Kay Thorpe 2 страница

— Até a noite o quê? — perguntou Maureen, que estivera ouvindo da mesa ao lado.

— Que é isso, Maureen? — disse Sharon, rindo. — O Martin é legal.

— Se você estiver desesperada... Ih, nã o devia ter dito isso, nã o é? — perguntou, curiosa. — Você está?

— O quê? — perguntou Sharon, fingindo inocê ncia.

— Desesperada. Ele nã o é o seu tipo, sabia?

— Será? — Sharon resolveu brincar em vez de se irritar. — E qual você acha que é o meu tipo?

— Oh, nã o sei — disse Maureen, encolhendo os ombros. — Ou melhor, sei sim. Algué m como aquele rapaz que a levantou do chã o naquele dia. Suave, sofisticado... e rico!

— Dinheiro nã o faz o homem — respondeu Sharon, achando que a colega estava passando dos limites, mas sabendo que era sem má intenç ã o.

— Ah, faz sim, sabia? Principalmente se é de famí lia — disse ela. Depois de uma pausa significativa, acrescentou: — Você que o viu de perto, acha que ele é rico de famí lia?

— Nã o tenho a menor idé ia — disse Sharon, sentindo sú bita e inexplicavelmente um aperto na garganta. — Eu estava ocupada demais com os meus arranhõ es para notar uma coisa assim.

— É, é mesmo — concluiu Maureen, sem tentar esconder a incredulidade. Ela devia ter sua pró pria versã o dos acontecimentos daquela tarde.

— Bom, de qualquer jeito, você s dificilmente vã o se encontrar de novo, nã o é?

— É — disse Sharon, encerrando o assunto. — Dificilmente.

Mas estavam ambas erradas. Ao sair do escritó rio à s cinco horas, acompanhada por Martin, lá estava Lee Brent encostado ao Mercedes cinzento, usando um terno quase da mesma cor. Ele dirigiu-se a ela, ignorando o rapaz a seu lado e os olhares curiosos dos outros colegas que saí am.

— Vamos — disse, abrindo a porta de passageiros.

Sharon sentiu-se pregada no chã o e ficou olhando para ele. Coube a Martin romper o silê ncio.

— O que significa isso, Sharon? — perguntou, perplexo. — Pensei que você estava livre esta noite.

— E estava... quer dizer, estou — disse ela, conseguindo controlar-se e erguendo o rosto para encarar o olhar cinzento. — Você deve estar enganado.

Um lento sorriso formou-se nos lá bios dele antes de responder.

— É sobre isso que vamos conversar. Levei um tempo enorme para descobrir você. Vai entrar ou tenho de empurrá -la para dentro?

— Escute aqui... — disse Martin nervoso.

— Sinto muito — cortou Lee Brent, impassí vel. — É um assunto entre Sharon e eu. — E completou, sem tirar os olhos dela: — Você deve ter notado que estou parado em lugar proibido.

— Como sempre — disse ela.

— Está bom — disse Martin, recuando e compreendendo que os dois já se conheciam. — Entendi. Boa noite, Sharon.

Lee Brent levantou as sobrancelhas enquanto o outro se afastava depressa.

— E entã o? — perguntou, segurando a porta do carro aberta.

Consciente da curiosidade com que Maureen espreitava da porta do pré dio, Sharon resolveu nã o opor resistê ncia e entrou no carro. Quando já estavam rodando foi que ela sentiu forç as para falar.

— Nã o sei bem o que você quer — disse, rí gida. — Mas seja o que for, é melhor falar logo.

— Nã o ainda — respondeu ele sem se voltar. — Fique quietinha aí, até a gente se afastar um pouco dessa gente toda e entã o conversaremos com calma.

— Se afastar dessa gente toda? Para onde? — perguntou, irritada.

— Um lugar pú blico qualquer, nã o se preocupe — disse, sorrindo. — Relaxe, vamos.

