por aí com você e Dave. — Voltou a cabeç a ao notar que Jú lia nã o respondeu imediatamente e lanç ou-lhe um olhar perscrutador. — Nã o se preocupe, tenho uma boa explicaç ã o para o fato de David ter ido embora do jeito que foi. Você foi a primeira mulher com quem ele se envolveu um pouco mais, apó s um ano inteiro. Foi somente na nossa correspondê ncia que ele começ ou a se aproximar um pouco mais de mim. Nã o quer me contar o que aconteceu?

— Nã o seria muito justo para com David. Ele apenas deixou-se levar por um impulso, como você mesmo disse. A ideia de ir embora partiu dele. — Olhou-o de soslaio. — Você vai voltar a vê -lo antes de ele viajar?

— Naturalmente. Isto é, se viajar. — Seus traç os se contraí ram. — Ele falou algo a respeito de Lou antes de ir embora?

— Nã o. — Lou, pensou Jú lia, tinha estado longe de seus pen­samentos naqueles dias. Mais uma vez tomou consciê ncia da ligeira sensaç ã o de incó modo ao ouvir mencionar aquele nome, do senti­mento de que, em algum momento, de alguma forma, ele tinha tido uma significaç ã o. — Como é que ela era? — perguntou em tom displicente, e verificou que esperava sua resposta com uma expec­tativa que se assemelhava a um pressentimento.

Ele demorou alguns segundos para responder, se bem que isso pudesse ser atribuí do à sua concentraç ã o em evitar um buraco na pista.

— Atraente — disse calmamente. — Alta, esguia e atraente.

— E morena — acrescentou, e sentiu que ele a olhava.

— Por que me pergunta, se David já lhe falou a respeito dela?

— Ele nã o falou. Pelo menos nã o desse jeito. — Jú lia franziu o cenho e subitamente seu rosto descontraiu-se. — Foi lá no Luigi's. Nã o consegui imaginar como é que sabia que ela era morena. — A lembranç a daquela ocasiã o voltou integralmente, ela acrescentou devagar: — Ross, o que você queria dizer quando declarou que era contra todas as morenas?

Ele deu um longo suspiro. Parou subitamente o carro no acos­tamento, ficou durante um bom momento olhando atravé s da ja­nela e finalmente voltou-se para ela,

— Preciso lhe contar uma coisa, Jú lia — ele disse. — Este nã o é o lugar apropriado, e duvido até mesmo de que seja o momento certo, mas tenho de pô r isto para fora. Quer tentar ouvir calma­mente e em silê ncio, sem precipitar conclusõ es?

Subitamente parecia que o carro encolhia, pressionando-a de todos os lados. Quando falou sua voz soava inexpressiva.

— Está certo.

Ross inclinou-se sobre a direç ã o, sem lazer a menor tentativa de tocá -la.

— Há uma ú nica maneira de contar, e vou direto ao assunto. Fui casado, há muito tempo, oito ou nove anos. Enid morreu seis meses antes que eu me mudasse para cá. Eu queria lhe contar enquanto você ainda estava no hospital, mas o dr. Stewart aconselhou esperar até que as coisas estivessem mais... solidificadas entre nó s. Ele provavelmente teria muitas reservas a respeito desse meu pro­cedimento, mas é que eu tinha de ter certeza de que desta vez seria eu quem lhe contaria.

O sentimento de claustrofobia estava passando, mas Jú lia sen-tí u-se transida de frio.

— Desta vez? — murmurou.

— Se você soubesse que seria minha segunda mulher nunca teria se casado comigo — replicou sem rodeios. — Você falou um bocado a respeito de seu pai na primeira noite em que passamos juntos, e entã o me dei conta de como você se sentia em relaç ã o a ocupar o segundo lugar. Você teria ficado ressentida se seu pai voltasse a se casar, pois isso significaria que você teria de compar­tilhá -lo com mais algué m. Da mesma forma você teria ficado ressentida com o fato de eu ter amado suficientemente uma outra mulher a ponto de pedi-la em casamento.

