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CAPÍTULO II



CAPÍTULO II

 

O aeroporto internacional da Cidade do México era uma massa fervilhante de pessoas no calor do fim da tarde. O avião que trazia essa mulher, que podia ser ou não a tia da criança, tinha tido um problema no motor e ficou retido em Kingston durante vinte e quatro horas; por isso, Rafael precisou reservar um quarto no hotel. do aeroporto e passar um dia inteiro sem fazer nada. Finalmente a chegada do avião tinha sido anunciada e ele se encaminhou, não sem relutância, à recepção. As mãos estavam enfiadas nos bolsos da calça justa de veludo e, como não estava usando jaqueta, a camisa fina. creme, grudava-se à pele. Mal percebia que diversos olhares femininos voltavam-se com curiosidade em sua direção.

O avião já tinha aterrissado quando chegou à recepção e, graças ao atraso, os passageiros foram despachados rapidamente.

Rafael ficou num canto, os pés levemente afastados, observando as mulheres que passavam, com a mesma agudeza. Quase todas eram de meia-idade e ele sentia os músculos do estômago sé retesarem só de imaginar que deveria aproximar-se de uma delas com as propostas do irmão.

Uma mulher numa cadeira de rodas passou empurrada por uma moça alta que olhava em volta com curiosidade. Rafael franziu a testa. Poderia ser a srta. Lord? A mulher na cadeira de rodas, que parecia pálida e abatida?

Mas não! Reprimiu a impaciência crescente ao ver que um homem e uma mulher se aproximavam e curvavam-se para abraçar a mulher inválida. Depois falaram com a moça e ela sorriu, dizendo algo que pareceu estar dispensando a gratidão deles.

Rafael desviou o olhar. Onde estava a mulher?, perguntou-se sentindo que suas reservas de tolerância se esgotavam. Certamente, imaginava que mandariam alguém para esperá-la! Ou deixaria o aeroporto para procurar acomodação num hotel?

— Desculpe-me, señor!

A voz feminina a seu lado o fez voltar de sua abstração e suas sobrancelhas uniram-se num gesto interrogativo enquanto se virava para olhar a moça que falava. Era a mesma que estava empurrando a cadeira de rodas e ele ficou um pouco mais aliviado. A mulher na cadeira de rodas poderia ser a srta. Lord, afinal?

— Sí? — Foi rude, mas não pôde evitar.

A moça sorriu, aparentemente sem dar atenção a sua atitude pouco gentil. Rafael teve de admitir que era uma jovem inusitadamente atraente. Alta, mais ou menos um metro e setenta, e não era magra como as moças de sua altura. Era magra, mas não excessivamente; os seios firmes estavam modelados pela fina camisa de algodão. Uma massa de cabelos finos vermelho-dourados caía como uma espessa cortina pelos ombros; tinha as feições perfeitas, os olhos de uma surpreendente cor esverdeada, cercados por cílios escuros, a boca carnuda e expressiva. Vestia-se como as jovens de hoje — jeans azul, justos nos quadris e nos tornozelos, e sandálias altas. Uma mala de lona pendia de seu ombro chamando a atenção para a gola aberta da blusa onde se podia ver claramente a suave linha do pescoço.

Sem dúvida, decidiu ele, não ignorava a admiração que causava no sexo oposto. Via-se isso nos olhos levemente oblíquos, na segurança que demonstrava — e Rafael escondeu-se sob uma fachada de frieza que era totalmente estranha nele.

— Desculpe — disse novamente, e sua voz era quente, rouca e indiscutivelmente inglesa —, mas o senhor não é, por acaso, o señor Cueras?

 Rafael enrijeceu-se.

— Sou Rafael Cueras — respondeu, polidamente.

— Oh, Rafael? — A moça pareceu desapontada. — Sinto muito, estava procurando o señor Juan Cueras.

Rafael ergueu-se em toda sua altura e olhou-a de cima para baixo.

— Juan Cueras é meu irmão, señorita. Está falando comigo em nome da srta. Lord?

— Em nome de... — ela interrompeu-se. — Oh, não, señor. Não falo em nome de ninguém. Eu sou Miranda Lord!