Nã o podia saltar do carro em movimento, portanto a ú nica coisa que lhe restava a fazer era relaxar e esperar até que chegassem ao destino, fosse qual fosse. Sharon olhava fixamente para a frente, mas toda a sua atenç ã o estava voltada para o homem sentado a seu lado. Sentia um leve perfume de loç ã o apó s a barba misturado ao cheiro de couro e madeira polida do painel. O carro era luxuoso, com todos os refinamentos possí veis e imaginá veis. Inclusive assentos recliná veis!

Chegaram a um bar numa travessa da Shaftesbury Avenue e Brent estacionou o carro num beco sem saí da, que surpreendentemente nã o tinha as faixas amarelas de estacionamento proibido.

Atravessaram o bar e Sharon notou de passagem a decoraç ã o em pedra e couro vermelho, com detalhes de arreios de latã o. Lee Brent levou-a a uma mesa tranqü ila nó fundo da sala. O lugar estava vazio, mas dentro de uma hora haveria certamente uma multidã o agitada.

— Á gua tô nica — respondeu, quando Lee perguntou o que queria tomar. — Ainda é muito cedo para bebidas mais fortes.

Talvez fosse, para ela, mas o gosto dele nã o parecia obedecer a horá rios, a julgar pelo drinque que trouxe do bar. No entanto, ele nã o parecia ter pressa para beber. Ficou rodando o copo entre os dedos, olhando-a do outro lado da mesa.

— Antes de mais nada — disse ele —, temos de resolver a questã o de um certo dinheiro seu que está comigo. Nã o vou devolvê -lo agora porque isso poderia ser mal interpretado por algué m que olhasse para nó s. Mas, quando eu o devolver, nã o quero saber de recusas, certo?

— Nã o era para você — esclareceu Sharon. — Era para pagar as meias que você me deu.

— Eu sei — disse ele, firme. — O seu gesto atingiu o alvo direitinho, se lhe interessa saber. Pela primeira vez eu fui pago na mesma moeda, por assim dizer.

Sem saber o que pensar, ela o encarou, desconfiada, mas a expressã o dele era sé ria.

— O que estou tentando dizer, de maneira tã o indireta — prosseguiu ele —, é que eu a julguei mal. E peç o desculpas. — Lee encostou-se na cadeira com um ar de quem tinha se livrado de um peso e esperava resposta.

- Aceito as desculpas — disse Sharon, pensando que nã o lhe restava outra coisa a fazer, pois seu pró prio comportamento naquela tarde també m nã o havia sido inteiramente inocente. Esgotada a raiva daquele episó dio, sentia-se agora insegura por si mesma e por ele. Baixou os olhos para o copo e tornou a encará -lo.

- Como é que você descobriu onde eu trabalhava? — perguntou, só para dizer alguma coisa.

— Descobri. Fim. Isso importa?

— Nã o, nã o importa — admitiu ela.

— Entã o vamos esquecer esse assunto. Fale-me de você.

— Porquê?

— Porque estou interessado — sorriu ele. — De verdade. De onde você é? Sua pronú ncia é ligeiramente diferente, mas nã o o suficiente para eu descobrir de onde.

Ele parecia sincero, mas Sharon nã o queria arriscar nada. E ele finalmente desistiu, encolhendo os ombros.

— Você nã o confia em mim — disse. — E tem suas razõ es.

Ofereceu cigarros, ela recusou e ele acendeu um, estudando o rosto dela atravé s das serpentinas de fumaç a.

— Vamos começ ar pelo começ o — disse em tom leve, guardando o isqueiro de ouro no bolso. — Eu sou Lee Brent, solteiro, honesto e independente, e gostaria muito de jantar com você.

Sharon nã o pô de deixar de rir, sabendo que isso já era uma capitulaç ã o. Fossem quais fossem as intenç õ es dele, aquele tom brincalhã o era irresistí vel.

Ela nem notou o nome do lugar onde foram comer, mas percebeu que o maitre era francê s e Lee um cliente suficientemente assí duo, a ponto de ter sua mesa predileta. Nesse ponto Sharon já se sentia bastante à vontade com ele e, quando chegou o café, ela se viu de repente falando sobre tia Dorothy e sobre a solidã o que sentia em Londres. Lee falou pouco, mas ela podia sentir que ele a entendia. Ao danç arem na minú scula pista do restaurante, ele colou o rosto ao dela, segurando suas mã os junto ao peito, mas nã o fez nenhuma tentativa de apertá -la mais. Por ela, poderiam danç ar a noite inteira, mas concordou quando ele sugeriu que estava na hora de ir embora.

