Хелпикс

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Capítulo III 2 страница



— É assunto seu, claro. Mas, se é assim, seria de se esperar que viesse visitar a Escócia numa época do ano mais agradável que neste inverno forte.

— Estou bastante preparada para enfrentar as condições — respondeu Melanie, perturbada com aquela insolência que conseguia vencer seu controle.

— É mesmo? — Ele tirou um cigarro do maço e colocou entre os lábios, completando antes de acender: — Isso é muito bom, srta. Stewart, porque parece que vai ter de contar com a nossa hospitalidade por mais tempo do que estava pretendendo.

— Porquê?

— As condições de tempo nesta área são imprevisíveis — disse ele, olhando a chama do cigarro. — Se não partir já, talvez não possa mais partir.

— Não posso ir embora antes de... — respondeu, inquieta, tentando controlar-se. — Haveria um jeito de pegar o meu carro?

— Duvido — disse ele com um meio sorriso.

— Entendo. — Melanie suspirou, tentando reprimir o pânico que sentia ao ver que ia ficar ali como uma espécie de prisioneira. — Bom, então vou ter de achar um jeito de aproveitar minha estada, não é?

— Minha cara srta. Stewart, se quer aproveitar, quem sou eu para reclamar?

— Eu não gostaria de incomodá-lo — declarou, irritada pela

indiferença dele.

— Isso não vai acontecer, srta. Stewart, pode ficar sossegada. Já estou acostumado às esquisitices do seu sexo. Se acha divertido dirigir algumas centenas de quilômetros para ficar trancada num hotel, no meio das montanhas, com este tempo, issoé inteiramente problema seu.

— É isso mesmo — disse ela, sentindo o sangue afluir ainda mais ao rosto e pescoço.

— Então esperarei a revelação do mistério — observou ele, sorrindo da agitação dela. — Até então, com licença.

— Sr. Bothwell! — Melanie chamou, quando ele já se virava para sair.

— Sim? — disse com uma expressão cínica.

— Talvez possa me dizer quando é que vou poder tomar um banho quente — disse, endireitando os ombros,

— Ah, claro, srta. Stewart — disse Bothwell, levantando as sobrancelhas. — Minhas desculpas. O aquecedor quebrou ontem à noite. Mas já está funcionando, e se quiser tomar um banho depois do café da manhã...

— Muito obrigada — respondeu ela ao cínico gesto de falsa gentileza

que ele lhe fazia.

— Suponho que sua valente declaração de estar preparada para enfrentar as condições não inclui banhos frios, não é?

Ele não esperou resposta. Virou-se e saiu da sala. Melanie ainda estava em pé diante da lareira, mordendo o lábio, irritada e deprimida, quando a porta se abriu e as duas velhotas entraram. Olharam para ela, curiosas, e Melanie resolveu que devia tomar a iniciativa de fazer contato.

— Bom dia. Que tempo horrível, não? — disse, sorrindo.

— Já estamos acostumadas. A gente mora aqui, sabe?

— Ah, é mesmo?

— É, sim — respondeu a outra mulher. — Minha irmã e eu nos aposentamos há muitos anos. Como a gente sempre vinha passar férias nesta parte da Caledônia, achamos que ia ser agradável mudar para cá agora que somos livres.

— Entendo — disse Melanie. — Mas acho que deve ser mais agradável quando é um pouquinho mais quente, não?

— Ah, a gente gosta de tudo, sabe? — disse uma delas, depois de trocar um olhar com a irmã. — Os invernos aqui são como os invernos de antigamente. Muita neve, lareiras de lenha, castanhas assadas...

— ...e as frutas de inverno — completou a outra. — Vai ficar para o Natal, srta. ... srta. ...

— Stewart. Melanie Stewart.

— Nós somos Sullivan — disse uma delas, depois de terem trocado olhares de novo. — Jane e Elizabeth Sullivan.

