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CAPÍTULO III 1 страница



 

 

A manhã seguinte estava linda. O sol brilhava forte, entrando pela janela, batendo no travesseiro e depois no rosto de Fenny. Ela acordou e, no começ o, nã o reconheceu o quarto estranho e luxuoso. Continuou deitada preguiç osamente até que, de repente, lembrou de tudo. Com um suspiro sentou-se, puxando a colcha para se cobrir. Já nã o era mais a garota ingê nua dodia anterior, porque nã o havia uma parte de seu corpo em que nã o sentisse a intimidade dos lá bios de Lion.

Ele a possuí ra inteira, durante horas. Algumas vezes tinha sido cruel, nã o dando muita importâ ncia ao fato de ela ser inocente, insultando-a até fazê -la entregar-se.

Naquela noite, nada teve importâ ncia, exceto o fato de que o amava. Mesmo assim, nã o se entregou sem luta, nã o se deu por vencida com facilidade. Sabia que, se ele apreciasse qualquer coisa nela, seria justamente o fato de ter lutado com ele... até que Lion a fez render-se.

Tinha sido totalmente dominada na escuridã o, mas agora já era dia, e devia encará -lo. Nenhuma vez ele murmurou uma palavra de carinho... Apreciara muito o seu corpo, e era tudo. Ela sentiu-se uma escrava naqueles braç os fortes, percebendo o ó dio profundo do homem que amava.

Continuava sentada, perdida em seus pensamentos, quando a porta do quarto foi aberta e Lion entrou, moreno e viril, usando uma camisa branca e uma calç a escura impecá vel. Fenny puxou a colcha, cobrindo-se, envergonhada. — Bom dia — ele disse, vindo sentar-se na beirada da cama. Depois deixou cair sobre as cobertas um objeto quetinha um brilho estranho. — A dá diva da virgindade deve sempre ser recompensada para satisfazer os deuses.

Fenny olhou para o presente, sentindo uma onda de indignaç ã o: estava sendo paga pela noite anterior, como qualquer mulher de haré m.

— Olhe — ele ordenou. — Tenho certeza de que vai adorar.

— Da mesma forma que você adorou, quando descobriu que eu nunca tinha pertencido a outro homem, nã o é? — ela perguntou, com os olhos faiscando.

— Realmente, fiquei muito surpreso; nã o esperava por isso — ele admitiu, inclinando-se sobre ela, com um braç o encostado na cabeceira. — Nã o esperava que você fosse tã o imaculada de corpo, já que tem uma mente tã o diabó lica. Machuquei você?

— Por que está perguntando isso? Por acaso faz alguma diferenç a? — Sentiu o rosto pegar fogo. — Nã o era o que você queria, me machucar?

— É indiferente. — Suas mã os morenas escorregaram pelos ombros dela, nus. — Nã o sou um animal. Apenas um homem com raiva, e o ó dio de um homem pode subjugar o seu lado bom. Você tem uma pele muito branca e sensí vel, é fá cil deixar marcas.

Quando a tocou, Fenny estremeceu.

— Nã o faç a isso, nã o me toque. Para sua surpresa, ele a soltou.

— Olhe o seu presente. Tenho certeza de que, de certa forma, vai se sentir recompensada.

Ela pegou o bracelete de ouro, esculpido com frutos, flores e pequenas cabeç as de mulheres. Obviamente era uma jó ia grega e, sem dú vida, rara e bem antiga.

— É um desenho da Afrodite sagrada — ele disse. — O trabalho de filigrana é excelente. Bonito, nã o acha?

— Muito bonito. Bem apropriado para a sua escrava.

— Se é como se sente... Quer tomar café aqui no terraç o da suí te, ou quer descer ao restaurante?

— Aqui está bom — disse, e ficou tensa porque ele tomou seu pulso e colocou o bracelete.

— Meus irmã os virã o nos visitar logo apó s o café. Lembre-se do que eu lhe disse.

— Sim, meu amo. Devo agir como uma esposa pateta e tentar convencê -los de que a perda de Penela como cunhada nã o é uma grande calamidade. Eu devo, se possí vel, mostrar-me como um exemplo de esposa amorosa e devotada.

