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CAPÍTULO 1



 

 

Samantha Clifton deixou o Cadillac de seu sogro, Howard Clifton, no estacionamento do aeroporto de Antí gua, desceu, fechou a porta e foi em direç ã o à sala de espera. O sol estava mais forte do que nunca e as palmeiras se agitavam ao vento. Carregadores, guias turí sticos, choferes e viajantes lotavam o aeroporto e formavam uma pequena multidã o colorida e barulhenta. O aviã o das Linhas Aé reas Canadenses, vindo de Toronto, tinha acabado de chegar trazendo muitos turistas que procuravam fugir do rigoroso inverno, a fim de passar uma ou duas semanas nas praias daquele paraí so tropical.

Samantha se aproximou da multidã o com certa relutâ ncia. Nã o queria ter vindo ao encontro da pessoa que estava para chegar. Chegara mesmo a permanecer o má ximo possí vel em St. John, a capital da ilha, onde passara a manhã fazendo compras. Apó s o almoç o tivera a idé ia de nã o comparecer ao aeroporto e ir para outro lado da ilha, onde ficaria a tarde inteira em uma das belas praias. Fingiria que havia se esquecido de ir ao aeroporto.

Sem conseguir ver a pessoa que tinha ido encontrar, foi até um dos terminais e olhou à sua volta. Lá ainda se encontravam alguns turistas, cobertos de suor pois usavam roupas quentes demais para aquele clima. Todos esperavam sua bagagem, mas ela nã o conseguiu ver Craig em nenhum lugar.

Quem sabe ele houvesse desistido... Talvez negó cios urgentes o tivessem impedido de deixar sua sala no Edifí cio Clifton, em Toronto.

Samantha olhou à sua volta, sem pressa, esperando nã o vê -lo; ao mesmo tempo desejava o contrá rio. Censurava-se por ter emoç õ es tã o contraditó rias. Craig, poré m, sempre exercia aquele efeito sobre ela.

O relacionamento deles era uma estranha mistura de amor e ó dio.

— Está me procurando? — algué m perguntou atrá s dela.

Samantha ficou tenta e um arrepio percorreu-lhe a espinha. Voltou-se lentamente e olhou para o homem quem lhe dirigira a palavra. Tinha olhos cinzentos e duros, sobrancelhas espessas e um rosto rí gido, queimado do sol. Ela sentiu voltar a velha antipatia de sempre por aquele homem: Craig Clifton, seu marido. Era um sentimento imediatamente superado pelo prazer de vê -lo novamente. Tratava-se de algo perigoso e perturbador, de uma reaç ã o puramente sensual à presenç a dele.

— Você está atrasada — ele disse com frieza, sem qualquer demonstraç ã o de estar contente ou nã o em vê -la.

— O aviã o chegou mais cedo do que estava anunciado — ela replicou, sacudindo a cabeç a, como se quisesse espantar a sensaç ã o de prazer. Seus cabelos ruivos longos batiam pelos ombros muito queimados de sol. — Você tem muita bagagem? Quer que eu traga o carro até a porta?

— Nã o, trouxe apenas esta mala. Posso leva-la até o carro.

Samantha entrou no estacionamento e, enquanto Craig acomodava suas coisas no banco de trá s do carro, ligou o motor. Ele tirou o paletó e a gravata, coloco-os em cima da mala e sentou-se ao lado dela.

Saindo do aeroporto, seguiram por uma estrada cheia de curvas.

Num determinado ponto Samantha virou à esquerda, afastando-se da capital da Ilha.

Percorreram vá rios quilô metros e deixaram para trá s os pastos verdejantes de uma grande fazenda antes que um deles falassem. De repente os dois abriram a boca ao mesmo tempo, como se nã o conseguisse mais suportar a tensã o que pairava entre eles.

— Há quanto tempo você está aqui? — perguntou Craig.

— Por que você nã o veio antes? — ela indagou.