Apesar de tudo, ainda achava que ele ia convidá -la para terminar a noite em seu apartamento, mas em vez disso ele seguiu diretamente para o outro lado do rio. Falaram muito pouco durante o trajeto até Camberwell. Sharon combatia dentro de si uma depressã o crescente. Tinha sido uma noite maravilhosa, mas estava chegando ao fim e era altamente imprová vel que viesse a encontrar Lee Brent outra vez. Aquele passeio tinha sido a maneira dele se desculpar. Só isso. Tinha sido muito gentil, mas de certa maneira Sharon preferia ter mantido a primeira impressã o dele.

Antes mesmo do carro parar, ela já estava com a mã o na maç aneta da porta.

— Foi ó timo — disse. — Muito obrigada.

— Nã o fuja — disse ele, docemente. — Que tal amanhã à noite?

— Nã o sei... — respondeu, voltando o rosto para ele.

— Sem compromisso. Eu apenas quero estar com você — disse, estendendo o braç o e passando a mã o levemente pelo rosto dela, sorrindo. — Você é diferente, Sharon. Acho que nunca encontrei nenhuma moç a como você.

Ela sentia a pele vibrar no lugar em que ele a tinha tocado. Queria acabar com tudo aquilo, mas ao mesmo tempo queria continuar.

— Diferente, como?

— Digo-lhe num outro dia. Reserve a semana para mim.

— Nã o sei — respondeu hesitante, as emoç õ es confusas. — Lee, eu...

— Eu já disse: sem compromissos. Você controla o ritmo. Gosta de teatro?

— Adoro — disse, tentando uma risada. — Mas nã o posso ir sempre, com o preç o que custam as entradas.

— Musical ou sé rio? — perguntou ele, ignorando a ú ltima frase.

— Sé rio. Mas...

— Eu compro as entradas — disse, deslizando a mã o por trá s do pescoç o dela, acariciando-lhe a nuca. Puxou-a para mais perto de si e, inclinando a cabeç a, beijou-a brevemente e muito de leve nos lá bios. — Isso a tranqü iliza?

— É essa a sua intenç ã o? — Os olhos azuis de Sharon brilhavam. — Nã o sou assim tã o diferente.

Foi a vez dele rir. E dessa vez puxou-a para mais perto, os lá bios mais fortes, se bem que ainda longe daquela intensidade que ela sentira da primeira vez, no apartamento. Sharon retribuiu o beijo sinceramente, consciente do que isso poderia significar, mas deixando para pensar depois. Nenhum outro homem a havia afetado tanto anteriormente. O simples fato de estar ao lado dele a deixava toda agitada por dentro.

— Agora chega — disse ele, brincando. — Eu sou humano. Venho buscá -la à s sete.

Ficou olhando o carro se afastar, antes de entrar em casa, sentindo ainda nos lá bios o toque dos lá bios dele. Nã o importava o porquê de Lee desejar a companhia dela. O importante naquele momento é que ele a queria. Só isso. Aproveitar as oportunidades, havia dito Maureen uns dias antes. E por que nã o? Sharon sabia que sempre poderia recuar, se as coisas fossem longe demais.

CAPÍ TULO II

Era o começ o de uma semana inesquecí vel. Foram duas vezes ao teatro, jantaram cada noite num restaurante diferente, uma noite danç aram até as duas horas da manhã e terminaram tomando café numa barraca que ficava aberta a noite inteira, em Pimlico. Na sexta-feira, Sharon já estava devendo à firma mais de quatro horas de trabalho e mal conseguia manter os olhos abertos quando chegou, à s dez horas da manhã.

— Esse, sim! — ponderou Maureen da mesa ao lado, com uma expressã o enigmá tica nos olhos. — Você nã o me contou quem é o seu namorado.

— Contei, sim — mentiu Sharon, surpresa. — É Lee Brent.

— E isso é tudo o que você sabe sobre ele?