— També m terá que aprender a usar o meu nome, como fez ontem à noite.

— Fiz isto? — Estava toda confusa novamente. Por Deus, ela nã o podia ter falado nada comprometedor durante aquelas horas em que esteve em outro mundo, vivendo só para ele, para aquele corpo forte de homem. Naqueles momentos nada tinha importâ ncia... Mas agora estava preocupada, teria falado alguma coisa que revelasse o seu amor?

— Você nunca vai saber, nã o é mesmo? — ele zombou. — Precisa de um criado para ajudá -la a banhar-se?

— Nã o preciso de nada.

— Você é um enigma. — Segurou-a pelo queixo e puxou seu rosto para a luz do sol, mostrando um brilho cruel nos olhos. — Você sabe menos da metade do que Penela sabe sobre os homens. Só posso imaginar que devia estar desesperada para enriquecer rapidamente, E espero que cada pagamento valha a pena. Ontem à noite você lutou como um demô nio, até que eu a venci.

— Tem que ficar lembrando a noite passada? Você é mais forte. Tive que me entregar, nã o importando se queria ou nã o.

— Talvez seja isso mesmo. — Seu sorriso era irô nico. — Foi uma noite de nú pcias cheia de surpresas. Lembre-se sempre de que, enquanto for minha esposa, será minha propriedade exclusiva. A esposa de um grego nã o olha para outros homens, a nã o ser que queira levar uma boa surra. Nó s temos um ditado: " Bata em sua mulher como você bate para limpar o seu tapete".

— Maravilha!

— Os gregos nã o fingem, como os outros homens. O que dizemos é para valer. O que fazemos, nó s o fazemos até o fim.

— Estou certa disso. Ele riu.

— Vou para a sala de estar e pedirei o nosso café. Nã o me faç a esperar muito tempo.

— Nã o, patrã o.

— O quê? O que foi que você disse?

— Foi exatamente o que você ouviu.

— Você pode me chamar do que quiser, se gostar, mas nã o na frente de outras pessoas. Muito menos dos meus irmã os. Entendeu bem?

Saiu com passos rá pidos, fechando a porta com violê ncia.

Fenny pulou da cama e foi para o banheiro. Abriu o chuveiro e ficou embaixo da revigorante ducha por muito tempo, ensaboando o corpo que parecia mais sensí vel, e percebeu que, apesar da luta com Lion, ele quase nã o deixara marcas nela.

Quantas mulheres Lion tivera na vida? Já estava com trinta e tantos anos, era um homem vivido; provavelmente, muitas mulheres tinham passado por suas mã os.

Teria amado Penela? Amar, talvez nã o. Mas estava certa de que ele tivera a prima nos braç os do mesmo jeito como a possuí ra na vé spera Ele nã o tinha dito que Penela sabia muito sobre os homens? Um indí cio de que suas relaç õ es eram í ntimas.

Uma sensaç ã o de ciú me invadiu Fenny. Será que ele tinha comparado as duas, achando-a sem experiê ncia, cheia de pudor e fria?

Nunca iria realmente descobrir, porque era apenas uma propriedade dele, para ser possuí da ou deixada de lado, dependendo de seu humor. Começ ou a se enxugar, tentando afastar aqueles pensamentos. De volta ao quarto, vestiu um robe que Penela tinha comprado com o dinheiro de Lion e separou a roupa que vestiria na viagem à Gré cia. Havia uma sandá lia para combinar e, uma vez mais, teve que usar uma palmilha para que o sapato nã o saí sse de seus pé s.

Enquanto escovava o cabelo, observou-se no espelho.

O terror da noite anterior tinha desaparecido de seus olhos. Era apenas interiormente que sentia aquela sensaç ã o de medo, ao pensar que agora fazia parte da vida de Lion Mavrakis.

Ela lhe pertencia e nada iria alterar esse fato. Ele era o primeiro e ú nico homem que a conhecia. Estavam unidos, e assim ficariam até que ela lhe desse um filho.