Ele riu baixinho, de forma irô nica e voltou-se para olhá -la. Samantha o encarou rapidamente e voltou a sentir aquela excitaç ã o perigosa.

Espera nã o experimentar a menor emoç ã o, apó s dois anos de separaç ã o. Jugava que tinha superado o amor que sentia por aquele homem.

— Ainda estamos agindo da mesma forma — ele murmurou, sentando-se mais perto e apoiando o braç o no banco onde Samantha estava.

— Como assim? — Ela perguntou, endireitando-se, a fim de evitar qualquer contato.

— Pensando as mesmas coisas e falando juntos, mesmo estando distante há algum tempo. Que bom ver você novamente, Samantha...

Ela nã o disse nada porque se aproximavam de uma aldeia. As casas eram de madeira e todas tinham uma acolhedora varanda na frente. As trepadeiras subiam pelas cercas e nos jardins cresciam palmeiras e bananeiras. A rua principal era estreita e cheia de curvas.

Samantha diminuiu a marcha, para evitar algumas crianç as sorridentes que paravam de propó sito no meio da rua. Tinha a pele reluzente e cor de chocolate e pareciam divertir-se muito com a brincadeira.

— Estou há quase uma semana — ela disse, respondendo à s perguntas de Craig.

— É mesmo? Por que veio?

Samantha olhou-o, també m surpreendida. Aquela reaç ã o seria sincera?

— Vim porque Carla me escreveu, dizendo que Howard estava muito doente e queria me ver.

— E ela nã o lhe disse que tinha escrito també m para mim, contado a mesma coisa? — perguntou Craig.

Ele acariciou lentamente os ombros nus de Samantha e enterrou os dedos em seus cabelos. Dominando-se o quanto podia, ela procurou nã o reagir à quela atitude provocante e manteve o olhar fixo na estrada.

— Ignorava o fato até esta manhã, quando Carla me pediu para ir pegá -lo no aeroporto. Só entã o me contou que tinha solicitado a sua presenç a por causa de Howard, mas você disse que só viria depois de concluir alguns negó cios. É bem caracterí stico de você, pô r os negó cios em primeiro plano. Nem se importa com os sentimentos de seu pai.

Aquele comentá rio causou o efeito que Samantha pretendia. Ele parou de acariciar-lhe os cabelos e se afastou. Sabia, poré m, que Craig ainda olhava para ela. Conseguiu sentir aquele olhar frio e observador, que nã o perdia o menor detalhe de seu rosto, de seus cabelos, de sua roupa. Eram olhos astutos, acostumados a enfrentar oposiç õ es e competiç ã o.

— E o que você me diz da sua atitude? — ele perguntou, provocando-a. — Por que deixou esse emprego tã o absorvente e veio até aqui visitar seu sogro? Nã o tinha percebido até agora que gostava tanto de Howard. O que espera ganhar com isso? Quer ser beneficiada no testamento dele?

“Nã o posso deixar que ele me descontrole! E me faz ficar zangada! ”, pensou Samantha.

— Gosto muito de Howard e de Carla — ela disse, como muita calma — Eles tê m sido muito bons amigos comigo — Subitamente a emoç ã o surgiu em sua voz. — Vim porque ele está muito doente... Você nã o sabia? Seu pai está morrendo!

— Sim, eu sei.

— Nã o podia me recusar a vir. Nã o podia deixar de atender aos desejos de um moribundo, embora você talvez o consiga.

O silê ncio voltou a reinar entre eles, enquanto passavam pela aldeia de Liberta, deixando para trá s a Igreja de Sã o Bernabé. Tinha um sé culo e era construí da com um tipo de pedra verde muito comum em Antí qua. Era uma atraç ã o turí stica e erguia-se numa curva da rua principal da aldeia.

Samantha guiava com muito cuidado. A estrada agora passava por entre colinas verdes, cobertas de vegetaç ã o espessa. Vá rios tipos diferentes de palmeiras se misturavam com quaresmeiras e eucaliptos, bem como diversas qualidades de arbustos.

