Хелпикс

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—Eu já lhe disse. Sim! 10 страница



— Tire as mã os de mim — disse Ross, sem alterar a voz —, se nã o quiser se complicar. — Nem sequer se importou de virar a cabeç a, enquanto Lester se apressava em tirar a mã o. Jú lia.

Ela se desencostou da parede, cô nscia dos olhares interrogativos lanç ados em sua direç ã o, deu um sorriso neutro para Lester e foi à frente de Ross, em direç ã o ao hall, onde Peggy e Mike falavam com um grupo de pessoas.

Havia muita neblina quando saí ram. A capota do carro estava toda molhada. Atravessaram a cidade em silê ncio ejá estavam quase na estrada quando Ross disse friamente:

— Volte a fazer isso e você se arrependerá.

— O quê? — perguntou ela. — Conversar com um outro homem?

Ele estava tenso.

— Nã o banque a esperta. Você encorajou um homem de quem nem sequer gosta só para me provocar. Chama isso de comporta­mento adulto?

— Nã o — ela disse com voz neutra —, nã o dou nenhum nome a isso. Nó s apenas conversamos e foi tudo.

— Sim, em um canto, durante trê s horas. Discutindo o quê? Negó cios? — Furioso, pó s o carro em terceira. — Garanto que você nã o o informou de sua dor de cabeç a. Nã o, esse tipo de conversa é reservado para os maridos! Bem, se você está querendo se exibir novamente, hoje à noite, desista. Nã o tenho a menor vontade de me mostrar gentil!

Jú lia ficou sem se mover. Sentiu uma agulhada nos olhos, teve a sensaç ã o de que as coisas se amontoavam sobre ela e a sufoca­vam. Aqueles trê s ú ltimos meses tinham sido uma pilhé ria. Ross nã o a amava. Nã o do modo como ela queria ser amada, nã o como ela pensava que fosse amada, nã o como ela o amava. Uma farsa, e ainda assim ela tinha sido feliz em sua ignorâ ncia.

O carro ia mais lento a fim de desviar-se para Marlow, Estava muito abafado. Ela estendeu a mã o cegamente a fim de abrir a janela, sentiu que a porta se abria e gritou o nome de Ross. A ú ltima coisa de que se lembrou foi da mã o dele se estendendo a fim de ampará -la, e o ranger do breque...

 

— Desculpe-me, senhorita, mas vamos fechar dentro de cinco minutos — disse a voz, e Jú lia piscou, vendo a figura uniformizada parada diante dela.

— Como?

— Estamos fechando, senhorita, dentro de alguns minutos. Sin­to muito, terá de ir embora. — Ele se desmanchava em desculpas. — É o horá rio de inverno.

A tarde caí a rapidamente, nas ruas as lâ mpadas já estavam acesas. Jú lia se deu conta de que devia estar sentada no parque havia mais de uma hora, o local estava quase deserto. Pela primei­ra vez sentiu o ar ú mido e suas mã os enregeladas.

— A senhorita está bem? — O vigia do parque a encarava com curiosidade, e ela fez um esforç o para se recompor.

— Oh, sim. Muito bem, obrigada. — Ela se levantou e sorriu. — Acho que estava sonhando de olhos abertos. Nã o tinha idé ia de que já era tã o tarde.

Podia sentir que o olhar dele a seguia, enquanto se encaminhava para a saí da mais pró xima, e fez o possí vel para mostrar-se deci­dida, como algué m que se dirige a um lugar muito definido. Quanto a ela, nã o tinha a menor ilusã o. Nã o tinha mais para onde ir, a nã o ser para o hotel.