Dizer que Rafael ficou surpreso seria uma obra-prima de falta de exatidão. Ficou perplexo, atônito! Olhou para a moça como se ela o tivesse ameaçado de morte. Não podia acreditar, não podia! Esta mulher — esta jovem — era a tão esperada tia da Inglaterra! Não era possível! Em seu país as tias eram mulheres de meia-idade ou velhas vestidas de preto. Nunca um pouco mais do que crianças.

Miranda Lord estava sorrindo de sua surpresa.

— Algo errado? — perguntou, num tom divertido. — Não sou como esperava?

O fato dela acertar exatamente o que estava errado, irritou-o. Não gostava do modo como o olhava, do ar zombeteiro com que encarava sua confusão.

— Eu... não, señorita! — respondeu, rapidamente. — Talvez seja... mais jovem, só isso.

— Bem, minha irmã era doze anos mais velha — respondeu, enquanto um amontoado de lembranças tristes toldava seu olhar por um instante. Depois sacudiu a cabeça com impaciência. — Sinto desapontá-lo.

O ar despreocupado tinha voltado e Rafael deu uma rápida olhada à volta deles. Não podiam continuar ali de pé, pois a qualquer momento outro avião chegaria e outros passageiros iam lotar a sala. Mas relutava em responsabilizar-se por ela. E isso precisava ser feito.

— Queira vir comigo, señorita — convidou-a, sentindo que seu inglês piorava enquanto uma irritação irracional tomava conta dele. — Tem bagagem?

— Só uma mala. Está lá. Vou buscá-la.

— Eu vou buscá-la, señorita.

Rafael afastou-se rapidamente e apanhou a pequena mala preta, notando as extremidades gastas com um gesto dos lábios. Era óbvio que a situação era como Juan sugerira. Esta moça não tinha dinheiro e, certamente, não era a pessoa que ele teria escolhido para tomar conta de uma criança de oito anos. Pela primeira vez, experimentou um pouco de simpatia pela causa do irmão. Talvez Juan tivesse razão, apesar de tudo.

Voltou para perto da moça e ela disse:

— Não precisa continuar a chamar-me de señorita. Meu nome é Miranda. Estou, acostumada a ser chamada assim.

Rafael não respondeu, simplesmente indicou com a mão que devia acompanhá-lo até lá fora, onde sentiram o calor atenuado do fim da tarde.

— Suponho que está me esperando desde ontem, não? — perguntou Miranda, enquanto caminhavam até o lugar onde Rafael deixara o carro. — Sinto muito. Foi um defeito no avião. Realmente, uma tortura.

Ela não parecia nem um pouco cansada dessa espera, pensou Rafael com um cinismo não habitual e logo desprezou-se por isso.

— Como essas flores são bonitas! — dizia ela agora, estendendo as mãos e sacudindo os ombros. — Mal posso acreditar, sabe? Que estou aqui, no México. Viajo muito pouco.

— Pensei que as razões desta viagem fossem pouco estimulantes, señorita.

Ela o olhou de lado e seus olhos o encararam friamente. Mesmo sendo alto, ela não precisava olhar para cima para olhá-lo de frente, o que era desconcertante para Rafael. A maioria das pessoas com quem se relacionava eram muito mais baixas do que ele.

Ela disse, vagarosamente:

— Minha irmã e o marido morreram há mais de quatro meses. Tenho de acostumar-me à idéia de que nunca mais os verei.

Rafael sentiu a reprovação em sua voz e não deu importância a isso. Tinha certeza de que estava causando má impressão; não disse nada e ela afastou o olhar novamente, comentando algo a respeito dos canteiros de flores diante das dependências do aeroporto.

O Mustang cinza metálico brilhava na área de manobra do estacionamento. Miranda admirou em silêncio suas linhas elegantes, depois perguntou:

— Seu?

— Do meu irmão, señorita. — Escancarou a porta do passageiro. — Quer entrar, por favor?

Encolhendo os ombros, ela se sentou enquanto Rafael colocava a mala no porta-malas antes de entrar também. Fazia algum tempo que ele não andava de carro com uma mulher que não fosse da família e podia sentir o aroma delicado de algum perfume que ela usava e o calor de sua pele próximo a seu corpo.

