Хелпикс

Главная

Контакты

Случайная статья





CAPÍTULO V



CAPÍTULO V

 

À tarde do dia seguinte, Miranda teve de admitir que não tinha feito nenhum progresso com Lucy. E tudo por culpa de Juan. Embora relutasse em aceitar a opinião de dona Isabella, não podia ignorar seu comportamento egoísta. Longe de encorajar Lucy a conversar com a tia, Juan a distraía o tempo todo, tratando Miranda como um juiz que tivesse vindo para decidir se devia ou não confiar a criança à adoção.

Miranda teve de levar em consideração que Lucy não fazia objeções à atitude de Juan. Pelo contrário, como todas as crianças, regalava-se com a atenção constante e com certeza logo estaria completamente mimada.

Mas o que podia fazer? Quando falava com Lucy, ela era hostil, como se a tia fosse uma intrusa, não querendo ouvir nada que pudesse acarretar uma mudança de situação. Num curto espaço de tempo, sua mente imatura adaptara-se às circunstâncias do lugar e Miranda suspeitava que quanto mais tempo ela permanecesse ali, maior seria p bloqueio mental. E se a amnésia fosse, de certa forma, proposital? Nunca recuperaria a memória, se não quisesse.

Miranda desejou saber mais a respeito dessa amnésia. Padre Esteban falou muito pouco sobre ela na carta. Contou que a criança tinha sido achada por um homem chamado Benito Sanchez durante uma expedição às montanhas. Sanchez encontrara a criança num platô sobre um estreito barranco, inconsciente e seriamente machucada. A explicação encontrada foi a de que um avião devia ter caído no barranco, e a criança, atirada longe. Fragmentos de avião espalhados no platô pareciam provar essa teoria. No entanto, embora tivessem feito uma expedição de busca, não encontraram outro vestígio de escombros. A teoria, de início, pareceu estranha. Mas havia muita neve nas montanhas e não era totalmente inconcebível que ela tivesse amortecido a queda de Lucy. Sanchez levara a criança à missão, no Mosteiro de São Miguel, onde padre Esteban tomara conta dela. E só depois que conseguiu falar é que descobriram que era inglesa, e que não lembrava quem era. As investigações levaram muitas semanas, até descobrirem que um avião tinha se espatifado nas montanhas e que havia uma família inglesa a bordo.

Diante do espelho da penteadeira, Miranda examinava sua aparência. O cabelo, que lavara antes de tomar banho, estava quase seco e caía em fios grossos sobre os ombros nus. Ainda estava enrolada na toalha de banho e sabia que daí a alguns minutos teria de abandonar o seguro isolamento do quarto e descer para jantar com a família. Não era uma perspectiva que lhe desse prazer.

Na noite anterior, tinha jantado no quarto. Mas esta noite Juan a convidara para jantar com eles e não tinha um bom pretexto para recusar.

Se Lucy ainda estivesse por perto, era capaz até de achar que Juan estava com segundas intenções. Mas a menina estava na missão. Apesar de ter ficado o dia todo na hacienda, Diaz, o chofer, a tinha levado de volta através do vale.

Rafael viria para o jantar e ela se lembrou disso, quando desejou ter uma boa desculpa para não aceitar o convite. Não que não gostasse dele; ao contrário. Ele a perturbava de uma maneira incompreensível, e Miranda sempre ficava confusa na presença de Rafael. Não o entendia, estava certa disso. Mas sentia que o comportamento dele era provocado por circunstâncias que ela desconhecia.

Mas agora era hora de vestir-se para o jantar. Miranda levantou-se, soltou a toalha, deixando-a cair sobre o tapete. Pegou roupa de baixo limpa de uma gaveta, depois pegou o único vestido longo que trouxera. Era um vestido simples, de seda preta, que comprara para uma viagem a Copenhague, com David, mas não chegara a usar.

Conseqüentemente, teve um instante de dúvida quando ele deslizou sobre seus ombros, caindo suavemente sobre os quadris. Depois acalmou-se. Parecia bastante adequado. As mulheres espanholas e portuguesas não gostavam do preto? Encolheu os ombros, acertando o decote. As mangas eram longas e medievais — franzidas no ombro, estreitas embaixo —, enquanto a saia era drapeada e insinuava a elegante curva das pernas.

Hesitou um pouco quanto, ao penteado. O cabelo lavado estava sedoso e grosso e ficava bem, espalhado sobre o tecido escuro do vestido. Decidiu deixá-lo solto.