Era verdade, apesar de Sharon relutar em admitir. Nunca tinham discutido o passado de Lee, apesar de já terem conversado sobre tantas outras coisas. Ela nã o sabia bem se essa omissã o era proposital ou nã o, mas até aquele momento nã o tinha se preocupado. Estava com a cabeç a muito ocupada em outras coisas.

— E se você me contasse o que pensa saber sobre ele? — propô s Sharon. — Posso dizer o que é verdade e o que nã o é.

Maureen inclinou-se e atirou sobre a mesa dela um recorte de jornal datado de algumas semanas atrá s. Havia uma grande fotografia de casamento com alguns comentá rios embaixo. O rosto de Lee sorria; com aquele sorriso meio de lado que ela conhecia tã o bem, de braç o dado com a noiva, do lado esquerdo. A moç a parecia vagamente familiar, expressã o viva, cabelos escuros. Estava de branco, mas com um chapé u mole, de abas largas, em vez do vé u tradicional. O noivo, de cabelos loiros, era absolutamente desconhecido para Sharon.

— E daí? — perguntou. — Ele nã o é o noivo.

— Leia — insistiu Maureen. — Mamã e estava limpando uns guardados e eu encontrei esse jornal entre os papé is. É um casamento de famí lia. Ela é irmã dele.

Bem, já sabia da existê ncia dela, pensou Sharon, recordando; usava ainda um par de meias que tinha sido dela. Por isso o rosto lhe parecera familiar, claro. Ela e Lee se pareciam muito, a nã o ser nas diferenç as entre homem e mulher. Lora, chamava-se ela. Lora Massey, agora que se casara. Nã o mais Lora Brent.

Levou algum tempo para captar o resto da nota. Companhia Brent... Olhou de novo para a foto. Um homem mais velho de pé ao lado de Lee, cabelos brancos, mas a mesma expressã o no rosto. Seria o pai? Companhia Brent. Onde é que tinha ouvido aquilo antes?

— Ainda nã o entendeu, nã o é? — perguntou Maureen, triunfante. — Ele nã o deve ter-lhe contado que é dono deste mesmo pré dio onde trabalhamos. A Companhia, pelo menos, possui nã o apenas este, mas Deus sabe quantos pré dios de escritó rios mais, pelo mundo todo. Já ouviu falar da cadeia de hoté is Brentwood? Pois é deles també m. Até agora isso foi tudo o que eu consegui descobrir, mas tenho certeza de que tem mais. Sã o comerciantes de imó veis no sentido mais amplo da expressã o. Uma organizaç ã o multimilioná ria, segundo tudo o que se sabe sobre eles. O pai é o presidente. E imagino que Lee deverá ser o sucessor, uma vez que é filho ú nico.

— Esse nã o é o meu Lee — disse Sharon, com voz pastosa. — Eu o conheç o há menos de uma semana. E o que lhe dá tanta certeza de que eu ainda nã o sabia dessas coisas?

— Se eu nã o tivesse certeza, bastaria olhar para sua cara agora — disse a outra moç a, num tom meloso e consolador. — Sharon, você nã o percebe que ele está apenas brincando com você? Você nã o é o tipo dele.

— Você achava que eu era, sim, nã o faz muito tempo.

— Era brincadeira e você sabia disso. Na posiç ã o dele, pode ter as mulheres que quiser.

— Por que haveria de se importar com uma qualquer como eu, nã o é? disse Sharon, tentando manter a voz firme. — Para ser bem honesta,

Maureen, eu nã o me importo. Mesmo.

— Ah, se importa, sim. Você está caidinha por ele, nã o está? É natural. Ele é incrí vel mesmo.

— Má s ele só está atrá s de uma coisa e na hora em que conseguir, me dá um chute, nã o é isso o que você quer dizer?

— Algo assim, acho. — A moç a sentia-se incô moda. — Olhe, Sharon, nã o estou criticando. Se algué m assim arrastasse a asa para mim eu ia ficar tã o entusiasmada quanto você. Mas é que ele vive num mundo inteiramente diferente. Você nem imagina.

Por que nã o tinha pensado nisso, pensou Sharon desanimada. Nã o tinha querido saber de nada. Era essa a verdade.