— Como vai? — disse Melanie, apertando a mão de uma e depois da outra, ao perceber que era esse tipo de comportamento que esperavam dela. — Sabe, eu não pretendo ficar até o Natal. Tenho de voltar a Londres em menos de uma semana. Eu trabalho lá.

— Em que é que trabalha, srta. Stewart? — perguntou Elizabeth Sullivan.

— Desenho ilustrações para livros infantis.

— É mesmo? — perguntaram em coro as irmãs. — Que interessante!

— E, bastante. Eu gosto muito. Mas o que eu quero mesmo é escrever as histórias também. Além de ilustrar, claro.

— Claro — disseram as duas, juntas.

— E por que é que veio a Cairnside, srta. Stewart? — perguntou Jane Sullivan — Está pesquisando para algum livro?

Melanie suspirou. Por que é que perguntavam tanto por ali? Seria apenas uma maneira de demonstrar simpatia? Fosse o que fosse, não precisava responder, nem protestar, como tinha feito com Bothwell.

— Vim para ver uma casa que fica perto daqui. Monkshood — disse Melanie, afinal, achando que não podia ignorar a pergunta.

— Monkshood! — exclamaram as duas, juntas, voltando-se uma para a outra.

— Não é aquela casa que pertencia ao falecido Angus Cairney? — perguntou Elizabeth, intrigada.

— É. É essa mesma — respondeu Melanie, os olhos brilhando. — Conhecem?

— Já ouvi falar. — Elizabeth deu de ombros e voltou-se para a irmã. — Você também conhece a casa, não conhece, Jane?

— Ah, é aquele casarão horrível perto da aldeia, não é? — disse Jane, mexendo na bolsa.

— Claro! — respondeu Elizabeth, voltando-se então para Melanie. —

Mas por que é que está interessada naquela monstruosidade? Não está pensando em comprar aquela casa velha, está?

— Não — respondeu ela, sincera, esquentando as mãos na chama da lareira. — Não estou pensando em comprar, não. Só quero dar uma olhada.

— E veio de Londres até aqui só para dar uma olhada em Monkshood?! — exclamou Elizabeth, alarmada. — No pior do inverno!

— É — disse Melanie com firmeza, tentando acabar com aquele bate-papo tolo. — Talvez possam me dizer como chegar até lá.

Mas bem nesse momento a porta tornou a se abrir e o velho Alaister entrou. As velhotas sorriram desejando bom-dia e ocuparam uma mesa para dois.

Melanie suspirou e foi até a sua mesa, que já estava arrumada. Ia ter de esperar. Mas não tinha pressa. A neve ainda caía pesada e parecia que ia continuar assim para sempre.

Comeu devagar, para encher o tempo. Quando terminou os outros já haviam se retirado e ela resolveu dar uma olhada pelo hotel.

Além da saleta de recepção e da sala de jantar, havia uma de estar equipada com televisão, que parecia deslocada naquele lugar. Havia o bar com o balcão e mais uma saleta e outras portas fechadas com etiquetas de "Particular" e que deviam provavelmente ser usadas pelo proprietário e sua família.

A garota loira estava de novo atrás do balcão quando ela passou pelo hall em direção a seu quarto.

— Já telefonou para a oficina em Rossmore? — Melanie perguntou, chegando impulsivamente ao balcão.

— Não, senhorita — respondeu —, mas acho que não ia adiantar muito com esse tempo. É uma oficina pequena, entende? Não estão muito bem equipados.

— Mas deve haver alguém aqui na região que possa rebocar o meu carro, não? — perguntou Melanie, um tanto alarmada.

— Nesta época do ano eles estão sempre muito ocupados com os casos de emergência. E não se pode dizer que rebocar o seu carro até Cairnside seja uma emergência, não é?

— É, é verdade — concordou Melanie, mordendo o lábio.

A moça sorria para ela, simpática, mas Melanie não estava a fim de conversa e voltou-se abruptamente para ir para o quarto.

— Posso chamar a oficina de Newtoncross, se quiser — disse a moça, atenciosa.