Seria isso verdade?, pensou ela, enquanto os segundos se trans­formavam em minutos. Ela era realmente assim? Seu pai tinha quarenta e poucos anos quando sua mã e morreu, e ainda era um homem muito atraente. Mas com certeza...

— Você ia me contar depois que nos casá ssemos? — ouviu sua pró pria voz rompendo o silê ncio, e Ross sorriu desajeitado.

— Era minha intenç ã o, só que eu nunca conseguia encontrar a ocasiã o apropriada. Como disse antes, o primeiro ano de casamento já apresenta suficientes problemas sem que seja necessá rio acres­centar outros.

— Mas entã o eu descobri? Foi isso que eles pensam que aconteceu?

— Nã o é certo. Nã o é nem mesmo certo que você descobriu, Ningué m, a nã o ser David, sabe alguma coisa a respeito dela, ou pelo menos é o que eu supunha. — Ele falava com cuidado, esco­lhendo as palavras. — Mas, pressupondo que você soubesse, pode ter acontecido que sua mente lidasse com o choque da revelaç ã o simplesmente fingindo que nã o aconteceu. Para que isso ocorresse era preciso bloquear tudo que estivesse relacionado com o fato. Foi por isso que o dr, Stewart nã o queria que eu contasse a verdade imediatamente. Ele esperava que você começ asse a se lembrar por si mesma.

— Nã o acredito — disse ela a muito custo. — Mesmo que eu tivesse descoberto por acaso eu... — Fechou os olhos, e sua voz tremeu, — Ross, nã o é possí vel que eu fosse assim tã o desequili­brada. Nã o é possí vel!

— Ningué m está dizendo que você é desequilibrada — Estendeu os braç os para ela, puxando-a para junto de si. — É apenas uma teoria, uma explicaç ã o possí vel. Como o fato de contar a você nã o suscitou nenhuma espé cie de reaç ã o, é mais do que possí vel que tenhamos embarcado em uma canoa furada. Pelo menos agora po­deremos começ ar da estaca zero. — Afastou-a de modo a poder contemplar seu rosto. — Ou será que vai ficar tudo na mesma?

Jú lia olhou aqueles olhos cinza vacilantes e sacudiu lentamente a cabeç a.

— Nã o — disse, com toda firmeza de que se sentia capaz —, nã o vai fazer a menor diferenç a, Nã o permitirei que faç a alguma em falar a respeito dela. Jú lia cerrou os olhos enquanto ele ligava o motor e tentou controlar suas emoç õ es. Fosse ou nã o verdade, tudo estava consumado muito antes de Ross conhecê -la. Se de agora em diante iam ser felizes, ela tinha de parar de revolver o passado. Aquele dia passado na companhia de Ross foi o que de melhor lhe aconteceu durante muitos anos, Mesmo nos dias que se segui­ram, quando mais uma vez ela se encontrava sozinha durante ho­ras, encontrou uma diferenç a no fato de que agora sempre havia o fim da tarde, tã o almejado e para o qual podia fazer planos. Recomeç ou a ir à aldeia, fazendo compras no pequeno mercado, surpreendentemente farto. Aos poucos começ ou a superar seu cons­trangimento em relaç ã o à quelas pessoas que a haviam conhecido antes do acidente. Levaria algum tempo até que eles a aceitassem sem reservas, mas possivelmente isso teria ocorrido da mesma for­ma, se nada tivesse acontecido.

David só telefonou na segunda-feira. Foi Ross quem atendeu, e seus olhos nã o se despregavam de Jú lia, enquanto ela ouvia. Sim, disse, ambos estavam bem. Como é que estavam as coisas na cidade? Apó s alguns momentos ele disse:

— Espere — e cobriu o bocal com a mã o. — Dave quer saber se gostarí amos de passar uma noite na cidade — disse. — Quer nos convidar para ir a algum lugar, em retribuiç ã o à nossa hospeda­gem. Como é que você se sente em relaç ã o a isso?

— Como é que você se sente? — ela repetiu. Seu sorriso foi tranquilizador.

— Generoso. E a mudanç a lhe faria bem. Podemos combinar para a pró xima sexta-feira. — Retirou a mã o. — Sim, está bem, Dave. Na pró xima sexta-feira. Até logo.