— Desculpe — consolou Maureen, encarando-a. — Talvez eu devesse ter ficado de boca fechada. Vai sair com ele hoje?

— Vou — encerrou ela, arrumando os papé is sobre a mesa. —- Já é hora do café, nã o?

A outra moç a entendeu a indireta e nã o disse mais nada, mas Sharon achou difí cil concentrar-se no trabalho. Por que é que 'essas coisas tinham de ser importantes, no final das contas? O tempo todo ela tinha estado bem alerta, sabia que nã o ia durar. E se o encontro de hoje à noite fosse o ú ltimo, que fosse maravilhoso, memorá vel.

Lee chegou à s oito, conforme combinado. Entrando no carro, ela tentou esconder as emoç õ es, por trá s de uma fachada alegre. Já estavam a meio caminho da cidade quando ele finalmente a interrompeu.

— Você está falando demais — disse secamente. — Que foi que aconteceu?

— Você devia ter me contado — disse ela, depois de uma pausa extremamente longa.

— Contar o quê? — perguntou ele, sem desviar os olhos da rua.

— A Companhia Brent. — A voz dela soava como uma acusaç ã o. — Por que você nã o me contou quem era, Lee?

— Você nunca perguntou como eu ganhava a vida. Que diferenç a faz isso? Você sabia que eu nã o era nenhum funcioná rio esforç ado.

— Nã o. Esse é o meu departamento — disse, agastada.

— Nã o foi o que eu quis dizer. — A voz dele soava impaciente. — Nã o seja tã o sensí vel. Nã o me importa o tipo de trabalho que você faz. Apreciei a sua companhia nessas ú ltimas noites e acho que você també m se divertiu.

— Sim.

— Entã o, vamos continuar assim.

Quer dizer que ele pretende continuar?, pensou ela, meio tonta. E se continuar, por quanto tempo? E para quê? Sentia que ele se continha todas as vezes que se despediam com um beijo. O que é que ele estava escondendo?

— Onde vamos? — perguntou baixinho, depois de alguns minutos em silê ncio.

— Pensei em jantarmos em minha casa, para variar um pouco — disse ele, prontamente. — Já encomendei os pratos. Vai estar tudo pronto e arrumado assim que chegarmos lá.

Entã o era esse o encerramento da semana de preparativos: um jantar a só s, à luz de velas, com mú sica suave e, provavelmente, champanhe para encerrar.

E daí?, pensou Sharon, bravamente. Se tinha de ser seduzida um dia por algué m, Lee Brent nã o poderia ser melhor resposta à s preces de qualquer donzela. Ela o amava e o amor deveria transpor todas as barreiras. Se ele a desejava tanto, a ponto de se dar a uma semana inteira de preparativos para a cena final, por que nã o deixar as coisas acontecerem por si mesmas? Fosse qual fosse o sacrifí cio que o destino lhe reservava para o futuro, ela teria ao menos gozado de alguma proximidade com Lee.

Aliviada, verificou que nã o havia nenhum porteiro de serviç o na entrada do pré dio. Esforç ou-se por parecer natural à medida que subiam, no elevador. Lee, certamente, nã o notava nada estranho nela. Se ainda se lembrava das poucas palavras que tinham trocado no carro, devia ter preferido esquecê -las. Era como ele tinha dito: que diferenç a poderia fazer para a relaç ã o deles?

A mesa já estava servida junto à enorme janela aberta para a vista magní fica da cidade, envolta em neblina. Num carrinho té rmico, a refeiç ã o esperava por eles: pato com laranjas, maravilhosamente bem preparado.

Nã o havia velas, mas a luz era fraca, criando uma atmosfera de intimidade. També m nã o havia champanhe, apenas um vinho que tinham tomado algumas vezes e que Sharon tinha dito adorar. E gostava agora ainda mais, pois lhe dava certa seguranç a. No decorrer da noite, foi se sentindo mais firme e decidida. Amava aquele homem e, se lhe pedisse, iria para a cama com ele. Desejava isso. Desejava fazer amor com ele. Era como um furacã o, crescendo dentro dela.