O hotel, Ross, o fato de saber que ele tinha estado com Lou tã o recentemente. Vai matar dois coelhos com uma só cajadada?, ela lhe tinha perguntado na noite passada. Recuar para o momento em que ele tinha largado tudo significava aproximar-se do ponto de partida. Ou nã o? Compreendeu que essa nã o seria a primeira vez que ele vira Lou, desde que ela o abandonara. Deveria ter ocorrido pelo menos uma ocasiã o em que ela lhe fornecera o nú mero de te­lefone de Kensington. Isso devia ter acontecido pelo menos uma vez. Por mais estranho que parecesse, ela duvidava de que poderia estar correndo o perigo de perdê -lo completa mente para a outra mulher. Ross poderia achar Lou irresistí vel até certo ponto, mas nã o era suficientemente tolo a ponto de correr o risco de confiarem algué m que já o decepcionara uma vez. Podia até mesmo aceitar que ele amava a ela, Jú lia, à sua maneira. Só que nã o era à maneira dela. Ela o queria integral e completamente, nã o estava disposta a compartilhá -lo.

Portanto, qual seria a alternativa? Perder novamente a memó ­ria? Obrigar sua mente a fazer outra tentativa desesperada para começ ar outra vez do iní cio? Comprimiu os lá bios. Nã o, isso nã o tornaria a acontecer. Nã o poderia acontecer. Aquela Jú lia de seis ou sete semanas atrá s tinha sido uma pessoa diferente. Dessa vez ela iria encarar as coisas como elas eram. Mas de que modo? Pela separaç ã o? Pelo divó rcio? Tentou imaginar a vida sem Ross e sentiu um aperto na garganta. Muito bem, e que tal um ultimato? Obri­gá -lo a escolher entre as duas. Sabia que isso també m nã o era resposta. Provavelmente venceria, mas que efeitos isso teria sobre seu casamento?

Estava bastante escuro no momento em que voltou para o hotel. Ross telefonava, no momento em que entrou no quarto. Olhou para ela e disse:

— Nã o precisa mais, obrigado — e pousou o telefone no gancho.

— Onde foi que você se meteu? — ele perguntou. — Já estava telefonando para Bill a fim de saber se você tinha ido lá.

— Ele já deve ter saí do — ela disse. — Nunca fica até muito tarde na sexta-feira.

— Nem mesmo quando vale a pena? Ela levantou o queixo, agressiva:

— O que você quer dizer com isso?

Fez-se uma pausa, enquanto ele a estudava, em seguida deu de ombros, passou a mã o pelo cabelo e levantou-se da borda da cama.

— Nada de especial. Estava preocupado com você. Que foi que aconteceu?

— Nada — ela disse, com uma ponta de impulsividade. — Eu... saí passeando por aí e me esqueci da hora.

— As lojas fecharam uma hora atrá s.

— Nem todas. E há outras coisas para ver. — Afastou-se dele e colocou a bolsa sobre a cadeira. — Nã o tenho de prestar contas de como passei cada minuto.

— Nã o, se nã o tem vontade. — Ele a olhava pelo espelho, com o cenho ligeiramente franzido. — Guarde seus pequenos segredos.

Já nã o está na hora de você se aprontar? Vamos nos encontrar com David à s sete e quinze.

Ambos guardariam seus segredos, ela pensou, irritando-se com ele. Momentaneamente, pelo menos. Ele tinha o atrevimento de ficar ressentido com a possibilidade de ela ter estado com Bill todo aquele tempo. Logo quem! Vendo-o agora, refletido no espelho, ain­da lhe era difí cil reconciliar o conhecimento que ela agora tinha dele com a imagem que havia formulado a seu respeito por tanto tempo. Por mais de uma vez conseguira convencê -la de sua inte­gridade. Como as mulheres podiam ser cegas, quando se tratava de enxergar atravé s de um homem que se apoderava de suas emo­ç õ es! Totalmente cegas, teimosamente cegas!

Pusera um vestido muito simples, preto e sem mangas. De certa forma, parecia apropriado a seu estado de espí rito. Quando ela saiu do banheiro, Ross já tinha descido até o bar, avisando antes que a encontraria lá. As sete e dez Jú lia pegou o casaco e a bolsa e saiu do quarto para encontrá -lo. Naquele momento, sentia-se desprovi­da de toda e qualquer emoç ã o, e na verdade apreciou aquele vazio. Tinha uma noite inteira pela frente, antes que pudesse tomar qual­quer " decisã o. O que quer que acontecesse, David nã o seria envol­vido, pelo menos no que dependesse dela.

