Хелпикс

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—Eu já lhe disse. Sim! 2 страница



Ele estava inclinado para a frente, com os cotovelos apoiados no joelho e a cabeç a baixa.

— Se você quer saber com isso se tí nhamos diferenç as de opi­niã o, a resposta é nã o. — Um sorriso muito ligeiro surgiu e desa­pareceu. — Somos parecidos em muitas coisas, nó s nã o aceitamos as coisas como elas vê m. Isso torna a vida interessante algumas vezes,

Jú lia bem que podia imaginar, embora interessante nã o fosse o adjetivo de sua escolha. Desde que seu pai morrera tivera de ser independente. Era bem plausí vel que tivesse se ressentido de qual­quer tentativa dele de impor sua vontade a ela, E no entanto devia ter ficado claro, quando ela o conheceu, que havia um homem que gostaria de ser o lado dominante em qualquer relacionamento, o que, nesse momento, era muito evidente. Ou poderia estar ocor­rendo o fato de que sua percepç ã o agora era mais aguda porque estava livre da emoç ã o que ele havia despertado nela, a ponto de convencê -la a desposá -lo em um prazo tã o curto? Ela o tinha amado de verdade ou tinha sido levada a se convencer de que o amava? Ela tinha de reconhecer que ele era um homem a quem ela teria achado extremamente atraente em circunstâ ncias diferentes.

— Todos os casais brigam de vez em quando — ele prosseguiu. — E sempre dizem que o primeiro ano é o pior. Duas pessoas nã o podem aprender a viver juntas da noite para o dia. — O sorriso surgiu de novo, e ele levantou a cabeç a. — A cama de casal é o melhor modo de fazer as pazes.

A cor subiu a seu rosto pá lido. Ela indagou rapidamente:

— Você sempre viveu nesta regiã o?

— Nã o, nasci e fui criado em Londres, como você.

— Por que foi que você se mudou para cã?

— Por vá rias razõ es. — A hesitaç ã o foi tã o rá pida que pareceu ser fruto de sua imaginaç ã o. — Durante uns dois anos eu tinha um só cio na cidade e entã o decidi me estabelecer por conta pró pria. Esta regiã o me pareceu muito boa. Mudei para cá há uns cinco anos. — Ele a encarou firme. — Isto mais ou menos completa o que você já sabia do meu passado, mas nã o tem muito a ver com o que você já sabia a meu respeito durante estes ú ltimos meses. Vamos ter de enfrentar a possibilidade de que talvez leve tempo até você recuperar a memó ria. Tempo e paciê ncia, e será preciso começ ar da estaca zero. Pelo menos desta vez vou saber melhor como lidar com você.

Jú lia sentiu a boca seca e se deu conta de uma veia que latejava na tê mpora.

— A coisa nã o é tã o simples assim, nã o acha? Você nã o pode esperar que sem mais essa nem aquela... eu volte ao ponto em que está vamos.

A expressã o dele estava cuidadosamente controlada. — E qual é a alternativa?

— Nã o sei. — Ela tentou dizer essas palavras com toda a calma. — Mas deve existir uma. Você seria capaz de viver com algué m que você nem sequer reconhece?

— Eu poderia tentar, na esperanç a de que o reconhecimento sobreviesse. — Ele respirou fundo. — Jú lia, você é minha mulher e está sob minha responsabilidade. Que espé cie de marido eu seria se concordasse com o que você está sugerindo?

Eu nem sequer tenho certeza do que estou sugerindo. Nã o tenho certeza de nada, exceto de que nã o posso aceitar as coisas desse jeito. Você está me pedindo que eu volte e seja novamente sua mulher, como antes. E como...

— Nã o, nã o estou. — Havia uma ponta de có lera em seu tom. — Eu quero que você volte, mas jamais pediria o que você nã o está preparada para dar. Eu fiz com que você me amasse uma vez, e posso fazê -lo novamente,

— Eu o amei? — ela perguntou involuntariamente, e notou que seus lá bios se contraí am.