Fenny o amava, ainda mais do que no dia anterior, mas nã o queria engravidar. Se tivesse o filho que ele desejava, o relacionamento deles terminaria. Foi esse pensamento que trouxe o terror de volta a seus olhos acinzentados. Teveque esperar alguns segundos até recuperar a calma e poder ir juntar-se ao marido no terraç o da suí te.

Ficava bem acima das ruas barulhentas de Londres e do verde das á rvores. Ele estava sentado à mesa, lendo o jornal da manhã, e olhou-a, rapidamente, enquanto ela se dirigia

ao parapeito.

— Nã o temos muito tempo, Fenella. — Pela primeira vez disse seu nome, mas sem nenhuma emoç ã o. — É melhor você comer alguma coisa, porque o vô o para a Gré cia é demorado e só servem sanduí ches e café, a bordo. Quero ir direto para Petaloudes por razõ es de negó cios.

— Você nunca pá ra de trabalhar? — ela perguntou, servindo-se de café.

— Nã o, se for preciso. — Serviu-a de bacon com ovos.

— Pronto, isto vai sustentar você.

— Obrigada.

Lion já tinha comido e lia agora o caderno de economia do jornal. Vestia um terno de corte perfeito e usava um reló gio Cartier no pulso. Um autê ntico homem de negó cios bem-sucedido. Mas aquelas mã os fortes eram as mesmas que haviam dominado e acariciado todo o seu corpo.

Naquele momento ela pensou que nã o havia basicamente nada de nobre no amor... era na verdade a mais primitiva das experiê ncias do ser humano.

Perturbada, Fenny tentou nã o olhar para aquele que a fazia sentir-se daquele jeito...

— Fico contente de ver que você está com apetite, querida. Talvez seja o ar da manhã. O dia está lindo e isso ajuda,

nã o acha?

Ela corou e nã o respondeu. Lion continuou:

— Estranho, mas eu nunca dei muita importâ ncia a você, achava-a insignificante. Quando a encontrava na casa de seu tio, quase nem a notava. O que houve com o seu cabelo? Parece que você o usava diferente. Já sei: ficava sempre preso num rabo-de-cavalo, nã o é?

Ela concordou com a cabeç a,

— Quando se trabalha num escritó rio, o cabelo solto atrapalha. Principalmente se você tem que passar o tempo todo batendo à má quina. Por isso eu me acostumei a usá -lo daquele jeito.

— É. Sem dú vida, habituou-se a nã o competir com a sua prima. Enquanto ficar comigo, prefiro que use o cabelo solto como está agora. Quero que seja admirada. Há uma beleza estranha e singular em seus olhos. Mas, fique sabendo: outros homens poderã o olhá -la, mas nã o permita que toquem em você!

— Como se eu quisesse que eles me tocassem!

— Claro, minha querida. Eu tinha esquecido que você tem aversã o por ser tocada. Nã o precisa ficar vermelha. Você deve ter percebido, ontem à noite, que eu nã o fiquei totalmente desapontado. Tive prazer com você. Portanto, pode ficar com a consciê ncia tranquila e usar aquelas lindas roupas e jó ias sabendo que trabalhou bem por elas e as mereceu.

— Oh, Lion!

— Foi exatamente assim que você falou ontem à noite. Continue dizendo o meu nome dessa forma, e meus irmã os irã o aprová -la.

— Você consegue ser tã o ferino e selvagem como um leã o.

— Sim, e é bom que nunca se esqueç a disso. Fenella no covil do leã o, hein? Acha que, se for esperta, eu acabarei comendo na sua mã o?

— Nunca esperei viver tanto tempo.

— Só o tempo suficiente de me dar o que quero. — Ele pegou um pê ssego, partiu-o ao meio, retirou o caroç o e entregou-lhe uma das metades.

O suco escorreu de seus dedos pelos de Fenny e, como sempre, ela sentiu que havia alguma coisa pagã no que ele fazia. Aquele grego rude e primitivo fazia com que ela se lembrasse de ritos de amor, magia e guerra. Grandes pedras de sacrifí cios no sol ardente, a oliveira prateada e o figo fé rtil do terreno á rido da terra antiga.

Fenny mordeu a polpa do pê ssego.