David já tinha chegado quando ela desceu até o bar. Ambos se levantaram no momento em que ela entrou, mas foi o rosto do mais jovem que se abriu em um sorriso.

— Que bom vê -la novamente, Jú lia — disse.

— Da mesma forma. — Inclinou-se impulsivamente e beijou-o no rosto, mas arrependeu-se no mesmo instante e procurou afas­tar-se. Se David ainda se sentia envolvido com ela, e, a julgar por sua aparê ncia, isso poderia ser verdade, entã o qualquer espé cie de encorajamento de sua parte era injusto. — É um alô e ao mesmo tempo uma despedida — ela acrescentou, sorrindo, fazendo piada.

— Pelo menos você vai deixar o inverno para trá s.

— É verdade. Nã o posso dizer que morro de amores pelo frio.

— Ele se mostrava propositadamente expansivo. — Martí ni, Jú lia!

— Por favor. — Ao se sentar, surpreendeu o olhar irô nico de Ross e desviou rapidamente o rosto. Nã o tinha certeza do que ele estava pensando, nã o tinha certeza se queria saber. Se ela tinha de encarar aquela noite até o fim, entã o deveria fazer um esforç opara ocupar seu pensamento com outras coisas, falar a respeito de assuntos que solicitariam sua atenç ã o.

— Você voltou a pensar em pedir transferê ncia para aquele poç o de petró leo no Mar do Norte? — ela perguntou, quase em pâ nico, no momento em que o silê ncio tinha atingido vastas proporç õ es. — Seu trabalho lá seria muito diferente do que você faz agora?

— Nã o tanto quanto você pensa — respondeu David. — Para iní cio de conversa, estaria totalmente isolado da civilizaç ã o e re­duzido a pouquí ssimas possibilidades, no que diz respeito ao lazer. Por outro lado...

— Ela está se referindo apenas ao trabalho interrompeu seu irmã o, ligeiramente irô nico. — Aquilo pelo que você recebe um salá rio.

— Ah, sim. — David lhe sorriu e voltou-se para Jú lia. — Você nã o está interessada em ouvir falar a respeito de petró leo, nã o é?

— Sim — respondeu ela com firmeza —, estou sim. Você apenas mencionou o assunto, nunca se aprofundou. Por exemplo, como é possí vel saber por onde se deve começ ar a prospecç ã o?

Ross pegou o copo e recostou-se na cadeira. Um sorriso bailava em seus lá bios, mas a expressã o do olhar de sua mulher estava muito longe de ser divertida.

— A festa é sua, David.

Como obter petró leo, como processá -lo e como utilizá -lo foi o assunto que os ocupou durante os drinques no bar do hotel, a cor­rida de tá xi até a Villa Dei Cesari, em Grosvenor Road, e a entrada de um jantar excelente. À quela altura, a cabeç a de Jú lia estava tomada por uma confusã o de detalhes para os quais ela, com toda certeza, seria incapaz de encontrar qualquer utilidade. Sentiu-se aliviada quando David convidou-a para danç ar.

— Fiquei contente por você concordar em vir hoje à noite — disse ele suavemente, quando estavam na pista.

Ela o encarou com firmeza.

— Nã o havia a menor razã o para recusar o seu pedido,

— Você sabe que havia, nó s dois sabemos. — A mã o à s suas costas tornou-se tensa de repente. — As coisas, para mim, absolu­tamente nã o mudaram, Jú lia. É por isso que vou embora na quin-ta-feira. Se quiser, estou fugindo de novo.

Ela mal sabia o que dizer. Mesmo que fosse livre, duvidava de ter alguma resposta. David era... David. Uma boa pessoa, mas...

O coraç ã o disparou. Lou! Lou! Tudo se remetia a Lou! Olhou para Ross, sentado sozinho à mesa, girando lentamente o copo entre as mã os, Estaria pensando nela, naquele momento? Desejando que ela estivesse a seu lado? De agora em diante pensaria nisso toda vez que olhasse para ele, mas sem que ele o percebesse.

— Nã o há nada a ganhar quando se foge — ela disse. — As coisas sempre acabam nos atingindo. — Forç ou-se a perguntar; — Esteve com Lou desta vez?