Saíram do estacionamento e Rafael sentiu-se aliviado por ter de concentrar a atenção no trânsito. Percebeu que ela olhava tudo com interesse e, esforçando-se para comportar-se naturalmente, mostrou-lhe os dois picos das montanhas que se tornaram famosos em todo o mundo desde o tempo em que o conquistador espanhol Cortes vira a cidade asteca do planalto que ficava entre as duas. Mas não entrou na Cidade do México, indo direto para Puebla. Se ela ficasse desapontada por não poder passar algum tempo na capital, não interessava. Se desejasse fazer turismo depois de encerrar o negócio que a trouxera ao México, era problema dela.

— A que distância fica Guadalima? — perguntou Miranda subitamente, enquanto as nuvens começavam a escurecer os raios do sol poente.

— Ainda estamos longe, señorita. — Rafael fez uma pausa. — Não pensei nisso no aeroporto, mas será que está com fome?

— Não especialmente. Fizemos uma refeição no avião. — Olhou para as unhas. — Diga-me: entendi que seu irmão devia encontrar-se comigo. Ele... ele está doente, ou algo assim?

— Não. Não está doente, señorita.

— No entanto houve algum motivo, não? — insistiu ela, desafiando-o com o olhar. — Afinal, você não queria vir, não é?

Rafael ficou perplexo.

— Por que diz isso?

— É óbvio. — Afundou-se no banco, levantando o pé e passando os braços pelo joelho. — Tenho a sensação de ser mais do que um estorvo para você.

— Sinto muito — disse, arrependido.

— Não, não sente. Só estou tentando imaginar por que precisou vir a meu encontro se não tinha vontade.

Rafael suspirou e uma parte da tensão dissipou-se.

— Deve me perdoar, señorita. Estou um pouco cansado.

— Fale-me sobre Lucy.

— Então tem certeza de que é Lucy?

— Bem, vi uma fotografia dela, mandada por um padre, padre... Esteban? — Ele concordou e a moça prosseguiu: — Não é a melhor fotografia que já vi, mas certamente se parece com ela. Além disso, acho que não há tantas crianças vagando pelo México que correspondam a sua descrição.

— Não. — Rafael teve de admitir.

— Entendi que seu... irmão... tem sido muito bom com ela.

Esta era a oportunidade, mas Rafael não a aproveitou imediatamente. Tinha a sensação de que essa moça estava fora de qualquer possibilidade que Juan tivesse levantado. Não tinha certeza se ela estaria preparada para abandonar a sobrinha, por mais tentadora que fosse a oferta. Disse:

— Meu irmão está muito apegado a... à criança.

— É. Foi o que o padre disse. Devo agradecer a ele por se interessar tanto por ela. Seu irmão não tem filhos?

— Meu irmão não é casado, señorita — retrucou Rafael secamente mas ela se limitou a sorrir.

— Sei. — Seus olhos dançavam. — Claro que não poderia ter filhos, não é?

Rafael sentiu que ela estava rindo dele novamente. Seus lábios se contraíram. — Para dizer a verdade, Juan está... noivo, señorita.

— Oh! — Mordeu o lábio inferior com os dentes. — E o señor? É casado? Tem filhos?

— Não! — Rafael sacudiu a cabeça.

— Oh, parece muito decidido a esse respeito. — Encolheu os ombros. — Nem eu. Mas sempre pensei que as pessoas se casassem cedo nos países latinos.

— Nem todos desejam se casar, señorita — foi obrigado a responder.

— Não, eu sei disso. Está saindo da moda, não é?

— Não foi o que eu quis dizer, señorita.

— Não foi? — Seus olhos pousaram por um instante na gola aberta da camisa, depois na pele do peito coberta de pêlos, antes de descerem até os antebraços e às mangas arregaçadas. Contemplou o simples relógio de ouro, depois baixou o olhar para as próprias mãos.

Mulher alguma de sua raça jamais o olhara da maneira como ela o olhou e isso o aborreceu. Não tinha respeito, essa moça inglesa? Será que lá as mulheres se consideravam iguais aos homens em todos os sentidos da palavra? Tinha ouvido dizer, mas achou difícil acreditar.

Com um suspiro profundo disse:

— Tem intenções de casar-se no futuro, señorita?

Ela arregalou os olhos e virou-se para olhá-lo.

— Não, num futuro próximo, não. Por quê?

Rafael moveu-se desajeitadamente. Tais perguntas pessoais lhe eram estranhas.