Quando estava pronta para descer, percebeu que tremia um pouco. Sabia que era ridículo mas, de repente, sentiu-se terrivelmente só. Talvez fosse a noite, consolou-se, prendendo o relógio com pulseira de prata que ganhara de Susan e Bob ao completar vinte e um anos há dezoito meses. Assim mesmo, desejou ter alguém na hacienda em quem pudesse confiar.

A família estava reunida na sala principal, um cômodo imponente que ficava sobre o terraço. Era mobiliado com conjuntos de cadeiras e sofás estofados com-seda em tons de malva e verde, e mesinhas, algumas com vasos de porcelana fina e figurinhas de jade.

Hesitou ao alcançar a ampla porta, esperando que alguém a visse. 52

Dona Isabella estava lá, conversando com um homem de batina preta. Miranda imaginou por um instante que fosse padre Esteban. Mas, quando se virou para falar com Carla, viu que era muito mais jovem que o superior do mosteiro. Carla e Constância estavam iguais, de vestido longo branco estampado com flores, e Miranda temeu não identificá-las. Mas não precisava: o rosto de Carla era infinitamente mais áspero do que o da irmã. Juan, muito bem vestido, estava falando com Constância. E o terceiro homem, de costas para ela, era sem dúvida Rafael. Juan olhou para cima e a viu de pé à porta. Com uma rápida palavra para Constância, atravessou a sala e veio até onde Miranda estava.

— Señorita! — exclamou, os olhos brilhando de admiração. — Está... está linda!

Miranda forçou um sorriso.

— Não fique tão surpreso — brincou, enquanto ele pegava sua mão, levando-a quase até os lábios.

— Não! É isso mesmo. — Balançou a cabeça. — Quero cumprimentá-la, señorita.

Acabaram atraindo a atenção dos outros e, após um instante de hesitação, Dona Isabella apresentou seu acompanhante.

— Padre Domênico toma conta de nossa capela no vale — explicou, depois que eles apertaram as mãos. — Ele também mora no mosteiro com padre Esteban.

O sorriso de padre Domênico era caloroso.

— Então é a tia de nossa pequena niña, señorita? — perguntou ele. Que es impossible! É tão jovem!

Miranda aceitou os cumprimentos com um sorriso, sem esquecer que, silenciosamente e em segundo plano, estava quem ela mais desejava que a admirasse: Rafael, elegante e muito atraente vestido a rigor. Olhava seu próprio copo de uísque com tanta atenção que devia achá-lo fascinante, pensou Miranda. Seu comportamento a irritou. Sabia mais dela do que qualquer um dos outros. Por que não podia ser como Juan, como padre Domênico, até? Por que não podia cumprimentá-la amigavelmente como o resto da família? Bem, isso não era de todo verdade, admitiu ela com certa relutância, ao ver Carla de pé, perto da lareira.

Miranda recebeu um aperitivo e a conversa tornou-se geral. Em consideração a ela falaram em inglês e só às vezes Juan se expressava na própria língua, por um lapso. Jantaram à luz de velas e Miranda teria ficado encantada se os motivos para estar entre eles não a perturbassem tanto.

Para surpresa de Miranda, Rafael se sentou numa das extremidades da mesa, diante da mãe — e não Juan como seria de se esperar.

Miranda estava atônita. A posição de Rafael na casa a deixava intrigada. Antes, parecia simples: o filho mais velho herdara a propriedade, e o mais novo dedicava sua vida aos doentes. Mas, Rafael era o mais velho? Parecia mais jovem que Juan; talvez por ser mais gordo, mais moreno, Juan parecesse mais velho. E se era o filho mais novo, por que dirigia a hacienda?

O café foi servido na sala e Juan colocou alguns discos numa eletrola. Um suave som de guitarra encheu o aposento. Depois, dirigiu-se até Miranda, que admirava um crucifixo de prata, cravejado de pedras preciosas.

— É muito velho, señorita — murmurou ao seu ouvido e Miranda sobressaltou-se, apertando com força o cabo cheio de pedras.

— Estava contando a srta. Lord que esta peça deve ter sido trazida a Guadalima por nosso antepassado, Alberto Cueras, Juan — explicou Constância, pegando novamente o crucifixo e colocando-o no lugar com respeito.

— Nosso antepassado, si! — Juan sorriu. — E Constância também disse que tem mais de trezentos anos?

— Sim. É muito bonito. Todas as relíquias religiosas têm uma certa mística, não? Imagino que estejam imbuídas da divina revelação da fé.

— E acredita no misticismo, señorita? — perguntou padre Domênico, aparecendo subitamente a seu lado.

— Depende, señor — retrucou Miranda, cuidadosamente. — Acredito na presença divina. Se essa presença se manifestou na terra, ou não, é uma questão de crença individual.