— Sim. — Sua expressã o alterou-se. — Sim, eu a vi.

— E?...

Ele sacudiu a cabeç a.

— E nada. Com toda a franqueza, ela me deixou frio. Nã o con­sigo entender o que vi nela. — Surpreendeu um brilho fugitivo nos olhos dela e subitamente sentiu-se intimidado.

— Está bem, ela ainda consegue acelerar os meus sentimentos. Seria capaz de provocar isso em qualquer homem. Mas o resto nã o me preocupa mais. Mesmo se tivé ssemos nos casado, nã o ficaria com ela para sempre. Precisa de algué m tã o duro quanto ela.

Algué m como Ross, por exemplo. Mas ele també m nã o pudera prendê -la. Era isso o que lhe cabia esperar, que a pró pria Lou se cansasse novamente do relacionamento?

— O que você vai fazer estes dias, agora que Richard quer o apartamento de volta? — perguntou Ross, quando voltaram à me­sa. — Lá existe somente uma cama, nã o é?

— Sim, mas ele disse que eu poderia dormir no divã, apesar de todo o desconforto, conforme o pró prio Rick frisou. — David olhou atravé s das janelas, das quais se descortinava uma bela vista do Tamisa. — É difí cil imaginar que na pró xima semana estarei a milhares de quiló metros de distâ ncia. Viajar sempre me afeta, pelo menos viajar de aviã o. Sou do tipo que prefere longos cruzeiros marí timos.

Ross sorriu.

— Você nasceu com cem anos de atraso. Tem que aprender a se adaptar a nossa era.

— Nã o sei, nã o. Mais dia, menos dia, vou acabar me ajeitando em algum lugar. — David dizia isso com bom humor. — De uma coisa tenho certeza: lá é que nã o há de ser.

A noite chegava ao fim. Ao se despedir de David, Jú lia lutou contra o desejo sú bito de convidá -lo para passar no chalé seus ú 1timos dias ali. Isso apenas serviria para adiar uma decisã o, e de nada adiantaria. Ross nã o teve muito que dizer, enquanto regressavam ao hotel, mas havia algo em sua atitude que ela achou perturbador.

— Mais um drinque, antes de dormir? — ele perguntou, ao en­trarem na portaria, acrescentando, enquanto ela recusava: — Bem, eu nã o resisto e vou tomar. — Seu rosto estava contraí do. — Vejo você daqui a pouco.

Ela já estava deitada quando ele subiu, quinze minutos mais tarde. Apagara a lâ mpada da cabeceira, puxara as cobertas até o queixo e estava de olhos fechados. Ele ficou parado na porta du­rante uma fraç ã o de tempo que para ela pareceu um sé culo, antes de fechá -la. Em seguida ouviu seus passos que se dirigiam até a mesa e, logo apó s, o barulho das chaves c das moedas, enquanto ele esvaziava os bolsos. Escutou o ruí do abafado das almofadas que cediam, o som dos sapatos que caí am sobre o tapete, mais alguns movimentos e percebeu que escovava os dentes.

Em seguida, Ross voltou para o quarto e apagou a luz. Jú lia sentiu cada nervo de seu corpo retesar-se insuportavelmente, en­quanto o colchã o cedia ao peso do corpo dele.

— Você nã o está dormindo — Ross disse. — Pare de fingir.

— Estou cansada. — Ficou admirada com a seguranç a com que falava. — Foi um dia cheio.

— Deu para perceber. — Fez uma pausa, e ela sentia que ele a olhava, apesar de ser impossí vel perceber sua expressã o no escuro. — Você nã o vai me dizer aonde foi hoje à tarde?

— Já contei. Eu apenas...

— Passeou. Sim, eu sei, Mas onde é que foi?

— Por aí. — Conseguiu detectar um leve tremor na voz, mas nã o teve certeza se ele percebera. — Eu... estive pensando muito.

— É? — O tom com que se exprimia se alterara de um modo quase imperceptí vel.

— Pensando em quê?