— E o seu emprego? — perguntou Craig, ignorando de propó sito a irritaç ã o de Samantha.

Ela voltou a olhá -lo. Craig se apoiava de encontro à porta do carro, e que nã o deixava de ser perigoso.

— Pedi demissã o há algumas semanas... — ela revelou, sempre olhando em frente.

— Entã o, está desempregada?

— No momento, sim — ela disse, com a esperanç a secreta de que Craig nã o lhe perguntasse por que tinha deixado a seç ã o editorial da revista feminina onde trabalhava.

Nã o queria de modo algum que ele descobrisse que havia mentido.

Na verdade, fora solicitada a pedir demissã o, quando os proprietá rios da revista decidiram fazer um corte de pessoal devido à situaç ã o econô mica. Seu cargo havia sido considerado desnecessá rio.

O silê ncio pairou mas uma vez. O sol batia em cheio no carro e felizmente o ar-condicionado funcionava. A estrada cortava a aldeia de Falmouth e, por trá s das casas, via-se a baí a de á guas azuis e praias douradas. Á esquerda erguia-se a escola, cinzenta e desolada. Samantha diminuiu a marcha, seguindo por uma estrada estreita e um tanto esburacada. Numerosas cabras que pastavam pelos campos pararam, ao ver o automó vel.

— Por que nã o tocou no dinheiro que enviei para o seu banco? — perguntou Craig, com aquela franqueza que era sua marca.

— Porque nã o quis. Prefiro ser independente de você. — Sua voz se alterou um pouco. — Por que continua a me enviar dinheiro?

— Porque você ainda é minha mulher.

— Você poderia ter se divorciado de mim — ela disse com os lá bios trê mulos, embora fizesse o possí vel para mantê -los firmes. — Por que nã o se divorciou?

— E por que haveria de me divorciar? Você nã o me deu a menor razã o para isso.

— Eu o abandonei. Nã o é uma razã o suficiente? — ela perguntou em voz baixa, voltando a agarrar com forç a a direç ã o.

— Segundo meu modo de pensar, nã o. Creio ter compreendido por que você partiu. Queria se afastar durante algum tempo, ficar sozinha, descobrir o que desejava da vida e a separaç ã o nã o pareceu uma boa idé ia. Eu, no entanto, sempre achei que um dia vamos voltar a nos dar bem, quando você se tornar uma mulher adulta e parar de se comportar como uma crianç a mimada.

Samantha viu tudo vermelho pela frente. Craig se mantinha sempre tã o calmo e arrogante! Sempre parecia ter razã o, dando a impressã o que ela era a culpada de tudo.

— Nã o sou uma crianç a mimada! — ela retrucou, indignada, lanç ando-lhe um olhar furioso.

— Ei, cuidado! Está indo depressa demais! Diminua a velocidade, senã o vamos acabar batendo!

Craig agarrou na direç ã o, voltando-a com violê ncia para a direita e o carro quase saiu da estrada.

— Tire o pé da embreagem — disse ele, enquanto o carro percorria o acostamento. — Eu disse para tirar o pé e nã o para acelerar ainda mais, sua idiota! — berrou Craig. Suas palavras penetram finalmente no cé rebro de Samantha e só entã o ela percebeu que o carro descia uma ladeira a toda velocidade. — Breque, breque! — gritou ele, e ela afundou o pedal.

Os pneus rangeram e o carro parou a pouquí ssima distâ ncia do tronco de uma á rvore.

— Por que você fez isso Craig? Por que virou a direç ã o?

— Porque você parecia um morcego e ia cair num dos maiores buracos que já vi. Poderia ter destruí do o carro, isso para nã o falar do que aconteceria conosco. Nã o estava olhando para onde ia e precisei agir. Você ainda tem um temperamento dos diabos, Samantha!