— É perto daqui? — perguntou Melanie, parando.

— Não muito. Mas é a cidade mais próxima e talvez lá haja alguém que possa ajudá-la.

— Então está bom. Agradeço a sua gentileza. — Voltou-se e subiu para o quarto.

Com o aquecimento funcionando de novo, o quarto estava quentinho e agradável. A cama já estava arrumada e Melanie puxou a cadeira de vime para perto da janela. Sentou-se e ficou olhando pela janela, um tanto resignada. Se Michael soubesse que o tempo estava tão incerto, ia exigir que ela voltasse imediatamente a Londres. Mas, mesmo que quisesse, não poderia voltar agora. Seu carro estava abandonado no meio da estrada até que surgisse alguém para arrancá-lo da neve. Além disso, Cairnside não era nada do que tinha esperado.

Ainda em Londres tudo tinha parecido tão simples. Tão, tão simples! Ela dirigiria até aquele hotel que os advogados tinham mencionado, e daria uma primeira olhada em Monkshood. Mas em Londres o tempo estava bom. Um pouco chuvoso e frio, mas nada como aquilo. Ninguém tinha ihe dito nada sobre os extremos de temperatura daquele lugar. Não podia durar muito mais. Havia de parar de cair neve.

Era bobagem voltar para Londres sem ver a casa. Sabia que Michael faria tudo para consolá-la, mas no fundo ele ia ficar satisfeitíssimo por provar mais uma vez que ela não era capaz de fazer nada sozinha. Talvez fosse pelo fato de Melanie não ter mais pais que ele se sentisse tão protetor com ela. Mas era um pouco demais às vezes, e por isso tinha resolvido enfrentar aquela aventura, mesmo contra o sarcasmo e a ironia de Bothwell e as deploráveis condições do tempo.

Levantou-se e andou inquieta pelo quarto. O que será que as pessoas faziam ali quando o tempo estava assim tão ruim? Era impossível ficar trancada no quarto o dia inteiro.

Parou à janela de novo. Dava para a frente do hotel. Lá fora, ocupado em remover a neve da entrada, estava o funcionário que lhe havia indicado a cabine telefônica no dia anterior. Talvez desse para dar uma volta. Se se agasalhasse bem e não saísse da estrada principal, não havia perigo nenhum em dar um passeio. Talvez pudesse até chegar à aldeia e perguntar onde era Monkshood. Seria ótimo, porque evitaria a curiosidade do pessoal do hotel.

Decisão tomada, sentiu-se imediatamente mais animada. Abriu a mala depressa. Felizmente tinha se lembrado de trazer as galochas.

Minutos depois, com seu casaco de pele de carneiro, gorro enfiado até as orelhas, luvas e galochas altas protegendo pés e pernas, ela desceu a escada do hotel. Não havia ninguém na recepção. Só um cachorro collie que parecia mais interessado no osso que roía com gosto. Melanie saiu.

A porta estava dura de abrir, mas ela conseguiu, emergindo para um inundo branco e tão frio que mal se podia respirar. Lá de dentro de seu quarto toda aquela brancura tinha parecido convidativa, mas, agora que estava ali, Melanie hesitou. Olhou em torno enquanto os flocos de neve grudavam em seus cílios longos, invadindo sua boca e narinas, mas não havia ninguém com quem passar o tempo. Mesmo o funcionário que tinha visto limpando a entrada já tinha desaparecido.

Melanie suspirou. Enfiou as mãos nos bolsos, batendo os pés no chão, sem saber o que fazer. Sabia para que lado ficava a aldeia, mas não seria arriscado tentar caminhar até lã?

Olhou para o hotel. Assim coberto de neve nas bordas do telhado parecia tão acolhedor e confortável que Melanie sentiu-se tentada a desistir da caminhada. Mas ficar ali o dia inteiro, sem nada para fazer, perdendo tempo, era demais para ela. Começou a caminhar, decidida.