—Em nó s. — Quem dissera, pensou Jú lia, que uma meia ver­dade era preferí vel à verdade inteira, ou era o contrá rio? — Eu... eu tentei esquecer tudo o que se referia a Enid, Ross, mas nã o foi possí vel. Sei que é uma tolice da minha parte, mas nã o consigo evitar. Afinal de contas, isso faz muita diferenç a. Sinto muito.

O tempo pareceu interminá vel, antes que ele respondesse.

— Já passou uma semana desde que lhe falei a respeito dela.

Eu jamais teria lhe contado, se soubesse que isso a atingiria dessa forma.

— Eu disse a você que tentaria — murmurou. — Você mal sabe como eu me esforcei. Mas nã o consigo. Quando... quando você me toca, eu penso nela. O que quer que seja que você me diga, já disse a ela antes. Você tinha razã o em relaç ã o a mim, Ross. Eu nã o suporto ficar em segundo plano.

— Você acha que é tã o simples assim? — A luz voltou a se acender, e seus olhos cinza cravaram-se nos dela. — Você por acaso acha que sou feito de ferro? Durante semanas a fio tratei de você como se fosse feita de porcelana, Jú lia. Nã o pense que vou reco­meç ar tudo. Diga o que disser, eu me recuso a acreditar que foi tudo fingimento de sua parte, na semana que passou. Você me deseja tanto quanto eu a desejo!

Com o coraç ã o aos pulos ela disse com um fio de voz:

— Existem mais coisas no casamento do que a mera satisfaç ã o fí sica, julguei que já nos tí nhamos posto de acordo em relaç ã o a isso. Dê -me tempo, Ross. Deixe que resolva isso por mim mesma.

O rosto dele ficou mais tenso do que nunca.

— Nã o sou psicanalista — disse finalmente —, mas aprendi algo em relaç ã o as mulheres: você s, a maior parte do tempo, nã o sabem o que querem. Se eu concordasse com a sua sugestã o, você iria deduzir que eu nã o me importava com você. — Estendeu a mã o e segurou-lhe o queixo, obrigando-a a encará -lo. — Nã o é possí vel, Jú lia. Nã o vou me arriscar a perder o que eu consegui recuperar. Se você quiser pensar em Enid, entã o pense. Eu, com certeza, é que nã o vou fazê -lo.

Jú lia cerrou os olhos, enquanto os lá bios dele encontravam os seus. Naquele exato momento, ela se recusava absolutamente a pensar.

 

CAPÍ TULO IX

 

Peggy telefonou na segunda-feira, pela manhã. — Você s se divertiram? — perguntou. — Eu ia telefonar ontem, mas nã o foi possí vel.

— Foi ó timo, obrigada — Jú lia respondeu automaticamente, ape­sar de imaginar que havia muito pouco a acrescentar. — David mandou lembranç as.

— Quanta gentileza de sua parte! Ele nã o pretende passar uns dias aqui antes de viajar?

— Duvido. Nó s nos despedimos na sexta-feira à noite. — Sua mente cerrou-se novamente as lembranç as evocadas por aquele re­lato. — Ross disse que apareceria por aí mais tarde, apó s o traba­lho. Acho que quer conversar com Mike a respeito de um assunto.

— Você acha, é? — Do modo como a voz de Peggy soava, podia imaginar que ela estivesse sorrindo. — Esse seu homem nunca lhe conta nada?

— Depende — disse Jú lia cuidadosamente.

— Pois é, os homens sã o assim mesmo — ela replicou, tentando consolá -la. — Nã o quer vir aqui em casa na quinta-feira? Posso tocar no assunto com Ross, quando ele chegar.

— Sim, ó timo. — Jú lia desejou poder pensar em algum outro adjetivo. — A que horas?

— A mesma hora de sempre... Oh, me esqueci! — Peggy parecia estar pedindo desculpas. — Oito horas está bem?

— Sim. — Mordeu a lí ngua. — Estaremos só nó s quatro?

— Sim, claro. — Fez-se uma pausa. — Por quê?

— Nã o há nenhuma razã o especial. Entã o, até quinta-feira, Peg­gy. Obrigada pelo telefonema.