Ainda estavam sentados ao sol no terraç o, quando algué m tocou a campainha da suí te. Fenny sentiu uma tensã o imediata e, quando Lion se levantou, soube que os irmã os dele estavam prestes a entrar na sala de estar. Apesar de nervosa, ela o seguiu. Nã o havia meio de fugir daqueles homens.

Ele abriu a porta e, imediatamente, as mã os morenas de seus irmã os bateram em seu ombro: era como se os trê s tivessem estado separados por um mê s, em vez de uma noite.

Gregos dos pé s à cabeç a. Um relacionamento familiar tã o poderoso que poderia excluir o desconhecido, se eles assim o desejassem.

— Olá, recé m-casado! — Zonar riu. — O chefe da famí lia e, só agora, um marido! O que está achando, mano?

Os irmã os invadiram a sala, subjugando Fenny com suas alturas e seus bronzeados. Eram parecidos e tinham uma aparê ncia mais suave do que Lion. Bonitos e menos assustadores, tinham olhos castanho-escuros ao invé s do amendoado que tornava o olhar do irmã o mais velho tã o expressivo.

Só entã o os dois lhe deram atenç ã o.

— Você parece diferente... — Demetre foi o primeiro a falar.

— É uma ó tima garota. — Zonar observou seu cabelo sedoso e dourado. — Tranquila e linda.

Fenny permaneceu no mesmo lugar, sem se defender da opiniã o que faziam dela. Lion nã o disse nada, ignorando o medo que ela sentia por estar sendo julgada naquele tribunal familiar.

Foi Demetre quem percebeu a troca de esposas.

— Mas que diabo! O que foi que saiu errado? — perguntou, confuso e bravo.

— Ou certo? — Zonar olhou para Fenny e ela percebeu que ele parecia diferente de seu gê meo por causa de algumas linhas de sofrimento marcadas em seu rosto.

O rapaz caminhou em sua direç ã o, com um sorriso.

— Posso beijar-lhe as mã os e dar-lhe as boas-vindas à famí lia?

Fenny nã o teve tempo para protestar ou concordar, porque Zonar, impulsivamente, tomou sua mã o esquerda e levou-a aos lá bios.

— Você é muito bonita. Cabelos dourados e pele lisa... muito raro, hoje em dia, quando os cosmé ticos podem fazer milagres para embelezar uma mulher.

Quando os lá bios dele tocaram sua mã o, Fenny imediatamente percebeu que uma coisa perigosa tinha acontecido: Zonar Mavrakis estava atraí do por ela. Rapidamente, libertou seus dedos dos dele.

— Você é um homem de sorte, Lion — disse o irmã o.

— Acha? — O rosto moreno e duro estava indecifrá vel.

— Mas claro que sim, mano. Quantos homens tê m a sorte de largar uma mulher de cabelo cor de platina e apanhar imediatamente uma de cabelo dourado?

— Fico contente que você esteja tã o deslumbrado com a minha jovem esposa. Ela estava com receio de que meus irmã os nã o a aprovassem.

— Aprovar? — Demetre olhou para o irmã o mais velho, assustado. — Nó s vamos ter mesmo que aceitar esta garota no lugar de Penela? Ela é uma impostora...

— Ela e eu nos casamos ontem de manhã, na igreja, e à noite nos tornamos marido e mulher. Nã o há mais nada para dizer!

— Há ainda muito a ser discutido — protestou Demetre.

— Estas coisas simplesmente nã o podem acontecer.

— Parece que acontecem, e até mesmo com os gregos.

— O sorriso de Lion era a pró pria ironia. — Mas uma mulher é uma mulher e esta será o suficiente para as minhas necessidades. Um rosto agradá vel na hora das refeiç õ es, um pequeno consolo no fim do dia.

Foi entã o que Fenny sentiu que devia deixar os irmã os Mavrakis a só s para discutirem entre si o que iam fazer. Seguindo o instinto, dirigiu-se a Lion e ficou quase nas pontas dos pé s para alcanç ar com seus lá bios aquele rosto duro e marcado.

— Devo ir para o quarto, ver se a bagagem está toda pronta. Sei que você quer ir embora logo.