— Se nã o me amou, você soube representar com muita convic­ç ã o, em vá rias ocasiõ es! Sei muito bem que nã o posso forç á -la a voltar para casa quando você for dispensada daqui, pelo menos legalmente, mas nã o tenho a menor intenç ã o de facilitar as coisas de modo que você se torne independente de mí m. Para você o fato de termos passado trê s meses juntos tem que significar algo. Nã o quer se lembrar?

— Sim, é claro que quero. — A despeito de todos os seus esforç os sua voz tremeu subitamente. — Eu daria tudo para conseguir me recordar de tudo o que você me disse, até mesmo um pequeno fato já bastaria, para começ ar. Só que nã o posso. Nada disso significa o que quer que seja para mim. Sinto muito se isso o magoa. Nã o posso evitar... Bem que gostaria de poder!

— Está certo. — O tom de sua voz era propositadamente tran­quilizador. — Nã o fique preocupada. Nã o quero que você se con­trarie. Podemos falar a respeito disso outro dia, se você quiser.

— Sim. — Ela apressou-se em concordar, recusando-se a admitir que o problema nã o desapareceria nem sequer diminuiria com o passar do tempo. — Sim, podemos fazer isso.

Os olhos dele ainda estavam fixos nos dela.

— Há algo mais que você gostaria de saber? Algo que eu tenha omitido?

Havia muito mais coisas que ela gostaria de saber, mas era duvidoso que ele conseguisse ajudá -la. Poucas pessoas se conhe­ciam o bastante ou eram suficientemente honestas a ponto de se­rem capazes de uma autê ntica auto-apreciaç ã o. Como ele dissera, a ú nica maneira de começ ar a voltar a conhecê -lo era voltar a viver com ele na casa que nem sequer imaginava como seria, e essa era uma decisã o que ainda nã o estava preparada para tomar. Tinha de pensar no assunto, refletindo a respeito do que significaria o fato de nã o recuperar a lembranç a daqueles meses. Seria capaz de aprender a amar aquele homem novamente, a viver com ele, como o tinha feito antes? Será que a estranheza de seu relacionamento nã o tornaria as coisas ainda mais difí ceis do que lhe pareciam naquele momento?

— Nã o. — respondeu finalmente. — Nã o há nada de que eu me lembre.

— Entã o acho melhor ir embora. Você parece cansada. — Pô s-se de pé. — Voltarei hoje à noite. Há alguma coisa que você gostaria que eu trouxesse?

Ela balanç ou a cabeç a, sem dizer nada. Podia sentir que ele a olhava e esperava, mas nada neste mundo teria conseguido con-vencê -la a levantar o rosto naquele momento.

— Tente descansar um pouco — disse ele, apó s um minuto bem pousado. — Soube que você nã o dormiu muito bem na noite passada.

Ele retirou-se, deixando um leve aroma de loç ã o de barbear e um sú bito e irracional sentimento de que ela estava privada de algo. Ele era o laç o que a unia à quelas semanas que haviam ficado para trá s. Seu ú nico laç o, Nã o importava o que ela pensava ou sentia a respeito dele como pessoa, era somente por meio dele que conseguiria repor as peç as que faltavam.

 

CAPÍ TULO II

 

A estrada principal atravessava verticalmente o centro da cidadezinha de Otterbridge. Depois, Ross virou à direita, acelerando o carro logo que deixaram o perí ­metro urbano, mantendo a velocidade a oitenta por hora durante alguns quiló metros de estrada, antes de diminuir a marcha ao che­gar ao lugar chamado Marlow.

Alguns minutos mais tarde percorriam a rua central, limpa e muito atraente, e ele disse com toda precisã o:

— Vivemos um pouco afastados da aldeia, mas temos outro car­ro, se você sentir a necessidade de vir até aqui. Neste lugar, dois automó veis sã o essenciais.

Jú lia disse:

— Nã o sei guiar — e sentiu que ele a olhava.

— Sabe sim. Eu a ensinei quando você pediu. Nã o é todo mundo que consegue tã o rapidamente, mas você tirou a carteira de moto­rista em sete semanas. Aposto que você vai descobrir que sua ha­bilidade nã o foi prejudicada.