— A culpa foi toda sua. Fiquei zangada, porque eu nã o sou uma crianç a mimada. Você sempre me enfureceu. Foi por isso que o abandonei. — A reaç ã o diante do que tinha acontecido se manifestou e Samantha começ ou a tremer. Cobriu o rosto com as mã os e choro. — Por que você veio para cá? Preferia que nã o viesse! Se soubesse disso, teria partido antes de sua chegada. Seria preferí vel que Carla tivesse me avisado ontem e eu sairia da sua casa. Gostaria que ela nã o me pedisse para encontrá -lo. Vai ser horrí vel estar com você aqui! Nã o posso suportar estar junto de você. Tenho de ir embora!

Samantha falava sem parar, com a maior incoerê ncia, mas acabou parando por falta de ar. O silê ncio que se seguiu era interrompido unicamente pelo trinado dos pequenos pá ssaros amarelos que saltavam de galho em galho, na mata. Samantha cobriu o rosto para disfarç ar a violê ncia de suas emoç õ es. No entanto, mantinha-se alerta, à espera de que Craig lhe disse algo.

Craig se mexeu, mas agiu ao contrá rio do que ela esperava. Abriu a porta do carro e desceu. Despeitada pelo fato de ele nã o ter dado nenhuma resposta a seu protesto, Samantha tirou as mã os do rosto e olhou a sua volta. Com as mã os enfiadas nos bolsos de sua elegante calç a cinza, Craig examinava a posiç ã o do carro. Nã o parecia nem um pouco afetado diante de tudo o que ela havia dito. Estava muito mais interessado no carro do que nela. Samantha ficou ainda mais indignada.

— Vamos precisar de sua ajuda para sair dessa situaç ã o — ele disse com toda calma, encarando-a. — Parece que está vindo um carro, descendo o morro. Peç a ao motorista que pare, por favor.

— Você que pare o carro!

— Vamos, Sam. Sabe muito bem que é mais fá cil a pessoa parar vendo você do que um tipo como eu.

— E se for uma mulher? — Samantha perguntou, em atitude de desafio.

— Ela vai parar para ajudar outra mulher que se encontra numa situaç ã o difí cil — disse Craig, sorrindo, o que lhe atenuava um pouco a rigidez da expressã o. Ele deu a volta e abriu a porta. — Vá para a beira da estrada, antes que o carro passe por nó s — acrescentou, ajudando-a a descer.

— Está bem — disse ela com má vontade, recusando a mã o que ele lhe estendia.

Estava decidida a evitar qualquer contato fí sico com Craig. Percebeu entã o que nã o se arriscava nesse sentido. Estava longe dele há muito tempo, sem fazer amor, e nã o tinha a menor certeza de que conseguiria se comportar de forma racional.

Samantha foi até a beira da estrada no exato momento em que o veí culo chegava ao fim do morro. Acenando, correu até a estrada e o carro, que, aliá s, era um taxi, freou bem junto dela. O chofer olhou para Samantha com uma expressã o de surpresa em seus olhos castanhos.

— Por favor, pode nos ajudar? — Ela pediu. — Tivemos de sair da estrada para evitar um buraco e agora o carro ficou preso. Será que pode nos ajudar a empurrá -lo para a estrada?

— Sem dú vida, senhorita! — o chofer disse, sorrindo. — Nã o é verdade? — ele acrescentou, voltando-se para o outro rapaz sentado a seu lado. Os dois eram muitos jovens, fortes e deviam trabalhar no hotel do governo, situado na regiã o. Certamente voltavam para casa, depois de cumpridas suas tarefas. — Onde está o carro?

Logo o Cadillac estava novamente na estrada e o tá xi se afastou rapidamente, deixando para trá s de si uma nuvem de poeira.

— Daqui por diante quem dirige sou eu — disse Craig.

Samantha nã o discutiu, pois nã o gostava de dirigir naquela estrada. Era cheia de obstá culo e a deixava muito tensa. Sentou-se ao lado de Craig, fechou a porta e partiram.