— Isso mesmo, Fenella. — Olhou para Demetre. — Está vendo como ela é obediente?

— Você já a tem na palma da mã o, hein? — comentou Zonar, acompanhando-a até a porta do quarto. Fenny sabia que os olhos escuros dele pousaram na cama, antes que ela fechasse a porta atrá s de si.

Por alguns instantes, ficou em pé e muito quieta, sentindo as mã os frias e o rosto quente. Que situaç ã o mais incrí vel! Demetre nã o gostara dela, enquanto Zonar gostara até demais. Os gregos! Nã o tinham meias medidas! Por que precisavam se envolver tanto no casamento de um irmã o?

Mas tinha que encarar o fato de que Lion nã o era um irmã o comum. Ele havia comido o pã o que o diabo amassou para que os gê meos sobrevivessem no terrí vel inverno dofim da guerra. Usara todos os meios para tornar-lhes a vida mais agradá vel. Nã o havia nenhuma dú vida na cabeç a de Fenny de que os dois o adoravam e queriam, que fosse muito feliz com a mulher certa, pois ningué m melhor do que ele merecia tal coisa.

Na opiniã o de Demetre, Penela nã o podia ser substituí da, porque tinha sido a escolhida de Lion. Por outro lado, Zonar apreciara a beleza discreta de Fenny.

Bonita? Ela foi até o espelho e deu uma olhada objetiva em seu rosto e corpo. Sua aparê ncia era extremamente comum e inglesa, no entanto agradava ao jovem grego. Devia ser porque, desde que ele perdera tragicamente a esposa, provavelmente procurava consolo com outras mulheres, para tentar esquecer.

Só que, agora, Zonar estava cometendo um grande erro: ele devia entender que nã o podia se interessar demais por Fenny. Ela era a esposa de Lion, propriedade dele, e iria ser um inferno se ela permitisse que o irmã o se aproximasse ou mesmo que chegasse a tocá -la.

O que poderia fazer para nã o prejudicar os dois irmã os? Um homem que cobiç asse a esposa do irmã o era amaldiç oado pelos gregos. Alé m disso — e muito pior —, a natureza de Lion nã o admitia que sua esposa fosse de qualquer outro. Era dele, para beijar ou surrar... para manter ou rejeitar. A vida com ele parecia empurrar Fenny para um abismo, para onde quer que olhasse.

Começ ou a dobrar e guardar na mala de couro as roupas menores que usara na noite anterior. Seu coraç ã o bateu depressa ao perceber, pela primeira vez, o monograma nelas. O sí mbolo de um leã o rugindo, e as iniciais " P. M. " Nada era dela! Nem o homem, nem as roupas, nem mesmo aquela ilha. A ilha das borboletas!

Demetre a chamara de impostora, e estava certo. Nã o tinha o direito de estar ali, apesar de nã o ter outro lugar para ir. Tio Dominic nã o a aceitaria de volta, depois do que fizera. A porta do quarto foi aberta e Lion entrou.

— O rapaz está aqui para levar a bagagem para baixo. Você está pronta?

— Estou.

Pegou a jaqueta que fazia conjunto com a camisa, e a bolsa que combinava com aqueles sapatos grandes. Por um momento, sentiu um impulso histé rico de rir... mas teria sido um riso que acabaria em choro.

— Tudo pronto — disse, e saiu do quarto onde Lion havia tirado a sua virgindade e partido o seu coraç ã o.

O helicó ptero já os esperava no aeroporto. Era vermelho metá lico, propriedade particular de Lion, no qual ele viajava da ilha para qualquer outro lugar, a negó cios.

Demetre continuava a olhá -la como se achasse que nã o deviam confiar nela. Era de natureza mais introvertida do que a de Zonar, por isso estava profundamente chocado com o que Fenny fizera. Devia julgá -la uma sem-vergonha. As mã os nervosas de Fenny seguravam a bolsa no colo.

" Oh, Deus, nã o estarei saindo de um inferno para entrar em outro? ", pensou.

— Nervosa? — Lion sentara-se ao lado dela. — Você nunca voou num helicó ptero?