Ela duvidava disso. O fato de contemplar suas mã os segurando O volante nã o lhe trazia o menor senso de familiaridade. Mordeu os lá bios. Nã o esperava que as coisas fossem fá ceis, mas eram ainda mais difí ceis do que ela tinha imaginado durante aquela ú ltima semana, tã o tensa. Havia tantos detalhes em jogo, tantas coisas a aprender. Se pelo menos ela conseguisse se convencer de que aque­la situaç ã o fantá stica nã o era um pesadelo, do qual ela talvez pu­desse despertar!

Tinham deixado a cidadezinha para trá s e seguiam por uma estrada estreita, ao longo da qual as á rvores se enfileiravam. Ross desviou o carro para algo que se assemelhava a um acostamento, desligou o motor e a contemplou durante um bom momento antes de dizer tensa mente:

— Você está com os nervos à flor da pele. Tem medo de que eu nã o mantenha minha palavra?

— Nã o — respondeu ela, com a voz embargada. — E que eu nã o consigo evitar. Por favor, tente compreender, tenha um pouco de calma.

— Estou tentando. Acredite em mim, estou tentando de verdade. Mas você també m tem de tentar. — Fez uma pausa, escolhendo cuidadosamente as palavras. — Você tem de confiar em mim, ou entã o nã o adianta. Será que nã o percebe isto?

— Eu sei. E confio. Mas acontece que você sabe como as coisas se passaram entre nó s, eu só posso imaginar. Esta... esta estra­nheza é algo que vou ter de superar no seu devido tempo, e você nã o me ajuda em nada se ficar cobrando isso de mim o tempo todo.

Havia tristeza em seu sorriso.

— Isso faz sentido. Muito bem, esqueç amos o que falei. — Enfiou a mã o no bolso e retirou a cigarreira. — Cigarro?

— Por favor. — Contente por ter algo em que se concentrar, inclinou a cabeç a em direç ã o à chama do isqueiro e em seguida recostou-se no banco, enquanto ele fazia o mesmo. A fumaç a a acalmava, e o ato de fumar era em si tranquilizante. Sentiu que relaxava um pouco e que as contraç õ es no estô mago começ avam a ceder. Ele estava fazendo tudo que podia para externar solidarie­dade e compreensã o; as coisas nã o lhe eram mais fá ceis do que para ela.

Jú lia moveu ligeiramente a cabeç a a fim de contemplar aquele perfil bem definido, enquanto ele olhava atravé s da janela. Viu a boca de traç os bem precisos e o queixo de linhas retas, com uma cova profunda bem no meio. Havia beijado aquela boca e fora bei­jada por ela, tinha estado entre aqueles braç os que agora segura­vam a direç ã o. Parecia quase impossí vel que uma mulher pudesse esquecer esse tipo de experiê ncia.

— Estamos longe? — ela perguntou, enquanto ele voltava a ca­beç a em sua direç ã o. — Estamos longe de casa?

— Nã o muito. — Ele fez uma pausa e pó s a mã o no bolso. — Antes de prosseguirmos, tenho uma coisa que preciso lhe devolver.

Jú lia contemplou a pequena caixa quadrada que ele colocou em suas mã os e sentiu que sua garganta se contraí a.

— Abra — disse ele.

Ela obedeceu passivamente, e nã o conseguiu tocar o brilhante que faiscava em seu leito de veludo negro. Nã o era dela. Pertencia a mais algué m. Algué m que o escolhera com um brilho nos olhos.

— É lindo — conseguiu dizer, e fechou a caixa com um gesto seco. — Desculpe-me, eu nã o posso. Você nã o se incomoda se eu o deixar aí por algum tempo?

— Sim — ele retrucou —, eu me incomodo. — Ele pegou a caixa, tirou o anel e colocou-o no dedo dela. Seu toque era firme e caloroso.

— Se vamos recordar tudo, entã o teremos que nos prender aos principais detalhes. Este foi o primeiro presente que eu lhe dei. Você sempre o usou. — Retirou a mã o e acrescentou ternamente:

— Eu a amo Jú lia. Nã o deixe nunca de pensar nisso. Agora, vamos para a nossa casa.