Só quando terminaram de comer e se instalaram num dos grandes sofá s para tomar café e licor foi que seu estado de espí rito começ ou a mudar. Talvez sentindo isso, Lee aproveitou que tinha se levantado para trocar o disco e apagou mais uma luz.

— No escuro, a vista da janela fica mais bonita — disse.

Sharon tentou nã o ficar tensa quando ele passou um braç o em tomo de seus ombros e puxou-a para perto de si. Era bem o que ela tinha imaginado. Ele agia de acordo com as regras. Abriu os lá bios para. receber o beijo dele, tentando renovar o desejo que havia sentido antes. O desejo ainda estava lá, mas submerso numa sensaç ã o de alerta maior. O movimento da mã o dele, subindo da cintura para seu seio, provocou-lhe uma estranha mistura de desejo e rejeiç ã o. Queria aquele toque, aquela carí cia, mas nã o assim. Sentia que era para ele como um objeto, um desafio que tinha de ser vencido.

Ainda abraç ado a ela, ele levantou a cabeç a pousando os lá bios em sua testa, afastando seus cabelos, em movimentos lentos, sem apressá -la. Dizendo, sem palavras, que tinha a noite toda para eles. Quando finalmente falou, a voz dele soou como uma intrusã o.

— Eu sei que faz menos de uma semana que nos conhecemos — murmurou —, mas nã o posso esperar mais. Sharon...

— Nã o! — disse, empurrando-o com ambas as mã os e pondo-se de pé. — Nã o, Lee. Eu... mudei de idé ia.

Ele ficou imó vel por um momento, a expressã o indecifrá vel na penumbra pesada.

— Como, mudou de idé ia? — disse, sorrindo. — Nã o acha que é melhor ouvir a pergunta primeiro antes de responder?

— Já sei o que você vai dizer — disse ela, mantendo-se na defensiva, louca para agarrar suas coisas e sair correndo dali antes que ele a dominasse de novo. Mas queria que ele percebesse exatamente como se sentia.

— Durante toda a semana eu sabia para onde está vamos indo. Você me procurou com uma ú nica intenç ã o, nã o foi, Lee?

— Procurei-a com alguma intenç ã o, sim — sorriu ele, misterioso. — Mas nem eu mesmo sabia exatamente qual, até uma noite dessas.

— Espera que eu acredite nisso?

— Nã o — admitiu ele. — Você nã o está disposta a acreditar em nada do que eu venha a dizer agora. — Lee pô s-se de pé antes que ela conseguisse escapar, bloqueando o caminho da fuga. Pousou as mã os com firmeza nos ombros dela, forç ando-a a encarar os olhos cinzentos.

— Sharon, se eu quisesse apenas ir para a cama com você, já teria conseguido.

— Entã o o que... — disse ela, sem entender.

— Quero que se case comigo.

Ela soltou o ar retido nos pulmõ es num longo sopro de alí vio e seu corpo perdeu a rigidez. Um calor começ ou a espalhar-se dentro dela, até estourar em estrelas que brilharam em seus olhos.

— Lee...

— Entã o, responda — ordenou ele, já sabendo a resposta, os lá bios tremendo num sorriso. — Sim ou nã o?

Ainda estava chocada, mas nã o tinha mais dú vidas da seriedade dele, mesmo com aquele sorriso brincando em seu rosto. A reaç ã o dela faria qualquer-um sorrir, pensou, confusa. Tinha tanta certeza das razõ es por que ele a tinha trazido ali e...

— Sim — disse ela. — Sim. Sim!

— Entã o tudo bem. — A voz dele soava satisfeita. Lee carregou-a nos braç os e sentou-se de novo no sofá com ela sentada em seu colo, abraç ados, o rosto dela pousado em seu ombro. A boca com que ele a beijou era agora possessiva, excitando-a. Sharon lanç ou os braç os em torno do pescoç o dele, apertando-o e retribuindo o beijo, febril. Toda sua mente estava concentrada no pensamento de um futuro inteiro assim, com Lee. Sra. Lee Brent. Soava bem! E ainda era difí cil de acreditar.