— Obrigada — disse Jú lia baixinho, quando ele desligou o te­lefone. — Refiro-me ao fato de você nã o deixar escapar que sabia de alguma coisa. Ele com toda a certeza já superou o problema.

— Nã o esteja tã o segura assim. Ele pode estar à espera da opor­tunidade de vê -la novamente, mesmo que seja na minha compa­nhia. — Ross, ao afirmar isso, mostrava-se bem-humorado. — Da­das as circunstâ ncias, nã o posso lhe recusar isso. Mais cinco dias e ele estará de volta ao deserto.

— Você acha que ele deve voltar? — perguntou ela, enquanto ambos voltavam à sala de estar, e ele a encarou.

— É uma boa experiê ncia. Apó s trê s anos ele estará qualificado para ocupar um posto mais elevado.

— Mas a vida lá é terrivelmente solitá ria, segundo ele diz, Nã o teria sido melhor se ele tivesse tentado conseguir outro emprego, enquanto permanecesse na Inglaterra?

— Cabe a ele decidir. — Ross sentou-se na cadeira que ocupava quando o telefone tocou, acendeu outro cigarro e contemplou-a atra­vé s da fumaç a. — A ú nica coisa de que ele parece estar sentindo falta lá é de uma mulher, e se ele está assim tã o desesperado sempre há um jeito de resolver a situaç ã o.

Ela franziu o nariz.

— Você coloca as coisas de um modo um tanto cru.

— Pois eu diria realista. Afinal, trata-se de uma necessidade mais do que natural. — Ele parecia estar se divertindo. — Imagino que você situa os sentimentos dele em relaç ã o a você em um plano bem diferente.

— Suponho que sim. — Sorriu para ele suavemente. — Talvez eu tenha razã o.

— Está querendo que eu fique com ciú me?

Houve um momento de tensã o entre eles. Em seguida, ambos sorriram e aquele constrangimento passageiro dissipou-se.

— Sim — disse ela —, é mais ou menos isso. De acordo com os redatores da seç ã o de correspondê ncia sentimental nas revistas, nã o faz muito bem a um marido ser muito complacente.

— Ah! Entã o sou complacente? — Inesperadamente ele agar­rou-lhe o pulso, obrigou-a a ajoelhar-se a seus pé s e franziu o cenho. — Quer repetir o que você disse?

— Até que poderia. — Estava rindo. — Mas só quando você parar de soprar fumaç a em meu rosto.

— Isso é um detalhe.

Ross jogou fora o cigarro e puxou-a para junto de si, roç ou o queixo em sua fronte e riu, ao ouvir sua exclamaç ã o de protesto.

— Alguma outra queixa, sra. Mannering?

— Nã o. — A voz dela era suave, e notou que os olhos dele se ensombreciam. Agora, nada mais poderia privá -los um do outro, pensou exaltada, enquanto suas bocas se tocavam. Nada!

Peggy e Mike foram jantar com ele, na quinta-feira. Jú lia usou seu vestido azul preferido, e sabia que sua aparê ncia nã o poderia ser melhor.

— O que quer que tenha acontecido, com certeza fez muito bem a você s dois — comentou Peggy com aquela simplicidade que era só dela, no momento em que as duas se encontravam a só s na cozinha preparando o cafezinho. — Esta noite poderia ser idê ntica a dezenas de outras de que me recordo, mas imagino que você nã o pensa assim.

— Nã o — reconheceu Jú lia, e levantou a cabeç a para olhá -la imperturbá vel. —Acho que tudo isso já nã o importa tanto. Talvez algum dia eu me lembre de tudo, talvez nã o. Mas, com certeza, nã o vou me preocupar com isso.

— Que bom para você. — Havia afeto na voz de Peggy. — Ross disse que talvez você s passem uns dois dias em Londres, quando telefonou ontem. Onde é que vã o ficar?

— Nã o tenho a menor idé ia. Foi ele quem tomou as providê ncias. Ele lhe contou que David volta para a Á frica na pró xima quinta-feira?