Uns dois quiló metros adiante tomaram uma pequena entrada que dava passagem para apenas um carro e ao longo da qual cor­riam duas valas profundas. Jú lia pensou na contingê ncia de guiar por aquela estrada no escuro, em um carro daquele tamanho, e decidiu que isso definitivamente estaria aqué m de suas forç as, mes­mo que ela pudesse conduzir tã o bem quanto Ross afirmava com toda confianç a.

Dobraram a estrada e de repente surgiu a casa, escondida por canteiros de rosas e azá leas. As clematites se aferravam à s paredes irrepreensivelmente brancas e algumas lucarnas espiavam por de­baixo do teto coberto de palha. Era um lugar de sonho, o tipo da casa que muitas pessoas desejariam possuir mas jamais poderiam encontrar, pois o preç o estaria fora de suas possibilidades. Jú lia duvidou de que a casa tivesse aquela aparê ncia quando Ross a descobriu. Os batentes das janelas pareciam novos. Automatica­mente pô s-se a calcular qual o valor das prestaç õ es mensais do seguro contra fogo que ele deveria ter feito por causa do teto de palha.

Ross deu a volta ao carro com a mala na mã o e abriu a porta para ela. Seu coraç ã o começ ou a pulsar forte, antecipando alguma coisa. Jú lia subiu a seu lado as escadas cobertas de lajotas, em direç ã o à só lida porta de carvalho, esperando enquanto abria a porta. O hall era acolhedor, e algumas traves atravessavam o teto baixo. De um arco à direita, Jú lia conseguia divisar parte de uma grande sala de estar, com uma grande lareira de pedra tomandotoda uma parede. Havia mais duas portas, ambas fechadas, e uma escada feita de barrotes só lidos, ligados na extremidade a uma fileira de balaú stres esguios e brancos, que ofereciam grande seguranç a.

— Foi idé ia sua? — Perguntou ela em meio ao silê ncio. — E muito imaginativo.

— Tudo isso foi idé ia minha — ele replicou, pousando a mala no chã o de tá buas enceradas. — Tive um ano inteiro para pensar nisso tudo enquanto a casa estava sendo reformada. Nã o é muito difí cil encontrar mã o-de-obra competente nesta regiã o, mas é quase impossí vel conseguir com que trabalhem em um ritmo diferente. — Sem mudar de expressã o, adiantou-se e abriu a porta do outro lado da sala. — Venha ver a cozinha. Espero que você ainda goste de cozinhar.

Jú lia o seguiu lentamente, contemplou os armá rios de pinho, o equipamento moderno e brilhante e tomou consciê ncia de que sua esperanç a se esvaí a rapidamente. Nã o adiantava. Era melhor acei­tar o fato. Nada do que ela tinha visto até entã o conseguira des­pertar algo alé m da admiraç ã o e prazer que se poderia esperar da visita a um lugar como aquele. Ela teria se sentido exatamente da mesma forma se tivesse ido à casa com a intenç ã o de comprá -la. Na realidade era exatamente assim que ela se sentia, só que dessa vez ela teria de levar em consideraç ã o algo mais do que uma sim­ples casa.

— Ainda gosto de cozinhar — disse subitamente, e deu-lhe as costas. — Posso ver meu quarto?

— Em um minuto. — Era difí cil dizer o que ele estava pensando ou sentindo. — Você nã o viu o jardim.

Nesse momento Jú lia queria apenas ficar sozinha durante al­gum tempo, mas ele já estava levantando a aldrava da porta. Com relutâ ncia, ela permaneceu a seu lado, contemplando a grande ex­tensã o do gramado verde-esmeralda que ondulava até um lago ro­deado de salgueiros.

Diante deles estendiam-se plantas em profusã o, e à direita co­meç ava o bosque pelo qual tinham passado ao percorrer a estrada. Pró ximo à s arvores encontrava-se um cã o com as orelhas empina­das, em expectativa. Ross assobiou suavemente, e o animal correu até ele, apoiou-se nas patas traseiras e enfiou o focinho nas mã os de seu dono, em uma saudaç ã o barulhenta e entusiasta.