Fenny fez que nã o com a cabeç a e desejou que ele lhe segurasse as mã os, enquanto o helicó ptero ganhava altura. No começ o, teve muito medo. Mas quando Lion abriu uma pasta e começ ou a estudar alguns documentos, tã o calmo como se estivesse sentado numa poltrona em seu escritó rio, ela se sentiu mais confortá vel e começ ou a apreciar o vô o. Os tons graves das vozes de Zonar e Demetre chegaram aos ouvidos dela: falavam em grego, possivelmente omitindo o seu nome da conversa para que Lion nã o pudesse ouvi-los.

— Está se sentindo melhor, agora que já estamos no ar? — Lion olhou-a rapidamente e a luz que entrava pela janela bateu em seus olhos, tornando-os ainda mais brilhantes no rosto moreno. — Acho este meio de transporte mais conveniente do que um aviã o. Podemos aterrissar no nosso pró prio telhado, sabia?

— Nã o. — Fenny esforç ou-se para sorrir. — Conheç o muito pouco do seu mundo, apesar do que você pensa de mim.

— Tenho certeza, de que nã o ignora o que foi escrito nos jornais sobre o reino ensolarado da famí lia Mavrakis, na ilha de Petaloudes. Todos sabem que somos gente reservada, nã o costumamos permitir que estranhos entrem em nosso mundo.

— E sou uma estranha. Penetrei em seu mundo sem ao menos ser convidada.

— Nã o se esqueç a disso, e nã o venha correndo para mim, se algum membro de minha famí lia se recusar a aceitá -la.

— Está se referindo a Demetre, nã o está? Eu... eu percebi que ele está chocado comigo e nã o pretende me perdoar.

— E acha que pode culpá -lo por isso? Ele conhece mais os perigos da vida do que Zonar, que é agora um cí nico declarado. Agarra-se aos prazeres da vida como um garoto colhendo uma fruta do quintal do vizinho. Nã o se esqueç a de que Zonar agora é seu irmã o e nã o tente procurar seu apoio, pois, como você mesma sabe, somos uma famí lia muito unida. E ele nã o vai querer entrar em choque com um de nó s, por causa de... Bem, por sua causa.

— Claro que nã o me esquecerei. Mas eu... eu preciso ter ao menos um amigo, e ele se portou bem comigo. Foi gentil, acho que nos daremos bem.

— Acha mesmo? — Seus olhos eram maliciosos. — Deixe de drama. Nã o me diga que precisa de alguma simpatia?! Você sabia os riscos que ia correr, quando aceitou passar por toda aquela cerimô nia que a tornou esposa de um grego. Nã o somos pessoas gentis; portanto, nã o comece a sentir pena de si mesma. — De repente, ele se inclinou sobre Fenny e sua voz soou muito grave: — Nã o acredito que você tenha sido idiota a ponto de esperar que sua vida fosse cheia de emoç õ es e de um grande romance ao meu lado.

— Nã o pensei quando devia. Depois, já era tarde demais. Seria o mesmo que passar por uma fogueira, achando que nã o ia me queimar.

— Minha querida, você nã o é mais crianç a. Pô r a mã o no fogo e tentar atacar leõ es sã o coisas de crianç as e de idiotas. Você nã o tem nenhuma desculpa plausí vel. Entã o, pare de tentar me convencer de que nã o sabia o que estava fazendo. Aplauda o seu pró prio sucesso. Você estava uma noiva angelical, muito bonita, e ontem à noite mostrou-se bem satisfató ria.

— Achou mesmo? Sé rio? — Ela abaixou os olhos para o bracelete em seu pulso e se perguntou o que ele teria murmurado para Penela, se fosse ela quem estivesse sentada ali. — Fico feliz que você nã o tenha se sentido totalmente tapeado.

— Uma mulher é uma mulher. — Deu de ombros. — O acordo que fizemos está bem para mim, você já sabe que só quero um filho. Depois, entã o, terá a sua liberdade e poderá fazer de sua vida o que bem entender.