Nã o conversaram durante o resto do caminho. Craig se encontrava na direç ã o, procurando evitar os buracos e os veí culos que vinham em sentido contrá rio. Samantha contemplava a paisagem. Os campos verdejantes se estendiam até as colinas distantes. No cé u muito azul algumas nuvens passavam, navegando como caravelas. A estrada se desviou para esquerda e lá estava o mar, ainda mais azul do que o cé u.

As ondas vinham morrer nas praias douradas e a á gua era de uma transparê ncia incrí vel.

Faltavam poucos quilô metros para chegarem à residê ncia dos Clifton. Howard a construí ra nos dez alqueires de terra adquiridos havia trinta anos, quando descobriu a linda ilha de Antí gua em meios à s á guas azuis do Caribe. Aquele lugar se tornava cada vez mais um refú gio de milioná rios nos tró picos.

Howard ainda era riquí ssimo, mas nã o tinha boa saú de e fora viver permanentemente com sua segunda mulher, Carla, no bangalô, construí do no rochedo, do qual avistava uma baí a muito bonita. Era presidente da companhia e ainda tinha grandes interesses nos negó cios que eram feitos em todo o mundo. No entanto, a supervisã o de tudo cabia a Craig, seu filho mais velho, o ú nico nascido do primeiro casamento com Ashley Colter, filha de um aristocrata inglê s empobrecido, que conhecera ao visitar Antí gua pela primeira vez. Fazia alguns anos que divorciara dela, apó s um processo demorado e cheio de incidentes desagradá veis.

Samantha olhou para Craig. Ele nã o havia mudado muito. Era oito anos mais velho do que ela e tinha agora trinta e trê s anos. Seu queixo ainda era firme, os cabelos continuavam negros e o corpo permanecia atlé tico. A pele continuava queimada de sol, embora ele tivesse acabado de chegar do Canadá, mergulhado em pleno inverno. De acordo com a mã e de Craig — a bela e despreocupada Ashley — a cor morena se devia à possibilidade da existê ncia de sangue í ndio na famí lia Clifton.

— O primeiro Clifton a ir para o Canadá era um explorador e aventureiro. Ao que se sabe uniu-se à filha de um chefe í ndio. E por isso que a pele deles tem essa cor de cobre. Talvez isso explique o fato de serem tã o calados e introvertidos — Ashley riu. — Para falar a verdade, Howard é arredio demais para o meu gosto. Jamais conseguir descobrir o que o entusiasmava, a nã o ser o fato de ganhar milhõ es de dó lares. Espero que você tenha mais sorte com Craig do que eu tive com o pai dele, minha querida. Lembre-se de que meu filho carrega algo de mim nele. Ele gosta de viver, rir e amar.

Tinha sido difí cil acreditar no que Ashley dissera a respeito de Craig nas primeiras semanas de casamento. A lua-de-mel fora passada num iate pertencente ao pai dele e visitaram as ilhas Bahamas. Craig se mostrou alegre e amoro, gentil e cortê s, lhe ensinando muitas coisas; como manejar um barco a vela, como mergulhar no mar à procura de conchas e como fazer amor...

De repente Samantha sentiu um aperto no coraç ã o. Nã o queria recordar a lua-de-mel. Sempre sofria ao lembrar os dias luminosos, passados nas ilhas verdejantes e desertas, de praias douradas, e marcados pelo amor que sentia por aquele homem agora sentado ao seu lado.

Já se haviam passado quase quatro anos desde que o conhecera, em Londres. Nessa é poca acabara de completar vinte e um anos e estava muito contente e entusiasmada com seu emprego. Trabalhava numa editora que publicava nã o apenas jornal, mas vá rias revistas, inclusive uma dirigida especificadamente ao pú blico feminino. Exercia suas funç õ es no departamento de publicidade da revista feminina, cuidando dos anú ncios. Procurava aprender tudo o que podia a respeito da produç ã o de uma revista, pois tinha a ambiç ã o de um vir a ser a editora-chefe.