Jú lia recuou um pouco no momento em que a cabeç a do animal, coberta de lindas manchas, voltou-se para ela. Os modos do cã o nã o tinham mudado, era ela que se sentia insegura. Ele a conhecia, e isso era mais do que evidente. Ele a conhecia o suficiente para ter perdido os modos ariscos, caracterí sticos de sua raç a, e contem­plá -la sem temor. Depois de um momento estendeu a mã o e deixou que o focinho ú mido a tocasse e cheirasse, antes de segurar a orelha do animal e coç á -la suavemente. Seu pê lo era espesso e quente, e os mú sculos rijos do pescoç o faziam pressã o contra ela.

— Basta, Shan — ordenou Ross, e o cã o pô s obedientemente as patas no chã o. Ficou olhando para eles, sacudindo a cauda felpuda, à espera do pró ximo gesto.

— Desapareceram as ú ltimas dú vidas? — perguntou Rosssuave­mente, e Jú lia desviou-se daquele olhar excessivamente perscrutador.

— Nã o tenho certeza do que quer dizer exatamente com isso.

— Tem sim, só que nã o quer admitir. No fundo você suspeita de que tudo o que eu lhe disse pode ser mentira, nã o é mesmo? Apesar de que nã o tenho certeza dos possí veis motivos que você me atribui para reclamá -la como minha esposa.

— Muito bem. — Ela o encarou com toda a honestidade. — Em um determinado momento isso passou por minha cabeç a. Nã o é tã o estranho assim.

— Nã o disse que era. Só queria deixar bem claro que você estava convencida disso. Você trabalhou nessa cozinha, Jú lia. Você gosta­va deste lugar. — Enfiou as mã os nos bolsos da calç a. — Foi você quem plantou as dá lias e as trepadeiras. Quer você se lembre, quer nã o, há uma parte de você aqui, e você terá de aceitar o fato.

— Já aceitei. — Ficou surpreendida com a calma com que falava, — Quem é que rejeitaria um cantinho em um lugar como este? É perfeito!

— O arquiteto nã o poderia receber elogio maior. — Fez um gesto brusco. — Você disse que queria ver seu quarto.

No andar de cima ele lhe mostrou o quarto, que dava para a frente da casa, era um aposento grande com duas janelas e deco­rado em tons repousantes de coral pá lido e marrom. Consciente de que, quase com certeza, aquele era o quarto que eles deveriam ter compartilhado, Jú lia procurou dizer algo que aliviasse a tensã o do momento, e nã o encontrou nada adequado.

— Desç a quando estiver pronta — disse Ross formalmente. —Eu lhe tarei um chá. A sra. Cooper deixou preparado o jantar nageladeira.

— A sra. Cooper?

— Nossa diarista. Eu lhe disse que uma salada e um prato de carne fria bastariam. Está bem?

— Sim, ó timo. — Jú lia hesitou por um instante. — O que mais

você lhe disse?

— Somente o necessá rio. Ela é uma boa mulher, e fará o que puder para levar as coisas adiante como de costume, mas você terá de enfrentar uma certa incompreensã o e talvez até mesmo o em­baraç o, se nã o conseguir reconhecê -la.

— Tem tanta certeza assim de que nã o conseguirei? — disse Jú lia prontamente.

Ele estremeceu.

— Sua intuiç ã o é tã o valiosa quanto a minha. De acordo com o dr. Stewart, nã o há regras precisas no que diz respeito à amné sia. Um pequeno detalhe pode ser suficiente para fazer com que todas as recordaç õ es voltem. Ou entã o seria necessá rio mais uma pan­cada na cabeç a.

— Poderia ser uma idé ia — ela murmurou, esboç ando um ligeiro

sorriso.

— Obrigado, uma vez basta.

Aliviada, fechou a porta assim que ele saiu e apoiou-se nela, com os olhos fechados. Teria de encontrar algum padrã o aceitá vel de comportamento, um biombo atrá s do qual pudesse se esconder até que tivesse se acostumado à quela situaç ã o totalmente impos­sí vel. E teria de começ ar agora, sem perda de tempo, ou entã o de nada adiantaria prosseguir.