Desligou o telefone, sentindo uma mistura de alí vio e arrependimento. Conversar com Peggy representava para ela a normali­dade, e a isso ela se aferrava. No entanto, a tensã o em que isso a colocava quase superava sua necessidade. Normalidade! Ficou pa­rada, pensando em Ross e na expressã o fechada de seu semblante durante os dois ú ltimos dias. Desde a ú ltima sexta-feira ele nã o tinha esboç ado a menor tentativa de tocá -la e tornara bastante claro que qualquer esforç o futuro teria de partir dela. Pelo menos quanto a isso ela nã o poderia censurá -lo. Poucos homens poderiam extrair prazer do fato de fazer amor com um pedaç o de madeira totalmente amorfo.

Nã o foi a primeira vez que Jú lia desejou desespera da mente po­der adquirir algum controle sobre suas emoç õ es desencontradas. Outras mulheres tinham sido enganadas por seus maridos. Como é que elas procediam? O que lhe faltava era um cará ter mais forte, ou entã o suficiente profundidade de sentimento para obrigá -la a querer lutar por Ross. Se pelo menos houvesse algué m com quem ela pudesse conversar,.. Algué m com quem ela pudesse comparti­lhar ao menos uma parte de sua confusã o...

Subitamente seu coraç ã o bateu mais forte. Havia uma pessoa: o dr. Stewart. Ele sabia quase tudo a respeito de sua histó ria. Que mal haveria em lhe relatar oresto?

Nã o foi difí cil descobrir o nome do hospital. Ao discar, Jú lia tentou nã o pensar se ela estava ou nã o agindo corretamente. Tinha de encontrar uma vá lvula de escape ou entã o ficaria louca. Per­guntou pelo dr. Stewart com o coraç ã o aos pulos, quase desligou o telefone, enquanto esperava que o fossem chamar, e ficou contente por nã o tê -lo feito no momento em que ouviu aquela voz calma, de que se lembrava tanto.

— Como vai, sra. Mannering?

— Eu... eu gostaria de ir vê -lo — exclamou, — É possí vel?

— Tudo é possí vel — ele replicou, sem demonstrar surpresa. — Quer vir agora?

De alguma forma, ela sabia que ele nã o lhe falharia. Tinha de ser agora ou nunca, e ele compreendeu isso.

— Estarei aí dentro de meia hora — ela disse.

A sra. Cooper lanç ou-lhe olhares inquisitivos quando ela entrou na cozinha a fim de apanhar a chave do carro.

— Vai sair? — perguntou.

— Sim. — Jú lia nã o conseguiu sorrir. — Acho que quando euvoltar a senhora já nã o estará mais aqui. Podia pô r á gua no bebe­douro de Shan?

— Ponho, sim. Ele vai sentir falta do passeio da manhã.

— Eu sei. Eu o levarei para dar uma volta hoje à tarde. Até amanhã, sra. Cooper.

Levou vinte minutos ate chegar ao hospital. O cheiro de limpeza penetrou-lhe nas narinas no momento em que ela entrou pela porta principal e uma criada a olhou sem a menor curiosidade, enquanto fazia uma pausa na sua tarefa de encerar o chã o. O dr. Stewart saí a nesse momento do elevador e foi a seu encontro, a fim de cumprimentá -la.

— Eu a vi chegar da janela da enfermaria — disse. — Há um café à nossa espera na sala da administraç ã o. — Viu que sua ex­pressã o se modificava e sorriu, reconfortando-a. — A diretora neste momento está ocupada em algum lugar do hospital. Nã o seremos interrompidos, se é esse o seu receio.

Ele nã o esperou por uma resposta, mas empurrou-a delicada­mente para dentro do elevador e apertou o botã o. Jú lia nã o conse­guia encará -lo, apesar de nã o ter como deixar de ver seu reflexo no aç o polido da porta. O impulso e o desespero que a tinham levado até lá já estavam dando lugar à dú vida, O dr. Stewart obviamente estava disposto a ouvir, mas como seria possí vel ajudá -la? Nã o havia nada fisicamente errado com ela, nem pí lulas ou remé dios que ele pudesse prescrever. E por onde ela começ aria? Como co­meç aria?