— Ele tocou no assunto. Penso que é uma boa idé ia.

— Tem medo de que ele se envolva novamente com Lou. — Pela primeira vez Jú lia conseguiu dizer aquele nome sem sentir nenhu­ma sensaç ã o em particular. — Pelo que David me contou a respeito dela, acho que nã o há a menor chance, mas Ross nã o quer nem ouvir falar. Você sabe como ele é quando põ e uma idé ia fixa na cabeç a, — Ela parou e entã o riu subitamente. — Sabe, acho que alguma coisa do passado pode estar voltando. Eu me vejo aceitando fatos relativos a Ross impossí veis de eu ter descoberto nestas ú l­timas semanas. Por exemplo, saber, entre duas dú zias de gravatas, qual é a que ele sempre usa com um terno que eu, em sã consciê n­cia, nunca o vi vestir antes. Algumas vezes é um sentimento mis­terioso, um pouco como aqueles pressentimentos que se usam como argumento em favor da reencarnaç ã o. Suponho que, em certo sen­tido, estamos começ ando a viver novamente aqueles trê s meses.

Peggy sorriu.

— Quem foi que disse uma vez que a vida é uma longa lua-de-mel?

A noite foi muito agradá vel, e Jú lia sentiu sinceramente que os Ashley fossem embora.

— Você s precisam ir lá em casa na semana que vem — disse Peggy ao se despedirem. — Claro que nem vou tentar competir com o prato hú ngaro que você nos serviu. Telefonarei na segunda -feira, depois que você s voltarem.

Depois que a porta se fechou e o carro se afastou na noite ene­voada, Jú lia olhou para Ross e disse com ternura:

— Que gente boa! — Humm. — Passou o braç o ao redor de seu ombro, abafando um bocejo com a mã o livre. — Mas gostam de um papo. Gostaria de partir bem cedo amanhã, ou, melhor dizendo, hoje. Devo procurar uma ou duas pessoas, se você nã o se importa de passar uma ou duas horas sozinha durante a tarde.

— Está matando dois coelhos com uma só cajadada? — ela per­guntou bem-humorada, e ele lhe beliscou o braç o.

— Estou aproveitando a oportunidade. Nã o vou à cidade com tanta frequê ncia assim. Mas se você prefere que eu nã o os procure...

— Claro que nã o. Até que me importaria, mas farei o sacrifí cio, em nome dos negó cios. Trata-se de negó cios, nã o?

Ross foi até o hall e apagou a luz.

— Sim — disse no escuro —, trata-se de negó cios.

Fizeram uma viagem rá pida na manhã seguinte. Chegaram ao centro da cidade na hora do almoç o e decidiram fazer a refeiç ã o no restaurante do hotel, em vez de sair novamente.

Tanto quanto Jú lia podia se lembrar, havia passado seis ou sete semanas desde que estivera em Londres, tinha de se dizer constan-temente que mais cinco meses tinham escoado desde que deixara o apartamento compartilhado com mais duas garotas. Pensara em procurá -las enquanto estivesse na cidade, mas refletiu melhor e de­cidiu o contrá rio. Haveria perguntas demais a ser respondidas, mui­tas armadilhas a evitar, a menos que contasse tudo, e isso nã o tinha intenç ã o de fazer, pelo menos nã o desnecessariamente.

Ross deixou-a por volta das duas, dizendo-lhe que se ausentaria por pouco tempo. Entregue a si mesma, Jú lia foi dar um passeio pelo Strand, aproveitando o sol brilhante da tarde. Apreciava aque­la sensaç ã o de anonimato que lhe vinha de pertencer outra vez à multidã o apressada, e no entanto se sentia aliviada ao pensar que isso era apenas um interlú dio. O chalé era seu lar, e o campo, seu deleite. Estranho como as opiniõ es de algué m podiam mudar tã o radicalmente em um perí odo de tempo relativamente curto, pen­sou, parando para olhar uma vitrina que exibia casacos de inverno. Dois anos antes, ou mesmo um ano, nã o teria conseguido imaginar que pudesse viver em qualquer outro lugar que nã o Londres.



  

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