Atravessou o quarto e abriu a porta do armá rio. Lá havia roupas que jamais tinha visto, ao lado de outras que lhe eram familiares. Seguindo um impulso, desceu o zí per do vestido de lã cor de â mbar que Ross levara ao hospital, tirou-o, pô s um vestido justo azul-es-curo que comprara havia um ano e imediatamente se sentiu me­lhor. Era novamente Jú lia Gardner, pelo menos naquele momento.

Havia uma foto dela e de Ross ampliada e emoldurada sobre a penteadeira, ambos usavam trajes de banho, nos fundos via-se um lago e por detrá s dele as montanhas. Ross estava com os braç os ao redor de seus ombros, e ambos riam. Ao contemplar o retrato, Jú lia teve mais uma vez consciê ncia daquela sensaç ã o incô moda de intrusã o, como se estivesse bisbilhotando a vida de algué m a quem nã o conhecia. Estremeceu e desviou o olhar. As coisas estavam piorando, era vez de se ajeitarem.

Ross estava trazendo uma bandeja da cozinha no momento em que ela desceu. Tinha tirado o paletó, posto um sué ter leve a fim de enfrentar o friozinho da tarde de outono e amarrado displicen­temente uma echarpe em volta do pescoç o. Descobriu també m, en­quanto ele a olhava, que estava precisando barbear-se novamente. Por mais estranho que parecesse, tudo aquilo lhe deu uma certa seguranç a. Se notou que ela mudara de vestido, nã o fez o menor comentá rio.

O fogo crepitava na lareira da sala de estar. Jú lia sentou-se em uma poltrona confortá vel, muito pró xima à mesinha onde Ross ti­nha depositado a bandeja. Aceitou a xí cara que ele lhe estendia e levou-a aos lá bios, feliz por ter o que fazer com as mã os, exatamente como acontecera no carro.

— O que farí amos sem as amenidades sociais? — comentou Ross secamente, decifrando sua expressã o sem esforç o. — Aceita mais aç ú car?

— Sim — disse Jú lia, esforç ando-se para encará -lo. — Imagino que você é muito bom em lembrar detalhes como este.

— No que diz respeito a você, sim. Sã o as coisas pequenas que fazem com que um casamento dê certo. — Sentou-se em frente a ela, em uma poltrona igual, tomou o chá rapidamente e colocou a xí cara sobre a mesa. — Sei exatamente como é que você gosta do café da manhã: ovos bem passados e pã o preto. Sei qual é sua aparê ncia quando surge com os cabelos todos desmanchados, os olhos sonolentos; como é que você... — Ele a contemplava com um ligeiro sorriso. — Devo prosseguir?

Ela sacudiu a cabeç a, sentindo o calor subir ao rosto.

— Você já conseguiu o que queria. Como é que você prefere o café?

— Bem forte. Gosto do bacon bem passado, ovos no ponto e torradas com pouca manteiga. Nã o gosto que me desarrumem o jornal e quero ter tempo de ler a seç ã o de esportes antes de ir trabalhar. Isso quer dizer que tomo o café da manhã à s oito em ponto, de segunda a sexta. —Arqueou a sobrancelha. —Acha que vai conseguir?

A despeito de si mesma, ela teve de sorrir.

— Eu já nã o consegui?

— Admiravelmente, urna vez que decidimos quem era o respon­sá vel por isto. Nã o que tivesse sido fá cil. Ambos fomos indepen­dentes por muito tempo. — Uma expressã o indecifrá vel estampou-se brevemente em seu rosto. — Mais chá?

— Eu me sirvo. — Inclinou-se em direç ã o à mesa. — E você?

— Para mim uma já chega.

— Você já notou como é que a chaleira fica por dentro?

— Como se fosse nicotina? — sugeriu ela enquanto ele tirava do bolso a cigarreira.

— Agora me diga que fumo demais e eu vou começ ar a sentir que você de fato voltou para casa!