Jovem e entusiasmada, cheia de ideias feministas que tinham sido incutidos por sua mã e, uma mulher muito politizada. Samantha era o mesmo tempo um pouco ingê nua e ignorante das escusas manobras de bastidores que levavam as grandes companhias a engolir as pequenas. Nunca tinha ouvido falar da Empresa Clifton, uma companhia canadense proprietá ria de uma cadeia de jornais na Austrá lia e no Canadá, e que procurava meios de adquirir um jornal inglê s.

Quando lhe solicitaram para acompanhar um homem chamado Craig Clifton até as salas onde era produzida a revista feminina, Samantha nã o tinha a menor idé ia de que era o herdeiro de uma empresa que faturava milhõ es. Agora se lembrava de que havia gostado dele assim que o vira. Apreciou o fato de ele tratá -la em pé de igualdade e de lhe fazer perguntas inteligentes a respeito da revista.

Craig ouvia suas respostas com atenç ã o, sem deixar de fita-la sequer por um momento com aqueles olhos cinzentos e observadores.

Depois que se despediram, Samantha nã o pensava em revê -lo e ficou sinceramente surpreendida quando ele voltou no dia seguinte ao departamento de publicidade convidando-a para ir ao teatro naquela mesma noite. Ela aceitou, muito contente, pois se tratava do musical Evita, que desejava muito ver mais para o qual nã o tinha conseguido entradas até aquele momento.

Nas semanas seguintes os dois se encontraram muitas vezes. Descobriram que tinham muitos interesses em comum e apreciavam a companhia um do outro. Em nenhum momento Craig falou de seu relacionamento com Howard Clifton, o milioná rio dono de jornais ou porque se encontrava na Inglaterra. Disse apenas que era do Canadá, morava e vivia em Toronto e estava na Inglaterra a fim de representar a empresa em que trabalhava.

De repente Craig desapareceu de sua vida tã o abruptamente como tinha surgido, sem comunicar que ia embora e sem dizer se voltaria.

Samantha ficou magoada e surpreendida consigo mesma, pois sempre havia se considerado muito liberada em suas atitudes com o sexo oposto. Nã o era de seu feitio apaixonar-se por um homem que o conhecesse há pouco tempo.

Aquela havia sido a pior primavera de sua vida, pois lutara para esquecê -lo e tinha fracassado. Seus dias e noites eram invadidos pela lembranç a de Craig e seus beijos. Entã o na noite de uma sexta-feira de junho, quando deixava o escritó rio, ele surgiu diante dela, como se nunca tivesse partido. Ignorando as duas pessoas que a acompanhavam, beijou-a na boca e lhe fez aquela proposta absolutamente inesperada:

— Quer se casar comigo, Samantha?

Ela sentiu-se tã o feliz ao vê -lo que se atirou em seus braç os.

— Quero, sim, sem dú vida! — declarou.

Samantha percebeu que o carro diminuiu a marcha. Deixou as recordaç õ es de lado e olhou pela janela. A estrada descia por uma colina e ela viu as á guas azuis de uma pequena baí a, guardada por dois rochedos.

Logo chegaram a um portã o aberto, seguindo por uma alameda junto à qual se alinhavam imponentes palmeiras. A alameda terminava no pá tio forrado de lajotas de pedra, para a qual davam as arcadas de uma construç ã o baixa e comprida. As paredes muito brancas brilhavam ao sol e as janelas estavam cobertas por toldos azuis e verdes.

O carro mal tinha acabado de parar quando um homem desceu os degraus, aproximando-se. Era Jeremiah Smith, o mordomo de Howard Clifton, e estava todo vestido de branco. Era sé rio e calmo e em seus olhos muito negros havia uma expressã o de tristeza.