Ela perdeu um pouco o fô lego quando ele deslizou a mã o para dentro do decote de seu vestido. Os dedos dele eram quentes, macios, suaves, e ao mesmo tempo estranhamente intensos ao tocar a pele dela. Ele sabia como tocar. E onde tocar, arrancando dela um pequeno suspiro. Quando ele abriu os trê s pequenos botõ es de sua roupa, afastando o tecido que a cobria, Sharon nã o fez nenhum gesto para detê -lo, mas ele devia ter sentido alguma tensã o nela, pois levantou a cabeç a e encarou-a.

— Que foi? — perguntou em voz baixa, sem retirar a mã o. — Está preocupada?

— Nã o — respondeu, tentando parecer segura de si.

— Nã o gosta que eu a toque assim? — insistiu, percebendo a inseguranç a dela. — Estou machucando?

— Nã o — respondeu ela, pousando a mã o sobre a dele. — Eu gosto. É ó timo, mas... Lee, eu quero fazer amor com você, claro. Mas é que... — Ela hesitava, sem saber direito o que queria dizer.

— Nã o consegue se entregar porque ainda suspeita que a proposta que fiz é apenas uma desculpa para levá -la para cama — concluiu ele, sem expressã o. — Acha mesmo que eu chegaria a esse ponto só por uma noite de prazer?

— Nã o. Acho que nã o.

— Entã o, pare de ser tã o bobinha. Aconteç a o que acontecer, nó s vamos nos casar.

— Por que eu? — perguntou ela, de repente. — Você podia escolher quem quisesse, Lee. Por que eu?

— Por que você acha? — disse, com uma ligeira mudanç a de expressã o.

— Nã o sei direito. Você nã o chegou nem a mencionar a razã o mais comum.

— Nunca disse eu te amo? — sorriu Lee. — Talvez por achar que você já sabia disso. Eu nunca pedi ningué m em casamento antes. Tem de me desculpar se nã o sigo as regras do jogo.

A partir daquele momento ela seria capaz de perdoar tudo e dar tudo aquilo que ele quisesse, mas desta vez foi Lee quem achou melhor parar.

— É, você está certa. Vale a pena esperar. — Fez uma pausa e continuou: — Você nã o se importa se nosso casamento for bem discreto, nã o é? Acabamos de enfrentar um monte de pompa e cerimô nia no casamento de minha irmã. E acho que eu nã o agü entaria enfrentar tudo de novo no papel central.

Sharon concordou. Preferia també m uma cerimô nia discreta, principalmente naquelas circunstâ ncias.

— E a sua famí lia, Lee? Como vai reagir?

— Meu pai vai gostar muito. Ele acha que eu devia assentar de uma vez.

— Mas será que ele vai aprovar a sua escolha?

— E por que nã o?

— Bem... eu nã o pertenç o ao seu mundo.

— Só na sua cabeç a. Nã o na minha. O que é que cria essa diferenç a? Dinheiro?

— Nã o só isso — disse ela, passeando o olhar pela sala escura. — O ambiente, principalmente. Você sempre viveu desse jeito, a vida inteira. Isto para mim é como um outro planeta.

— Você logo se adapta. É tudo uma questã o de ponto de vista — disse Lee, interrompendo-a com um pequeno gesto de impaciê ncia. — Esqueç a essas coisas. Nã o sã o importantes, a nã o ser que você as torne importantes. Amanhã vou apresentá -la a meu pai. Nã o, amanhã, nã o. Vamos deixar para domingo. E o ú nico dia que ele tem para descansar.

Estudou a reaç ã o dela por um momento, depois retirou a mã o que ainda mantinha sobre o seio dela e tomou a fechar os trê s botõ ezinhos.

— Melhor levá -la para casa.

Sharon queria ficar, mas nã o conseguia dizer isso. Sabia que precisava ficar um pouco sozinha, para ordenar as idé ias. Ia casar-se com Lee. Ainda nã o conseguia acreditar. Conhecia-o há tã o pouco tempo! Será que o amor podia mesmo acontecer daquela forma? Tinha sido assim do lado dela, por que nã o acreditar que acontecera o mesmo com ele? E que outra razã o poderia Lee ter para querer desposá -la?

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