Não era tão ruim, afinal de contas. A neve sobre o chão estava fofa em vez de escorregadia e dava para andar bem depressa para não sentir frio. Apesar de tudo estar branco, dava para perceber bem claramente os contornos do caminho. Além disso, as marcas de pneu de algum carro que tinha passado eram uma trilha segura. Sentiu-se animada. Era melhor que ficar no hotel, sentada diante da lareira, ouvindo o clique-claque das agulhas de tricô das irmãs Sullivan. Maldade minha, pensou, nem sei se elas fazem tricô ou não.

Ao virar a curva da estrada deparou com um grande portão coberto de neve. Parou para olhar a casa que havia ao fim da entrada ladeada de árvores. Parecia tudo meio abandonado, mesmo com a brancura da neve.

Evidentemente, a casa estava vazia. Dava de fundos para a encosta da montanha, como o hotel. Não devia estar longe da aldeia e, segundo Jane Sullivan, Monkshood ficava perto da aldeia. Seria aquela?

Sem parar para pensar, empurrou o portão e entrou. Caminhou pela entrada até a casa. As chaves que os advogados tinham lhe dado em Fort William estavam em sua bolsa no hotel. Portanto, não poderia entrar, mas não resistiu à tentação de dar uma olhada e quem sabe espiar através de alguma janela aberta.

Jane Sullivan tinha razão. Era um lugar velho e feio. Nem mesmo a neve acumulada nos batentes suavizava as janelas quadradas. As trepadeiras secas que subiam pelas paredes pioravam ainda mais aquele ar de abandono.

Verificou, desapontada, que as janelas da frente estavam todas fechadas com venezianas. Deu a volta pelo jardim descuidado.

Atônita, descobriu pegadas na neve. Pegadas enormes que cruzavam e descruzavam diante da porta traseira. Algumas das marcas pareciam ter sido feitas no dia anterior, pois já estavam quase cobertas de neve. Mas havia outras, evidentemente recentes.

Franziu a testa, intrigada. Podia estar errada. Aquela casa podia não ser Monkshood, e nesse caso estava invadindo propriedade alheia.

Sacudiu a cabeça, confusa. Cairnside era uma área tão pouco habitada que parecia impossível existirem duas casas tão grandes com as mesmas características, ambas em evidente estado de abandono. Os advogados já a tinham prevenido de que a casa estava abandonada e malcuidada. Mas tinham dito também que era sólida e por isso tinha resolvido vir olhar de perto.

O silêncio era pesado em torno da grande construção. Nem a neve fazia barulho ao cair e ela começou a sentir-se inquieta. E se estivesse certa? Se aquilo fosse realmente Monkshood e alguém estivesse dormindo lá dentro? Afinal, não havia pegadas na entrada e na frente da casa. Quem quer que fosse a pessoa, era evidente que queria permanecer no anonimato.

Sentiu um arrepio percorrê-la. Agora havia pegadas na parte da frente. As suas próprias pegadas. Alguém que olhasse do andar de cima da casa poderia vê-las claramente. Sentiu um impulso desesperado de correr dali, mas, ao pensar no sorriso de Michael dizendo que ela não ia conseguir fazer nada sozinha, controlou as emoções. Estava sendo melodramática, deixando o silêncio perturbá-la. Afinal de contas, aquela casa era dela, e se havia alguém lá dentro era melhor que saísse logo.

Ganhando coragem, experimentou a maçaneta da porta. Para sua surpresa ela cedeu e Melanie abriu a porta, sem poder acreditar naquilo.

Viu uma cozinha, triste e fria. Havia um fogão dum tipo que nunca tinha visto antes, e que devia servir também como aquecedor para a água da casa, uma mesa um pouco embolorada pela umidade e várias cadeiras simples, de madeira.

Hesitou no batente, ouvindo atenta, mas não distinguiu nenhum ruído. Se havia alguém usando a casa, não devia estar ali no momento. Entrou. Mas deixou a porta aberta por precaução.