— Só para saber, señorita. — Começava a ficar escuro e ele estava impaciente para chegar ao aeroporto de Puebla. Se... se a criança for sua sobrinha, quais são suas intenções?

— Minhas intenções, señor? — Ela encolheu os ombros. — Não sei o que quer dizer.

— Me expressei mal. — Rafael brecou e mudou a marcha, pois um carrinho de mão aparecera à frente deles inesperadamente. — O que quero dizer é... vai levá-la de volta para a Inglaterra?

— Claro. — Ela pareceu surpresa. — Para onde mais eu a levaria? Sou seu único parente, agora. Susan, isto é, minha irmã e eu não temos pais. Morreram há mais de oito anos. Quando Bob, o marido dela, arranjou um emprego no Brasil, eu ainda estava no colégio. Não os via há mais de um ano quando... quando recebi a notícia de que haviam morrido.

— Ah! — Rafael fez uma pausa. — Então talvez ache difícil ter de lidar com uma criança.

Miranda voltou-se para olhá-lo.

— Realmente está preocupado, señor?

Rafael enrijeceu-se. Que pergunta! Fez um gesto de indiferença com os ombros.

— Naturalmente, é dever de todos se importar, señorita. A criança é pequena, impressionável. Precisa de mão firme e de um ambiente seguro. Precisa de boa comida e roupas, de alguém a quem possa recorrer quando tiver problemas, alguém que esteja sempre à espera, pronto a oferecer-lhe ajuda e conselhos.

Miranda acompanhava o desenho do couro atrás de seu assento com um, dedo descuidado.

— E acha que não posso dar a ela essas coisas? É onde quer chegar?

— Não disse isso, señorita. Você é jovem, tem sua própria vida. Que lugar haveria nela para uma órfã de oito anos?

— Começo a achar que está tentando me dizer alguma coisa, señor — retrucou, friamente.

Rafael suspirou, desejando pela enésima vez não ter concordado em participar dessa situação impossível.

— Apenas que meu irmão está preocupado com o bem-estar da criança, señorita — afirmou, inexpressivamente. — É natural que seja assim. Nestas últimas semanas ela tem sido o centro das atenções.

— Mas ela não se lembra quem é, não? — retrucou Miranda. — Como acha que se sentirá ao descobrir que os... os pais morreram?

— Naturalmente, isso é impossível de responder.

— Claro. — Ela levantou os ombros. — Mas não acha que para uma criança da idade de Lucy é mais importante ter alguém que ela conheça, alguém que ela conheça realmente, para tomar conta dela do que qualquer outra coisa?

— Talvez, señorita.

— Mas não está muito certo, não? — Ela sacudiu a cabeça com impaciência, — Estou começando a adivinhar por que seu irmão não veio ao meu encontro pessoalmente. Queria que o senhor intercedesse por ele, não? Que fosse seu advogado! Mas por quê? O que significa Lucy para ele?

Rafael viu com alívio as luzes de Puebla aparecerem à sua frente.

— Terminaremos nossa viagem de helicóptero, señorita — declarou, secamente. — Então encontrará meu irmão e julgará pessoalmente seus motivos.

No aeroporto, as formalidades foram logo cumpridas e eles se dirigiram ao canto mais silencioso da pista, onde um helicóptero prateado e azul brilhava sob as luzes fracas. Miranda não disse nada depois que saíram do carro, e se estava surpresa por ter de completar a viagem de helicóptero, não revelou. Rafael começava a ficar perturbado e, após ajeitá-la no banco a seu lado, apertou seu próprio cinto com dedos impacientes. Nunca deveria ter aceitado essa missão. Por sua própria culpa, indispusera a jovem contra o irmão.

Já no ar, sentiu-se mais relaxado. Voar, no helicóptero ou no mono-plano que também pertencia à propriedade, sempre o acalmava. Seu pai fora um hábil piloto e algumas das primeiras recordações de Rafael eram os vôos acrobáticos que ele realizava, calculados para abalar os nervos mais duros. Rafael amara isso e, ao completar catorze anos, sabia pilotar um avião tão bem quanto o pai. Naturalmente a mãe não sabia, não naquela época. Mas assim que teve idade suficiente para tirar o breve, voar tornou-se um de seus grandes prazeres. Um prazer do qual também se privara.