Ele voltou a atenç ã o para o monte de papé is que trouxera e Fenny olhou pela janela, sem reparar direito no que via. Aquele acordo terrí vel! Nã o suportava nem pensar naquilo. No entanto, ele tinha todo o direito de esperar que fosse cumprido. Nã o importava quanto amor sentisse por ele, Lion nunca iria considerá -la sua verdadeira esposa. Era apenas o meio mais eficaz para ele ter um herdeiro e uma fonte de satisfaç ã o para a sua virilidade. Seu corpo era a ú nica coisa que o interessava; seus sentimentos nã o significavam nada.

" Uma mulher é uma mulher", ele tinha dito, dando de ombros para o amor.

— Você fuma, Fenella? — Zonar estendeu para ela uma cigarreira dourada.

— Nã o, ela nã o fuma — disse Lion, sem levantar os olhos dos papé is.

O rapaz tornou a sentar-se, mas Fenny podia sentir que a observava com curiosidade e malí cia. Ela era a garota inibida que tinha sido suficientemente audaciosa para arrumar um marido rico. Zonar estava intrigado e atraí do, planejando conquistar a esposa do irmã o: a mulher que o irmã o nã o amava, mas que possuí a.

Oh, Deus! O coraç ã o de Fenny estava pesado com tantos problemas. A ú ltima coisa do mundo que queria era ser a causa de uma discó rdia entre Lion e Zonar.

Queria uma amizade, nã o um flerte. Precisava que um dos membros da famí lia Mavrakis lhe desse as boas-vindas, mas claro que nã o da maneira que Zonar pretendia.

Seus dedos tamborilavam na bolsa, e assustou-se quando Lion bateu com a caneta em suas mã os.

— Vai acabar quebrando as unhas — ele repreendeu. — Você alguma vez fez balanç o de contas naquele escritó rio onde trabalhava?

— Algumas vezes — respondeu, perguntando-se o que ele pretendia com aquela pergunta.

— Você é boa em contas?

— Eu as fazia bem, sim. Gosto desse tipo de trabalho.

— Ó timo. — Entregou-lhe uma pasta com papé is e tirou do bolso da jaqueta uma lapiseira dourada, que combinava com a caneta. — Vê se consegue resolver isso aqui: sã o contas dos meus restaurantes em Atenas, mas feitas em inglê s, para nã o complicar o meu gerente, que é um compatriota seu.

Fenny pegou a pasta e a lapiseira e percebeu que Lion só estava pedindo o seu auxí lio para manter a sua mente ocupada. Ficou muito grata e sorriu-lhe, com carinho e doç ura. Ele olhou-a por um momento; depois, disse secamente:

— Bem, dê um jeito nisso aí e ganhará uma xí cara de café.

Está certo. — Curvou-se sobre a pasta, com uma pontinha de dor no coraç ã o. Pelo jeito, ele nunca iria olhá -la sem aquele ar cí nico, nunca sentiria por ela algo mais do que ó dio.

Tentou concentrar-se nas colunas de contas, procurando somá -las corretamente e ganhar um pouco de sua aprovaç ã o.

As horas passavam. O barulho do helicó ptero e o murmú rio de vozes masculinas chegaram até Fenny, que estava completamente absorta nos papé is.

O trabalho mental estava sendo o melhor remé dio que podia querer. Chegara à ú ltima pá gina quando o aroma de café fez com que levantasse os olhos para ver que o lanche estava sendo servido.

— Vamos aterrissar em Nice para reabastecer. — Lion entregou-lhe uma xí cara de café, que cheirava deliciosamente. — Se olhar pela janela, poderá ver o mar azul.

Sul da Franç a! Fenny olhou para fora, para o oceano deslumbrante, e as praias brancas a deixaram encantada. A Inglaterra fria e cinzenta tinha ficado para trá s. Imaginou que, apó s aquela breve parada, voariam direto para a Gré cia.

Enquanto tomava café, Lion conferiu seu total com o dele.

— Você é muito eficiente. Já sei quem chamar, a qualquer hora, quando tiver muito trabalho em minhas mã os.

— Unindo o ú til ao agradá vel, nã o é?

Ele deu uma risada e entregou-lhe um sanduí che com uma grossa fatia de presunto.



  

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