Reagiu à tendência de andar nas pontas dos pés. Cruzou com firmeza a cozinha e abriu a porta do outro extremo. Dava para um corredor que, apesar de meio escuro, tinha luz suficiente para Melanie ver que atravessava toda a casa até a porta da frente. Tinha várias portas e lá no fim uma escada que subia.

Sentiu-se um pouco mais segura. Não havia sinais de ninguém estar morando ali. Abriu uma porta.

Ali parecia ser a sala de jantar. Havia uma mesa, coberta por uma grossa camada de poeira, muitas cadeiras e uma cristaleira antiga, cheia de pratos e xícaras.

Uma outra porta levava a uma espécie de estúdio, com prateleiras de livros nas paredes e uma grande mesa que serviria perfeitamente para seu trabalho de ilustração.

Entrou depois no que devia ser a sala de estar, com um conjunto de sofá e duas poltronas, além de várias outras cadeiras e poltronas avulsas.

Se o andar de cima seguisse a mesma linha, a casa parecia ter sido mobiliada com muita unidade de gosto. Melanie achou que uma boa limpeza havia de melhorar tudo aquilo. Sentiu-se animada. Se ficasse detida ali em Cairnside por algum tempo mais, podia cuidar disso ela mesma.

Estava tão excitada com esses pensamentos que não ouviu os passos que desciam as escadas cobertas de tapete e chegaram até a porta da sala.

Melanie quase teve um colapso ao ouvir uma voz grave soar de repente às suas costas.

— Que diabo está fazendo aqui?

Voltou-se, ainda não recuperada do choque. Era Sean Bothwelt, que a encarava tão surpreso quanto ela, mas bem menos assustado.

— Você! — exclamou, perplexa. — Então aquelas pegadas eram suas?!

— Eram, sim — respondeu, carrancudo. — Mas você ainda não me respondeu. O que pensa que está fazendo aqui?

— Eu podia lhe fazer a mesma pergunta — disse, ligeiramente trêmula diante da força daquele olhar.

— Eu perguntei primeiro — insistiu, rude, apertando os olhos.

— Muito bem — respondeu Melanie, engolindo em seco. — Esta casa me pertence, isto é Monkshood, não é?

— É, srta. Stewart. Isto aqui é Monkshood, sim. Mas ela não pertence a você. Pertence a mim!

                     Capítulo III

 

 

Melanie ficou completamente sem fala por um momento, olhando indefesa para Bothwell, como se ele fosse algum fantasma maligno.

— Deve estar havendo algum engano, sr. Bothwell — conseguiu dizer depois de reunir todas as suas forças. — Angus Cairney era meu tio-avô. Minha mãe era a única parente que ele tinha e, como ela já morreu, Monkshood foi deixada para mim.

Os olhos cinzentos de Bothwell se sombrearam com os longos cílios negros, que eram o único traço mais delicado naquele rosto rudemente másculo. As costeletas muito longas tornavam-no ainda mais sombrio, acentuando seu ar impositivo. Se usasse roupas diferentes caberia perfeitamente em outro momento histórico, mais primitivo. Mas, mesmo vestido como estava, Melanie teve a exata sensação de que, mesmo nos dias de hoje, ele era ainda daqueles que fazem suas próprias leis.

— Entendo — disse ele. — E quem foi que disse que Monkshood pertencia a você?

— Ora.... os advogados, é claro.

— Que advogados? — exigiu ele, duro.

— McDougall e Price.

— Ah! — fez Bothwell, passando a mão no rosto. — Eles entraram em contato com você em Londres?

— Sim, são os meus advogados.

Melanie de repente se empertigou. Percebeu que ele estava aproveitando o susto dela para tirar todas as informações que podia.

— Talvez agora possa me dizer por que achou que Monkshood era propriedade sua — exigiu ela, endireitando ainda mais os ombros.