Agora, enquanto dirigia o helicóptero em direção ao vale do Lima, podia se permitir ser agradável com a moça, pois em pouco mais de uma hora ela não mais seria sua responsabilidade. Conhecia o terreno como a palma da mão e conseguia guiar o helicóptero até de olhos vendados. Olhou de relance para sua passageira e viu as feições tensas à luz difusa do painel de controle. Sentiu remorso. Fora frio e obstinado, completamente diferente do normal. Ela não tinha culpa dele ter recuado instintivamente diante da familiaridade demonstrada pela moça. O que estaria pensando a seu respeito?

Balançou a cabeça. Juan também ficaria surpreso. Afinal, ele também estava esperando uma mulher de meia-idade. O que diria ao confrontar-se com esse emancipado espécime feminino seria interessante de se ouvir. No entanto, algo precisava ser dito agora e Rafael procurou palavras adequadas.

— Ninguém tem intenção de tentar... tirar sua sobrinha, se é que a criança é realmente sua sobrinha, señorita — disse, finalmente.

Ela o olhou de lado.

— Ninguém poderia.

Sua segurança era irritante. Obviamente não tinha idéia do poder da família Cueras, se pensava que suas palavras tinham muito peso aqui.

— Eu... não tomaria essa atitude, señorita — retrucou, calmamente. — Não está na Inglaterra, agora.

— Está me ameaçando, señor? — perguntou incrédula e os nós dos dedos ficaram brancos sob a pele das mãos.

— Não, señorita, não a estou ameaçando. Estou simplesmente lhe dando um bom conselho.

— E o que faz, señor? Trabalha para seu irmão nessa propriedade que padre, Esteban mencionou nas cartas? Está trabalhando para ele agora?

Rafael não se lembrava de ter ficado tão zangado há muito tempo.

— Não — respondeu, com os dentes cerrados. — Não "trabalho" para meu irmão, señorita. Nada tenho a ver com a propriedade.

— Ah!

No entanto, estava intrigada. Ele podia sentir isso. Mas não tinha intenção alguma de esclarecer nada. Logo ela ficaria sabendo, sem dúvida. Mas não por seu intermédio. Não conseguia entender sua antipatia pela moça, porém não queria mais nada com ela.

Depois disso, fez-se silêncio entre eles. Sobrevoaram as cordilheiras, descendo no vale onde as luzes começavam a aparecer. Uma lua fugidia saiu de trás das nuvens o suficiente para iluminar os muros cinzentos da Hacienda Cueras; o helicóptero baixou mais em direção ao vale onde um estreito pedaço de terra flanqueado por construções de tijolo fornecia uma área de aterrissagem suficiente. Enquanto aterrissavam, Miranda olhou com curiosidade à sua volta, notando provavelmente a falta de construções formais.

— É isto?

— É isto, señorita — concordou friamente, abrindo a porta enquanto as turbinas paravam. — Só uma curta viagem de carro e estará na Hacienda Cueras.

— Oh, mas... Miranda interrompeu-se. — Pensei que Lucy estivesse na missão, com o padre Esteban.

— Está, señorita. Mas a missão é pequena, as acomodações lá são limitadas. Meu irmão insiste para que aceite sua hospitalidade. Além disso, não seria aconselhável perturbar a criança a esta hora da noite.

Pensou que fosse recusar. Mas, embora a boca expressiva se enrijecesse um pouco, jogou os cabelos para trás com gesto descuidado e inclinou-se para soltar o cinto de segurança. Ofereceu-lhe a mão para sair; após um instante de hesitação, Rafael pegou-a, colocando seus dedos frios e finos nos dela. Era a primeira vez que a tocava e podia dizer, pelo jeito de seus olhos o fitarem, que ela não lhe era indiferente. Porém ele retirou a mão logo que pôde e virou-se com alívio para falar com Gerardo Sanchez, o mecânico, que morava numa das construções de tijolo. Falaram rapidamente em patcix — uma mistura de mexicano e nahuatlan nativo —, excluindo Miranda. Mesmo assim, Rafael sentia sua presença atrás dele, magra e elegante apesar do traje informal, olhando ao redor com olhos interessados.

Estava quase frio e após um instante ele despediu Gerardo e voltou-se para a jovem.