Padre Domênico sorriu.

— Muy discreto, señorita, muito discreto. Não se compromete. Mas não pertence à Igreja, não é?

— A igreja católica, señor? Não. Mas tenho uma mentalidade aberta.

— E o que é isso? — Padre Domênico franziu a testa.

— Isso significa que o nome dado à fé é menos importante para mim do que a própria fé.

Padre Domênico estava impressionado.

— É uma teoria interessante, srta. Lord. Gostaria que discutíssemos isso em outra ocasião. Não imaginava encontrar uma compreensão tão madura em ombros tão jovens.

— A srta. Lord é uma jovem interessante, padre — observou Rafael, e seu tom de voz indicava ironia.

Miranda, que não viu Rafael atravessar a sala para reunir-se ao grupo, ficou tensa com sua proximidade. Mas padre Domênico virou-se para ele rapidamente e disse:

— Concorda, Rafael? É uma concepção interessante, não é? Algo que o Concilio Ecumênico está sempre buscando.

— E algo com o qual o senhor não pode concordar, padre — comentou Rafael, secamente. — Ou pode?

— Não é preciso pegar um peixe para se gostar de jogar a linha, Rafael.

— E é isso que está fazendo, padre? Jogando a linha?

O sorriso que padre Domênico lançou a Rafael era, ao mesmo tempo, afetuoso e desafiador.

— Conhece-me bem demais, Rafael — disse, sem rancor. — Mas percebo mais do que um simples interesse em seu tom, meu filho.

Rafael sacudiu a cabeça. As mãos estavam enfiadas nos bolsos da calça e ele mal desviava os olhos de suas botas de camurça preta.

Do outro lado da sala, dona Isabella estava sentada num sofá baixo, e servia o café num serviço de prata. Escolheu esse momento para chamar os filhos e padre Domênico para perto de si e, com relutância, Juan e o padre se desculparam e foram pegar suas xícaras. Constância já tinha se afastado para olhar os discos e, por um instante, Miranda e Rafael ficaram sozinhos.

Embora fosse uma situação que Miranda desejara acima de tudo, agora que acontecia sentia-se perdida. Incapaz de achar qualquer outra coisa para dizer, murmurou, estupidamente:

— Não seria melhor ir para perto de sua mãe?

Rafael olhou-a de lado, demorando o olhar sobre a pele suave de seu pescoço.

— Não sou uma criancinha, señorita. Sou capaz de tomar minhas próprias decisões.

— Oh, está bem. Sinto muito, só pensei em dar uma sugestão!

Rafael examinou-a com os olhos atentos e escuros e ela quase desejou que ele voltasse a observar as botas.

— Parece que tem o dom de atrair tanto meu irmão quanto padre Domênico, señorita. Isso devia compensar minha falta de... interesse.

Os olhos de Miranda refletiram a dor que ele deliberadamente lhe causou.

— Por que diz isso? — exclamou, indignada. Depois olhou para as próprias mãos. — Por que não vai para perto de sua mãe? Parece que não o atraio mesmo.

Houve um momento de silêncio. Depois, Rafael suspirou.

— Está bem, está bem. Sinto muito. — Fez uma pausa. — Diga-me, como vai indo com Lucy?

Miranda olhou-o através dos cílios.

— Não estou indo.

— Quê?

— Não estou fazendo progressos com ela. Acho que nunca vou fazer. Não aqui, pelo menos.

— Por quê?

— Seu irmão não facilita as coisas.

— Não. Ele não faria isso. — Rafael soltou o ar pelas narinas. — Falou com a criança?

— Sozinha? Não.

Rafael tirou uma das mãos do bolso e passou-a pelos cabelos. O gesto chamou a atenção de Miranda para os músculos dos ombros que apareciam sob o fino tecido do paletó. Perguntou-se o que ele faria se ela estendesse os dedos e tocasse a renda da camisa... sua pele sob a seda macia, bronzeada e coberta de finos pêlos pretos...

— ... longe da hacienda.

Miranda acordou de seu devaneio e viu que Rafael a olhava impaciente.

— Escutou o que eu disse? — perguntou rispidamente e, quando ela fez que não com a cabeça, soltou uma exclamação e continuou: — Estava dizendo que seria melhor conversar com Lucy sem a presença de meu irmão. Mas não aqui. Fora da hacienda.

— E como acha que vou conseguir isso? — perguntou secamente. — Seu irmão jamais me permitirá levá-la a qualquer lugar. Não sozinha, pelo menos.

— É, acho que ela não permitiria mesmo. A menos que... — Fez uma pausa. — A menos que eu as leve.