Bothwell voltou para ela os olhos cinzentos, forçando-a a mover-se, incômoda. Ela não ia permitir que Sean Bothwell a intimidasse, mas na verdade ele a perturbava como nenhum outro homem havia conseguido até então. Era a atitude imprevisível dele que conseguia esse efeito. Era muito desconcertante não saber nunca o que ele ia fazer ou dizer em seguida. Melanie tinha sempre achado fácil lidar com os homens, mas Bothwell era diferente, por alguma razão.

— Angus Cairney era meu pai — disse ele apertando os olhos enquanto a encarava intensamente.

— O quê? — Melanie sentiu as pernas fraquejarem. Sacudiu a cabeça, confusa. — Mas... mas os advogados! Eles nem sabiam que Angus fosse casado!

— Ele não era mesmo — disse Bothwell olhando-a, provocador. Melanie sentiu o sangue colorir suas faces violentamente. Torcia as

mãos, nervosa. Tinha certeza de que ele devia estar se divertindo com a perturbação dela. Apertou os lábios, tentando encontrar algo para dizer, mas a afirmação dele era irrefutável.

Parecendo abrandar um pouco, Bothwell desviou dela os olhos, passeando-os pela sala. Acendeu um cigarro e caminhou até a janela. Estavam fechadas por venezianas, mas era possível ver o exterior através das barrinhas de madeira. Ele ficou de costas um tempo, olhando para fora, e Melanie sentiu-se aliviada por ter aquele momento para se recompor. Mas, mais cedo ou mais tarde, ia encará-la de novo e teriam de continuar a conversa.

Quando ele pousou de novo os olhos nela, Melanie sentiu uma horrível sensação de inadequação. Pela primeira vez lamentou não ter esperado Michael para vir com ela. Essa situação nunca teria ocorrido se ele estivesse junto. Ele teria insistido em tomar todas as informações primeiro, para depois fazer uma visita oficial ao lugar. Não teria nunca compactuado com aquela invasão impulsiva de uma propriedade particular.

— E então? — disse Bothwell num gesto largo. — O que pretende fazer com isto?

— Eu... eu... Oh, não sei — disse, apertando os lábios para que não tremessem. — Acho... quer dizer... sinto que não tenho mais nenhum direito sobre este lugar...

— Ora, vamos, srta. Stewart — disse ele, apertando os olhos frios. — Poupe-me as formalidades. Estou bastante consciente de que abalei o seu coraçãozinho, mas não deixe que isso perturbe sua cabeça. Certamente McDougall e Price hão de concordar comigo, nisso pelo menos.

— Seu... seu pai fez um testamento...

—  É, eu sabia. Mas imagino que deve ter sido feito há muito tempo.

— Sim — disse Melanie. desviando os olhos, incapaz de sustentar o olhar dele. — Talvez tenha feito outro depois...

— Deve ter esquecido que fez o primeiro — disse Bothwell, encolhendo os ombros largos. — Ele já era velho. Não dava muita importância a esses assuntos.

— Mamãe só falou nele algumas poucas vezes. Nunca o conheci.

— Ela devia ser a única parente do velho. Ele nunca se casou.

— Mas sua mãe... — Melanie controlou-se imediatamente.

— Minha mãe já era casada. Com outro — explicou ele, rude. — Mas não acho que deva se preocupar com os detalhes do meu nascimento.

— Estou me sentindo tão mal...

— Por quê? — perguntou ele friamente. — Não podemos ser responsabilizados pelos atos dos outros. Vou deixá-la agora para examinar a sua propriedade. Só uma coisa, porém: quando resolver vender a casa, eu sou o primeiro pretendente.

— Oh, por favor... — Melanie voltou-se para ele, juntando as mãos num gesto que parecia de súplica. — Por favor, não vá. Eu... Bem, gostaria que ficasse.

— Por quê?

— Afinal... afinal somos quase parentes, não é? — perguntou, tirando o gorro de pele e deixando os cabelos caírem como uma cortina clara e brilhante em tomo de sua face corada. — Acho que podíamos ser amigos. Eu gostaria de seu conselho.