— Seja bem-vindo, sr. Craig — ele disse, com as tí picas boas maneiras e a voz macia dos moradores de Antí gua. Abriu a porta para Samantha e foi até o bagageiro. — Pode deixar que eu levo as malas, sr. Craig. Acho que o senhor vai querer tomar um banho e mudar de roupa, nã o é mesmo? Eu o acompanho até seu quarto.

— Obrigada, Jeremiah. Como vai? — Perguntou Craig, demostrando interesse e consideraç ã o.

— Nã o posso me queixar, senhor, nã o posso me queixar... — disse Jeremiah de bom humor, pegando as malas e olhando para Samantha. — O sr. Farley perguntou pela senhora. Disse que está à sua espera, na piscina.

— Farley?! — exclamou Craig, sem disfarç ar uma leve irritaç ã o. — Há quanto tempo ele está aqui?

— Chegou na semana passada — disse Samantha.

— Mas ele deveria estar na universidade. O semestre ainda nã o terminou.

— Parece que nã o tem passado muito bem e Carla decidiu que ele deveria descansar — informou Samantha, com alguma hesitaç ã o.

Craig ficou muito aborrecido. Praguejou baixinho e, com ar decidido, entrou em casa. Samantha hesitou durante alguns segundos antes de segui-lo.

O vestí bulo estava forrado com Lajotas e a mobí lia se resumia a alguns divã s muito simples, em cima dos quais se viam almofadõ es verdes.

Havia uma porta de vidro, que dava para a piscina.

Samantha foi até lá e sentou-se a uma das mesas cobertas por um guarda-sol. O jovem que nadava na piscina deu algumas braç adas em sua direç ã o e saiu. Era magro e nã o muito alto. Suas costelas apareciam sob a pele bronzeada. Tinha os cabelos negros, encaracolados e tã o compridos que chegavam pelos ombros. Seus olhos, a exemplo dos de sua mã e, Carla Clifton, eram grandes e negros. Farley sentou-se ao lado de Samantha.

— Ele chegou? — perguntou.

— Sim.

— Você lhe contou que estou aqui?

— Nã o. Foi Jeremiah quem contou, ao me dar seu recado, Craig perguntou por que você está aqui.

— E...

— E disse que você está doente e Carla achou melhor que descansasse alguns dias.

— O que ele disse?

— Nã o tenho certeza, mas parece que ficou aborrecido. Samantha sorriu.

— Quer dizer entã o que está zangado — comentou Farley, desanimado — Meu Deus, o que eu faç o? Craig vai ficar maluco quando descobrir que saí da universidade.

— Eu nã o sabia disso!

— Nem eu, até está manhã, quando decidi nã o voltar mais. Nã o importa o que meu pai ou Craig digam, mas o fato é que nã o posso voltar. Nã o sou feito de pedra. Se por acaso eu voltar, terei mais uma depressã o nervosa. Nã o aguento mais. — Farley colocou a mã o sobre a de Samantha. — Graç as a Deus você está aqui, Samantha! Sabe o que é enfrentar Craig e lhe dizer como se sente, nã o é mesmo? Entende perfeitamente o que é se chocar contra a vontade dele.

— Creio que sim...

— Você nã o quer falar ele a meu favor? — o rapaz pediu em um tom de sú plica. — nã o quer procurar convencê -lo de que nã o levo o menor jeito para seguir carreira no mundo dos negó cios? Diga que o que mais desejo é ser um cantor, divertir as pessoas com minhas mú sicas, como minha mã e costuma fazer...

— Tentarei.

— Obrigado, obrigado — ele murmurou, beijando a mã o de Samantha. — Gosto muito de você. Sabia disso? Preferia que nã o tivesse casado com aquele mostro insensí vel que é meu irmã o. Gostaria de poder ir embora com você, para sempre...

— Farley, pare com isso! Por favor, comporte-se — ela protestou, tentando retirar a mã o.

De repente algué m se aproximou e Samantha levantou os olhos.

Craig, usando um maiô minú sculo, contemplava as mã os dela, entrelaç adas com as de Farley.

 

 



  

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