Sua oferta foi relutante. Pôde sentir isso e ela não queria dever favores a alguém que não apreciava sua companhia.

— Obrigada. Vou pensar em alguma outra coisa — recusou com voz polida, quase inaudível.

— Hei! O que há de errado agora?

— Bem! Não quer realmente me levar a lugar algum, quer?

Ele recolocou a mão no bolso.

— Podia levar...

— Ora, quanto trabalho! — Agora Miranda estava zangada. — Bem, posso me arranjar sem sua ajuda, obrigada!

— Rafael! — A voz educada de dona Isabella interrompeu a discussão. Nenhum dos dois tinha percebido sua aproximação e o olhar que ela lhes lançava era de curiosidade. — Rafael, o que está havendo?

— Perdão, madrecita. Estava me esperando, não?

— Perguntei o que está havendo, Rafael! — insistiu dona Isabella, olhando friamente para Miranda. — Vocês pareciam estar... brigando.

Rafael tirou as mãos dos bolsos e abotoou o paletó. Depois uniu as mãos nas costas.

— Está enganada, madrecita. A srta. Lord e eu não estávamos... brigando. Ao contrario, estávamos discutindo a possibilidade de irmos até o lago com sua sobrinha.

Miranda prendeu a respiração, mas dona Isabella não percebeu. Ela também estava muito surpresa.

— Você, Rafael?

— Si, madrecita. Tenho certeza de que Juan ficará contente por ficar livre de suas responsabilidades por uma manhã, no?

— Eu não acho... — começou a dizer Miranda indignada, quando ele a interrompeu.

— A srta. Lord acha que meu irmão não vai se opor, madrecita — insistiu. E, para não contradizê-lo, Miranda não teve outra saída senão se calar.

Além disso, bem lá no fundo, uma estranha excitação começava a quebrar sua resistência, deixando-a com as pernas moles. A perspectiva de uma manhã em algum lago com Rafael era tão agradável quanto conversar com Lucy sem a presença sufocante da família. Era estranho, pensou ela, como raramente considerava Rafael uma pessoa da família.

Juan, ao contrário, teve outra reação. Quando a mãe lhe contou a respeito do passeio, imediatamente sugeriu que fossem todos.

— Podíamos fazer um piquenique, no?

— Não — disse Rafael, com autoridade.

— Por quê? — Juan teimou. — É uma boa idéia!

— Não é verdade que a hacienda precisa de sua atenção, mi hermano? — inquiriu Rafael, com frieza. — Não condeno sua afeição pela criança, mas não está negligenciando os negócios da hacienda?

O rosto redondo de Juan ruborizou-se.

— Não está em posição para poder falar, Rafael! — declarou ressentido, o que não intimidou o outro.

— No obstante, Juan, a srta. Lord e eu levaremos a criança sozinhos. De acordo?

— Quando?

— Ainda não sei ao certo. — Rafael encolheu os ombros. — Não amanhã, por lo menos. Talvez depois de amanhã, si?

Miranda escondeu o desapontamento. Devia saber que Rafael não estaria livre no dia seguinte. E um dia passaria depressa.

O grupo se separou depois disso e Miranda não teve outra oportunidade para falar com Rafael antes que ele e padre Domênico partissem. Dona Isabella e Constância foram se despedir deles, enquanto Juan se servia de uma dose grande de conhaque de uma garrafa de cristal sobre a mesa de canto. Estava claramente derrotado e ela torceu para que ele não fizesse nada para tornar as coisas mais difíceis.

Não sabia se subia ou não, quando Carla se aproximou. Miranda não queria falar com ela, mas como Juan estava lá, embora não pudesse ouvi-las, não pôde afastar-se e ignorá-la.

— Bem, señorita — comentou Carla, num tom zombeteiro. — Então decidiu mudar de tática, no?

Miranda olhou para o outro lado.

— Preferia não discutir a esse respeito, señorita, se não se importa.

— Oh, mas eu insisto. — Carla soltou uma risada breve. — Acho tudo isso muito divertido. Mas está perdendo seu tempo com Rafael. Não pode ajudá-la.

— Acho que vou para a cama, señorita. — Miranda ia se afastar, mas a mão de Carla em seu ombro a deteve.

— Momento, señorita. Uma palavra de aviso, se quiser. Concentre-se em Juan para seus fúteis desejos, mas deixe Rafael em paz. Ele não se sente atraído por seus encantos tão óbvios! — Um sorriso malicioso curvou seus lábios. — Não se sente atraído por mulher alguma, señorita!

 



  

© helpiks.su При использовании или копировании материалов прямая ссылка на сайт обязательна.