— Você não me parece o tipo de mulher que aceita conselhos de ninguém — disse ele, encostando-se indolente e elegante no batente da porta.

— Por que pensa assim? — perguntou, dominando a indignação.

— Deve haver alguém em Londres que a aconselhou a não vir para Cairnside nesta época do ano. Você usa anel de noivado. Será que seu noivo não se preocupa com você ou essa jóia é um mero adorno, usado apenas para causar curiosidade?

Melanie olhou para o diamante quadrado que Michael tinha lhe dado de presente. Estava tão acostumada a usá-lo que nunca pensou que alguém fosse notar.

— Sou noiva, sim — disse devagar. — Meu noivo realmente sugeriu que eu esperasse até a primavera para vir. Mas acho que dá para entender que fiquei preocupada em deixar a casa vazia durante todo o inverno.

— Podia ter contratado alguém para cuidar dela. Os advogados podiam cuidar disso.

— Não pensei nisso.

— Por que, exatamente, queria vir pessoalmente? — perguntou Bothwell, cruzando os braços.

— Minhas razões não pareceriam razoáveis à sua maneira fria de enxergar as coisas — respondeu, impaciente.

— Vamos tentar!

— Queria ver a casa porque nunca tive uma casa própria antes. Nem mesmo morei, nunca, numa casa, em toda a minha vida. Sempre vivi em apartamentos e estava pensando, talvez, em vir morar aqui. O que é uma grande bobagem.

— Entendo — disse Bothwell, tragando o cigarro. — E seu noivo? Ele concorda em mudar para cá?

— Eu... ainda não falamos sobre isso — disse Melanie com um gesto quase involuntário. — Ele também é advogado, em Londres.

— Pois devia falar com ele — observou secamente.

— Acha que estou sendo boba? — disse, corando ainda mais.

— Por quê? Por conversar com seu noivo?

— Não. Sabe o que quero dizer. Por pensar em ficar com a casa,

— Se eu concordar, você vai achar que tenho interesses pessoais, não é? — disse ele, atirando o toco do cigarro na lareira vazia.

— Dadas as circunstâncias, acho que devia me dizer o que pensa.

— Porquê?

— Na verdade, a casa é muito mais sua que minha.

— Ah, não, srta. Stewart. A casa é sua.

— Você está fazendo questão de não me entender — disse Melanie, fixando nele os olhos. — Para que queria a casa?

— Para morar nela. Para que mais?

— Se eu fosse um homem, podíamos talvez chegar a alguma espécie de acordo...

— Se você fosse um homem, esta situação não teria acontecido. Você simplesmente venderia a casa e não inventaria essa bobageira sentimental de ter um lar e etc. ...

— Como ousa dizer isso! Se eu resolver me mudar de Londres, isso é assunto só meu.

— Se quer tanto sair de Londres, talvez deva examinar melhor os motivos que a levam a isso. — Os olhos cinzentos brilhavam frios e provocantes. — Talvez a razão não seja Londres.

— O que quer dizer?

— Sinto muito, srta. Stewart — disse ele, voltando-se em direção à porta —, mas não tenho (empo para ficar aqui discutindo a manhã inteira. Algumas pessoas têm de trabalhar, sabia? Com licença.

Melanie ficou olhando enquanto ele avançava pelo corredor. Sentia o corpo tremendo e a respiração entrecortada. Sempre que se defrontava com aquele homem ficava nervosa depois.

Depois de alguns minutos conseguiu retomar o controle de si mesma e olhou em torno outra vez. Era bobagem deixar-se influenciar pela amargura dele. Além disso, não tinha certeza se queria ou não ficar com a casa. Michael teria de concordar e ela não conseguia vê-lo sujeito àquele tipo de clima.

Para ela o lugar parecia perfeito. Havia muita liberdade e muita vida animal por ali e seria ideal para escrever os livros infantis com que sonhava.



  

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