O café ajudou um pouco. O fato de estar sentada naquele escri­tó rio aquecido com uma xí cara na mã o parecia dar à s coisas uma dimensã o bem mais razoá vel. O dr. Stewart també m ajudou, nã o exercendo a menor pressã o.

— Vi seu marido a semana passada — disse. — A julgar pela sua aparê ncia, imaginei que a maior parte de seus problemas tinha sido superada, mas obviamente isso nã o aconteceu.

Jú lia olhou para ele surpresa.

— Ross tem vindo aqui?

— Nã o, nó s nos encontramos por acaso. Um amigo meu está vendendo a casa, e eu, por coincidê ncia, estava lá quando seu ma­rido chegou para avaliá -la. Naturalmente, indaguei da saú de de minha ex-paciente.

— Percebo. — Mordeu os lá bios. — E o que foi que ele disse?

O mé dico sorriu.

— Disse que a senhora estava bem de â nimo. Seu marido é um homem de poucas palavras, mas cada uma delas tem seu peso, ou pelo menos foi o que eu pensei. Será que ele se enganou tanto assim?

— Naquele momento, nã o. — Jú lia pousou a xí cara. — O senhor ficaria admirado se eu lhe dissesse que recobrei a memó ria?

— Nã o, eu ficaria mais é interessado. — Ele a estudou atenta­mente. — Quando foi?

— Há trê s dias. — Fez uma pausa. — É um tanto complicado.

— Nem tanto. A senhora nã o é a primeira mulher a ficar emo-cionalmente perturbada ao se dar conta de que seu marido lhe ocultou alguma coisa. Admito que seu marido errou em nã o lhe contar nada a respeito de sua primeira mulher, mas...

— Nã o se trata disso. — Ela o interrompeu de imediato, ten­tando logo em seguida ser inteiramente honesta consigo mesma, bem como com o mé dico: — Nã o é apenas isso. Ross me falou sobre Enid há mais de uma semana.

— Antes que a senhora recobrasse a memó ria? Entã o... —- Ele pareceu surpreso. — Prossiga.

Tornou-se mais fá cil falar, uma vez que ela começ ou. Contou-lhe tudo, desde sua visita ao escritó rio e de seu encontro com Lou até o momento naquela sexta-feira em que tinha visto Rose sair do apartamento de Lou.

— A histó ria com Enid aconteceu há muito tempo — disse ao acabar. — Eo seu envolvimento com essa mulher també m. Mas é o aqui e o agora que tornam tudo insuportá vel.

— O que é muito compreensí vel. — O doutor fez uma pausa, seus olhos a fitaram pensativamente. — Tem certeza de que ainda existe algo entre seu marido e essa outra mulher? Sua visita, na­quela tarde, nã o poderia se prender a algum outro motivo?

— Se fosse assim, nã o haveria necessidade de ocultar o fato, nã o acha? — ela replicou, sem maiores rodeios, e levantou-se, indo até a janela contemplar a vista da cidade. — O senhor acha que devo deixá -lo?

— Nã o — ele respondeu calmamente. — Acho que devia lhe contar e dar a ele uma oportunidade de se defender.

— Mas que defesa ele teria a apresentar? Que defesa qualquer outro homem teria? — Ela se voltou e o encarou com ar iró nico. —Ou o senhor acha que um homem deve ter uma mulher e uma amante?

— Sob o ponto de vista fí sico, isso nã o lhe causaria nenhum dano. — Seu tom era neutro. — Moralmente, eu me sentiria incli­nado a condená -lo.

O ressentimento dissipou-se tã o rapidamente quanto tinha surgido.

— Desculpe-me — ela disse com sinceridade. — Nã o devia ter falado assim. O senhor nã o pediu que eu viesse aqui lhe relatar meus problemas.

— Mas posso ter ficado contente por a senhora ter findo. A longo prazo, guardar as coisas para si acaba fazendo muito mal. — Espe­rou um momento e acrescentou: — Só sinto nã o poder lhe oferecer um conselho melhor. Confirmar seus temores nã o poderia deixá -la em pior estado do que a senhora se encontra neste momento.



  

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