Seu sorriso dissipou-se subitamente. Pousou a xí cara, levantou-se, atravessou a sala em direç ã o à janela e ali ficou, olhando para fora.

— Shan fica fora o tempo todo? — perguntou, apó s alguns mi­nutos.

— Ficava, até mesmo antes de você chegar. Ele tem um canil muito bem instalado e muito espaç oso. — Havia uma mudanç a aparente no tom com que falava. — Primeiro ele chegava perto da cozinha, em seguida conseguia entrar na casa quando caí a a noite e uma vez em que cheguei em casa inesperadamente encontrei-o na cama. Cada vez que eu chamava por você ele vinha correndo para mim.

Ela voltou a cabeç a.

— É sé rio?

— Nã o me dei ao trabalho de perguntar... Os cã es da Alsá cia andam sempre em matilha, é preciso sempre que haja um lí der. Se eu nã o o tivesse castigado daquela vez ele teria ficado insupor­tá vel. — Fez uma pausa. — Aqui acaba a liç ã o. Você nã o tem medo de ficar sozinha com ele, nã o é mesmo?

— Acho que nã o. Ele parece gostar de mim — respondeu Jú lia.

— Que animal sá bio! — Seu tom era descontraí do. — Vamos dar uma olhada no jardim enquanto o sol nã o se põ e. Você havia planejado fazer lá uma sé rie de obras antes que o frio chegasse.

Percorreram o jardim durante uma hora, andando um ao lado do outro, poré m mantendo certa distâ ncia, o fosso que os separava ainda nã o era transponí vel, Jú lia nã o ficou surpreendida ao cons­tatar que ainda tinha alguns conhecimentos de jardinagem. Seupai sempre se mostrara interessado no assunto e a contagiara com seu entusiasmo durante a adolescê ncia, em sua casa de Harrow. Ross confessou sua indiferenç a quase total em relaç ã o à quela forma de relaxar.

— Os jardins eram feitos para que as pessoas neles se sentassem e os olhassem — disse ele quase sorrindo quando chegou o momento de voltarem para casa.

Anoiteceu. Quando bateu sete horas, tomaram a refeiç ã o prepa­rada pela sra. Cooper, e em seguida Jú lia preparou café para am­bos. Ao trazer a bandeja da cozinha, deparou-se com as cortinas fechadas e Ross colocando mais um pouco de lenha na lareira.

— O serviç o de meteorologia prevê uma noite fria — comentou, sintonizando o rá dio em um programa musical enquanto ela depo­sitava a bandeja. — Está chegando um tanto cedo demais nesta regiã o. Habitualmente a gente pode confiar em que o tempo con­tinue suave até a primeira semana de novembro. Há alguns cober­tores a mais no armá rio de seu quarto, se você sentir necessidade deles durante a noite.

— Obrigada. — Jú lia serviu o café, pô s aç ú car em sua xí cara e perguntou. — Preto e doce?

— Duas colheres — ele respondeu sucintamente, afundando-se na poltrona que havia ocupado antes. — Você nã o esqueceu como fazer um café gostoso — observou ele satisfeito. — Você encontrou alguma dificuldade em localizar as coisas?

— Nã o — respondeu, tomando pela primeira vez consciê ncia do fato. Mexeu lentamente a colher, sentindo que ele a olhava e relu­tando em retribuir o olhar. Dos dois ele sem dú vida é quem estava mais à vontade. Ela gostaria de ter a mesma capacidade de dissi­mular. Seria um imenso alí vio esquecer os problemas que a ator­mentavam.

— A que horas a sra. Cooper costuma chegar? — perguntou, rompendo o silê ncio.

— As oito e meia — ele disse. — Costumo cruzar com ela na estrada — acrescentou sem mudar de tom. — Posso ficar sem tra­balhar mais um dia, se você quiser. Nã o há nada que esteja me apressando.

— Oh, nã o! — A recusa foi rí spida demais. Esforç ou-se para atenuá -la um pouco. — Mais cedo ou mais tarde vou ter de acabar ficando sozinha. Você fica na cidade para o almoç o?



  

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