— Venha — disse ele. — O carro está esperando, assim como meu irmão. Gerardo me disse que não recebeu minha mensagem ontem à noite, informando que seu avião estava atrasado.

Encaminhou-se pela trilha e ela o acompanhou.

— O que quer dizer? — perguntou, surpresa. — Não telefonou?

— Não há telefones nos altos vales dos Chiapas, señorita. — Encolheu os ombros. — Sem dúvida, meu irmão e minha mãe devem estar convencidos de que joguei o Mustang fora da estrada ou espatifei o helicóptero!

Miranda mordeu o lábio, olhando-o com ansiedade, e à fraca luz da lua viu que sua boca demonstrava divertimento. Subitamente sorriu e escapou-lhe uma sonora risada.

— Não é engraçado — censurou ele, estreitando os lábios; no entanto, o sorriso era contagiante, e apesar de tudo ele também sorriu.

— Parece tão melhor quando sorri — exclamou ela impulsivamente, e ele ficou satisfeito por terem alcançado o carro e não precisar responder.

Gerardo colocou a bagagem na parte de trás e ergueu a mão num gesto de adeus. Depois, partiram através do gramado que levava à trilha. O cheiro dos pinheiros e arbustos perfumava o ar, misturando-se aos cheiros comuns de terra e gente. Rafael guiava com perícia, acelerando ao deixar o campo de pouso e começar a subir as colinas.

A Hacienda Cueras parecia especialmente bonita à luz irradiada por suas numerosas janelas e Miranda soltou exclamações ao ver o telhado de mosaicos da fonte de pedra do átrio; Rafael já se acostumara a vê-lo e simplesmente achava que o som das águas era refrescante nas tardes quentes.

Mal estacionou o veículo diante dos degraus que levavam ao pórtico sombreado, a porta reticulada abriu-se e a silhueta da mãe foi desenhada à luz que vinha de dentro da casa. Estendeu as mãos para recebê-lo, descendo apressadamente a escada em sua direção enquanto ele saía do carro.

— Rafael! Oh, Rafael! — exclamou, com voz fraca. — Dios gracias, estas aqui! De donde...

— No ahora, madrecita — disse Rafael, acalmando-a. — Estoy seguro. — Tirou as mãos dela de seu pescoço, olhando de relance para Miranda Lord, que estava saindo do carro. — Esta é a srta. Lord, madrecita. Srta. Miranda Lord.

Dona Isabella arregalou os olhos, surpresa ao se deparar com a moça vestida de modo tão informal.

— É... é a tia da criança... da Inglaterra? — perguntou na própria língua.

Rafael escondeu seu divertimento ante o espanto da mãe. Se ele ficara surpreso, ela estava atônita.

— Isso mesmo — ele concordou. — Senhorita Lord, esta é minha mãe, dona Isabella Cueras.

Miranda estendeu a mão e dona Isabella apertou-a polidamente, mas sua expressão estava longe de ser acolhedora. No entanto, a gentileza era um instinto inato, e forçou-se a dizer:

— Espero que tenha feito boa viagem, señorita.

— Razoável. O avião atrasou vinte e quatro horas em Kingston por causa de um problema no motor. Sinto muito tê-la deixado preocupada, mas seu filho mandou uma mensagem.

Os olhos escuros de dona Isabella voltaram-se para o filho.

— Mandou uma mensagem, Rafael?

— Claro. Gerardo disse que não a receberam.

Dona Isabella soltou uma exclamação de impaciência.

— Não, não recebemos. Ficamos muito preocupados com você, Rafael... e com a senhorita também, é claro. — As últimas palavras foram uma explicação posterior.

Rafael inclinou-se no fundo do carro e tirou as coisas de Miranda.

— Bem, agora está acabado. Chegamos em segurança. Bem, vai me desculpar, mas tenho assuntos que requerem minha atenção imediata.

Miranda fitou-o com ar decepcionado.

— Vai... embora?

Rafael inclinou-se ligeiramente.

— Preciso ir. Como lhe disse, señorita, não moro na hacienda. Minha mãe tomará conta de você e logo meu irmão aparecerá.

Ela fez um gesto de desconforto.

— Mas...

Rafael desviou os olhos do apelo que havia nos dela e, ignorando o tom de reprovação da mãe que o chamava, entrou no carro.

— Adios, amigos. Nos hablaremos pronto. Adios!

 



  

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